Iniciativa Comunista (PRCF) entrevista Sofia Manzano

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Initiative Communiste
PRCF (Pôle de Renaissance Communiste en France)

“Apresentar à classe trabalhadora e ao povo brasileiro um projeto enraizado na luta popular e na perspectiva do socialismo” – ENTREVISTA COM SOFIA MANZANO, candidata às eleições presidenciais de 2022 no Brasil

A uma semana das eleições presidenciais no Brasil, que prevê um segundo turno entre o fascista Bolsonaro e o ex-presidente Lula, a Iniciativa Comunista apresenta entrevista exclusiva com Sofia Manzano, candidata declarada do Partido Comunista Brasileiro (PCB), muito ativo na luta contra a política e o regime fascista de Bolsonaro no Brasil, mas também no apoio às classes populares destruídas por anos de capitalismo neoliberal agressivo, como os camponeses pobres, trabalhadores do setor público, mulheres, jovens e negros. É uma candidatura ainda mais bem-vinda e corajosa na medida em que Bolsonaro, defensor declarado da ditadura militar do passado, liderou uma violenta política anticomunista assim que chegou ao poder, como atesta a expulsão dos médicos cubanos dos desertos médicos onde se estabeleceram para ajudar os mais pobres.

Diante do fascista Bolsonaro e enquanto Lula faz um pacto com o líder da conservadora direita católica, Geraldo Alckmin, a candidatura de Sofia Manzano é uma lufada de ar fresco para as classes populares e oferece uma alternativa real para os trabalhadores e as forças progressistas do Brasil. Que a camarada Sofia Manzano alcance o melhor resultado possível e permita o máximo alcance às massas na indispensável luta pela perspectiva socialista no Brasil!

Iniciativa Comunista – Qual é o balanço do mandato de Bolsonaro para a classe trabalhadora e o povo brasileiro?

Sofia Manzano – O governo de extrema-direita do agitador fascista Jair Bolsonaro executou e aprovou no Congresso Nacional um conjunto de contrarreformas responsáveis pela destruição do trabalho, ao retirar todo o sistema de proteção trabalhista, jogando a classe trabalhadora brasileira na informalidade e agravando a acentuada precariedade das condições de trabalho: os salários são pagos por dia e por hora, sem nenhuma proteção vinculada à aposentadoria! Essa lógica destrutiva do serviço social acelerou as políticas de desarticulação do sistema de proteção social, impedindo os trabalhadores de reivindicar proteção pelo período em que teriam direito à aposentadoria. Além disso, os trabalhadores do setor público têm sido atacados com a supressão de seus direitos, cortes no orçamento público (especialmente na educação e saúde), ataques às universidades públicas e à ciência e tecnologia, pela interrupção da pesquisa científica no Brasil.

Bolsonaro lidera um conjunto de forças de direita neofascistas, neonazistas, reacionárias e obscurantistas que colocaram em risco as liberdades democráticas e a “normalidade” institucional, com o apoio de frações da burguesia rentista, do “agronegócio”, do setor bancário e de setores da burguesia industrial brasileira. Sua base social de extrema-direita é composta por setores da classe média que recebem grandes salários, parte significativa dos setores religiosos neopentecostais, segmentos do exército e milicianos ligados ao crime organizado. Com Bolsonaro, a fome aumentou, a miséria atingiu uma população de 33 milhões de pessoas, o acesso aos serviços públicos foi drasticamente reduzido, o desemprego aumentou enormemente, a população negra e pobre dos mais diversos subúrbios está sob constante ataque. Além disso, a brutalidade policial, o racismo e os feminicídios contribuíram para o aumento da mortalidade entre os jovens negros e a população LGBT. Na realidade, o país mergulhou no caos social e na violência política. As invasões de territórios indígenas e a destruição ambiental crescem e os assassinatos de quilombolas – comunidade formada por escravos fugidos em áreas remotas – avançam índios e ativistas políticos.

IC – Por que o PCB decidiu apresentar um candidato independente?

