Montadora reduz remessa de lucros

O desempenho tem como pano de fundo a deterioração nos resultados dos fabricantes de carros, que estão pressionados pela queda de consumo e o maior esforço de venda para desovar os estoques formados nos últimos meses – uma combinação que se tornou evidente nos feirões e promoções realizados recentemente.

Paralelamente, a situação repercute a necessidade do setor em reter parcela significativa dos recursos no Brasil para fazer frente ao desenvolvimento de produtos e aos investimentos de US$ 22 bilhões previstos pela indústria automobilística no ciclo de 2011 a 2015. Completa o quadro a valorização do dólar, que diminuiu os ganhos na moeda americana.

Com o cenário mais nebuloso para o fim do ano, a opção escolhida foi reforçar o caixa no Brasil. Dados do Banco Central (BC) mostram que as remessas chegaram a ultrapassar US$ 800 milhões em agosto, mas caíram para US$ 13,5 milhões em fevereiro (veja gráfico). Os números são referentes aos envios feitos por fabricantes de veículos e implementos rodoviários usados em caminhões.

A queda registrada pelas montadoras não foi a única, mas foi a mais expressiva entre os setores da indústria que mais remetem recursos ao exterior. Em todo o ano passado – quando os resultados no Brasil ajudaram a reforçar o caixa das matrizes nos Estados Unidos e na Europa -, a indústria automobilística marcou o maior valor entre os setores acompanhados pelo BC, com a remessa recorde de US$ 5,58 bilhões.

Já em 2012, os fabricantes de veículos estão atrás da indústria de bebidas, cujas remessas somaram US$ 846 milhões até abril – um aumento de 24% em um ano.

Para o consultor Luiz Carlos Mello, que presidiu a Ford de 1987 a 1992, os números expressam o cenário mais desafiador para a indústria, marcado por margens de rentabilidade estreitadas por elevadas despesas de venda e reajustes salariais históricos. Taís fatores se somam a um investimento de capital de giro adicional, como resultado da acumulação de estoques para patamares mais altos desde a crise financeira de 2008.

“São custos que não estavam previstos para esse nível quando o orçamento foi feito”, diz o analista. Por outro lado, avalia, as montadoras não podem deixar de investir pesado em mercados emergentes, como o Brasil, onde está o maior potencial de crescimento.

Com investimentos e custos em alta, os recursos disponíveis para as remessas diminuem quando se tem pela frente uma demanda que não acompanha o ritmo do ano passado, período no qual as vendas de carros bateram recorde. “O mercado claramente não evoluiu da maneira que se esperava. Foram colocados planos para um volume que não aconteceu”, afirma Letícia Costa, diretora de pós-graduação do Insper e especialista na área.

O ambiente de negócios mais delicado no Brasil é refletido nos balanços divulgados no exterior pelas grandes montadoras instaladas no país. Operações na América do Sul, onde o Brasil corresponde ao principal mercado, contribuiram menos nos resultados do primeiro trimestre apresentados pela Ford e a General Motors.

No grupo Fiat – que além da marca italiana inclui a Chrysler -, as vendas no mercado brasileiro caíram 1,9% no primeiro quadrimestre, enquanto a queda nos emplacamentos de carros da Volkswagen em igual período foi de 3,9%. A Ford já adiantou que os negócios na América do Sul seguirão dando lucro neste ano, mas menos do que em 2011.

As montadoras, assim como a Anfavea – entidade que representa o setor -, preferiram não se manifestar sobre a queda na remessas de lucro.

Para Letícia, a recuperação do mercado americano pode ter reduzido as necessidades de remessas para grandes fabricantes de Detroit. Por outro lado, ela lembra que matrizes sediadas na Europa poderão precisar de recursos gerados no Brasil, dada a instabilidade economica no continente.

