Brumadinho: crime ambiental do capital
O rompimento da barragem do Feijão, da Vale do Rio Doce, em Brumadinho, não foi um acidente, nem um fato isolado, mas sim um crime ambiental, um crime que causou dezenas de mortes já confirmadas e mais de três centenas de pessoas desaparecidas, entre as quais incluem-se trabalhadores da Vale e moradores da região. Repete-se o caso de Mariana, considerado um dos maiores desastres ambientais já ocorridos no mundo.
Há muitas barragens como a de Brumadinho em operação no Brasil. Na região há 6 barragens semelhantes, das quais, segundo a imprensa, 5 estão em situação de risco, assim como muitas outras em Minas Gerais e outros estados. Essas barragens detêm o fluxo de rejeitos do processo de mineração, composto de minério de ferro e outros metais, amônia e outros produtos que, se não detidos, contaminam o solo e as águas dos rios, matando-os e pondo em risco a saúde dos habitantes das cidades que se abastecem de suas águas, além de contaminar a cobertura vegetal da região. O desastre pode ter efeitos até no rio São Francisco. Os impactos ambientais diretos e indiretos são de grande vulto e permanecerão por décadas, com custos incalculáveis para a sociedade.
Entre as múltiplas causas do ocorrido está o peso do setor na economia brasileira: o minério de ferro é segundo produto na lista das exportações do Brasil, representando 8,82% do total das exportações (o primeiro é a soja). O Brasil se tornou a principal fonte de nióbio, mineral importante para o setor aeroespacial e outras áreas, e de grafita, essencial para as baterias de carros elétricos, cuja produção tende a crescer nas próximas décadas, em todos o mundo. Outros minérios são explorados e têm grande potencial econômico.
A indústria extrativista representa 4% do PIB e contribui com 25% do saldo comercial do país. As 10 mil minas existentes no Brasil (87% são de micro e pequeno porte) geram 180 mil empregos diretos e mais 2,2 milhões de empregos indiretos. Foram exportados US$ 46,4 bilhões em 2017. A Vale é a maior mineradora brasileira e maior produtora mundial de níquel e minério de ferro e possui portos, ferrovias e navios.
Não por acaso, o governo atual anunciou que, para favorecer o setor minerador (e o agronegócio), pretende “aliviar a pressão” sobre as empresas, tirando poder do Ibama e outros órgãos ambientais para simplificar os processos de licenciamento ambiental e prover outras vantagens para as companhias. E, com certeza, o governo não irá propor aumento na taxação da mineração que, no Brasil, é significativamente baixa (a CFEM, principal imposto, varia entre 1 e 4% sobre o faturamento com os minérios), mostrando, mais uma vez, a grande influência política do setor junto ao Estado brasileiro, o que também se verifica na legislação específica para a mineração, a qual, em essência, protege as empresas e pune a sociedade.
Mesmo sem esse “relaxamento”, já é extremamente frágil, no país, o processo de fiscalização sobre barragens: para as 790 barragens de contenção de rejeitos existentes, há 154 fiscais, o que cobre cerca de 3% das barragens cadastradas. Segundo a Agência Nacional de Águas – ANA, 42% das barragens em uso, no Brasil, são irregulares. Mais ainda, a legislação que rege o projeto e a operação de barragens é antiga e defasada em relação às leis de países mais desenvolvidos, não levando em conta, por exemplo, de forma abrangente, os riscos envolvidos para as populações expostas a um possível rompimento da estrutura.
A natureza privada e oligopolista da atividade mineradora, no Brasil, faz com que custos de prevenção sejam considerados despesas indesejadas. Quando o mercado está em baixa, as empresas, para manterem as suas margens de lucro, tendem a reduzir os gastos com a manutenção das barragens. Os efeitos externos negativos da atividade, como os riscos para os trabalhadores, a poluição e os rejeitos gerados e o esgotamento precoce de recursos minerais estratégicos recaem, assim, sobre a sociedade. A busca do lucro no prazo mais curto possível se opõe a considerações estratégicas para o país, como a de reduzir o ritmo da extração para manter as reservas por mais tempo, preparar a substituição da atividade por outras possibilidades econômicas nas regiões em fase de esgotamento das minas, para manter os níveis de emprego e renda.
No sentido contrário ao do Brasil, muitos países em desenvolvimento operam suas atividades de mineração com empresas estatais. Outros países aplicam taxas mais elevadas ao setor, usadas, entre outras finalidades, para financiar pesquisas de fontes renováveis de energia e a construção de alternativas de geração de renda para suas economias no período subsequente ao esgotamento das reservas.
É preciso modificar a legislação sobre barragens e impactos ambientais da mineração, tornando-a mais rígida e possibilitando a identificação, responsabilização e punição dos culpados pelos crimes ambientais, como o de Brumadinho.
Esse desastre, assim como o de Mariana, é mais uma prova evidente de que a mineração deve ser estatizada, no Brasil, não apenas para que sua operação envolva objetivos nacionais de longo prazo e de forma ambientalmente sustentável, mas também para que possa contribuir, com mais arrecadação de impostos, para o desenvolvimento econômico e social do país, voltado ao atendimento prioritário às necessidades da classe trabalhadora e dos setores populares.