Sobre o atentado ao candidato Bolsonaro
O que causou e o que se pode esperar do eleitorado após o atentado ao candidato Bolsonaro?
A primeira reação de muitos, após a divulgação do ocorrido, foi de que este teria sido uma encenação promovida pelos grupos que apoiam o candidato. Fatos como a ausência de sangue visível na ocasião foi uma das razões apontadas para esse entendimento, e a justificativa seria a intenção de mudar a imagem de Bolsonaro, que passaria a ser visto como uma pessoa humana, uma vítima da violência. Mas, convenhamos, uma encenação desse porte teria que envolver muita gente, médicos, instituições…e uma facada nos intestinos não seria, certamente, a melhor forma de produzir uma farsa.
Seguiram-se especulações opostas: uma, produzida pelos apoiadores de Bolsonaro, de que o PT estaria por trás do atentado; outra, no sentido oposto, apontava para outros setores da direita como os possíveis mandantes. Ambas são muito pouco críveis, uma vez que essa forma de atuar nunca fez parte do repertório do PT e que, se alguma facção da direita tivesse decidido por essa via, esta teria, muito provavelmente, contratado matadores profissionais, como parece indicar o caso do assassinato da vereadora Marielle, do PSOL do Rio de Janeiro.
O atentado foi, ao que tudo indica, obra de um doente, um “lobo solitário” que alegou agir em nome de Deus. Ele, no entanto, alegou também que tinha ódio dos ataques de Bolsonaro aos gays, aos quilombolas, às mulheres e a outros grupos da sociedade. E não podemos nos esquecer que esse candidato já se manifestou a favor de liberar o direito à posse de armas para todos, de permitir que os policiais decidam, em suas operações, se devem ou não executar, sumariamente, criminosos pegos em fragrante delito. Bolsorano já atacou gays, menosprezou e ofendeu mulheres, já sinalizou que apoia e apoiaria, se eleito, ações violentas contra os comunistas e outras correntes de esquerda. Bolsonaro defende o golpe de 1964 e a ditadura que se seguiu, com toda a violência que impôs ao país. Bolsonaro incita e promove a violência – inclusive a que o afetou – e a intolerância em diferentes níveis e formas.
Bolsonaro representa um conjunto de reações. Ele ataca empresas estatais de papel estratégico, construídas nas últimas décadas, ataca grandes empresas privadas brasileiras, abrindo mais ainda as portas para o capital estrangeiro. Admira Trump e aponta para uma maior subserviência aos Estados Unidos. Ele representa a reação contra todas as conquistas no campo dos direitos humanos, civis e democráticos, obtidas após a queda da ditadura, contra todos os avanços sociais – mesmo que limitados – obtidos nos governos Lula e Dilma (e alguns oriundos da “Era Vargas”). Representa, assim, e muito bem, todos queles que não suportam ver pessoas homoafetivas relacionando-se de forma aberta e livre, que não concebem como empregadas domésticas possam ter direitos trabalhistas, que filhos de trabalhadores possam estudar em uma universidade pública, que trabalhadores sem-terra possam ter onde plantar e colher. Representa aqueles que não aguentam o livre embate das ideias políticas, a livre organização partidária e sindical. E consegue, com seu discurso imediatista e cheio de propostas simplórias para os graves problemas nacionais, capturar em parte o sentimento de frustração e insatisfação de setores da população que, cansados das falsas promessas dos candidatos do sistema, acabam por se verem atraídos para as soluções aparentemente mais eficazes, como “matar todos os bandidos”. É a tática fascista, que precisa ser combatida com radicalidade.
Bolsonaro é o atraso, o ódio, a violência, a reação no seu sentido mais profundo. É a defesa dos privilégios de poucos pelos meios mais violentos. É o ódio racial, a intolerância generalizada.
E isso não é tudo: por trás desse comportamento está a enorme dificuldade do convívio entre o capitalismo monopolista de hoje – com suas políticas neoliberais adotadas pelos Estados que lhe dão suporte – e a estrutura da democracia burguesa liberal. Esta, mesmo extremamente limitada, principalmente pela gigantesca influência do poder econômico dos grandes grupos privados no sistema de representação política – os mais beneficiados por essa estrutura – pressupõe e depende de um mínimo de pactuação social – com garantias e direitos – com partes da classe trabalhadora, o que, para viabilizar a continuação do processo de acumulação e reprodução do capital, é extremamente difícil, pois, para que este se dê, é necessário explorar mais e mais os trabalhadores e deles retirar todas as suas garantias sociais e todos os seus direitos democráticos, com destaque para os de organização e expressão.
É de se esperar que os eleitores, em sua grande maioria, reconheçam que a violência generalizada não interessa a ninguém. É de se esperar que os eleitores identifiquem em Bolsonaro os mesmos sinais de desequilíbrio e imprevisibilidade de seu admirado Trump e de seu agressor em Juiz de Fora. E que, assim, se posicione a favor de um programa político que coloque o foco na discussão das questões e propostas para a superação do quadro atual, que defenda o fortalecimento e o avanço das liberdades democráticas e permitam a organização dos trabalhadores no enfrentamento às desigualdades sociais e aos ataques do capital, no rumo da construção de um novo país, onde a classe trabalhadora tenha vez e voz.