Câmbio volátil e depreciado põe em risco juro mais baixo

A instabilidade excessiva e uma desvalorização muito acentuada do câmbio podem dificultar o projeto do governo de reduzir os juros para níveis mais baixos, provocando também incertezas num país hoje mais integrado à economia internacional, advertem alguns economistas. Além de um eventual impacto inflacionário, um risco que hoje parece pequeno, um dólar que oscila muito também afeta a vida de muitas empresas que tem dívida no exterior ou incluíram a importação na sua estratégia produtiva, influenciando também decisões de investimento no país – em renda fixa e na bolsa e também em atividades produtivas.

Para o ex-ministro das Comunicações Luiz Carlos Mendonça de Barros, o câmbio não pode ser visto apenas como um fator importante para a rentabilidade da indústria, como, segundo ele, parece acreditar o Ministério da Fazenda. “O câmbio tem hoje uma grande abrangência no equilíbrio macro e microeconômico do país.” O Brasil, lembra ele, tem um déficit em conta corrente (resultado das transações de bens, serviços e rendas com o exterior) que, se não é enorme, tampouco é desprezível, e precisa ser financiado – nos 12 meses até abril, somou 2,04% do Produto Interno Bruto (PIB), ou US$ 51,6 bilhões.

Um dólar volátil demais pode inclusive afetar decisões de empresas estrangeiras de investir no setor produtivo, diz ele – que, no entanto, não atribui ao movimento do câmbio o fluxo recente um pouco menor de investimentos estrangeiros diretos. Também ex-presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Mendonça de Barros destaca ainda que uma alta muito forte do dólar afeta as empresas que se endividaram no exterior, muitas vezes a um custo menor por prazos mais dilatados.

Para ele, o movimento recente do câmbio atrapalhou até mesmo as vendas de títulos da dívida pública. No dia 22, quando o dólar testou o limite de R$ 2,10, o Tesouro ofertou três lotes de NTN-Bs (papéis atrelados ao Índice de Preços ao Consumidor Amplo) com vencimento em 2016, 2018 e 2022, mas não vendeu nada. Muita volatilidade no câmbio pode afastar o investidor estrangeiro que ajuda o governo a alongar os prazos da dívida pública, a taxas mais baixas, não se tratando de um dinheiro especulativo, avalia ele, hoje sócio da Quest Investimentos.

Mendonça de Barros lembra que, nos últimos anos, um número muito maior de empresas passou a importar. Se o dólar sobe muito, isso pressiona os custos das companhias, podendo se traduzir em alguma inflação. Por tudo isso, ele acha que não faz sentido comemorar a depreciação mais acentuada do câmbio, como fez o ministro da Fazenda, Guido Mantega. O discurso tende a contribuir para desvalorizar ainda mais a moeda, num momento de incerteza no cenário externo, especialmente em relação à crise na Europa.

“Um câmbio muito desvalorizado e volátil pode colocar em risco o objetivo do governo de ter juros reais mais baixos”, diz ele, que vê um cenário de fato propício para o BC testar níveis menores para a Selic, com um quadro externo benigno para os preços, uma atividade doméstica fraca e um quadro de juros baixíssimos no mundo desenvolvido.

A alta mais forte do dólar incomodou o BC, que vendeu US$ 5,4 bilhões em swaps cambiais depois que o dólar se aproximou de R$ 2,10. Além disso, o sempre discreto diretor de Política Econômica do BC, Carlos Hamilton de Araújo, chegou a dizer publicamente que o excesso de volatilidade no câmbio era preocupante. Ontem, o dólar, que no fim de fevereiro estava em R$ 1,72, fechou em R$ 1,986.

Para o ex-presidente do BC Gustavo Loyola, sócio da Tendências Consultoria, o governo tem alguns objetivos simultâneos em alguma medida conflitantes, como o de desvalorizar deliberadamente o câmbio, reduzir os juros e ampliar o crédito. O real mais fraco tem algum efeito sobre a inflação, ainda que no momento o repasse da desvalorização da moeda para os preços seja limitado.

