Maria Brandão Reis: campeã pela paz
Por Rafaela Fraga
À memória de Maria Brandão – Baiana de Rio das Contas, Maria Brandão dos Reis nasceu junto com o século XX, no ano de 1900 – a primeira dos 9 irmãos que teria. Ainda em sua mocidade, abriu uma pensão na Baixa dos Sapateiros, em Salvador. Essa pensão lhe poria em contato com muitos dos jovens a quem formou politicamente, já sinal do trabalho fundamental que desempenharia na Bahia ao longo de sua trajetória.
Maria era uma mulher hospitaleira, e também muito altiva. Aos 47 anos, adentrou robustamente na luta política a partir de uma demanda de seu povo: mulheres, crianças e famílias inteiras da, como era chamada, invasão do Corta Braço estavam sendo ameaçadas de despejo. Maria Brandão organizou os moradores em vigília e, junto ao movimento, puxou uma passeata. Hoje, o Corta Braço é o bairro do Pero Vaz, vizinho à Liberdade e ao Curuzu.
Influenciada pela Coluna Prestes, organizou-se no Partido Comunista Brasileiro (PCB) e, junto ao Partido, deu continuidade à sua militância política voltada, principalmente, à luta pela paz e contra a carestia da classe trabalhadora, a qual ela conhecia de perto. Entre 1947 e 1951, teve uma atuação de muitíssimo destaque – mas nem tanto prestígio -, tanto no PCB quanto na Federação de Mulheres do Brasil, a FMB.
Foi se hospedando na pensão de Maria Brandão que a histórica militante comunista Ana Montenegro a conheceu, e por ela foi introduzida à vida política. Em trecho do seu livro Falando de Mulheres, Montenegro traz: “Eu a conheci, Maria, usando uma linguagem que não era minha – a linguagem do povo. Eram expressões que não tinham me ensinado nas escolas e nem tinha lido nos livros e com as quais você convencia pessoas, quando ia, de porta em porta, pedindo assinaturas pela paz.” A que se referia Ana Montenegro?
Em 1950, o Partido Comunista organizou uma campanha pela proibição do uso de armas atômicas, seguindo diretrizes da União Soviética direcionadas a todos os PCs do mundo. Essa ação ficou conhecida no Brasil como “Campanha pela Paz”, e sua principal finalidade era o recolhimento de assinaturas da população para fortalecer a máxima de que qualquer arsenal atômico existente no mundo deveria ser eliminado.
A esta altura, o Partido já tinha sido posto na ilegalidade, e Maria seguiu firme em sua atividade partidária. Não apenas participou da Campanha, construída também pela FMB, como foi recordista: segundo o Jornal Momento Feminino, Maria Brandão dos Reis levou 10.700 assinaturas para o III Congresso Brasileiro dos Partidários pela Paz, ocorrido no Rio de Janeiro em 1951 e para o qual foi como delegada da Bahia.
“Dezenas de grupos de mulheres subiram aos morros, percorreram os bairros e foram às portas das fábricas”, dizia uma edição do Jornal Momento Feminino no mesmo ano, mostrando Maria nas fotos. Ela ficou conhecida como “milionária da paz” pela quantidade de assinaturas que recolheu a partir de seu trabalho de base. Este que, aliás, influenciou na formação de comitês de base nos bairros, fator importantíssimo para a organização da classe, a qualquer tempo.
Como reconhecimento à sua atuação altamente disciplinada e avançada, em 1952 Maria Brandão foi indicada ao recebimento de uma medalha de ouro do Júri Nacional dos Prêmios da Paz, condecoração de grande notoriedade e importância, concedida aos mais destacados coletores de assinaturas. Assim, oficialmente, tornou-se Campeã da Paz.
Maria tinha esperança, mas não era uma esperança abstrata; ela a construía, dia após dia, na luta de classes. Ela dizia que lutava pelo novo, pelo que estava a nascer. Além do exemplo, da inspiração e de todo o ensinamento, a Campeã da Paz deixa para as novas gerações a receita para tamanha esperança, mesmo nos piores momentos: convicção política e compromisso com a luta de classes.
Em 1947, Maria Brandão dos Reis participou de uma campanha popular de arrecadação de fundos para o Jornal O Momento. 74 anos depois, falamos desta mulher de luta com admiração e respeito, buscando disseminar e eternizar o seu legado. Pela memória de Dona Maria!