A hipocrisia da herança colonial: Itália concede cidadania aos mortos do naufrágio

A concessão da cidadania póstuma e a oferta de abrigo são medidas tomadas sob o impacto da tragédia. Na véspera do naufrágio, como acontece, em geral, todos os dias, cerca de mil imigrantes chegaram à Itália e permanecerão amontoados em barracões no centro de recepção de Lampedusa, aguardando pela definição de sua situação, que aponta, mais provavelmente, para a deportação. A população da região manifestou sua solidariedade ao imigrantes, afirmando que querem “receber os imigrantes vivos, e não mortos”.

A hipocrisia se confirma não apenas pelo fato de que a guarda costeira e a  a capitania dos portos  da região tenham demorado mais de duas horas para  descobrir que um navio estava em chamas e afundando a menos de um quilômetro de Lampedusa ou pela lei, aprovada em 2002, que identifica como crime de cumplicidade com a imigração ilegal qualquer apoio a imigrantes que não tenham permissão oficial e mesmo qualquer ajuda para os barcos que os transportam.  A hipocrisia – que não acontece unicamente na Itália mas também na maior parte da Europa e em outros países  – se constata no contraste entre a postura formal de respeito à democracia e aos direitos humanos, mantida pelo governo da Itália, e a prática de novas formas de exploração ou de total esquecimento, de abandono de regiões inteiras da África, da América e da Ásia – muitas das quais foram colonizadas por potências européias, que usufruíram de suas riquezas e escravizaram seus povos – à pobreza aguda, à falta de perspectivas, que leva suas populações à busca de melhores condições de vida nos países mais desenvolvidos.

Este estado de coisas tende a agravar-se com a crise econômica em curso, que se sobrepõe às mazelas geradas pelo próprio sistema capitalista,  como o desemprego agudo, e à pesada herança do colonialismo.