Eutanásia Da Produção Industrial Brasileira
Crítica da Economia
Por José Martins
Para justificar a aprovação da reforma da Previdência os economistas brasileiros (do governo e do mercado) não cansavam de dizer que ela era necessária para que a economia voltasse a crescer. O mesmo argumento, aliás, que também utilizaram nos casos da reforma trabalhista, teto de gastos do Orçamento, privatizações de empresas e serviços públicos, desregulações do mercado, etc.
Por que essas reformas fariam a economia retomar o crescimento? Por causa da “explosiva divida pública” do país. Nada mais além disso. Por causa de um suposto desequilíbrio das contas públicas a economia não poderia voltar a crescer. É o que eles sempre dizem.
Mas esses economistas ficam muito perturbados quando se compara a relação divida pública/PIB do Brasil com o que existe no resto do mundo – principalmente com as economias dominantes, como verificaremos mais abaixo – e se conclui que essa “explosiva dívida pública” brasileira não é tão explosiva a ponto de ser um motivo suficiente para paralisar a produção no país.
O fato é que muita gente acreditou neste lero-lero que a “nova Previdência” e outras reformas comandadas pelos capitalistas da indústria e outras classes parasitas do sistema trariam a economia de volta ao crescimento, à geração de emprego, etc.
É nisso que essas pessoas ingênuas acreditaram. E continuam acreditando. Mesmo que os próprios patrões e seus economistas desmintam posteriormente que essas promessas eram falsas.
Como agora, nas últimas semanas, depois de vencerem covardemente mais uma batalha contra os trabalhadores produtivos no país, eles vêm a público para dizer com a maior cara de pau do mundo que a reforma da Previdência é um passo importante, mas não garante retomada do crescimento.
E o pior, a recuperação prometida ainda vai demorar, dizem eles. Só no longo prazo, sabe-se lá quando, pode-se imaginar a economia voltando a crescer acima de 3% ao ano, pelo menos. Só depois de um número infinito de reformas no sistema.
E não desistem. Continuam com o mesmo lero-lero. Garantem que todas essas infinitas reformas e apertos fiscais futuros terão o mesmo efeito dinamizador da atividade econômica das reformas trabalhistas, do teto de gastos, das privatizações, da Previdência, etc.
“O crescimento econômico requer outras reformas. Há um certo sonho de que a simples aprovação da reforma da Previdência produziria uma explosão de investimentos, e o Brasil voltaria a crescer como jamais cresceu no passado. Isso não é verdade”, diz o conhecido economista Affonso Pastore, da USP e Ibre da Fundação Getúlio Vargas.
E explica: “Nós não temos o investimento sendo uma força propulsora. Não temos também impulso vindo das exportações. E, finalmente, não é possível usar estímulos fiscais porque o governo está fazendo o contrário, está fazendo um ajuste. Ele corta gastos. Isso significa que a recuperação da economia é lenta. Não há como sonhar uma recuperação muito forte.”
Ele só não explica por que o governo brasileiro continua fazendo esses idiotas ajustes fiscais e cortando gastos (não os gastos financeiros, mas os gastos correntes). Desnecessariamente, pelo menos para a produção real. Como se isso fosse a coisa mais natural do mundo. Como se algum vestígio dessa desastrosa política fiscal da economia do imperialismo na periferia do sistema ainda existisse nas principais economias do mundo, como EUA, Alemanha e Japão.
Para Marcos Lisboa, outra figurinha carimbada da economia do imperialismo no Brasil, o cenário para a retomada da produção é ainda mais preocupante. Mesmo, repita-se, depois das reformas trabalhistas, teto de gastos no Orçamento, privatizações, Previdência, etc.
Para ele, todos estes sacos de maldade que eles empurraram pela goela abaixo dos trabalhadores produtivos nos últimos anos ainda não foram suficientes. Vejam suas explicações:
“Se não acertar a questão tributária, do comércio exterior e da infraestrutura, a notícia é ruim. O país chegou na situação em que chegou por tentativas precipitadas de descobrir um atalho, inventar uma novidade, desonerar a folha, dar um crédito do BNDES, dar um estímulo para um determinado setor. Essas medidas precipitadas é que geraram esse caos institucional que a gente vive no ambiente de negócios. É preciso desfazer o que foi feito na última década para que o investimento volte a crescer e o país volte a gerar mais renda. Essa agenda está demorando para avançar. E quanto mais demora para andar, piora a estagnação”.
Todos esses economistas da periferia capitalista são perigosos chantagistas. O Sr. Lisboa é um pouquinho mais que os outros. Continua jogando todos os males e dificuldades atuais da economia na desgastada desculpa da “herança maldita” da administração de Guido Mantega na economia. E aquela ingênua opinião pública acredita piamente nisso.
Todo lero-lero repetido milhões de vezes vira verdade.
Os economistas do mercado são altamente desonestos. Aquilo, por exemplo, que o Sr. Lisboa chama de “tentativas precipitadas de descobrir um atalho”, “inventar uma novidade”, “dar um estímulo para determinado setor”, etc. nada mais é do que tudo que se faz atualmente nas economias dominantes do sistema. Políticas anticíclicas para evitar, pelo menos provisoriamente, a queda livre do sistema.
Assim, o relaxamento quantitativo dos famosos “helicópteros de Bernanke” e todas as políticas monetárias “inventadas” pelos bancos centrais dos EUA (Fed), da União Europeia, Japão, etc. para evitar uma súbita paralisação das suas economias, a partir crise global de 2008/2009, entrariam facilmente nesta lista de “medidas precipitadas” que o Sr. Lisboa considera desonestamente como a verdadeira razão da estagnação da economia brasileira.
