A relação da OTAN com organizações fascistas

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Angeles Maestro, ODIARIO.INFO

A aliança entre os EUA, a UE e a OTAN com grupos nazistas não começa na Ucrânia. Vem de longe, e iniciou-se quando ainda decorria a 2ª Guerra Mundial. Logo então as potências ocidentais iniciaram a recuperação possível de todas as organizações fascistas. A criação da OTAN gerou o necessário sistema de coordenação entre essa rede criminosa de organizações, governos e serviços secretos de numerosos países. Os fascistas e neonazistas que são hoje aliados privilegiados dos EUA-UE-OTAN na Ucrânia (e os heróis da mídia ao seu serviço) inserem-se diretamente nessa linhagem.

É possível que muitas pessoas, que se atrevem a procurar o que vai para além do que a propaganda oficial repete, tenham ficado espantadas e indignadas ao constatar a colaboração directa da UE e dos EUA com o golpe fascista na Ucrânia em 2014, que envolveu a inclusão das milícias nazistas no exército e na polícia, e que iniciou os massacres cotidianos no Donbass que mataram 14.000 pessoas, segundo dados oficiais.

Tal como aconteceu com a pandemia de Covid-19, construir uma história – exatamente a mesma na maioria dos países – e repeti-la incansavelmente por todos os meios de comunicação, alinhando-a oportunamente com a censura de posições discordantes e com a repressão – é fundamental para não despertar o povo, que poderia fartar-se de pagar com as suas condições de vida as consequências das suas aventuras militares e, sobretudo, de serem “carne para canhão”.

No caso da Ucrânia, revelar que os aliados das “potências democráticas” exibem cruzes suásticas junto à bandeira da OTAN, que empreendem a limpeza étnica da população de cultura russa, cigana, judaica ou de raça “não ucraniana”, que usam reiteradamente a população como escudo e que exibem nas ruas os que resistem, seminus, com uma bola na boca, envoltos em plástico e amarrados a sinais de trânsito, desfaria em pedaços a propaganda oficial. Entraria em colapso o discurso prenhe de mentiras e meias verdades destinado a justificar a política imperialista da OTAN e de uma UE inteiramente submetida aos EUA, mesmo que à custa dos seus próprios interesses.

Não veria a opinião pública de forma diferente a situação na Ucrânia se fosse dito que aqueles que estão recebendo armas, treino e apoio militar direto no terreno – por exemplo, de um destacamento da BRIPAC espanhola – são os herdeiros diretos daqueles que colaboraram com Hitler no gigantesco massacre realizado na própria Ucrânia, na Bielorrússia e na Rússia, que custou à URSS 27 milhões de mortos (na maioria civis)? E se ainda por cima se soubesse que existe uma Ucrânia antifascista que resiste com armas – que os seus parentes que vieram à Espanha lutar contra o fascismo nas Brigadas Internacionais ainda recordam – e que milhares de refugiados que fogem do fascismo armado e treinado pela OTAN se refugiam na Bielorrússia e na Rússia?

E, finalmente, não mudaria a percepção das pessoas, não apenas sobre a situação na Ucrânia mas também sobre a natureza dos governos e da grande maioria das forças políticas na UE, se soubessem que não se trata apenas dos nazistas ucranianos, mas que os governos da UE, dos EUA e da OTAN colaboram desde imediatamente após a Segunda Guerra Mundial com os grupos nazistas que perpetraram os ataques terroristas mais sangrentos na Europa?

Os exércitos secretos da OTAN

Em 2005, Daniele Ganser, historiador suíço, especialista em relações internacionais e professor da Universidade de Basileia, publicou um livro com o mesmo título, fruto de um extenso trabalho de investigação sobre as relações entre a OTAN, as redes de organizações fascistas e o serviços secretos de grande número de países – muitos deles europeus – com o conhecimento e colaboração dos seus governos. O resultado foi uma enorme lista de ataques terroristas destinados a desestabilizar governos e, em geral, à “luta contra o comunismo”.

O elemento que desencadeou a sua investigação foi a confirmação feita em 1990 por Giulio Andreotti, primeiro-ministro da Itália, perante uma Comissão de Investigação do Parlamento italiano, da existência da Rede Gladio. Nela, os serviços secretos italianos atuavam sob as ordens da OTAN. Assinalou além disso que a Rede continuava ativa e que redes semelhantes existiam em muitos outros países.

No seu relatório, Andreotti confirmou que a Rede Gladio possuía uma grande quantidade de armamento, fornecido pela CIA, que estava escondido em 139 lugares, localizados em florestas, campos, igrejas e cemitérios, e que incluía: “armas portáteis, munições, explosivos, granadas de mão, facas, punhais, morteiros de 60 milímetros, canhões sem recuo calibre .57, espingardas com mira telescópica, transmissores de rádio, binóculos e vários outros tipos de equipamento”.