 


BC tenta melhorar expectativa de investidores estrangeiros

Valor Econômico

Em resposta à forte onda de pessimismo que invadiu os mercados financeiros nas últimas semanas, o Banco Central (BC) iniciou uma estratégia para balizar as expectativas. Na última semana, analistas situados em Nova York foram chamados pela autoridade monetária para conversas privativas – em alguns casos, com o próprio presidente do BC, Alexandre Tombini. O objetivo dessa ação seria tentar conter o viés mais negativo que passou a dominar os relatórios produzidos pelas instituições financeiras nos últimos dias e que claramente afetou os preços dos ativos no mercado local. O saldo das conversas, segundo relatos de participantes dos encontros, é a mensagem do BC de que a atividade vai começar a responder aos estímulos no segundo semestre. Essa previsão, somada à preocupação de que o dólar avance para cima dos R$ 2,00 de forma permanente, confirma a ideia de que a parcimônia vai conduzir as próximas decisões de política monetária do BC.

“O BC vendeu muito pessimismo em agosto, para justificar suas decisões de política monetária, e talvez isso tenha contribuído para esfriar ainda mais a economia”, explica um dos profissionais convidados para um encontro pessoal com a autoridade monetária. “Agora, o BC quis passar mais otimismo, o que parece estranho em um momento em que o mundo claramente está em deterioração”.

Justamente por ser um discurso com alguma “contradição” em relação ao atual momento global, o especialista diz que essa “estratégia” deve ter ajudado a confundir a curva de juros, que oscilou bruscamente na última semana. A taxa Selic em 8% passou a ser considerada um “piso”, depois de um período em que as apostas se consolidavam mais perto de 7,50%.

Segundo relato do analista, o resultado do alívio monetário em curso provavelmente será percebido em breve, provavelmente no segundo semestre. “Há coisas domésticas atrapalhando o canal do crédito e, na visão do BC, essas travas já estão sendo retiradas”, afirmou outro profissional, que também manteve contato com o BC. “A mensagem da parcimônia ficou bem clara em todo o tempo, tanto na questão dos juros quanto na do câmbio”, afirma.

“A visão da autoridade monetária é a de que o dólar está bom, mas que agora já “está bom””, relata uma fonte ligada ao governo, confirmando a visão de que BC e Fazenda estão satisfeitos com o nível do dólar atual. Ou seja, que suas atuações por meio de contratos de swap cambial pretendem, sim, garantir que a moeda não avance para cima dos R$ 2,10. “O BC quer dosar a evolução do dólar, e para isso é preciso dar saída ao investidor”, afirma a fonte. “O que o BC não poderia fazer neste momento é se omitir, como aconteceu em 2008”, explica. Ele lembra que o endividamento externo privado é elevado – de cerca de US$ 165 bilhões, segundo último dado disponível no BC, referente ao fim de 2011 – e uma desvalorização cambial abrupta e intensa pode ser uma dificuldade importante para as empresas.

Uma situação dramática, como a saída da Grécia da zona do euro, poderia, na visão dos especialistas, trazer uma pressão extra sobre a moeda. Nesse caso, não há dúvidas de que o BC atuaria vendendo reservas. “O BC tem dito repetidamente que as reservas existem para ser usadas”, afirma a fonte. “Mas, neste momento, o que ele está fazendo é mostrar que pode oferecer o hedge necessário para quem está exposto ao câmbio.”

A movimentação do Banco Central ocorre justamente no momento em que instituições financeiras, em especial estrangeiras, têm afirmado em relatórios que a fraqueza da economia brasileira começa a tirar o país da condição de “queridinho” do mercado global. A leitura é de que o dinamismo da economia doméstica garantia uma certa proteção do mercado local diante das turbulências externas. Com a retração da atividade, confirmada pelo último IBC-Br, espécie de indicador antecedente do PIB calculado pelo BC, essa “âncora” teria sido perdida. O excesso de intervenções por parte da Fazenda, tanto na política monetária quanto na cambial e no sistema financeiro, amplia ainda mais o tom negativo traçado por esses analistas.

