Lucio Bellentani: herói da classe operária brasileira

imagemEdmilson Costa – Secretário Geral do PCB

A classe operária perdeu, neste dia 19 de junho, um dos seus maiores heróis: o camarada Lucio Bellentani. Valente dirigente operário e ferramenteiro, Bellentani foi o principal responsável pela organização dos operários do ABC paulista no início da década de 70 do século passado, o período mais selvagem da ditadura no Brasil. A partir de uma estratégia do Comitê Central do PCB, dentro do plano de organizar o Partido nas grandes empresas metalúrgicas da região, o camarada Bellentani desenvolveu com êxito e de maneira clandestina, um paciente e abnegado trabalho de organização no interior das fábricas da região, a começar pela empresa em que trabalhava, a Wolksvagem. Nos primeiros anos da década de 70 o camarada Bellentani, como secretário político dos comitês de empresa da região, conseguiu organizar células do Partido nas principais empresas metalúrgicas, chegando a distribuir mensalmente cerca de 300 jornais Voz Operária, órgão clandestino do PCB.

“Os integrantes de nossas células levavam os jornais no fundo falso das marmitas, que era uma das poucas coisas que os seguranças da empresa não podiam revistar”, disse num depoimento feito recentemente para uma equipe do PCB que está documentando a memória do movimento operário a partir de entrevistas com os velhos militantes do Partido. No mesmo depoimento, Bellentani conta como se deu o processo de organização das células operárias na região: “Li um livro do Giap, comandante do exército vietnamita, onde ele descrevia a organização de células da resistência vietnamita ao exército dos Estados Unidos. Eram células clandestinas, compartimentadas por áreas de atuação. Então pensei: se eles lá, enfrentando o exército mais poderoso do mundo, conseguem organizar a resistência, aqui também nós poderemos adaptar esse modelo e organizar os trabalhadores no interior das fábricas. Assim, as células eram organizadas por seções dentro da fábrica, compartimentadas, onde os militantes de uma seção não conheciam os da outra e apenas um deles fazia o contato com o Comitê de Empresa. Dessa forma conseguimos organizar células tanto na Volks, onde tínhamos a maioria dos militantes, mas em todas as grandes empresas da região”.

Esse trabalho sofreu um duro golpe em 1972, quando Bellentani foi preso no próprio interior da empresa, após a prisão de um dos operários que não aguentou as torturas: “Estava trabalhando quando os policiais entraram com metralhadora e me prenderam. Fui algemado e levado para o próprio Departamento Pessoal da empresa, onde começaram as torturas, realizadas por agentes policiais do DOPS (Departamento de Ordem e Política Social da ditadura), o que revela a estreita relação entre a Volks e a polícia”. Ao chegar no DOPS as torturas bárbaras continuaram, mas Bellentani se manteve firme e não entregou os segredos do Partido. Ficou um ano e meio na cadeia. Mesmo com as prisões, a repressão não logrou desarticular completamente o trabalho nas fábricas, o que só conseguiram fazer em 1974/75, quando ocorreu a grande ofensiva da ditadura, organizada pelos setores da inteligência militar, para destruir o Partido, por meio da qual foi assassinado na tortura um terço do Comitê Central e presos milhares de militantes. A ditadura sabia quem eram seus inimigos. Possivelmente, a história do movimento operário brasileiro teria sido outra se esses episódios não tivessem acontecido.

Depois de solto, Bellentani trabalhou em várias empresas metalúrgicas, mas quando descobriam sua militância política o demitiam. Na segunda metade da década de 70 Bellentani foi trabalhar na Ford, em São Paulo, onde organizou uma das mais ativas Comissões de Fábrica do Estado, justamente no período de ascenso da luta de massas no Brasil. Organizou os trabalhadores, realizou várias greves, sempre cumprindo o papel de organizador de sua classe. Recentemente, a Volks reconheceu a perseguição e a colaboração com a ditadura e hoje os trabalhadores atingidos pela repressão reivindicam a construção de um memorial em homenagem àqueles que lutaram nos mais difíceis momentos da repressão no Brasil.

Há cerca de dois meses, Bellentani esteve num seminário realizado pela Unidade Classista sobre o trabalho nas fábricas, onde estimulou a juventude trabalhadora a realizar o trabalho de base como única forma de organizar os trabalhadores no interior das empresa. Com dor e tristeza nos despedimos do camarada Lucio Bellentani, mas nos comprometemos a seguir o seu exemplo. Camarada Lucio Bellentani, presente! Agora e sempre!


imagemHOMENAGEM À MEMÓRIA DE LUCIO BELENTANI

NOTA DE PESAR DA COORDENAÇÃO NACIONAL DA UNIDADE CLASSISTA
Foi com muita surpresa e pesar que recebemos, nesta quarta-feira, 19/06/2019, a notícia do falecimento do camarada Lúcio Belentani, histórico militante de uma das mais ousadas iniciativas do PCB durante a ditadura militar: organizar os trabalhadores da Volkswagen para a luta de classes a partir do chão da fábrica.

No período histórico em que vivemos hoje, em que as organizações, correntes e partidos ligados aos trabalhadores repetem como um mantra a necessidade de se retomar o contato com as massas a partir do trabalho de base, a história de vida de Lúcio Belentani é um exemplo de como realizar com êxito tal tarefa. Seu trabalho como organizador dos trabalhadores da Volks era reconhecido pelos operários e assustou a direção da empresa, que sentia os efeitos desse trabalho nas reivindicações e ações dos trabalhadores em busca de mais e melhores direitos. Em associação à ditadura, a Volkswagen denunciou Lúcio e os demais camaradas comunistas dentro da fábrica, o que resultou em sua prisão e tortura nos porões do DOPS.

Mesmo após esses acontecimentos terríveis, Lúcio Belentani manteve-se ativo na luta dos trabalhadores e recentemente dividiu sua experiência com a militância jovem, contribuindo para forjar uma nova geração de lutadores a partir da base.

A Coordenação Nacional da Unidade Classista se solidariza com os familiares e amigos de Lúcio Belentani neste momento de perda. A memória deste lutador nunca será esquecida por nós!

CAMARADA LÚCIO BELENTANI, PRESENTE!

Coordenação Nacional da Unidade Classista