Ano novo, ataques novos
O governo começa a mostrar a que veio: extingue o Conselho Nacional LGBT e promove diversos ataques
Neste dia 2 de janeiro de 2019, foram fixadas as competências dos ministérios empossados pelo novo governo. Por via da MP 870/19, são delineados os papéis a serem desempenhados pelos novos ministros, bem como as responsabilidades de cada ministério com relação ao seu espaço de discussão específico. Através de uma leitura superficial, é possível identificar o caráter, agora oficial, de um governo que se compromete a trabalhar junto à burguesia capitalista, aprofundando a miséria e reforçando o caráter LGBTfóbico, racista e misógino da exploração das classes exploradas, em acordo com o avanço do processo fascistizante no país.
Após colecionar, ao longo do processo eleitoral, diversas declarações de desclassificação das violências sofridas pela população LGBT, a presidência, em um de seus primeiros atos oficiais, extingue o Conselho Nacional de Direitos LGBTs do novo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Essa medida se apresenta em completa consonância com o constante cunho LGBTfóbico trazido pelos posicionamentos do novo governo.
Criado em 2001, o Conselho compunha uma das competências da pasta do Ministério dos Direito Humanos. Apesar de ter sido um órgão meramente consultivo, o que limitava severamente nossa capacidade de incidência nas discussões das pautas discutidas – um dos motivos pelos quais defendemos a representatividade deliberativa – o Conselho tinha importante papel na defesa dos direitos da população LGBT.
O Conselho é, então, “substituído” pelo Conselho Nacional de Combate à Discriminação, com genericidade que passa longe de fazer jus ao papel que o Conselho Nacional de Direitos LGBTs, com todas as suas limitações, era capaz de cumprir.
Essa medida vem acompanhada de outros ataques como ao Ministério da Cultura, à CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), ao CNPQ (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e ao povo indígena. Esses ataques confirmam o encerramento de um ciclo político onde algumas poucas concessões aos grupos historicamente discriminados ainda tinham espaço. Se havia dúvidas de que o governo Bolsonaro teria como tônica o retrocesso de direitos, as suas primeiras ações fizeram questão de saná-las.
CONSELHOS E DEMOCRACIA
Um dos problemas aos quais nos referimos quando caracterizamos a democracia no capitalismo como “Democracia Burguesa” diz respeito a quem realmente toma as decisões e conduz os rumos do país – o poder econômico. Das diversas limitações do nosso sistema político-econômico, destacamos duas: por um lado, os jogos de financiamentos eleitorais, corrupção e similares garantem que os interesses dos grupos econômicos dominantes estejam acima da vontade do povo. É assim que se torna possível a formação de, por exemplo, bancadas como a ruralista, comandada pelo agronegócio, e que a demarcação de terras indígenas seja passada da FUNAI para o Ministério da Agricultura. De acordo com quais interesses essas demarcações ocorrerão? A resposta é óbvia, e pagam o preço os povos indígenas.
Por outro lado, o modelo eleitoral representativo tem como centro de sua lógica a vitória da maioria – não apenas a numérica, mas também a político-econômica, garantida pela disparidade de possibilidades de campanhas próprias do nosso sistema político. Isso garante que as hegemonias sociais se reproduzam e se vejam refletidas nos votos – é a isso que nos referimos, por exemplo, quando dizemos que a democracia, além de burguesa, é também branca, masculina, heterossexual e cisgênero. Isso não é um desvio, mas consequência da própria forma de funcionamento desse sistema.
Os Conselhos são instrumentos de redução de danos. Estão longe de ser uma solução para esses problemas, mas são mecanismos que permitem maior participação política de algumas minorias sociais. Essa possibilidade de participação, no entanto, é ainda limitada pelo caráter consultivo da quase totalidade dos conselhos existentes, ou seja, o que os conselhos deliberam tem peso singularmente de aconselhamento para o governo, mesmo a despeito de toda a luta que a esquerda e os movimentos populares vêm travando.
Nos últimos ciclos de lutas, os diversos movimentos populares vêm trazendo reivindicações mais radicais para esse formato, mesmo ainda dentro do campo da institucionalidade. O Coletivo LGBT Comunista entende ser fundamental que lutemos por conselhos de caráter DELIBERATIVO, não apenas consultivo; que sejam estritamente civis e que se construam a partir dos bairros e das comunidades. Defendemos não ser possível falar de democracia sem que corrompamos a lógica representativa, para que toda a classe e grupos explorados possam incidir DIRETAMENTE no rumo de suas vidas e do país.
Assim, é reiterado o que já sabemos: para eles, nossa desumanização é plano de governo e estratégia econômica – é projeto de Brasil. A retirada do Conselho Nacional de Direitos da População LGBT precisa ser respondida politicamente. Não com defensivas ou diálogos rebaixados e acuados, como algumas organizações LBGT vêm fazendo com o governo, mas com radicalidade, coerência política e compromisso com a coletividade. As medidas adotadas pelo presente governo demonstram, de forma dolorosa, que a conjuntura exige organização e luta.
Coordenação Nacional do Coletivo LGBT Comunista