Marighella: exemplo de resistência e amor ao Brasil

imagemNo último domingo (4), completaram-se 49 anos do assassinato do militante comunista pelo regime militar

Leonardo Fernandes

Brasil de Fato

Era pouco mais de oito da noite do dia 4 de novembro de 1969 quando Carlos Marighella foi capturado e morto por agentes da ditadura militar, a um mês de completar 58 anos. Nascido na Bahia, foi militante do Partido Comunista, deputado federal, poeta e guerrilheiro.

Marighella já havia passado pela prisão e pela tortura durante o governo de Getúlio Vargas. No ano anterior, em 1968, com a instauração do Ato Institucional nº5 (AI-5), poderia ter escolhido o caminho de muitos dos seus companheiros, o exílio, mas decidiu resistir. É o que conta o autor da biografia mais conhecida de Marighella, “O guerrilheiro que incendiou o mundo”, Mário Magalhães.

“A decisão do Marighella de resistir à ditadura, quando ele poderia ter ido para o exílio, como muita gente boa fez legitimamente, foi decisiva para esse sentimento em torno do Marighella e da memória dele, que faz com que ele seja amado e odiado como não foi nem no tempo da ditadura. E é evidente que assim como o Marighella é para quem o rejeita, combinando ideias e ação dos valores que essas pessoas rejeitam, para quem gosta do Marighella, ele é hoje uma inspiração permanente”.

Magalhães explica que, embora um dos livros mais conhecidos do escritor e político baiano tenha sido o Minimanual do Guerrilheiro Urbano, naquela época, Marighella planejava o início da luta armada no campo, prevendo que o movimento seria sufocado se permanecesse nas cidades.

Outra estudiosa da vida de Marighella, sua sobrinha, Isa Ferraz, foi buscar conhecer mais a fundo a história do tio para a produção do documentário que leva o nome do guerrilheiro.“A minha relação com ele é de sobrinha, mas também de alguém que quis entender porque uma pessoa tão carinhosa, afetiva, que eu tinha tanta adoração como tio, era considerado como o inimigo número um da ditadura militar e perseguido até a morte”.

Ferraz conta que no processo de pesquisa, se surpreendeu ao descobrir o amplo apoio internacional recebido pelo tio. “Eu aprendi um monte de coisas que eu nem imaginava. Por exemplo, o apoio dos artistas europeus à luta armada do Marighella, como Jean-Paul Sartre, [Roberto] Rosselini mandou dinheiro, o [Jean-Luc] Godard fez um filme… vários intelectuais importantíssimos que eu tenho o maior respeito apoiaram e mandaram dinheiro, recursos. Esse interesse internacional eu não sabia que era tão grande”.

Para a documentarista, a opção de Marighella pela luta armada como forma de resistência ao regime militar se explica pelo contexto internacional ao qual estava inserido. “Só dá para entender o Marighella e as opções dele se olharmos para o contexto mundial e nacional. Quer dizer, o Marighella vai para a luta armada no momento em que estava ocorrendo o conflito na Argélia, os movimentos negros nos Estados Unidos, a guerra do Vietnã, a Revolução Chinesa, a Revolução Cubana, quer dizer, era um contexto. Todas as lutas identitárias começando a surgir, os movimentos estudantis, então era um contexto mundial”.

Com uma trajetória recheada de fatos tão relevantes para a história do Brasil e do mundo, Magalhães lamenta que a luta de Carlos Marighella tenha ficado por tanto tempo à margem dos livros.

“Cada um tem o direito de achar o que quiser do Marighella. Esse é um preceito democrático e de liberdade intelectual essencial. O problema foi que certa historiografia brasileira tentou criminosamente eliminar o Marighella da história nacional. E por muito tempo, esse projeto foi bem-sucedido, apesar do bravíssimo esforço das pessoas que nunca deixaram de lembrar a trajetória do Marighella”.

Mário saúda o fato de 49 anos depois, nome do líder estar tão presente no imaginário do povo brasileiro. “Houve grandes militantes e dirigentes comunistas na história do Brasil. Algo que destaca o Marighella é o que está nas pichações das cidades pelo país afora: Marighella vive. O Marighella não parece um personagem que morreu pouco depois das oito da noite, na Alameda Casa Branca, no dia 4 de novembro de 1969. Ele vive hoje. O Marighella hoje vive e perturba. Ele incomoda uns e estimula outros”.

Edição: Tayguara Ribeiro


EM OUTUBRO DE 2009, A COMISSÃO POLÍTICA NACIONAL DO PCB PUBLICAVA A SEGUINTE NOTA EM HOMENAGEM A MARIGHELLA:

Camarada Marighella, PRESENTE!

29 de outubro de 2009

O PCB, que sepultou as ilusões reformistas em seu processo de reconstrução revolucionária, respeita e compreende as razões de Marighella para romper com o Partido, mesmo divergindo do método e considerando que a forma de luta adotada pela ALN, apesar de legítima, não era adequada àquela correlação de forças e ao nível de organização e mobilização da resistência popular à ditadura.

Entretanto, apesar de considerarmos correta, até 1979, a linha política do PCB na questão do enfrentamento à ditadura pela via do movimento de massas e da frente democrática, não estamos entre aqueles que negam ou subestimam o papel da insurgência armada adotada por algumas organizações no período que, ao preço de muitas vidas que nos fazem falta, também contribuíram para a derrubada da ditadura.

Também é preciso ficar claro que a ditadura não escolhia suas vítimas apenas em função dos meios com que lutavam. Entre 1973 e 1975, foram assassinados dezenas de camaradas do PCB, cujos corpos jamais apareceram, dentre eles quase todos os membros do Comitê Central que aqui atuavam na clandestinidade.

Marighella não pertence apenas ao PCB nem à ALN. Pertence a todos os revolucionários e se inscreve na galeria de heróis que, em todo o mundo, lutaram e lutam contra a opressão e a exploração, por uma sociedade em que todos nos possamos chamar de companheiros.

Camarada Marighella, presente!

PCB – Partido Comunista Brasileiro

Comissão Política Nacional

Comitê Central

Rio, 25 de outubro de 2009

PARTIDO COMUNISTA BRASILEIRO – PCB

Ilustração: Carlos Marighella foi capturado e assassinado por agentes da ditadura militar no dia 4 de novembro de 1969 / Reprodução