Por direitos, empregos e salários

imagemRovena Rosa – Agência Brasil

O que se dá com a mão esquerda se tira em dobro com a mão direita

Henrique Suricato – Militante da UJC-SP e do PCB-SP

Desde o Governo Temer, não há reajuste do Bolsa Família[1]. O poder de compra dos beneficiários é duramente corroído com os constantes ajustes de preços dos alimentos e das tarifas como aluguel, transporte, luz, água e internet, para os quais a renda dos mais pobres é destinada.

Efeito similar acaba cumprindo o Auxílio Emergencial. Com o aumento da inflação dos alimentos, da gasolina, do gás e da tarifa de luz, o beneficiário que recebeu R$ 600,00 ao longo do ano passado não terminou 2020 com esse dinheiro tendo o mesmo poder de compra [2].

Os benefícios sociais de transferência de renda ajudam a atenuar a miséria social? Sim, de fato. Não somos apologistas de “quanto mais miséria, melhor” como alguns esquerdistas desejam. O alto grau de miséria social impede qualquer reação coletiva organizada contra a carestia geral, pois o individualismo das massas dispersas é fortalecido pela barbárie social, que é a tática bolsonarista de manutenção do poder. Mas é necessário tirar o véu da mera transferência de renda e revelar as “contrapartidas” que o capital exige para viabilizar esses programas e de onde ele tira de um ponto para levar a outro.

A exigência do capital de ter contrapartidas fiscais para executar os programas de transferência de renda demonstra didaticamente que, dentro do sistema capitalista, o que se concede sobre a mão esquerda é retirado em dobro com a mão direita.

A retirada com a mão direita neste caso são as compensações vindas da reforma tributária, reforma administrativa, corte no orçamento de outras despesas, como o avanço da reforma tributária, a retirada de benefícios e isenções para determinados setores e (aquilo que mais interessa ao conjunto da classe) o fim do gasto mínimo obrigatório com a saúde e educação. Esta última, uma proposta vinda do próprio governo [3].

Do contrário, reagirá para garantir seus ganhos por outras vias, abocanhando mais o poder de compra da classe através do aumento da inflação. Darão inúmeros nomes para isso (perda de credibilidade do mercado no Governo, reajuste nos investimentos, compromisso fiscal etc. [4]) quando na verdade trata-se de prosseguir com o saque coletivo da força de trabalho, a única mercadoria que não é valorizada na crise financeira e em quase momento nenhum. A redução de jornadas de trabalho e salário, a demissão em massa, as taxas de desemprego recordes e o alto grau de informalidade e repressão são as manifestações do Capital para sugar cada vez mais força de trabalho e domesticar sua reação de onde quer que ela venha, seja nos próprios locais de trabalho, seja nos salários e nas rendas já pífias.

Defendemos os programas sociais à medida que eles socorrem as massas desempregadas e informais assalariados ou autônomos da fome, mas isoladamente não serão suficientes para superar a carestia reinante em nossa classe. Precisam vir acompanhados de uma política séria de geração de empregos com qualidade e estáveis, com salários que sejam suficientes para sustentar as famílias, reajustados de acordo com a inflação real e com todos os direitos garantidos.

Defendemos também uma política de preços dos produtos de primeira necessidade sob controle dos trabalhadores. Onde o oportunismo dos especuladores e exploradores com o preço das mercadorias poderá ser visto à luz do dia, longe dos insustentáveis “segredos comerciais” [5].

E, por fim, é inconcebível a redução dos gastos na Saúde e Educação. Não são novidade para nenhum brasileiro as péssimas condições da educação e da saúde pública de nosso país; reduzir o orçamento é acelerar sua falência e a consequente miséria da nossa classe. O gasto obrigatório, no mínimo, deve ser mantido.

Do contrário, por mais bem vindo e necessário que sejam os programas de transferência de renda, eles terão a médio e longo prazo o efeito de “enxugar gelo”, se não tivermos controle nem valorizarmos a única mercadoria que trazemos em todos nós, a nossa força de trabalho.

Henrique Suricatto

[1] – https://oglobo.globo.com/economia/sem-reajuste-no-bolsa-familia-inflacao-corroi-poder-de-compra-de-beneficiarios-24903701

[2] – https://brasil.elpais.com/economia/2020-09-10/inflacao-da-cesta-basica-corroi-bolso-dos-mais-pobres-e-deixa-bolsonaro-em-alerta.html

[3] – https://www.bbc.com/portuguese/brasil-56188291

[4] – https://fdr.com.br/2021/03/03/guedes-teme-situacao-caotica-com-auxilio-emergencial-sem-contrapartida-ao-governo/

[5] – https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2020/08/agronegocio-bate-recordes-e-amplia-mercado-apesar-de-pandemia-de-covid.shtml