Centenário da Semana de Arte Moderna

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Por Carlos Eduardo Carneiro

Em 1917, ano em que os bolcheviques dirigiram e comandaram a revolução socialista na Rússia, aqui no Brasil os trabalhadores deram início à primeira grande greve operária. Nesta ocasião, as ideias comunistas possuíam pouca influência sobre o movimento, o anarquismo era hegemônico. Não tardou para a Revolução Russa semear pelo mundo o que Antonio Gramsci denominou de sovietismo. Em 1922, além da revolta tenentista, surge o Partidão, seção brasileira da terceira Internacional Comunista. O Partidão foi o maior partido brasileiro e o mais influente na classe trabalhadora antes do golpe de 1964 e, em pleno 2022, ano de seu centenário, a Fénix Vermelha cresce e se reafirma como alternativa revolucionária à classe trabalhadora brasileira. Por ocasião da fundação do PCB, o camarada e escritor Lima Barreto, grande figura do modernismo brasileiro, foi lembrado e homenageado.

Ainda em dezembro de 1917 e janeiro de 1918, Anita Malfatti realizou a Exposição de Pintura Moderna, precursora da famosa Semana de Arte Moderna de 1922. Apesar das críticas conservadoras, a arte é reflexo do contexto histórico e dava grandes passos. Entre 1917 e 1922, Anita já estava em contato com Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Menotti Del Picchia e outras personalidades de grande importância para a cultura nacional. Junto do pintor Hélio Seelinger, Oswald e Mário entram em contato com o grande escultor Victor Brecheret, francês recém chegado ao Brasil e que deixaria indelével marca na escultura nacional.

Segundo o arquiteto e crítico de arte Flávio de Aquino, provavelmente a Semana de Arte Moderna foi uma proposta do camarada e pintor Di Cavalcanti após conversa com o mecenas e poeta Paulo Prado. Segundo o pintor, foi uma semana de polêmicas para a “burguesiazinha paulistana”, mas de ruptura estética necessária. Di Cavalcanti filiou-se ao PCB em 1928. Sobre a Semana de Arte Moderna de 1922, o general e camarada Nelson Werneck Sodré escreveu que o impacto da Semana de 1922 é superestimado, pois tratou-se de uma agitação no seio da pequena burguesia paulistana. A burguesia ascendente sempre conciliada com os latifundiários e o imperialismo, apesar de financiar essa renovação da arte brasileira sempre foi cautelosa com os modernistas, pois estes nutriam um espírito de ruptura e um nacionalismo progressista.

Portanto, de imediato, a Semana de Arte Moderna não teve repercussão nacional e limitou-se aos círculos da classe média intelectualizada da cidade de São Paulo. Todavia, como bem escreveu Antonio Gramsci acerca do modernismo italiano e europeu, essa ruptura estética deu ao povo pobre instrumental criativo. Isso ocorre porque os signos empregados pelos modernistas são de vulgo, não reconhecidos como sublimes e de belas artes, basta ver os temas dos modernistas, as formas nas artes plásticas ou as expressões dos escritores e os versos livres dos poetas. Em 2007, essa influência nacional popular da Semana de 1922 é explicitada na Semana de Arte Moderna da Periferia, organizada numa quebrada da capital paulista pelo Cooperifa. Neste período, os saraus pelas periferias estavam forjando poetas pretos e pobres pelo Brasil. O mais famoso sarau foi o do Binho, também na cidade de São Paulo. Em minha passagem por Atibaia, organizamos o Sarau do Manolo, com uma ideologia socialista e que formou poetas como Felipe Nikito e também o camarada Thiago Cervan, este último considerado “o cristal vermelho” pelo poeta e tradutor comunista André Nogueira. Nas trincheiras do PCB estão também as rimas do funk e do RAP nas figuras de artistas como MC Primitivo, Camarada Janderson e Paula Ana.

Filiados ou não ao PCB, muitos artistas brasileiros orbitaram em torno do nosso partido ao longo do século XX. São tantos nomes e datas que não tenho pretensão de nenhuma síntese histórica. Para se ter uma ideia, a revista Literatura editada por Astrojildo Pereira em 1947, tinha em seu conselho editorial Manuel Bandeira, Orígenes Lessa, Graciliano Ramos e outros. O rico e proprietário poeta Oswald de Andrade morreu pobre financiando periódicos comunistas e greves. Nomes como Cândido Portinari, Jorge Amado, Solano Trindade, João Cabral de Melo Neto, Carlos Drummond de Andrade, Érico Veríssimo, José Lins do Rego, Hélio Oiticica, Thiago de Mello, José Wilker, Lúcio Costa, Oscar Niemeyer, Vianinha, Pagu e tantos outros. Muitos deles injustiçados e incompreendidos pelo nosso próprio partido se afastaram; outros, em certas circunstâncias, retornavam a somar forças com os comunistas. Costumo dizer aos amigos e camaradas que um verdadeiro revolucionário não exige autocrítica de ninguém, ele a faz.

Neste centenário do Partidão, prestamos nossa homenagem também aos 100 anos da Semana de Arte Moderna e aos artistas brasileiros. A Fênix Vermelha renasce forte porque além da crítica marxista ao capitalismo mundial e nacional, somos capazes de autocrítica e renovação interna. Como versificou Ferreira Gullar, quem falar da história do Brasil e de sua cultura terá de falar do nosso partido, o Partido Comunista Brasileiro, ou estará mentindo.

Vida longa ao Partidão!

Viva os artistas brasileiros!

Carlos Eduardo Carneiro é pedagogo e militante do PCB

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