História: 1973 – Morre o poeta chileno Pablo Neruda

imagemMax Altman | São Paulo – 23/09/2009 – 06h00

De acordo com a escritora Isabel Allende, Neruda morreu de “tristeza”, por ver dissolvida pela violência das armas a esperança representada por Allende

“Y desde entonces soy porque tú eres,
y desde entonces eres, soy y somos,
y por amor seré, serás, seremos.”

Passados apenas doze dias do golpe militar encabeçado por Augusto Pinochet que derrocou violentamente o governo de Salvador Allende no Chile, morre, em 23 de setembro de 1973, em Santiago, o poeta Pablo Neruda.

Tão logo o corpo foi transportado para a morgue do hospital, chega a notícia de que a casa de Neruda havia sido saqueada e seus livros, incendiados.

O funeral foi realizado no Cemitério Geral, rodeado por soldados armados com metralhadoras. Ainda assim, ouviram-se gritos desafiadores de homenagem a ele e a Allende, junto com a entonação em coro de A Internacional Socialista. De acordo com a escritora Isabel Allende, Neruda morreu de “tristeza”, por ver dissolvida pela violência das armas a esperança representada pelo amigo.

Nas eleições presidenciais de 1970, Neruda havia desistido de sua candidatura, facilitando a vitória de Allende. Ambos eram marxistas e acreditavam em uma América Latina mais justa e solidária.

Nascido Ricardo Eliécer Neftalí Reyes Basoalto, na cidade chilena de Parral, em 12 de julho de 1904, ficou conhecido mais tarde pelo pseudônimo de Pablo Neruda, um dos mais influentes poetas, sendo considerado pelo romancista colombiano Gabriel García Márquez como “o maior poeta do século 20 em qualquer idioma”.

Entre os múltiplos reconhecimentos destacam-se o Prêmio Nobel da Literatura de 1971 e o Doutorado Honoris Causa, pela Universidade de Oxford. Nas palavras do crítico literário norte-americano Harold Bloom “nenhum poeta do hemisfério ocidental de nosso século pode ser a ele comparado”.

Neruda foi também ativista político, senador e integrante do Comitê Central do Partido Comunista.

Órfão de mãe ainda bebê, a família se muda para a cidade de Temuco, a 670 quilômetros da capital chilena, onde cursa todos os estudos até concluir o 6º ano de Humanidades, em 1920. O impressionante cenário natural de Temuco, com bosques, lagos, rios e montanhas, marcará para sempre o mundo poético de Neruda.

Foi ali que, em 1917, ele publica o primeiro artigo no jornal La Mañana, com o título de “Entusiasmo e perseverança”. Três anos depois, começa a colaborar com a revista literária Selva Austral, com poemas que irão compor o primeiro livro: “Crepusculário”.

Naquela época, conhece Gabriela Mistral, outro Prêmio Nobel de Literatura chileno, de cujo encontro recordará: “…ela me fez ler os primeiros grandes nomes da literatura russa que tanto me influenciaram”.

Em 1924, publica o famoso “Vinte poemas de amor e uma canção desesperada”, obra em que ainda se nota uma influência do modernismo. Posteriormente, manifesta um propósito de renovação formal de intenção vanguardista em três breves livros publicados em 1926: “O habitante e sua esperança”, “Anéis” e “Tentativa do homem infinito”.

Em 1927, começa sua longa carreira diplomática. Nas viagens conhece, em Buenos Aires, Federico García Lorca e, em Barcelona, Rafael Alberti. Apregoa sua concepção poética de então, a que chamou de “poesia impura”, e experimenta o poderoso e liberador influxo do surrealismo.

Em 1936, acontece a Guerra Civil Espanhola. Comovido pelo combate e pelo assassinato do amigo García Lorca, Neruda se engaja no movimento republicano, primeiro na Espanha e depois na França, onde começa a escrever “España en el Corazón”. Naquele ano, retorna ao Chile e sua poesia passa a se caracterizar por uma orientação às questões políticas e sociais.

Nomeado cônsul geral no México, ali reescreve “Canto Geral”, poema do continente sul-americano. A obra foi publicada no México, em 1950, e clandestinamente no Chile. Composta de cerca de 250 poemas, constitui, a juízo do próprio Neruda, a parte central de sua produção artística. Quase todos os poemas foram criados em circunstâncias particularmente difíceis, quando Neruda vivia no exílio.

Em 1945, Neruda recebe o Prêmio Nacional de Literatura. Naquele mesmo ano é eleito senador pelo Partido Comunista, onde passa a militar e se depara com os poetas Pablo de Rokha e Vicente Huidobro, seus mais férreos rivais artísticos.

Nas eleições presidenciais de 1946 triunfa a Aliança Democrática, uma coalizão integrada por radicais, comunistas e democratas, que leva ao poder Gabriel González Videla.

A perseguição desatada pelo governo Videla contra seus antigos aliados comunistas culmina com o banimento do Partido Comunista. Uma ordem de prisão contra Neruda força-o primeiro à clandestinidade em seu próprio país e depois ao exílio.

Em meados de 1950, chega incógnito a Paris, protegido por vários amigos, entre eles o pintor Pablo Picasso. Reaparece publicamente na sessão de encerramento do Primeiro Congresso Mundial da Paz. No final da década, informado de que não era mais procurado, regressa ao Chile

Em 1969, é nomeado membro honorário da Academia Chilena da Língua Espanhola. Em 21 de outubro de 1971 é concedido a ele o Prêmio Nobel de Literatura. Viaja a Estocolmo para recebê-lo. Em suas “Memórias” recorda: “O velho monarca estendia a mão a cada um de nós; nos entregava o diploma, a medalha e o cheque (…) Se diz (ou disseram a minha mulher para impressioná-la) que o rei esteve mais tempo comigo que com os outros laureados, que me apertou a mão com evidente simpatia. Talvez tenha sido uma reminiscência da antiga gentileza palaciana com os súditos”.

A última aparição de Neruda em público foi em 5 de dezembro de 1972, onde o povo chileno prestou uma comovente homenagem ao poeta no Estádio Nacional. Ele morreu de câncer na próstata.

Somente em dezembro de 1992 se cumpriu o desejo do poeta de que seu corpo fosse enterrado em sua casa, na Ilha Negra. O local e todos os pertences são agora administrados pela Fundação Neruda.

Em 1994, veio a consagração no cinema, com o filme “O carteiro e o poeta”, em que Neruda se torna amigo de um carteiro que lhe pede para ensinar a escrever versos para poder conquistar uma bonita moça do povoado. Vencedor do Oscar de trilha sonora original, composta por Luis Enríquez Bacalov, além de outras indicações e prêmios.

Ilustração: Wikicommons. Além de poeta, Pablo Neruda foi ativista político, senador e integrante do Comitê Central do Partido Comunista

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