O anticomunismo e a hegemonia liberal burguesa

imagemThiago Salgado Vaz de Lima*

Nas linhas que seguem abaixo trazemos uma breve análise sobre a conjuntura atual acerca das movimentações políticas e discursivas envolvendo burguesia brasileira (e a natureza de classe do Estado), a ideologia dominante e sua capacidade de colocar seus interesses particulares de classe como universalizantes.
Provavelmente o camarada ou leitor que está lendo esse texto já reparou o quanto esse discurso de Saúde x Economia se coloca falsa e propositalmente polarizado no debate atual, não é? De um lado uns tantos acusam de irresponsáveis aqueles que pressionam governantes para a abertura do comércio e das atividades econômicas em um contexto de pandemia. De outro, estes últimos acusam os primeiros de egoístas por não perceberem que o não retorno da atividade econômica é tirar a sua única possibilidade de subsistência familiar. Reparem quanto cada um dos lados consegue identificar e responsabilizar o outro pelos deletérios efeitos econômicos e sanitários, mas não consegue colocar como alvo comum a concentração de capital em uma parcela muito mínima da população. Sendo acessível aos demais (que configuram a acachapante maioria), os frutos da produção capitalista conseguiriam garantir as condições materiais a fim de que todos pudessem fazer o isolamento social adequado para enfrentar a pandemia. O discurso da insuficiência de recursos no fundo público para qualquer política que minimamente mitigue os efeitos econômicos sobre a pandemia é aceito com a mesma passividade que se escuta ou se lê a notícia: “Banco Central anuncia conjunto de medidas que liberam R$ 1,2 trilhão para o sistema financeiro”.

Indo para a esfera política:

Ciro Gomes, Kim Kataguiri, Rodrigo Maia, Marina Silva, Sérgio Moro, Luciano Huck, FHC, Michel Temer e tantos outros “respeitados democratas” (fazendo uso de ironia) têm apresentado uma fala em comum extremamente coordenada… Já perceberam? A hipérbole utilizada para denotar o Lulopetismo como o extremo oposto ao decadente Bolsonarismo!

Pois bem, até aí nada de novo na velha tática anticomunista da classe dominante em ocultar as determinações mais profundas da sociedade de classes e operar a reposição da hegemonia liberal. Afinal, colocar o Lulopetismo, marcado pela conciliação de classes, como espectro de extremo oposto ao bolsonarismo é uma forma, também, de moderar a reação ao atual estado de coisas e não deixar reacender nas massas o desejo e o sentimento de transformações profundas e radicais nas relações sociais, políticas e econômicas da sociedade brasileira.

Nesse cenário excluem-se o movimento comunista e sua crítica radical, apresentando como único cenário democrático e moderado possível de existência política aquilo que falsamente é chamado de “centro democrático” ou de “nem esquerda nem direita”, o que em sua essência é esconder todo arcabouço ideológico da classe dominante para manter sua condição de classe (concentração de capitais e, em última instância, a manutenção da propriedade privada).

Esse mesmo recurso já foi usado pelos mesmos “atores” (de forma mais enfática por uns que por outros, é verdade) em outros exemplos recentes como em torno da Reforma da Previdência, a partir de seu falacioso déficit e do discurso de eliminar privilégios.

Mas quem eram os privilegiados desse slogan? O que eles pretendiam ocultar?

O funcionalismo público era apresentado como privilegiado por possuir estabilidade profissional e salários médios mais altos que a iniciativa privada. Para além de entrar no mérito bastante relevante que o instrumento nivelador não deveria ser o da precarização (ou seja, a pauta deveria ser aumentar os salários e proporcionar a mesma estabilidade empregatícia na iniciativa privada), o fato ocultado no discurso é a sonegação de grandes empresários na sua contribuição da previdência e uma carga tributária que não mexe nas grandes fortunas e heranças daqueles que se situam no topo da pirâmide social do país e produzem esse abismo social de características genocidas no país. Estes sim são os privilegiados!

Em todos os três cenários (pandemia, político e tributário) a ideologia dominante se estabelece levando para falsos debates e ocultando profundamente as determinações sociais dos fenômenos e, assim, pautando-se no mito do Estado liberal, aqui apresentado como um neutro mediador dos conflitos de classes que paira sobre as relações sociais de produção capitalistas.

Nesse cenário só vemos um crescente anticomunismo se estabelecendo (hora mais barulhento, hora mais silencioso) e o enfrentamento de trabalhadores x trabalhadores travestidos de “trabalhadores em condição de realizar isolamento” x “trabalhadores que necessitam retornar ao trabalho”, “trabalhadores da iniciativa privada” x “trabalhadores do serviço público” e até um “democratas x autoritários” que possa velar a ditadura do capital a depender do representante que ocupe a cadeira no aparelho de Estado.
Até quando vamos nos digladiar por migalhas e deixar o banquete da burguesia intacto?

Que tenhamos PAZ ENTRE NÓS, GUERRA AOS SENHORES!

* militante do PCB na Célula Marcos Cardoso Filho de Florianópolis/SC