É bom lembrar que, na sexta-feira, será divulgado o resultado oficial do PIB do primeiro trimestre. O BC parece estar atento ao efeito negativo que esse número pode provocar nos negócios. E quer dar um sinal mais claro ao mercado de que, a despeito da piora que se vê no exterior, a hora é de manter a parcimônia. “Acredito que o BC até poderia ser mais agressivo no corte de juros se houver uma ruptura no exterior. Mas, antes disso, a orientação parece ser a da parcimônia”, conclui um analista.

 


Varejo dependente de crédito cresce menos

Valor Econômico

Os segmentos do varejo mais ligados à renda exibem neste ano um desempenho superior ao daqueles mais dependentes do crédito. No primeiro trimestre, as vendas dos “setores renda” cresceram 5,7% em relação ao trimestre anterior, feito o ajuste sazonal, enquanto as dos “setores crédito” tiveram alta de 1,6%, segundo divisão elaborada pela LCA Consultores a partir da Pesquisa Mensal do Comércio do IBGE. Na média, as vendas do varejo cresceram 3% em relação ao quarto trimestre de 2011.

O primeiro grupo, mais vinculado à renda, teve como grande destaque o setor de supermercados, produtos alimentícios, bebidas e fumo, que avançaram 6,5% no período. No caso dos segmentos ligados ao crédito, quem puxa o desempenho para baixo são as vendas de veículos, que recuaram 0,3% na mesma base de comparação.

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A renda sobe com força neste ano, impulsionada pelo aumento de mais de 14% do salário mínimo e pelo cenário de baixo desemprego, que dá força aos trabalhadores em negociações salariais. Para ajudar, a inflação acumulada em 12 meses está em queda, engrossando o rendimento em termos reais.

No caso dos bens mais ligados ao crédito, o setor de veículos e autopeças foi o mais castigado. O maior endividamento das famílias, associado à inadimplência em alta, afetou tanto a demanda quanto a oferta de crédito para esses bens nos primeiros meses do ano, diz o economista Paulo Neves, da LCA. O desempenho dos setores ligados a crédito foi bastante desigual. No primeiro trimestre, as vendas de móveis e eletrodomésticos aumentaram 4,3% sobre os três meses anteriores, feito o ajuste sazonal. O resultado sugere que as vendas de veículos, bens de maior valor unitário, foram mais afetadas do que de outros segmentos ligados ao crédito que envolvem bens de preços mais baixos. O segmento de material de construção, por exemplo, viu as vendas aumentarem 6%. No entanto, a área de veículos, com peso superior a 32% na pesquisa do IBGE, derruba a média dos setores ligados ao crédito.

A expectativa para os segmentos ligados à renda continua favorável porque o rendimento real deve seguir em alta. O Valor analisou 216 convenções coletivas entre as que foram registradas no Ministério do Trabalho até 25 de maio, referentes a categorias com data-base nos cinco primeiros meses do ano. A média de ganho real negociada nesse intervalo quase dobrou, passando de 1,65% entre janeiro e maio do ano passado para 3,06% neste ano. A queda da inflação, o aumento do salário mínimo e o mercado de trabalho ainda aquecido ajudaram essas negociações salariais neste início de ano, apesar da desaceleração da economia doméstica e das preocupações com o cenário externo.

 


Com déficit bilionário, 15 Estados vão mudar regime de servidor

Valor Econômico

A reforma do regime de previdência do setor público federal acabou, mas a de Estados e municípios está apenas começando. Ao todo, 15 Estados estão preparando uma reforma aos moldes da realizada pelo governo Dilma Rousseff, que instituiu os fundos de previdência complementar (Funpresp) para os servidores federais, em substituição ao antigo regime, que garantia o salário integral. Nos próximos dias, o Estado do Rio de Janeiro deve reformar seu regime próprio de previdência, criando um fundo igual ao Funpresp. O déficit dos regimes de previdência dos Estados e municípios já se aproxima de R$ 50 bilhões por ano – o dos servidores federais será de R$ 61 bilhões em 2012.