SM – O PCB, que completou 100 anos em março passado, não poderia deixar passar a oportunidade de apresentar à classe trabalhadora e ao povo brasileiro um projeto enraizado na luta popular e na perspectiva do socialismo. No momento em que consideramos que a classe trabalhadora está passando por um processo de politização, queremos estar nas ruas, nos parques públicos, nas escolas e universidades, nas periferias, no campo e nas pequenas cidades, discutindo o projeto que interessa aos trabalhadores a favor de uma transformação revolucionária. No entanto, este projeto deve, é claro, incluir a mediação tática para lidar com as lutas imediatas da classe trabalhadora. Apresentar o projeto emancipatório, inclusive por meio da mediação tática, é justamente o motivo mais importante da nossa candidatura presidencial. De fato, o projeto de conciliação de classes liderado por Lula/PT não permite esse debate e esse movimento.

IC – Quais são as principais propostas do PCB para a eleição?

SM – Antes de mais nada, é preciso afirmar que nossa luta visa a instauração do poder popular e se insere na perspectiva socialista. Mas, no quadro das eleições, devemos ter um programa que satisfaça a classe trabalhadora e suas necessidades mais imediatas. É por isso que nossa campanha tem três pilares centrais: 1- Contribuir para a reorganização da classe trabalhadora, que teve suas estruturas autônomas (sindicatos, movimentos etc.) cooptadas pela política conciliatória do PT, posicionando-a no centro da luta de classes, de maneira indendente frente aos interesses da social-democracia brasileira. 2- Forçar a esquerda liberal democrática a assumir compromissos com a classe trabalhadora, e não com a burguesia. 3- Apresentar demandas imediatas que animam a classe trabalhadora, muito particularmente a juventude, para incentivar a luta e organização política. Medidas como: redução da jornada de trabalho sem redução salarial; a reforma agrária para combater o “agronegócio”; a reestatização dos serviços públicos de educação e saúde por meio da contratação de profissionais por concurso; estatização de empresas estratégicas de energia – minerais e petróleo.

IC – Quais são as principais críticas feitas ao PT e à dupla Lula-Rousseff?

SM – Podemos fazer uma lista de questões atestando a capitulação dos governos “burgo-petistas” com a política de conciliação de classes. Certamente, esses governos têm feito ações públicas: mesmo disponibilizando recursos para o setor privado, integraram vários jovens ao ensino universitário e construíram uma quantidade significativa de moradias sociais para populações carentes. No entanto, esse mesmo governo muito contribuiu para o enfraquecimento da classe trabalhadora, ao transferir escandalosamente recursos públicos para o setor rentista via mecanismo da dívida pública; adotando o chamado decreto “Lei e Ordem”, um decreto que Bolsonaro aplicou para processar ativistas que lutam para defender nossa classe.

IC – Quais são as perspectivas para o PCB e a classe trabalhadora se Lula for reeleito?

SM – O PCB não participará de um possível governo Lula: em 2023, estaremos onde sempre estivemos: ao lado da classe trabalhadora e de suas lutas. O bolsonarismo não será eliminado com a provável vitória de Lula. Devemos agir com determinação e disciplina na luta de classes. Além disso, surgem outras questões: haverá uma reforma agrária que enfrente o “agronegócio”? Como o governo conduzirá o orçamento para Educação Pública e Saúde? Sem esquecer o tema do aborto com Lula à frente do governo.

Na realidade, o cenário político de um provável governo Lula gera várias preocupações. Primeiro, qual será o papel da burguesia no aparelho de Estado (representado por Geraldo Alckmin, católico conservador designado como vice-presidente da coalizão liderada por Lula), além das coalizões que ele promove para concorrer como candidato, diante da crise social vivida pelo país? Em segundo lugar, qual será a base de apoio nas eleições legislativas? E, terceiro, qual será a posição do novo governo diante das recentes contrarreformas e leis como aquelas que limitam gastos ou levam à privatização de várias empresas estratégicas no país? Diante desse quadro desenhado por Lula, pelo PT e seus aliados, não percebemos um cenário favorável para a classe trabalhadora: pelo contrário, não temos dúvidas de que a “democracia” burguesa e a normalidade institucional serão preservadas.

IC – Qual é a posição do PCB em relação à guerra entre a OTAN e a Rússia na Ucrânia?

