PEC 181/2015: não é sobre licença maternidade

imagem“Nunca se esqueça que basta uma crise política, econômica ou religiosa para que os direitos das mulheres sejam questionados. Esses direitos não são permanentes. Você terá que manter-se vigilante durante toda a sua vida” (Simone de Beauvoir)

Na última quarta-feira, 08 de novembro, foi aprovada a PEC 181/2015, pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados. De iniciativa do senador Aécio Neves (PSDB), a PEC, em uma tentativa de ludibriar a sociedade, apresenta a intenção de estender o prazo da licença maternidade em caso de nascimentos prematuros. Entretanto, ela traz em sua redação uma discussão acerca do início da vida, desviando-se totalmente de seu pseudo-objetivo e recebendo, por esse motivo, o nome de “PEC Cavalo de Troia”.

O texto, na realidade, não visa proteger as garantias trabalhistas das mães que acabaram de gerar prematuramente – vez que tanto o senador que o propôs, como os deputados que o aprovaram, apoiaram a reforma trabalhista que passa a valer a partir deste mês de novembro, permitindo, legalizando e institucionalizando a retirada de direitos -, mas sim, criminalizar o aborto em qualquer situação, mesmo naqueles casos já autorizados pela legislação brasileira, como no estupro e quando a mãe corre risco de morte – direito conquistado há anos e com muita luta.

É válido constar que a discussão sobre um aborto legal e seguro vem sendo travada dentro das casas legislativas há muito tempo. Projetos e propostas são ignorados em plenário desde 1991, impedindo o avanço e a autonomia das mulheres sobre seus corpos. Médicos especializados, a Organização Mundial da Saúde, movimentos sociais e, até mesmo, instituições religiosas têm se manifestado a favor da descriminalização e da legalização do aborto. Entretanto, todos os estudos, índices e debates realizados são incessantemente rejeitados no Congresso Nacional, apenas para manter o status quo do conservadorismo que nos assola cada vez mais, estruturando e reforçando um punitivismo social, principalmente às mulheres que necessitam de políticas públicas. Tal punitivismo é de fácil constatação ao olharmos para a população feminina carcerária. Não encontramos entre elas mulheres presas pelo crime do aborto, o que demonstra que os artigos 124 e seguintes, do Código Penal, são apenas letra morta, cumprindo o exclusivo papel de estereotipar e criminalizar as mulheres pobres que não têm condições de arcar com o alto custo de um aborto seguro.

Assim, não nos é surpresa uma PEC que, para além de impedir os avanços da discussão do aborto enquanto política de segurança, promove um verdadeiro retrocesso às permissões legislativas como nos casos de estupro, risco de morte à gestante e fetos anencéfalos. Ainda que tais permissões encontrem barreiras no momento de serem legitimadas enquanto direitos, sua completa retirada legal aprofundará, ainda mais, um abismo social existente entre mulheres ricas, que podem pagar por um aborto legal e seguro e mulheres pobres e periféricas que morrem, diariamente, na tentativa de fazer valer sua autonomia, ao submeterem-se a métodos e clínicas clandestinas e precárias.

A hipocrisia e o infindável absurdo em torno da PEC 181/2015 pautam-se em três principais pontos. Primeiro, quanto aos casos de risco de morte da gestante, em o aborto sendo ilegal, haverá uma sobreposição da vida do feto à vida da mulher, o que, para melhor ilustrar, em um vídeo recém divulgado nas redes sociais[1], já ficou demonstrado que a mesma sociedade que recrimina quem realiza um aborto salvaria um ser humano quando colocado em risco junto a embriões, tornando o discurso de “defesa pela vida” extremamente incoerente. Segundo, em casos de fetos anencéfalos, há uma cega defesa em torno de uma realidade de sofrimento, que serve, tão somente, para perpetuar o discurso romântico da maternidade, fazendo com que aquelas que passam por essa situação se culpabilizem durante todo o período da gestação. E, por fim, quanto aos casos de estupro: a impossibilidade da prática do aborto, nesta circunstância, submete a vítima a mais uma violência além da violência sexual já sofrida, o que evidencia uma sociedade que legaliza os abusos sofridos pela mulher e que finge se importar com as suas vítimas.

Aliás, como já pronunciado pela Anistia Internacional, esta PEC submete as mulheres a um tratamento degradante, cruel e de extrema violência física e psicológica. Tal pronunciamento continua em defesa de um “Estado que tem o dever de garantir o aborto seguro e legal, para casos de estupro, agressão sexual ou incesto, risco à vida ou a saúde da mulher, ou comprometimento fetal grave. Além de oferecer às mulheres acesso ao atendimento de qualidade após o aborto, especialmente nos casos de aborto realizados em condições inseguras. Qualquer proposta que busque retirar o acesso ao aborto legal e seguro em caso de estupro deve ser repudiada”.

Por tudo isso, nós do COLETIVO FEMINISTA CLASSISTA ANA MONTENEGRO repudiamos a PEC 181/2015. Somos defensoras da descriminalização e da legalização do aborto com garantia de atendimento capacitado nas redes públicas de saúde. Denunciamos a toda a sociedade essa intenção, que às escuras, pretende maliciosamente atraiçoar-nos com uma proposta que aparentemente amplia direitos das mulheres gestantes, mas que, na verdade, escamoteia a derrocada dos direitos da classe trabalhadora, conquistados por meio de muita luta. Esta aprovação é sinônimo de genocídio e o mesmo Estado que a aprovará não auxiliará nenhuma de suas vítimas.

NÃO À PEC 181/2015!

SIM À VIDA DAS MULHERES!

#TODASCONTRAAPEC181

[1] https://goo.gl/Cyx75h

https://www.facebook.com/cfcamsp/posts/519497875082253