Além do Rio de Janeiro, o Valor apurou que os Estados de Santa Catarina, Espírito Santo e Pernambuco já têm projetos de reforma previdenciária prontos, que devem ser aprovados ainda neste ano. Já os Estados do Mato Grosso do Sul, Rondônia e Paraná estão com estudos avançados nesse sentido. O objetivo é semelhante ao perseguido pelo governo federal: equacionar o elevado déficit nas contas públicas causado pelo rombo previdenciário. No Espírito Santo, o déficit previdenciário dos 120 mil beneficiados foi de R$ 1,8 bilhão em 2011 – para 2012, o Estado estima que o déficit será de R$ 2,1 bilhões.

Hoje, a contribuição de Estados e municípios nos regimes de previdência vai de 11% (Rio de Janeiro), no mínimo, a 22%, no máximo (no Rio Grande do Norte). Com os fundos, as alíquotas de contribuição cairão a 7,5%, como foi aprovado em São Paulo, ou 8,5%, no Funpresp e como será no Rio de Janeiro.

No cenário traçado pelos técnicos do governo Dilma Rousseff até 2014, entre oito a 12 Estados terão criado seus próprios fundos de pensão. “Os Estados perceberam que a União conseguiu concluir a reforma iniciada ainda no governo Fernando Henrique Cardoso [em 1997], e que o esforço do governo federal abriu caminho para reformas semelhantes”, afirmou ao Valor o ministro da Previdência Social, Garibaldi Alves Filho.

No Paraná, dono do maior regime próprio de previdência em termos de recursos capitalizados (R$ 7 bilhões em administração, e outros R$ 5 bilhões para receber de obrigações contratadas junto ao Estado), o fundo de pensão que será criado visa interromper o déficit de R$ 100 milhões por mês para honrar os benefícios previdenciários dos quase 105 mil inativos. O Estado prevê a contratação de 15 mil a 20 mil novos servidores entre 2013 e 2016, e esses já seriam incorporados ao novo regime. Além disso, os militares também devem ser incluídos – diferente do que ocorreu com a União, onde o Funpresp não contempla os militares.

Os estudos no Estado são liderados por Jayme Lima, presidente da Paraná-Previdência, o instituto de previdência do Estado, que prevê um modelo igual ao Funpresp – isto é, com a contribuição paritária do Estado em até 8,5% do salário do servidor. No único fundo de pensão estadual já criado, o de São Paulo, a contribuição do governo é inferior, de 7,5%, sobre a parte da remuneração que ultrapassa o teto do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Lima também é o coordenador do grupo de técnicos que estuda as reformas em Estados e municípios no Conselho Nacional dos Dirigentes de Regimes Próprios de Previdência (Conaprev).

“Nós plantamos uma semente com o Funpresp, e os governos regionais entenderam a importância de solucionar a bomba relógio que são os crescentes déficits previdenciários”, afirma Jaime Mariz, secretário de Políticas de Previdência Complementar do Ministério da Previdência. Profundo conhecedor do arcabouço institucional do novo regime do setor público federal, Mariz avalia que há uma “janela de oportunidade”, aberta pela determinação de Dilma em aprovar o Funpresp, para que Estados e municípios façam reformas.

Entre os municípios, a capital de São Paulo tem os estudos mais adiantados. Com 144 mil servidores ativos, apenas 15% deles têm salários superiores ao teto do INSS – são esses os servidores contemplados no fundo de previdência complementar. Uma das propostas em estudo pela equipe de Gilberto Kassab (PSD) é a adesão ao fundo de pensão criado no Estado.

A movimentação dos municípios em relação a reformas na previdência vai se acelerar no segundo semestre. Os técnicos da área previdenciária do governo Dilma foram convidados pelo secretário de Administração de Maceió (AL), Sérgio Villela, coordenador do Fórum das Capitais, para participar do próximo encontro dos secretários das 27 capitais, em junho. A pauta é única: reformar o regime previdenciário dos municípios.

