Autobiografia inédita de Dirce Machado
Momentos marcantes da dirigente de Trombas e Formoso
(Enviado pelo correspondente do Jornal Poder Popular em Goiânia – Goiás)
Dirce era apenas uma jovem camponesa com pouco mais de 12 anos, quando recebeu uma importante tarefa do fazendeiro, patrão de seu pai: queimar livros. Aquela criança, que tanto queria aprender mas que não tinha acesso a praticamente nenhum material de estudo, ficou horrorizada, mas foi convencida a realizar a queima: o homem que vendeu os livros era procurado pela polícia.
Enquanto queimava os livros, Dirce se deparou com um volume de capa bonita que chamou sua atenção. “O cavaleiro da esperança”, escrito por Jorge Amado. Maravilhada, resolveu separa-lo para ler escondido. Todas as noites ia até o paiol onde estava guardado e, acompanhada de uma lamparina, lia até o galo cantar, quando voltava para casa e fingia estar dormindo.
Certo dia, um homem que morava na região apareceu na porta da fazenda, onde Dirce e sua irmã brincavam. Ele carregava um jornal, no qual ela conseguiu ler o nome: “Terra Livre”. O homem, que atendia por Antônio Cicici, lhe entregou uma edição, e ao olhar a capa a jovem sentiu suas pernas bambearem: o jornal estava convidando a população para comemorar o aniversário de Luís Carlos Prestes, a personagem principal do livro que Dirce acabara de ler. Aquela história que tanto a havia emocionado, era de uma pessoa real! Sentindo seu corpo amolecer, a jovem desmaiou, deixando Antônio Cicici intrigado por saber como aquela menina conhecia Prestes.
Dias depois, Antônio e mais um grupo de pessoas saiu de um matagal próximo da casa de Dirce. Precisavam de abrigo, pois estavam se reunindo quando a polícia invadiu o lugar. Eram os tais comunistas.
A versão completa dessa história é o preâmbulo de livro recém lançado pela editora Lutas Anticapital: Dirce Machado, a saga de uma camponesa da luta de Trombas e Formoso, que conta as memórias autobiográficas da militante comunista dirigente da Guerrilha de Trombas e Formoso, uma das principais referências de luta armada e Poder Popular que já ocorreram no país.
Organizado pelo educador popular Guilherme Martins e os historiadores Paulo Winicius Teixeira de Paula e Paulo Ribeiro Cunha, com textos do geógrafo Horieste Gomes, da professora de Direito Helga Martins e do historiador Claudio Maia, o livro narra a trajetória de vida contada pela própria Dirce. Com relatos impactantes, podemos verificar nas 240 páginas a vivacidade, determinação e abnegação da militante comunista, que passou a integrar as fileiras do Partido aos 13 anos de idade, após ser expulsa da fazenda onde morava por “ser comunista”.
Camponesa de nascimento, educadora popular por vocação, parteira por sua enorme solidariedade, exímia atiradora por necessidade e vereadora eleita por dois mandatos na década de 80, hoje com 89 anos, Dirce se mantém como referência na luta social e política no Brasil. Tendo enfrentado incríveis dificuldades em sua atuação militante, como as terríveis torturas durante a ditadura Militar Empresarial iniciada em 1964, mas nunca perdendo o bom humor e a confiança em seus camaradas e nas lutas participava, Dirce sempre defende que “a moeda que o capitalismo não conhece e nós forjamos, é a solidariedade”, e sua trajetória está aí para comprovar essa afirmação.
Ao lado de seu companheiro, José Ribeiro, e também de Declieux Crispim, Colombina Baiocci, Sebastião Bailão, Geraldo Tibúrcio, João Soares (Suarão) e Geraldo Aureliano militantes do PCB, teve uma atuação política de base que culminou no movimento camponês que infligiu uma derrota marcante para o Latifúndio no Brasil.
O livro “Dirce Machado, a saga de uma camponesa da luta de Trombas e Formoso”, tem lançamento marcado para o dia 15 de dezembro, no Museu da Imagem e Som em Goiânia, a partir das 19h. Também é possível adquiri-lo através do site da editora (lutasanticapital.com.br).