Nos EUA a polícia assassina duas pessoas por dia
CX36 Radio Centenario de Montevideo-Uruguai
Tal como era de esperar, o quadro de candidaturas presidenciais nos EUA é sombrio. Apesar de Obama representar uma política bélica e Hillary Clinton ser uma continuação da política beligerante, há candidatos republicanos que querem aprofundar e ir mais além do que existe actualmente. E os dois candidatos – sem possibilidades – representantes da ala supostamente progressista no Partido Democrata, Elizabeth Warren, que ataca Wall Street, e o auto-intitulado socialista, Bernie Sanders, um demagogo populista, são ambos fiéis apoiantes da política imperialista.
Chury: Dizemos à audiência que temos o gosto de dar as boas-vindas a James Petras, que nos fala a partir dos Estados Unidos.
¿Como vais Petras?
Petras: Estamos muito bem, muito contentes e trabalhando.
Chury: Trabalhando, é o habitual ¿não é?
Petras: Sim, bom, ao meio-dia termino o trabalho, só quatro horas por dia de trabalho, escrevendo e lendo. E depois sobretudo responder a cartas e outras cosas do mesmo género, mais ligeiro…
Chury: Assim vai a vida Petras…
Petras: Meio reformado, meio trabalhador.
Chury: Claro, metade e metade…
Petras: Exactamente Chury.
Chury: Petras, queria consultar-te porque vi, li algumas notícias de que os Estados Unidos remeteram, enviaram para a Ucrânia de Poroshenko elementos básicos de armas químicas. Queria verificar se isso podia ser simplesmente um rumor ou algo que pode ser confirmado…
Petras: Tivemos informação, e não exactamente secreta mas semi-secreta, que faz tempo que Washington, Inglaterra e França estão prestando apoio militar ao regime golpista em Kiev. E apenas há um mês recebemos a notícia de que forças especiais norte-americanas estão a treinar as tropas do regime, inclusivamente as brigadas fascistas, para as mobilizar para uma agressão contra os federalistas orientais.
E para além disso temos o facto de que o que passa por ajuda militar não letal são realmente armas com as quais se pode matar e bombardear cidades e povoações.
Então, faz tempo que Washington e os países ocidentais estão a fornecer armas, instrutores e forças para equipar o exército, e isto não há meses mas desde o começo das operações.
Para além da presença militar, é a presença de financiadores e do que poderíamos chamar operações clandestinas como as que montaram o golpe há dois anos.
Então, temos uma presença constante que depende da conjuntura, durante o golpe operações e infiltração para montar o golpe, depois na ofensiva temos oficiais assessorando as operações e agora temos uma escalada com armas, instrutores e forças especiais. Não sabemos onde vai terminar esta agressão, mas está em cada vez maior escala cada.
E para além do que está a passar na Ucrânia está o grande aumento de forças da NATO na Europa Oriental, a tal ponto que a Rússia está a responder com um aumento de armas e de presença na Crimeia e em outras áreas limite com os países ocidentais. Nunca vimos uma escalada e exercícios militares tão agressivos, tanto desde os Países Bálticos até aos Balcãs e agora na Ucrânia. Há uma tendência no sentido da agressão e da militarização por parte do regime de Cameron, Obama y Hollande.
Para além de qualquer discurso, os factos no terreno são algo de beligerante.
Chury: Petras, também de alguma maneira, ou de uma forma ou de outra, a pressão sobre a Síria intensifica-se, torna-se mais forte…
Petras: Sim, há um aumento de intervenção por parte da Turquia, Estados Unidos e Inglaterra a treinar as forças que eles auto-intitulam moderados. Mas o que sucede é que grande parte das armas estão a passar para três grupos: Al Qaeda, os seguidores de Bin Laden que são parte dos moderados segundo os porta-vozes ocidentais, há o Isis e há pequenos grupos fragmentados de diferente índole que poderiam incluir os Curdos e outros opositores.
Mas mais do que todos estão implicados a Turquia e a Inglaterra treinando e montando armas.
E não há que esquecer que o trânsito de quase todos os terroristas é pela Turquia, com uma segunda via pela Jordânia. E para além disso poderíamos dizer que a Arabia Saudita está financiando as operações dos terroristas.