“Estamos tomando alguns cuidados”, afirma Mariz. Alguns Estados e municípios que sondaram nos últimos dias a pasta apresentaram a ideia de que os institutos de previdência dos governos e prefeituras sejam os “gestores” dos fundos de pensão que serão criados. O Ministério da Previdência é fortemente contrário à iniciativa, e seus técnicos têm sugerido uma legislação mais próxima da adotada com o Funpresp e em São Paulo. “Os fundos de pensão devem ter gestão própria, com conselho fiscal, e cargos próprios”, afirma Mariz.

Com essa possibilidade, ele lembra que “não se pode intervir em uma autarquia federal e isso pode ser um problema”. A Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), órgão regulador do setor, não pode intervir na gestão de prefeituras e Estados.

Há, hoje, quatro fundos de pensão sob intervenção da Previc, por problemas de gestão. “Os três Funpresp da União [um de cada Poder] serão, juntos, o maior fundo de pensão da América Latina, e ele estará sob fiscalização da Previc”, diz Mariz. Nada mais natural, acrescenta, que os fundos que Estados e municípios criarem também sejam fiscalizados.

 


‘Só 4 ou 5 produtos representam70% das exportações’

O Estado de S. Paulo

Rubens Barbosa, presidente do conselho superior de comércio exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), defende uma reforma na estrutura de comércio exterior do Brasil. Para reverter a tendência de primarização da pauta exportadora, ele acredita que o País precisa revigorar a Câmara de Comércio Exterior (Camex). “A Camex está enfraquecida, esvaziada”, disse Barbosa, em entrevista ao Estado. A seguir trechos da entrevista.

Os economistas preveem queda no superávit comercial do Brasil em 2012. Como reverter isso?

Não vejo como um problema porque o superávit ainda vai ser grande. Agora isso pode ser uma tendência. E, nesse caso, vira um problema complicado para o governo. A economia brasileira, nos últimos anos, cresceu com base na exportação. Nos últimos três anos, o impulso veio da expansão do mercado doméstico. Há uma concentração muito grande de poucos produtos de exportação para gerar o superávit. Quatro ou cinco produtos que representam 70% da pauta de comércio exterior brasileira e todos produtos primários. A grande preocupação do governo deveria ser a perda da competitividade das manufaturas brasileiras.

O governo lançou política industrial nesse sentido. É suficiente?

Foram tomadas algumas medidas que vão no caminho correto, mas não resolvem o problema. São medidas pontuais, conjunturais, que tentam dar uma contrapartida para o setor privado. Foram feitas para compensar o câmbio, as altas taxas de juros e tudo que se convencionou chamar de custo Brasil.

As medidas de defesa comercial foram intensificadas. O governo Dilma é protecionista?

Dentre as medidas conjunturais, estão uma série para proteger os setores mais vulneráveis por causa da apreciação do câmbio e da alta taxa de juros. Todos os países estão tomando medidas restritivas para proteger o mercado interno. Podem ajudar no curto prazo a impedir um grande fluxo de importação de produtos estrangeiros, sobretudo vindos da China, que prejudicam a indústria brasileira. Mas não resolvem o problema. Não é através do protecionismo que vamos resolver os problemas internos do País. O custo Brasil só vai ser reduzido com reformas importantes em todas as áreas.

As atribuições sobre o comércio exterior estão divididas por vários ministérios. Isso provoca lentidão nas decisões?

É um problema que já estudamos há muito tempo na Fiesp. O conselho de comércio exterior fez uma proposta sobre isso. É um absurdo que hoje existam 16 órgãos que interferem no comércio exterior e mais de duas mil normas. Não existe um comando claro. Com o comércio exterior brasileiro ultrapassando meio trilhão de dólares este ano, está chegando o momento de reorganizar essa área. A nossa sugestão na Fiesp é que seja examinada no Brasil seriamente a ideia de se criar uma presidência da Camex, e subordinar o órgão diretamente à Presidência da República – da mesma forma que funciona nos EUA. Não se trata de criar nenhum novo ministério ou de aumentar a burocracia, mas de colocar foco no comércio exterior. Hoje a Camex é um órgão dentro do Ministério da Indústria e Comércio. O ministro é o presidente da Camex, mas isso é uma das suas atribuições.

