Democracia liberal é uma fraude
Por Gerardo Santiago*
O que está acontecendo na França nos mostra que a “democracia” liberal capitalista é uma fraude, um sistema político no qual o poder econômico, o dinheiro, é que manda, não o povo, como a palavra sugere. Diante da possibilidade de ver o seu projeto de “reforma” da previdência ser derrotado na Assembleia Nacional, Emanuel Macron apelou para o mais descarado golpismo: por meio de um artifício, uma “marretada” constitucional, passou por cima do Parlamento para impor a sua proposta goela abaixo do povo francês, por decreto.
Quer dizer, quando a agenda do grande capital enfrenta uma resistência política capaz de inviabilizá-la, o “estado democrático de direito” rasga a fantasia e usa o porrete. Não é só isso. A luta dos trabalhadores franceses contra o ex-banqueiro convertido em presidente também desnuda a forma como a mídia corporativa mente e manipula para defender os interesses da classe dominante. Se isso estivesse acontecendo na China, em Cuba ou na Venezuela, ou em qualquer outro país que por qualquer razão incomode a ordem neoliberal global, estaríamos escutando falar em “ditadura” e “autocracia”, ou não? Imaginem se fosse por exemplo Nicolás Maduro no lugar de Macron, ou que fosse a polícia chinesa agindo com a brutalidade que a francesa está utilizando. Imaginem se fossem centenas de manifestantes presos em Havana!
Na Ucrânia em 2014, neonazistas enfrentando a polícia com coquetéis molotov eram “lutadores pela liberdade”. Na França de 2023, trabalhadores e estudantes que façam a mesma coisa em defesa de direitos sociais são “vândalos” ou “delinquentes”. Assim funciona a “imprensa livre”, um dos pilares da “democracia” liberal, na verdade a cínica porta voz do pensamento único neoliberal.
Arroubos autoritários por parte de governantes idem não são propriamente uma novidade na História da França. Em junho de 1789, o então rei Louis Capet ordenou a dissolução dos Estados Gerais, arremedo de Parlamento existente na época, por não estar satisfeito com os rumos que o debate tomava. Os deputados representantes do “terceiro estado”, da população plebeia sem títulos de nobreza ou eclesiásticos, se insurgiram contra essa ordem e se mantiveram reunidos. Três semanas depois, era o povo que se insurgia e tomava a Bastilha. Começava uma revolução que mudou a França, a Europa e o mundo, além de enviar Louis Capet para a guilhotina.
A lição mais importante que se pode tomar da luta do povo francês contra Macron hoje é a mesma de 1789 e da Comuna de Paris em 1871: as aristocracias, as oligarquias, as plutocracias, as classes dominantes podem ser enfrentadas e vencidas pela rebelião daqueles que elas dominam, exploram e humilham. Que o espírito dos “sans culottes” de 1789/94 e dos “communards” de 1871 inspire as ruas francesas de hoje.
* GERARDO SANTIAGO: Aposentado do BB, Ex-Diretor do SEEB/RIO, EX- Diretor da PREVI, Advogado e Militante do PCB.
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