O papel dos meios de comunicação na greve da construção civil de Fortaleza
Lima Júnior*
Na última greve geral do dia 30 de junho, os trabalhadores da construção civil de Fortaleza e região metropolitana decidiram em assembleia a realização de uma greve para além daquele dia, iniciando no dia 5 de julho, após longos meses de campanha salarial em que a negociação com a patronal parecia cada vez mais difícil, emperrada com um ponto que parecia irrelevante: a proposta do vale combustível.
Evitando incomodar os empresários do transporte coletivo da região, intrinsecamente ligados às construtoras, a entidade patronal (Sinduscon) negou a proposta de conceder vale combustível aos trabalhadores que detêm meios próprios de locomoção. Isso porque os operários já recebem o vale transporte e, por não o utilizarem devido à grande maioria ir de moto aos canteiros de obra, esse vale acaba transferindo renda para as grandes empresas de transporte coletivos, representados pelo Sindiônibus.
Com uma categoria há muito organizada, devido ao Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil bastante combativo e construindo a luta diária da classe trabalhadora, a greve iniciou com bastante adesão. Pela manhã, os diretores do sindicato vão aos canteiros de obra e, de imediato, são recebidos de forma positiva pelos trabalhadores, que ao verem os dirigentes sindicais, descem do trabalho e se aglomeram na entrada do canteiro. Aqueles que não vão de moto para a concentração da greve, entram nos ônibus cedidos pelo sindicato.
Assim, todos os dias ocorrem assembleias na Praça Portugal, localizada numa das áreas mais nobres de Fortaleza, repleta de prédios que circulam a praça e, obviamente, foram construídos por aqueles que amanhecem o dia lutando por seus direitos. Em paralelo à greve, a burguesia usa de seus instrumentos para deslegitimar a luta dos operários. O melhor mecanismo para criminalizar a greve tem sido, todos os anos, os meios de comunicação, em sua maioria umbilicalmente ligados aos interesses das construtoras, quando não pertencentes aos donos destas.
Sob forte pressão do Sinduscon, que negava discutir o vale combustível e bombardeava na imprensa o modus violento da greve, a mediação veio por parte do ministério do Trabalho, que marcou uma reunião com as partes envolvidas, para sanar a situação.
A negociação no ministério do Trabalho repercutiu no Tribuna do Ceará, do Sistema Jangadeiro de Comunicação, ligado ao empresário e senador Tasso Jeiressati (PSDB), que é dono das concessões de transmissão da Tribuna FM e da TV Jangadeiro, filial do SBT, de forma ilegal, conforme a lei que deveria proibir a concessão de rádio e TV aos parlamentares. No vídeo do canal do Sistema Jangadeiro, intitulado GREVE VANDALISMO (https://www.youtube.com/
No mesmo dia, o Sinduscon divulgou um “anúncio” no jornal O Povo, publicado no caderno de esportes em quase uma página inteira, onde afirma que a greve é violenta e criminosa, novamente associando os trabalhadores furiosos com os sindicalistas.
Diante da chuva de ataques aos trabalhadores nos meios de comunicação, a greve seguiu firme, esperando a reunião final no Ministério do Trabalho, realizada no dia 20 de julho, onde o Ministério sugeriu um acordo para patrões e categoria, além de exigir que o Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil realizasse as assembleias até a terça-feira seguinte (25), sem as ações de mobilização nos canteiros, para evitar os transtornos ao trânsito na capital.
Na noite anterior à assembleia final da categoria, o Jornal da Cidade, da TV Cidade, afiliada à Rede Record, exibiu uma reportagem criticando novamente o vandalismo da greve dos peões (http://cnews.com.br/
Em assembleia final, realizada no dia 25 de julho, os trabalhadores chegaram ao consenso e aceitaram a proposta do Ministério Público. Entre as conquistas, estão o reajuste de 4,69% para todos os pisos da categoria, além do aumento no auxílio alimentação de R$ 119 para R$ 136 e uma comissão que irá discutir os critérios para a efetivação do vale combustível. A assembleia, apesar das limitações judiciais que impediram o Sindicato de ir aos canteiros, foi vitoriosa ao ter a presença de quase dois mil trabalhadores que foram por conta própria, convictos pela necessidade de construir a luta da sua categoria.
Qual o legado desta greve?
A greve dos operários da construção civil de Fortaleza e região metropolitana mostrou o papel dos meios de comunicação enquanto mantenedora da hegemonia do pensamento burguês. Durante o ciclo petista, a esquerda em maioria hasteou como bandeira de luta a “democratização” dos meios de comunicação. Sem jamais conquistar essa vitória, os meios de comunicação cresceram com uma série de irregularidades e estão cada vez mais fortes para atacar a classe trabalhadora, seja silenciando ou criminalizando sua luta.
Através do capital transnacional e interligado aos vários setores, vimos que os meios de comunicação são peça-chave para a burguesia, que também investe no setor de comunicação não somente para o lucro, mas como fundamento da sua propaganda. As construtoras financiam os meios de comunicação para que estes decretem a greve dos operários como um sacrilégio, sem aprofundar as causas da greve, relacionada à exploração intensificada da força de trabalho do peão que, enfurecido, vira um reles vândalo diante dos olhos da imprensa.
Assim como uma série de outras demandas, o setor da comunicação é um daqueles que sequer obteve qualquer reforma no período em que vivemos, deixando que a população tenha uma participação irrisória na produção da informação, restando apenas o consumo desenfreado de notícias que não tem uma regulamentação sequer. No governo Lula, houve a primeira e única Conferência Nacional de Comunicação, onde a maioria dos encaminhamentos foram engavetados pelos governos petistas.
Portanto, não basta como palavra de ordem para a esquerda a “democratização” dos meios de comunicação. No sistema burguês, a democracia sempre será parcial, privada. É preciso avançar, denunciando o papel da mídia na luta de classes enquanto mantenedora do sistema tal qual está. Mais que democratizar, é preciso entender que os meios de comunicação são modos de produção que foram privatizados e que tem uma força de trabalho alienada (jornalistas, gráficos, etc.). Só com o fim da propriedade privada, ou seja, com uma comunicação administrada pelos trabalhadores e pelo povo, teremos uma informação livre de preconceitos ou que lucre à custa do sangue alheio e do sensacionalismo.
*Comitê Regional do PCB-CE