A Camex está enfraquecida?

Ela está enfraquecida, esvaziada. As reuniões ministeriais praticamente não ocorrem. Pela lei, a Camex é um colegiado que tem a atribuição de examinar, formular e definir as políticas de comércio exterior. Hoje não faz isso. Todas as medidas que mencionamos foram feitas à margem da Camex. A estratégia de negociação comercial também não é examinada pela Camex. O objetivo não é retirar a competência de nenhum órgão, mas dar peso político para a Camex e dar um foco ao setor privado. Além dessa reforma do comércio exterior, há uma série de reformas que estão em discussão há algum tempo. No Brasil, estamos chegando à mesma situação da Índia. Nos últimos meses, a economia indiana começou a ter um declínio no crescimento, porque não eles conseguem aprovar as mesmas reformas que estamos discutindo no Brasil. O crescimento da economia brasileira vai desacelerar, se não houver disposição política do governo e do Congresso para enfrentar os problemas. A presidente Dilma hoje dispõe de um capital político altíssimo, que deveria ser aproveitado para liderar uma negociação séria e reduzir o custo do Brasil. E poderia começar tudo com a reforma tributária e a reforma da estrutura do comércio exterior.

Em seu artigo mais recente no “Estadão”, o sr. diz que a visita da presidente Dilma a Washington foi um passo “discreto” na construção de uma agenda Brasil – Estados Unidos. Por que o sr. qualifica como discreto?

Pelos resultados que alcançou. A ambição tanto dos EUA quanto do Brasil é muito pequena. Do lado dos EUA, não teve nenhuma proposta. Nós levamos algumas propostas. A presidente fez um chamado para que o setor privado americano invista no Brasil. Foi algo importante, mas discreto. Em vários setores poderíamos ter uma ação mais forte. Por exemplo: cooperação no área espacial, parcerias o pré-sal. Nas últimas semanas, tivemos dois fatos muito significativos. Estiveram no Brasil a secretária de Estado, Hillary Clinton o secretário de Defesa, Leon Panetta. Você vai dizer que não há nada de concreto. Mas o fato de o governo americano mandar para o Brasil dois funcionários cruciais na estrutura americana é importante. Eles não vieram aqui para passear. O que tentei mostrar no meu artigo foi que, apesar de a agenda Brasil – EUA estar mais desbloqueada do ponto de vista ideológico, com um relacionamento mais prático, os passos que estamos dando ainda são modestos.

Hillary Clinton chegou a falar em um acordo de livre comércio para o Brasil. O sr. vê alguma chance de isso ocorrer?

Isso é algo retórico. Não há nenhuma condição de fazer hoje um acordo de livre comércio como foi pensado no passado. E não é por causa do Brasil, mas dos EUA Eles não podem abrir o setor agrícola para os produtos brasileiros. Do ponto de vista comercial, o que pode avançar mais é a simplificação. Temos o TECA, Acordo de Cooperação Econômica e Comercial com os Estados Unidos, que foi assinado durante a visita do presidente Obama ao Brasil. Pela primeira vez, o TECA prevê a possibilidade de negociar as barreiras sanitárias, que abriria o mercado americano, por exemplo, para as carnes brasileiras.

 


A inserção internacional do novo Brasil

O Estado de S. Paulo

O Brasil mudou. A estabilidade econômica, aliada à elevação da renda de importante parcela da população, é o que tem movimentado a economia. O crescimento do mercado interno de bens de consumo, quer sejam televisores ou carne suína, tem atraído investimentos e gerado empregos. Somos a 6.ª economia mundial. O desafio é seguir crescendo.

A inserção competitiva desse novo Brasil no comércio globalizado exigirá intensas negociações. Infelizmente, estamos parados. A prioridade à Rodada Doha no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC) era a correta. Acordos multilaterais atendem melhor às necessidades de uma economia diversificada e complexa como a do Brasil. Após oito anos negociando, não nos parece que atingiremos o objetivo.