Estas armas foram utilizadas em ataques que eram sistematicamente atribuídos às Brigadas Vermelhas e que deram origem a inúmeras prisões e medidas repressivas entre as organizações operárias.

Os terríveis atentados na Piazza Fontana em Milão, da estação de Bolonha, na Piazza de la Loggia em Brescia e vários outros, que causaram a morte de 491 pessoas e feriram e mutilaram outras 1.891, juntamente com os assassinatos de juízes e jornalistas que procuraram investigá-los, mostraram a autoria da organização fascista Ordine Nuovo, em estreita colaboração com a OTAN, a CIA e os serviços secretos italianos, com a conivência dos governos de turno.

No quadro de grandes mobilizações operárias e populares contra a Guerra do Vietnã, o objetivo dos ataques era, nas palavras de um terrorista arrependido, “pressionar o governo italiano a declarar o Estado de Emergência e promover um regime autoritário na Itália.”

Ferdinando Imposimato, presidente honorário do Supremo Tribunal de Cassação, análogo ao Supremo Tribunal, resume os resultados das investigações por ele realizadas, nas quais estabelece o papel da OTAN, da Ordine Nuovo e dos serviços secretos militares nos massacres que ensanguentaram a Itália. Transcrevo as suas palavras, que podem ser consultadas aqui: “No decurso das investigações que realizei sobre as tragédias que assolaram a Itália, desde os atentados na Piazza Fontana, ao comboio Italicus Express que liga Roma a Munique, da Praça Loggia em Brescia, à tragédia de Bolonha, e no decurso de cujas investigações foram assassinados os meus colegas Giovannni Falcone, Paolo Borsellino e outros, ficou confirmado que o explosivo utilizado veio das Bases da OTAN. ( …) Escrevi tudo isso num livro e ninguém o desmentiu. Nessas bases, “terroristas negros” reuniam-se com representantes da OTAN, mafiosos, políticos italianos e maçons na véspera dos atentados. Tudo isso foi confirmado por testemunhas directas e ocorreu ininterruptamente (…) O problema é que o silêncio da imprensa impede a opinião pública de conhecer esta tremenda verdade: é a Operação Gladio quem ameaça a paz e a segurança e quem ameaça desencadear uma grande guerra”.

A lista de ações dos chamados stay-behind, fórmula utilizada para estabelecer a já mencionada colaboração entre a OTAN, os serviços secretos e as organizações fascistas locais para a realização de ações terroristas, em muitos casos consumadas, com o objectivo geral da luta contra o comunismo e a desestabilização de governos, é longa: França, Áustria, Suécia, Alemanha, Noruega, Turquia, Argélia, Itália, Portugal, Grécia, Moçambique, Dinamarca, Espanha (massacre dos advogados dedicados ao direito do trabalho de Atocha), Holanda, Bélgica, Suíça.

Daniele Genser destaca que a primeira intervenção num massacre popular ocorreu na Grécia durante a Segunda Guerra Mundial. A resistência antifascista grega foi, tal como em França e em Itália – destaca Daniele Ganser – impulsionada pelos comunistas. Depois de ter derrotado definitivamente as tropas fascistas foi em 1944 convocada uma grande manifestação pacífica, prelúdio de uma greve geral, em apoio ao poder popular vitorioso. As forças armadas britânicas, juntamente com a polícia e os direitistas massacraram a manifestação com dezenas de mortos e feridos. Depois dela, Churchill impôs a monarquia da família da rainha Sofia, que foi definitivamente expulsa da Grécia após o referendo popular de 1974.

A OTAN, organização terrorista

Estas linhas servem para documentar a colaboração da OTAN com as organizações fascistas e com os serviços secretos das potências “democráticas” para impedir, precisamente, que as organizações que representam legitimamente a soberania popular possam aceder ao poder. A dominação do capital e do imperialismo é o seu objetivo e para o conseguir usam qualquer aliança que sirva os seus interesses.

O fascismo não é mais do que a forma concreta que o capital utiliza para subjugar os povos. Como se dizia no filme Novecento, “os fascistas não são como os cogumelos, que nascem assim numa noite, não. Foram os patrões que plantaram os fascistas”.