Então, há um cerco que inclui a Arabia Saudita, que inclui Israel, Jordânia, Turquia e fora da região Estados Unidos, Inglaterra e França que estão montando a agressão contra a Síria para derrubar o governo e impor outro governo. Mas entre todas as forças envolvidas na guerra ninguém poderia dominar, e vão acabar como na Líbia, uma guerra de todos contra todos. E os países ocidentais vão lavar as mãos e deixar o país destruído.
O modelo para eles é o da Líbia, onde intervêm pensando que podem impor um governo fantoche mas terminam com nada, com tribos, bandos, delinquentes, mercenários, seitas, etc.
Temos um governo estável com Bashar al-Assad ou temos o caos, uma guerra caótica, umas guerras caóticas em que ninguém poderá impor novos governantes.
Chury: Passamos já mais da metade do segundo governo de Obama e os Estados Unidos, dentro de algum tempo estarão em eleições.
¿As eleições que venham nos Estados Unidos entre democratas e republicanos justificam alguma esperança de mudança na política internacional que possa ocorrer a partir de Washington?
Petras: Poderíamos dizer que a política de Obama passou a ser tão direitista que é impossível ver em que medida Hillary Clinton, que esteve como secretária de Estado durante 4 anos apoiando todas as guerras e os apoios a Wall Street, representa uma mudança. O que se passa entre os republicanos, há candidatos, há mais de uma dezena e estão a multiplicar-se diariamente, aparecem alguns que são inclusivamente mais beligerantes que Obama, que representam quase uma guerra constante no Médio Oriente a favor de Israel. Uma concepção que rejeita qualquer negociação com o Irão e que quer acelerar o enfrentamento militar com Rússia e China.
Então, apesar de Obama representar uma política bélica e Hillary Clinton ser uma continuação da política beligerante, há outros candidatos republicanos que querem aprofundar e ir mais além do que existe actualmente.
Da perspectiva progressista poderíamos anotar dois candidatos, que não têm possibilidades, como representantes da ala supostamente progressista no Partido Democrata, Elizabeth Warren, senadora de Massachusetts que está muito crítica em relação aos laços que existem entre Wall Street e a Casa Branca. Ela está constantemente a atacar os banqueiros, a acusar Wall Street de serem ladrões, etc.
Mas na política externa Warren apoia toda a política belicista, é um tipo de “belicista social”, por assim dizer, com algum ênfase sobre o bem-estar social mas com o outro lado apoiando a política imperialista.
O mesmo se passa com um auto-intitulado socialista, o senador de Vermont, Bernie Sanders de seu nome, é um demagogo que está sempre a defender os interesses populares, mas no final de contas vota o orçamento militar de Obama, apoia Israel incondicionalmente, é um sionista e combina uma política populista com uma política belicista. Outro candidato.
Então, não temos nenhum candidato consequente em termos de anti-imperialismo para além dos pequenos grupos como os verdes, e os grupos, as seitas socialistas que apresentam candidatos mas não conseguem nem 1% dos votos, ou por aí perto. Na realidade temos uma maioria de pessoas, de cidadãos que não têm opções, e normalmente nesta situação temos uma abstenção de quase 50% inclusivamente nas eleições presidenciais.
Chury: ¿Petras, que te pareceu, como leste, como se viu a visita de François Hollande a Havana, Cuba?
Petras: Bom, é uma visita de relações públicas, Hollande está muito desprestigiado, está totalmente entregue ao grande capital francês, perderam enorme apoio popular inclusivamente entre militantes do seu próprio partido. E procura, com esta visita, melhorar a sua imagem como homem de esquerda, mas as suas declarações seguem a linha norte-americana, não adianta nada sobre as negociações entre Cuba e Estados Unidos, repete sempre que é bom terminar o bloqueio, é bom negociar um acordo, etc.
E a visita a Fidel, outro acto simbólico de relações públicas. Diz, Fidel é um grande homem mas discordo das suas políticas e isso não é nada difícil de entender. Uma pessoa que segue o imperialismo, uma pessoa que manda tropas repressivas para África, uma pessoa que apoia o grande capital não tem nada a ver com Fidel Castro, tem mais a ver com os políticos da direita.