O País não pode ficar aguardando o ambiente negociador de Genebra melhorar. Não é o que os principais parceiros comerciais do Brasil têm feito. Acordos bilaterais e regionais, principalmente na Ásia, região de forte crescimento econômico, prosperam.

Um parceiro importante, como a Coreia do Sul, finalizou recentemente acordos comerciais com EUA e União Europeia (UE), mercados-chave para nosso comércio. Austrália, Brunei, Chile, Cingapura, EUA, Japão, Malásia, Nova Zelândia, Peru e Vietnã se dedicam à construção de uma ampla negociação comercial, conhecida como Trans Pacific Partnership (TPP). Até mesmo China, Coreia e Japão falam em se aproximar comercialmente, em reação à crise europeia. É preciso articular uma nova estratégia negociadora para o Brasil, que fortaleça nossa inserção internacional, hoje com nova e positiva perspectiva de futuro.

Acordos comerciais incluem trocas. O ativo do Brasil que mais se valorizou, além da estabilidade política e econômica, é o forte crescimento do mercado interno. São os 200 milhões de consumidores que tornam a posição do Brasil atraente. São eles, também, que devem ser lembrados como beneficiários de bens e serviços mais competitivos que ampliem seu poder de renda e sua qualidade de vida, mesmo que vindos do exterior. Precisarão, certamente, estar empregados, pois não se ignora a essencialidade de os setores produtivos do Brasil permanecerem saudáveis – mais do que isso, com renda crescente.

Negociar pressupõe expor setores produtivos a maior concorrência. Não se trata de menosprezar as dificuldades enfrentadas por inúmeros setores que, na falta de avanço em questões estruturais no chamado custo Brasil, ganham importante argumento protecionista, cuja validade não pode ser simplisticamente aceita, independente de análise. Muito menos se pode ignorar a valorização da moeda que facilita as importações. Valorização cambial – hoje já com reflexos da positiva queda de juros – e custo Brasil precisam ser enfrentados.

O pouco que ocorre na área de comércio exterior são ações de cunho protecionista nem sempre alicerçadas em critérios técnicos rigorosos. Os instrumentos de salvaguardas comerciais e de ações antidumping estão aí para ser usados. É essencial, porém, que as regras para essa utilização sejam observadas. É do interesse do Brasil valorizar o sistema de regras de comércio negociado no âmbito multilateral. Não se trata de ser a favor ou não do livre comércio, mas de ser a favor de um sistema de comércio baseado em regras negociadas e acordadas. Interessa ao Brasil a valorização do sistema de regras, e não o inverso.

A perda de competitividade do Brasil nos mercados externos é um fato, inclusive para o setor agrícola. O custo de mão de obra no País deixou de ser um fator de competitividade. Para muitos setores, ele é superior ao da maioria dos concorrentes. Sobre a questão da logística, é consenso o quanto ela penaliza a competitividade do Brasil. A estrutura tributária permanece um fator de ineficiência. Será preciso avançar nessas questões de competitividade, e uma estratégia de inserção internacional deve atuar nessa motivação. Negociações comerciais costumam demorar muitos anos. Mesmo se iniciando uma hoje, esta não cria a fatalidade de uma conclusão a qualquer custo.

A negociação simultânea de diversos acordos comerciais bilaterais fortaleceria muito o Brasil. A simultaneidade permitiria trocar o acesso ao nosso mercado interno com variados mercados externos para os setores produtivos. O mercado brasileiro seria compartilhado com os parceiros futuros. Não só ganharíamos mais com ele, como também se adicionaria um elemento de pressão para o outro lado, pois não concluir a negociação com o Brasil representaria perda relativa. Acredito que o que tem faltado para concluir o acordo com a UE, praticamente o único em negociação, é pressão. Sabem que estamos parados.