Efetivamente, o imperialismo é o terrorismo. Só quem não tenha memória pode ignorar que após a queda da URSS se multiplicaram as guerras de destruição perpetradas diretamente pela OTAN ou pelos seus países membros camuflados no que chamam “coligação internacional”, deixando atrás de si milhões de mortos, países destruídos e múltiplas organizações terroristas que agem sob as suas ordens e a quem financiam, armam e treinam. A lista de horrores é longa: Iraque (1991), Iugoslávia (1991 – 2001), Afeganistão (2001), Iraque (2003), Líbia (2011), Síria (2011), Iémen (2014). Governos de países com uma trajetória criminosa, como Colômbia e Israel, que não cessou de massacrar o povo palestino desde 1948, atuam como membros de fato da OTAN.

A isso há que acrescentar a participação direta ou encoberta dos EUA e das potências europeias numa infinidade de golpes, instigação de guerras civis, desestabilização de países, sanções e bloqueios que causaram a morte de milhões de pessoas, a fome e a doença na América Latina, África e Oriente Médio.

Nesta história criminosa de massacres devemos destacar a destruição perpetrada pela OTAN, sendo seu secretário-geral o dirigente do PSOE, Javier Solana, da República Federativa da Iugoslávia. A participação direta da UE, em aliança com os EUA de Bill Clinton, e com a OTAN, contou com a participação no terreno dos fascistas da Croácia, os Ustachis, aliados de Hitler e apoiados pelos serviços secretos da RFA desde 1979. Da mesma forma, a tríplice aliança ocidental apoiou-se numa organização criminosa, o Exército de Libertação do Kosovo (KLA) ligado a todas as redes de tráfico de heroína do Afeganistão e da Turquia, para instalar a maior base militar dos EUA no mundo, Camp Bondsteel, sob o comando da KFOR, ou seja, da OTAN.

Finalmente, após o infame anúncio do Governo do PSOE – Unidas Podemos de reconhecer a soberania do Marrocos sobre o Sahara, foi noticiada a realização de prospecções petrolíferas em águas saharauis e das Canárias por empresas israelenses e do reino Alahuita. Imediatamente depois realizava-se uma “histórica” reunião de Israel, EUA, Egito, Marrocos, Emirados Árabes Unidos e Bahrein (país que acolhe a Quinta Frota dos EUA), precisamente no kibutz onde viveu Ben Gurion, o primeiro-ministro sionista que perpetrou os mais terríveis massacres contra o povo palestino. Nesta reunião, a primeira que alia Estados Árabes com Israel e os EUA, decidiu-se criar uma aliança militar, uma mini-OTAN – segundo as suas palavras – para enfrentar o Eixo da Resistência que, com princípios anti-imperialistas e anti sionistas, agrupa a resistência palestina, Hezbollah e outras organizações marxistas e nacionalistas libanesas, Iêmen, Síria e Irã.

Anti-imperialismo e antifascismo

A história da OTAN e a sua aliança – uma vez mais – com as mais brutais organizações fascistas da Ucrânia mostra-nos o caminho. Quando um governo “progressista”, membro da OTAN após violar todas e cada uma das condições do Referendo de 1986, é o seu primeiro campeão e vende uma propaganda da guerra que, além do mais, está afetando diretamente as condições de vida da classe operária e das classes populares, não há outra resposta senão ligar a luta antifascista e a luta anti-imperialista.

O apoio militar da UE, dos EUA e da OTAN às organizações nazistas que estão massacrando a Ucrânia antifascista, as mesmas que colaboraram decisivamente com o fascismo alemão assassinando milhões de pessoas e que hoje praticam os mesmos métodos criminosos contra a população civil ucraniana, deve ser confrontado pelas organizações antifascistas e, em geral, pelo movimento operário.

É indispensável desmontar o discurso oficial de que as legítimas mobilizações contra as gravíssimas repercussões da sua opção belicista sobre as camadas populares, tal como as sanções contra a Rússia, são produto da extrema-direita. São os governos da UE, incluindo o nosso, os responsáveis pelo sofrimento do povo e quem favorece objetivamente o crescimento das posições fascistas. São eles, a OTAN, a UE e os EUA, que estão armando e organizando os nazistas ucranianos contra a Ucrânia antifascista.

É hora de nos apropriarmos da nossa história, da luta geral internacionalista e antifascista, que tantas raízes tem na nossa luta operária e popular, para a resgatar daqueles que nos enganam e a usurpam para a entregar, precisamente, aos inimigos de qualquer projeto de emancipação.

Hoje, tal como outras vezes fizeram gerações anteriores na nossa história, é necessário vincular a luta operária e popular em defesa de suas condições de vida com a luta anti-imperialista e contra aqueles que se apoiam em organizações fascistas para levar a cabo os seus planos de dominação. Hoje, mais do que nunca, o lema é: Socialismo ou barbárie.

Abril de 2022
Fonte: https://www.lahaine.org/est_espanol.php/la-relacion-de-la-otan

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