Chury: Agora sim, Petras, deixo-te para o final com alguns dos trabalhos que neste momento te estão ocupando…
Petras: Bom, o mais importante que temos que discutir é o expirar da mal chamada lei patriótica (“patriot act”), que é uma lei que permite a espionagem sobre milhões e milhões, quase toda a população norte-americana, 340 milhões estão sob a lupa da espionagem. E agora esta lei, por razões complicadas, não poderia conseguir a aprovação do senado.
Há um senador republicano libertário, Rand Paul, que se opôs e como consequência alguns aspectos da lei ficam agora sem base legal, por exemplo, a lei sobre espionagem está agora anulada e isso está a provocar o pânico entre os polícias na Casa Branca.
Mas a lei patriótica não é apenas a espionagem em massa, a lei patriótica legaliza a tortura, permite suspender o habeas corpus, permite o assassinato de qualquer suspeito por ordem presidencial.
Então, é uma pequena vitória porque a possibilidade de que poderiam espiar sobre toda a população está anulada e a nova lei que propõem dizem vai continuar a espionagem mas de forma mais selectiva. ¿Que significa isso? Que em vez de 340 milhões vão espiar 40 milhões.
O que sucede é que há uma grande oposição que normalmente não tem representação no Congresso. Uma grande maioria de americanos sentem-se ofendidos e violados por esta lei.
Então, Rand Paul, como candidato presidencial, quer aproveitar a opinião maioritária e articular uma oposição ao grande estado policial.
Mas há que entender que Rand Paul tem duas caras, ao mesmo tempo que está contra o estado policial gigante está contra o estado de bem-estar social, a segurança social e outras protecções e isso parece-me parte da contradição. A principal oposição à lei repressiva é também o candidato que mais se opõe às leis sociais que protegem o mínimo que temos de segurança social.
Mas em todo caso poderíamos dizer que a anulação, a extinção da lei patriótica é uma pequena vitória nesta situação que temos.
O segundo ponto sobre os Estados Unidos, temos uma notícia sobre os assassínios por polícias, até finais de Maio morreram 385 pessoas às mãos da polícia nos Estados Unidos, são quase duas pessoas assassinadas por dia. E o número de negros abatidos é três vezes maior que o de brancos.
E devemos assinalar que a grande maioria dos assassinados são pessoas desarmadas, como vimos em Ferguson, Baltimore e outros lugares. E o que chamam pessoas com armas, inclusivamente havia um esquizofrénico que tinha uma vassoura e quando a polícia vê a vassoura atingem-no com várias balas na cabeça terminando com a vida do pobre louco que estava a atacar a polícia com uma vassoura de palha.
O terceiro tema que queremos tocar que é importante é o facto de na Colômbia permanecerem 80 agrupamentos paramilitares muitos dos quais estreitamente vinculados com o exército e o governo de Santos. Há 8 anos Santos, e Uribe antes dele, declararam que já tinham terminado com os paramilitares, mas os peritos têm registado que os paramilitares continuam ocupando grande parte do território, matando civis, matando camponeses.
Então, como se pode pensar na paz quando os governantes continuam utilizando paramilitares para eliminar críticos, movimentos sociais e políticos. Para além de que o governo utiliza a cobertura de negociações para continuar a lançar bombas sobre os acampamentos e grupos insurgentes.
Eu tenho dúvidas sobre o que está a decorrer. Creio que o governo de Santos vai repetir o que sucedeu nos anos finais do século passado quando começaram negociações em Caguen e terminaram bombardeando e tratando de matar a chefia das FARC.
É uma situação difícil para pensar na paz quando a guerra prossegue em todo o lado e prosseguem os assassínios. Eu tenho dúvidas muito sérias de que algo positivo possa sair disto.
E finalmente estamos estudando aqui as novas declarações do secretário de defesa norte-americano, chamado Ashton Carter, que é mais belicista do que qualquer ministro da Defesa anterior. Que continua com declarações muito ameaçadoras contra a China dizendo que os Estados Unidos vão continuar a controlar o ar, o mar e os territórios dos países vizinhos da China. Está a provocar incursões sobre territorios chineses, ilhas na costa da China.
Diz textualmente que “os Estados Unidos vão continuar dominando como o temos feito nos últimos 70 anos após a Segunda Guerra Mundial”.
Então, não quer reconhecer que a China tem interesses, não quer reconhecer que a China é um poder emergente e que a China tem direito a partilhar o controlo sobre esta área.
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