Diversos acordos bilaterais simultâneos podem ter resultado próximo ao almejado na Rodada Doha. Dizer com quem e o que negociar não é pretensão de abordagem destas poucas linhas. É preciso, porém, começar. Estudos serão necessários. Os setores precisarão avaliar e se preparar para o futuro. A inserção competitiva da economia brasileira precisa ser construída. Isso tudo toma tempo e exige prioridade e participação da sociedade. A paralisia atual não é alternativa.

 


Crise afeta PIB chinês também no 2º trimestre

O Estado de S. Paulo

A perda de ritmo da economia chinesa deverá continuar pelo menos até junho, sob o impacto da crise econômica nos países ricos e os efeitos da política doméstica para desinflar a bolha no mercado imobiliário. Muitos analistas já revisaram para baixo as projeções de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) no segundo trimestre e esperam porcentuais inferiores a 8%, depois dos 8,1% registrados no período de janeiro a março.

Os dados negativos de abril deram um susto nos economistas e nas autoridades de Pequim, por mostrarem um quadro de desaceleração mais acentuada que a prevista. Estatísticas preliminares de maio indicam que a perda de fôlego continua, o que puxará para baixo os resultados do segundo trimestre. “Em termos anualizados, o crescimento do PIB de abril foi inferior a 7,5%, que é a meta oficial de expansão para o ano, e vai demorar de dois a três meses para haver uma reação”, disse ao Estado Yao Wei, economista do Société Générale baseada em Hong Kong.

A atividade industrial está em ritmo lento e as torneiras do crédito que sustentam os investimentos estão mais fechadas do que no ano passado. Segundo a agência de notícias Bloomberg, os empréstimos concedidos pelos grandes bancos estatais poderão fechar 2012 abaixo da meta oficial pela primeira vez nos últimos sete anos.

É possível que o volume de novos financiamentos fique em 7 trilhões de yuans (R$ 2,24 trilhões), cifra inferior à meta de 8 trilhões de yuans (R$ 2,56 trilhões) e aos 8,5 trilhões de yuans (R$ 2,72 trilhões) emprestados no ano passado.

Segundo o jornal oficial Securities Daily, o volume de novos empréstimos poderá cair para 500 bilhões de yuans (R$ 160 bilhões) em maio, depois do tropeço de 1 trilhão de yuans para 682 bilhões de yuans entre março e abril.

Medidas. Reunião do gabinete chinês realizada na última quarta-feira aprovou medidas de estímulo à economia, mas decidiu manter as políticas restritivas ao mercado imobiliário aprovadas ao longo dos últimos meses para conter a alta especulativa de preços. Entre os mais importantes anúncios está o aumento de investimentos em infraestrutura, com a antecipação do cronograma de projetos já aprovados e a concessão do sinal verde a novas obras.

“O crescimento do PIB deve melhorar no segundo semestre, mas o baixo crescimento no segundo trimestre, precedido de um fraco primeiro trimestre aumenta a possibilidade de o crescimento anual vir abaixo das atuais expectativas de pelo menos 8%”, escreveu Andrew Batson, diretor de pesquisa da consultoria Dragonomics.

Depois dos dados de abril, o banco americano J.P. Morgan reduziu de 8,5% para 7,9% sua projeção de expansão do PIB no segundo trimestre e espera um crescimento anual de 8,1% _frente a 8,6% nas estimativas anteriores. Esse porcentual já conta com a aceleração de projetos de infraestrutura e reação dos empréstimos bancários, além de um ligeiro aumento dos gastos públicos.

As projeções de crescimento também consideram um cenário no qual não há agravamento significativo da crise na Europa, região que é atualmente o principal destino das exportações chinesas.

A avaliação do economista-chefe do UBS, Wang Tao, é menos otimista. Ele prevê expansão do PIB de 8,2% neste ano, mas alerta que o porcentual será inferior se o cenário internacional se degradar. “Mesmo com suporte adicional de políticas , na hipótese de um colapso súbito da demanda externa, o crescimento anual da China vai provavelmente cair para cerca de 7%”, avaliou a economista.