Loyola também nota que o país está hoje mais aberto do ponto de vista comercial e financeiro. Um câmbio muito volátil, para um país que precisa de poupança externa (que equivale ao déficit em conta corrente), pode ter efeitos negativos. Por fatores como esses, a moeda não pode ser tomada apenas como algo que vai melhorar a competitividade da indústria, por melhorar a rentabilidade das exportações e encarecer as importações, diz Loyola.

Em entrevista recente ao Valor, o ex-presidente do BC Ibrahim Eris afirmou que um câmbio na casa de R$ 2 tem risco inflacionário, ainda que melhore de fato a situação da indústria.

“Você não pode desvalorizar a moeda em 20% e achar que não vai ter nenhum impacto sobre a inflação, embora seja algo transitório”, disse Eris. Para ele, que vê espaço para o BC testar níveis de juros comparáveis aos internacionais, o câmbio mais desvalorizado pode exigir da autoridade monetária em algum momento uma parada no ciclo de redução da Selic, atualmente em 9% ao ano. Hoje, o Comitê de Política Monetária (Copom) deve cortar mais uma vez a taxa, para 8,5%, segundo a expectativa da maior parte do mercado.

 


Fazenda prepara mais medidas para o crédito

Valor Econômico

O Ministério da Fazenda está concluindo a elaboração de três medidas para ajudar a destravar o crédito, informaram fontes oficiais: a ampliação dos limites da lei 12.431, que concede benefício fiscal para as renegociações de dívidas de até R$ 30 mil, para cerca algo em torno de R$ 100 mil; a restrição à cobrança de custos, pelos bancos, para que um tomador de crédito possa se beneficiar da portabilidade; e a definição clara da responsabilidade sobre as informações do cadastro positivo.

A renegociação de dívida é importante para transformar o inadimplente de hoje em um consumidor adimplente visando, sobretudo, o mercado de crédito para a aquisição de veículos. Para isso, porém, é preciso mudar o regime de tributação.

Quando um banco renegocia uma dívida com seu cliente, a operação equivale a um novo contrato de crédito sobre o qual a instituição paga Imposto de Renda. Se o tomador para de pagar a dívida refinanciada, o banco faz provisão para devedores duvidosos que é dedutível do IR no prazo de dois anos. A lei 12.431 suspendeu a cobrança do IR no ato da renegociação, transferindo-a para o momento da quitação do crédito refinanciado, mas só para débitos de até R$ 30 mil. Agora o governo quer elevar esse limite para algo entre R$ 80 mil e R$ 100 mil.

Além dessa medida, a Fazenda quer impor limites à cobrança de custos e encargos, pelos bancos, dos clientes que querem levar seus financiamentos para outras instituições que lhe ofereçam melhores condições de juros e de prazos (portabilidade). E, para fazer funcionar o cadastro positivo, falta apenas definir de quem será a responsabilidade pelas informações dos clientes.

Essas são as medidas que estão na agenda do ministro Guido Mantega. Outras iniciativas de maior fôlego para fazer frente à crise externa, se necessárias, só devem ser tomadas depois das eleições na Grécia e da reunião do G-20 em Los Cabos, no México, no dia 18.

 


Fiesp revisa projeção e vê produção negativa

Valor Econômico

Um novo recuo da atividade industrial paulista em abril fez com que a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) revisasse sua previsão para o setor no ano, tanto em São Paulo como no país.

Agora, a entidade prevê uma queda de até 2% na atividade industrial no Estado, ante expectativa anterior de estabilidade do indicador no ano. Em termos nacionais, a Fiesp reduziu a expectativa de crescimento da produção industria de 1,4% para uma estimativa entre zero e queda de 1%.

