Um século de luta por democracia como forma política

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PCB surgiu para representar o projeto da classe trabalhadora, diz Milton Pinheiro, membro do Comitê Central do PCB

Por: Assessoria de Comunicação do CEDEM, da Unesp

Pinheiro: “PCB sempre lutou e exerceu uma longeva defesa da democracia como espaço político importante para a permanência das suas lutas ao lado do povo brasileiro”

Imagem: Reprodução

Na sétima entrevista da série que o Centro de Documentação e Memória (CEDEM), da Unesp, publica para celebrar o centenário do Partido Comunista Brasileiro (PCB), o historiador Milton Pinheiro enfatiza a importância do partido para melhorar a qualidade da democracia brasileira, forjada a partir dos interesses da classe dominante. “O PCB sempre lutou e exerceu uma longeva defesa da democracia como espaço político importante para a permanência das suas lutas ao lado do povo brasileiro, afinal, durante todo o século XX o partido esteve durante 56 anos na clandestinidade/ilegalidade jurídica,” declara.

Pinheiro é professor titular, Cientista Político e membro permanente do Programa de Pós-graduação em História da Universidade do Estado da Bahia (UNEB).

Leia entrevista a seguir:

CEDEM – Qual o significado do Partido Comunista para a democracia brasileira?

Pinheiro – O PCB surgiu para representar o projeto da classe trabalhadora na perspectiva da revolução brasileira. Após o período de crise do movimento anarquista, quando da derrota do levante de 1918, no Rio de Janeiro, entrou em cena uma nova forma organizativa e outro projeto político para representar aqueles que lutavam para transformar o país, baseado nas ideias da revolução de outubro na Rússia. Contudo, o cenário político brasileiro era dominado, e em grande medida continua assim, por relações políticas desenvolvidas pela lógica da autocracia burguesa, cujo elemento central dessa dominação é uma democracia de baixa intensidade que é circunscrita à formalidade das instituições da ordem burguesa, que cerceia, dentro dessa ordem, o contraponto exercido pelos interesses populares.

Portanto, nessa conformação política, com esse caráter autocrático, o PCB sempre lutou e exerceu uma longeva defesa da democracia como espaço político importante para a permanência das suas lutas ao lado do povo brasileiro, afinal, durante todo o século XX o partido esteve durante 56 anos na clandestinidade/ilegalidade jurídica.

A defesa da democracia para o PCB se enquadra na perspectiva leniniana do melhor espaço político, nas circunstâncias da dominação autocrata burguesa, para atuar na luta de classes. Entendo que a democracia formal brasileira sempre teve um arcabouço que criou muitas dificuldades para a participação dos divergentes, não obstante o papel qualificado que o partido desempenhou para a democracia em nosso país. O PCB sempre procurou, na sua história de cem anos, a democracia como forma política para inserir o projeto da classe trabalhadora.

CEDEM – Qual a relevância dos comunistas para a historiografia política nacional?

Pinheiro – A leitura honesta do Brasil jamais poderá ser contada sem a presença dos comunistas brasileiros. Para além dessa questão basilar, onde encontramos centenas de estudos, teses e dissertações sobre o partido que dão conta dessa rica e importante historiografia, existe também uma historiografia sobre o Brasil realizada por quadros intelectuais do PCB, a exemplo de Caio Prado Júnior, Nelson Werneck Sodré e outros. O PCB juntamente com o PCF (Partido Comunista Francês) e o PCI (Partido Comunista Italiano) foram os partidos comunistas que mais atraíram o mundo artístico, científico e cultural no ocidente, tendo dentro das suas fileiras o que existia de mais importante intelectualmente em seus respectivos países, só que no caso do PCB com esse longevo histórico de ilegalidade imposta.

CEDEM – A criação do PCB contribuiu com avanços para a sociedade brasileira. O senhor poderia falar mais sobre a influência do partido em questões que hoje parecem normais, mas que foram postas em prática por causa do PCB, como por exemplo os benefícios trabalhistas?

Pinheiro – A primeira grande contribuição do PCB foi a construção de um projeto emancipatório para o Brasil. Depois podemos elencar um conjunto muito grande de questões relevantes: o surgimento da imprensa popular, a candidatura para a presidência da república do militante negro Minervino de Oliveira (pela primeira vez na história), a luta das mulheres pelo sufrágio universal no Brasil, a organização das empregadas domésticas, o feminismo classista e suas pautas em defesa da mulher, a liberdade de culto religioso (Jorge Amado e Carlos Marighella), benefícios trabalhistas colocados na constituição de 1946, a defesa do petróleo nacional e da Petrobrás estatal, o plano nacional de saneamento básico (Milton Caires de Brito), a luta pela paz mundial, a luta pela posse da terra (reforma agrária), o combate contra a ditadura do Estado Novo e a ditadura burgo-militar de 1964, a defesa da pesquisa científica (Caio Prado Júnior), entre outras.

CEDEM – Qual a força política do partido na contemporaneidade?

Pinheiro – O PCB, após a tentativa de destruição imposta pelo grupo liquidacionista de Roberto Freire (Cidadania), colocou em movimento uma extraordinária operação político-ideológica e orgânica, conhecida como a Reconstrução Revolucionária, que de forma exitosa reconstruiu o partido e o tornou vivo na realidade brasileira e atuante na luta de classes; tendo como eixo um programa estratégico socialista e uma pauta anticapitalista e antiimperialista. Nesse novo ciclo do PCB a tática é subordinada à estratégia.

O partido ainda é uma força política modesta, mas com uma importante presença nas lutas da classe trabalhadora, da juventude, das mulheres e das populações pobres e pretas das mais diversas periferias. Trata-se de um partido que se movimenta para derrotar a sociabilidade que gera as opressões do mundo capitalista e que, com determinação, disciplina e uma linha política vitoriosa vem dando sua contribuição. Isso é tão concreto, que, nesse momento do aniversário dos cem anos o PCB está lançando a pré-candidatura à presidência da república da economista e professora universitária, Sofia Manzano.

CEDEM – Qual o significado da preservação da memória para os comunistas?

Pinheiro – Sem memória histórica não existe presente. Os comunistas brasileiros têm um acervo de combate nas diversas manifestações culturais, populares e proletárias do Brasil que é extraordinário e muito necessário que seja preservado. Afinal, como nos informa Antonio Gramsci, “escrever a história de um partido significa nada mais do que escrever a história geral de um país a partir de um ponto de vista monográfico”.

O legado construído pelo PCB é rico e presente na história brasileira. São cem anos de uma façanha realizada em conjunto com a classe trabalhadora brasileira e os melhores filhos e filhas do povo. Seus militantes foram presos, perseguidos, torturados, exilados e assassinados, muitos não se sabem nem onde estão seus corpos, a exemplo do líder camponês Nestor Veras. Mas essa história e essa luta continuam mais vivas do que nunca.

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Fonte: https://www.cedem.unesp.br/#!/noticia/546/um-seculo-de-luta-por-democracia-como-forma-politica

O CEDEM custodia o acervo de Astrojildo Pereira e o Fundo do Partido Comunista Brasileiro.

Onde pesquisar:

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On-line: http://www.cedem.unesp.br/www.cedem.unesp.br
Presencial: Sede do Centro de Documentação e Memória (CEDEM), da Unesp
Praça da Sé, 108, 1 andar – São Paulo (SP)
E-mail: pesquisa@cedem.unesp.br
Tel.: 11-3116-1701

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