NÓS MULHERES, SOMOS LIVRES?

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Por Cheyenne Ayalla, via Jornal O MOMENTO – PCB da Bahia

“A violência obstétrica incorpora tanto violência física, verbal e psicológica bem como negligência no atendimento médico desde o momento que a gestante dá entrada no hospital para o parto. Para entender este processo, com uma visão feminista e classista, devemos ler de forma concreta e histórica a sociedade que nos rodeia.”

Em 10 de julho de 2022, foi noticiada nacionalmente a violência cometida por um médico anestesista à uma mulher cis durante um procedimento que se apresenta como um daqueles de maior vulnerabilidade e também de significado na vida de uma mulher. Trata-se de um estupro em pleno trabalho de parto. Este, que é um trauma irreparável, realizado da forma mais torpe que poderíamos imaginar, nos coloca de frente a conformação de uma estrutura social de bases machista, misógina e fundamentalmente classista.

Essas relações evidenciadas na cultura do estupro se escancaram também diante de abordagem de prisão deste “profissional”. Preso em flagrante, a abordagem comedida reflete não apenas um determinado pacto de viés racista que se estabelece entre a estrutura do Capital e a instituição policial, mas rememora aquilo que Sofia Manzano outrora levanta entre as palavras de Angela Davis: ao mencionar que “a estrutura de classe da sociedade capitalista abriga um incentivo ao estupro”, ressalta como aqueles que livres de quaisquer processos judiciais, exercem, na legitimidade de seu poder, sucessivas agressões de forma inconstestável. Estes encontram-se em enunciado claro por Davis. São “homens da classe capitalista e seus parceiros de classe média”.

Mesmo que as considerações acima trate de um texto dedicado as relações da crise da ordem capitalista e sua relação direta com a cultura do estupro, cabe a nós destacar essa complexa relação quanto a violência obstétrica. Para entendermos melhor a dimensão de tal problemática social, consideramos de início, que de 81% das mulheres brasileiras que sofreram algum tipo de agressão, cerca de 25% dessas mulheres relacionam essa violência com a questão obstétrica. Levando em conta que este é um problema de escala mundial, a Organização Mundial de Saúde (OMS) se posicionou a respeito do tema a partir da publicação de um documento sobre a prevenção e eliminação de abusos, desrespeito e maus-tratos durante o parto, uma vez que a discussão é fundamental. Mas esta medida não é suficiente. Do caso supracitado, que aconteceu na cidade do Rio de Janeiro, acaba sendo mais um número nessa estatística. Mesmo que exista uma legislação que impeça tais atos dimensionados frente às diretrizes da OMS, ainda não é suficiente para extinguir esta barreira social, uma vez que o caráter punitivista dos mesmos ainda não é capaz, sozinho, de coibir tal ação.

É preciso considerar todas as camadas que permeiam esse problema. A violência obstétrica incorpora tanto violência física, verbal e psicológica bem como negligência no atendimento médico desde o momento que a gestante dá entrada no hospital para o parto. Para entender este processo, com uma visão feminista e classista, devemos ler de forma concreta e histórica a sociedade que nos rodeia.

Em primeiro plano, à medida em que a economia nacional é prejudicada pela ofensiva neoliberal aqueles que estão nas posições da base dessa sociedade de classes são os primeiros a serem atingidos pela violência estrutural, como, por exemplo, as mulheres das classes trabalhadoras, sobretudo negras e periféricas. Nesse âmbito, por ocupar os cargos de oferta de serviços que tem decaído e precarizado sistematicamente nos últimos anos de crise a interdependência dentro dos lares bem como o rebaixamento do bem-estar estão anelados a essa progressiva e assustador aumento de violência domésticas vividas por essas mulheres. Diante disso, o processo cíclico de crises e lucros do capitalismo, principalmente, o brasileiro, que é dependente, implica na autonomia e emancipação das mulheres e em sua independência financeira, o que traduz em sua submissão material aos seus companheiros, que as detém como patrimônio, como objeto. Nesse entendimento, tal fato implica na emancipação dessa parcela significativa da sociedade.

Em segundo plano, uma visão histórica das relações de poder e gênero é mais antiga até que o próprio capitalismo, mas não mais antiga que a luta de classes. Desse modo, o patriarcalismo e machistas foi absorvido e colocado como um dos sustentáculos da sociedade capitalista onde a servidão de gênero se harmonia com dominação de classe, onde a classe hegemônica que castra a emancipação das demais faz esse papel do opressor das minorias em direitos e voz.

Dadas essas circunstâncias e reflexões, o objetivo urgente é planejar e se organizar para findar essa violência de gênero que as mulheres sofrem todos os dias, desde o nascimento até a morte.

Dito isso, uma revolução, ou seja uma mudança radical da sociedade, que incorpore classe, gênero e raça, pois esses estão entrelaçados e são inseparáveis para pensar e realizar uma mudança social, mude essa gama de opressões que a sociedade de classes falida impõe a todos nós.

Como diria nossa grande revolucionária bolchevique Alexandra Kollontai, “a libertação feminina só pode ocorrer com a vitória de um outro sistema econômico”.

Avante, camaradas! Venceremos!