Em abril, o nível de atividade da indústria paulista caiu 0,3% ante março, na comparação com ajuste sazonal. Sem ajuste, a queda foi de 5,2%. “Para a indústria de transformação do Estado terminar com estabilidade este ano, o crescimento ante o mês anterior deveria ser em todos os meses até o fim do ano de 1,3%. Isso nunca aconteceu”, explica Paulo Francini, diretor do Departamento de Pesquisas Econômicas da Fiesp. Para ele, a projeção de queda de 2% ainda é otimista, já que se baseia em sucessivas altas de 0,6% até o fim de 2012.

As recentes medidas tomadas pelo governo para alavancar a produção devem surtir efeito apenas no segundo semestre e seu impacto não virá a tempo de reverter essas quedas, na visão da Fiesp. “O câmbio a R$ 2 é, evidentemente, mais competitivo do que a R$ 1,70, mas é preciso calma para ver os efeitos nas exportações e importações”, acrescenta Francini.

O diretor da entidade acredita que a redução da Selic e dos spreads bancários também terá efeito mais visível a partir do segundo semestre. No entanto, a concorrência externa e a instabilidade do cenário internacional dificultarão a visibilidade desses resultados. “Há capacidade industrial no mundo que supera a demanda. Países concorrentes da produção nacional começarão a baixar preços para não perder os clientes brasileiros, o que atenua em parte os efeitos do câmbio mais favorável à indústria nacional.”

 


Mata Atlântica permanece sob a ameaça de fornos de carvão em Minas

O Estado de S. Paulo

A taxa de desmatamento da Mata Atlântica voltou a apresentar uma leve queda entre 2010 e 2011, em relação à perda de cobertura florestal que havia ocorrido no biênio anterior (2008 a 2010), mas os dados levantam a bandeira vermelha de que o bioma mais devastado do Brasil continua sendo ameaçado.

Essa é a interpretação feita pela SOS Mata Atlântica e pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que divulgaram ontem o Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica.

Olhando apenas a estatística, a devastação praticamente ficou estável. No biênio 2008- 2010, o desmate tinha sido de 31.195 hectares – cerca de 15.500 por ano. Entre 2010-2011 (período de um ano) foi de 13.312 ha ou 133 km². Mas houve aumento significativo na Bahia e em Minas, líderes no ranking do desmate (mais informações nesta página). E justamente esses Estados estiveram muito cobertos por nuvens durante a observação pelo satélite (cerca de 60% de visualização).

“Não posso afirmar que parou ou diminuiu o desmatamento porque grande parte de Bahia e de Minas não foi avaliada. Certamente se eu tivesse imagens – como esses são os Estados mais críticos – teríamos observado mais desmatamento ali”, explica Marcia Hirota, coordenadora do Atlas pela SOS Mata Atlântica.

Além disso, no levantamento anterior haviam sido mapeados 16 dos 17 Estados originalmente cobertos pela Mata Atlântica e neste foram somente 10. Em Alagoas, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Sergipe e Rio Grande do Norte, a análise foi impossibilitada pela ocorrência de nuvens. Piauí não foi avaliado em nenhuma ocasião. “Vimos queda em termos absolutos, mas se tivesse todas as informações, provavelmente esse total seria maior.”

Segunda Márcia, a ameaça na Bahia e em Minas, onde o problema já tinha sido identificado no levantamento anterior, são os fornos de carvão. O alvo são sobretudo as regiões com as chamadas “matas secas”, um tipo de vegetação que lembra a do Cerrado e por isso às vezes é confundida com ele. Mas pela lei da Mata Atlântica, de 2006, não é.

Entre os municípios campeões de desmate, três estão em Minas (Águas Vermelhas, Jequitinhonha e Ponto dos Volantes, 1.º, 3.º e 5.º, respectivamente), formando o que especialistas chamaram de “triângulo do desmatamento”. Lá, a pressão é dos fornos.