Além destas políticas monetárias de taxas de juros zero e ampliação desmesurada do crédito e endividamento das corporações privadas nas economias dominantes do sistema, o que o Sr. Lisboa e comparsas diriam das políticas fiscais anticíclicas aplicadas desde a crise de 2008/2009 nestas mesmas economias que comandam a economia do imperialismo na periferia do mercado mundial?
Observe-se que foram estas políticas de gastos e déficits públicos recordes nos últimos setenta anos que levaram, até este primeiro semestre/2019, a uma relação dívida pública/BIB de mais de 100% nos EUA, de mais de 250% no Japão, Europa (85%) Itália (132%), França (99%), Espanha (97%), Alemanha (61%).
Há uma mudança na política econômica mundial. Do mesmo modo que o relaxamento quantitativo na política monetária dos bancos centrais, o déficit público deixa de ser um problema fiscal nas economias dominantes quando se trata de impedir que a crise periódica de superprodução do capital ameaça empurrar a produção e o emprego para o precipício.
Guido Mantega simplesmente imaginava que no Brasil se pudesse fazer essas políticas econômicas de gente grande. Ignorou, como escrevemos abundantemente, no mesmo momento que ele as executava, a realidade do imperialismo que comanda totalitariamente as políticas econômicas impostas à economias dominadas como o Brasil.
A China, por exemplo, outra grande economia dominada, como o Brasil, luta neste momento contra essa massacrante realidade imperialista. Verifica-se que o estoque total de dívidas corporativas, domésticas e do governo do até recentemente chamado “chão de fábrica do mundo” agora excede 303% do produto interno bruto do país e representa cerca de 15% de toda a dívida global. É o que informa nesta semana a Bloomberg News.
No Brasil, a relação divida pública/PIB subiu de 60,8% em 210 para míseros 77,2% em março de 2019 (último dado disponível). A relação divida pública/PIB no Brasil é menor que a média mundial (85%) e muito menor que no Japão, EUA, França, Itália, etc. Pouco mais elevada que na Alemanha.
No entanto, é essa falácia de um “explosivo endividamento público brasileiro” que é usada pelos economistas do imperialismo – capitaneados no Brasil por gente como os Srs. Lisboa, Pastore et caterva – para justificar suas inócuas reformas e ajustes fiscais, engessar a economia e, finalmente, encaminhá-la para o sucateamento puro e simples, para uma inacreditável eutanásia das forças produtivas nacionais.
Para finalizar, como se materializará no curto prazo esta eutanásia? Volta-se à angustiante pergunta inicial: o que se pode esperar da economia real para os próximos trimestres?
A economista Alessandra Ribeiro, responsável pela área de macroeconomia da consultoria Tendências, bem mais ingênua politicamente que seus colegas acima citados, abre o jogo e dá alguns números para o futuro da massacrada massa trabalhadora no Brasil.
“A Tendências projeta um crescimento da economia um pouco abaixo de 1% neste ano. No ano que vem, um avanço de 2%. A economia ganha um pouco mais de tração a partir de 2021. Nesse cenário, a taxa de desemprego cai muito gradualmente, ainda estimamos taxa de desemprego em 11% ao final de 2022. Mas isso não significa que a economia não está gerando emprego. Está, mas é um trabalho mais informal. Nós esperamos este ritmo de criação de emprego ganhando mais tração, crescendo ao redor de 1,5% ao ano, mas com uma mudança na sua composição, de menos informal e mais formal.”
No começo de 2019 eles previam, computando a aprovação da reforma da Previdência, que acabou acontecendo, um crescimento de 2,5% para este ano. Agora, depois da dita cuja aprovada, estão prevendo “um pouco abaixo de 1%”, como informa a Sra. Ribeiro.
Considerando o histórico pouco recomendável destas previsões do mercado, não há muito risco de se prever um crescimento real “um pouco abaixo de zero”. Na virada do ano a economia brasileira estaria saindo da estagnação e entrando na depressão.
Neste cenário da empresa da Sra. Ribeiro, que é mais ou menos compartilhado por todos os economistas do mercado, só dentro de dois a três anos “a economia ganha um pouco mais de tração”.
O desemprego? Continuará, segundo essa previsão, praticamente no mesmo nível até final de 2022. Portanto, por mais três anos e meio os trabalhadores serão obrigados a enfrentar filas cada vez mais quilométricas para uma mísera vaga de emprego. Informal, diga-se de passagem, considerando-se os efeitos maléficos mais do que evidentes da reforma trabalhista sobre os trabalhadores produtivos.
E depois do final de 2022? Isso é um grande mistério. O futuro a Deus pertence, dirá a Sra. Ribeiro e os inabaláveis economistas do capital e do imperialismo.
Com essa sublime imprecisão e cinismo perante o mundo real, perante o sofrimento da classe trabalhadora expulsa da produção, eles estão prometendo à nação em transe que haverá melhora do crescimento só no longo prazo. Vai demorar anos e anos…
Que até lá cada um se vire como pode. Eles se esquecem o que dizia lorde John Keynes, o guru dos economistas de Estado: “no longo prazo todos nós estaremos mortos”.
Ele se referia, evidentemente, à classe capitalista e todos os demais parasitas do sistema.
Lorde Keynes se referia às classes proprietárias que ele mesmo representava e procurava salvar naquele momento de crise catastrófica da economia mundial da revolta e da revolução dos trabalhadores produtivos em todo o mundo.