SM – Minha posição nesta guerra reflete a posição do PCB. A guerra na Ucrânia consagra o esgotamento das negociações diplomáticas para resolver o conflito incluindo a própria Ucrânia, a Rússia e a OTAN. A adesão da Ucrânia à OTAN ameaçaria seriamente a segurança da Rússia, como explica seu governo. A questão central é a pressão que o governo dos Estados Unidos exerce sobre os países membros da OTAN para desenvolver essa organização militar em países que fazem fronteira com a Rússia, incluindo a Ucrânia. A OTAN já está instalada em 14 países da região desde a queda da URSS, com a intenção muito clara de cercar a Rússia e controlar o reforço internacional do Bloco China-Rússia. Isso desempenha o papel de contrapeso ao imperialismo dos EUA e seus aliados que querem sabotar o gasoduto North Stream 2. A adesão da Ucrânia à OTAN ofereceria a possibilidade de instalar, neste país, mísseis de médio alcance e ogivas nucleares, o que é inaceitável para a Rússia, em nome da chamada “segurança estratégica”.

Desde o advento da crise global de 2008, observamos o crescente peso da China no mundo e, em menor medida, da Rússia: isso revela as contradições cada vez mais fortes dentro do bloco imperialista ocidental, bem como o declínio do poder dos Estados Unidos como potência absoluta. Devemos considerar também a crescente hegemonia do imperialismo alemão sobre o bloco da OTAN e os impasses dessa aliança interimperialista. Nesse sentido, as relações econômicas e políticas da Rússia com alguns países europeus, nas últimas décadas, intensificaram as contradições intercapitalistas dentro da OTAN. Cinicamente, e mesmo diante de tantos atos de guerra e sabotagem da paz mundial, os Estados Unidos culpam a Rússia exclusivamente pelo belicismo na região – e isso, apesar das inúmeras guerras travadas pelo imperialismo norte-americano e seus aliados no Afeganistão, Líbia , Iraque ou Síria, que são apenas alguns exemplos das recentes guerras de presas travadas pelo bloco da OTAN para manter seus próprios interesses políticos e econômicos em nível global.

O fim da URSS deveria ter levado à extinção da OTAN, mas o que observamos é o avanço belicista do imperialismo norte-americano que, com sua fraseologia hipócrita sobre a paz, mantém mais de 700 bases militares em quase todos os continentes, inclusive na América Latina, além das estruturas ativas de inteligência em todo o mundo. A Rússia de hoje não é mais a URSS socialista de outrora, pois jogou por terra as inúmeras e profundas conquistas dos trabalhadores soviéticos. Hoje, a Rússia é um país capitalista, cujo governo tem pretensões expansionistas e que reprime firmemente os movimentos sociais.

Os interesses das burguesias americana e russa são evidentes nesta luta pela divisão do mundo capitalista e a guerra não interessa em nada aos trabalhadores. Por isso, denunciamos as ações do imperialismo norte-americano, que entregou a região ao fascismo e à Reação, com o objetivo de consolidar sua influência global. Acima de tudo, conclamamos todos os trabalhadores dos países membros da OTAN a lutar pela saída de seus países desta aliança interimperialista pela divisão do mundo: sem a dissolução da OTAN, um futuro de paz para a humanidade torna-se inconcebível.

A única solução para resolver este conflito, que está longe de terminar, inclui a luta autônoma da classe trabalhadora mundial contra o imperialismo dos Estados Unidos, da OTAN e de todo o sistema capitalista. Nenhuma burguesia de qualquer nação do mundo pode trazer paz aos explorados e oprimidos. Acima de tudo, consideramos que a classe trabalhadora ucraniana deve se organizar para liquidar de uma vez por todas o regime neofascista, a fim de estabelecer um poder popular, autodeterminado e socialista, hostil a qualquer intervenção estrangeira. Apelamos ao fortalecimento da unidade dos trabalhadores russos e ucranianos para superar o capitalismo e marchar para o socialismo nesses países, e exortamos os trabalhadores de todos os países a construir a Revolução Socialista Internacional!

Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)

Fonte:

« Présenter à la classe ouvrière et au peuple brésilien un projet ancré dans la lutte populaire et dans la perspective du socialisme » – ENTRETIEN AVEC SOFIA MANZANO, candidate à l’élection présidentielle de 2022 au Brésil

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