Para a equipe, apesar de o total de desmate parecer pequeno, os dados são significativos porque restam 7,9% de Mata Atlântica no País, quando analisados os fragmentos com mais de 100 hectares – tamanho considerado representativo para a conservação da biodiversidade.

Código Florestal. Mario Mantovani, diretor de Políticas da Mata Atlântica, alerta que o dado também é significativo diante da mudança do Código Florestal. Apesar de a lei da Mata Atlântica prevalecer sobre o Código, garantindo a proteção ao bioma, ele reduz a necessidade de recomposição de mata ciliar que tenha sido desmatada. Na avaliação dos especialistas, para a Mata Atlântica, a recuperação é até mais importante, visto que a maior parte já está destruída. Isso põe em risco, segundo eles, o fornecimento de água das grandes cidades, como São Paulo.

 


Copom pode detonar ajuste de investidores

Valor Econômico

O comunicado que o Banco Central fará após a reunião de política monetária desta quarta-feira tem potencial para mexer com o mercado financeiro de forma mais intensa do que de costume. Com uma posição técnica desconfortável, investidores estão com o dedo no gatilho para ajustar suas carteiras, ao menor sinal de mudanças no rumo da política monetária.

Se o comunicado deixar dúvidas sobre a continuidade do corte de juros, uma onda de correção de posições pode fazer as taxas futuras dispararem e reduzir o apetite por títulos públicos prefixados – que irão a leilão na quinta, no “day after” do Copom -, como ocorreu na semana passada, quando os índices que medem o desempenho de papéis prefixados e de títulos atrelados à inflação amargaram a pior perda semanal desde 2008.

Nos últimos dias, o mercado viu a volatilidade crescer intensamente, acarretando fortes perdas nas carteiras que carregam ativos prefixados. A convicção de que a taxa Selic poderia ir para a casa dos 7% foi abalada, levando a uma onda de zeragem, tanto em títulos públicos prefixados quanto em contratos de DI futuro. “O mercado carregava uma grande posição aplicada em juros a um preço muito ruim. Para ganhar com essas apostas, o juro teria de cair abaixo de 8%”, diz Fernando Rocha, sócio e economista da JGP.

Quem comprou LTN e NTN-F viu sua carteira perder valor nos últimos dias, e foi buscar proteção nos DIs. Ao zerar essa posição, a alta dos juros futuros foi potencializada. Para se ter uma ideia, o DI janeiro/2014, o mais negociado, teve sua taxa elevada de 8,06% (18 de maio) para 8,53% anteontem, depois de bater 8,62% na máxima.

“O mercado foi procurar hedge nos DIs porque ficou inseguro com o que poderia acontecer com a política monetária, pressionando ainda mais as taxas futuras e atraindo mais ordens de stop loss”, afirmou um operador.

Passada boa parte da correção, o mercado parece ter se acalmado ontem, com o DI de janeiro/2014 voltando a marcar 8,36%. Mas uma nova onda de zeragem vai depender do comunicado do Copom de hoje. Se o BC sinalizar que pode parar o ciclo ou tirar o pé do acelerador, a curva tende a abrir novamente. “Se a percepção for de que o ciclo continua, há espaço para mais fechamento”, diz Rocha.

A virada do humor foi provocada por um conjunto de fatores: o governo anunciou um pacote de estímulo ao crédito; o dólar assustou ao flertar com o nível de R$ 2,10; e o Banco Central reforçou o discurso sobre parcimônia – inclusive em encontros reservados com analistas.

“A interpretação foi a de que se o governo passou a usar outros instrumentos para estimular a economia, a necessidade de cortar a Selic diminuiu”, afirma Rocha. Até então, segundo ele, o mercado acreditava que o BC iria aproveitar a janela de oportunidade para levar o juro ao menor nível possível.

Para um gestor de fundos, “a correção foi motivada pelo vazamento das conversas paralelas do BC com investidores, e não por mudanças de expectativa em relação ao juro”. Segundo essa fonte, as medidas para estimular as vendas de carros estão surtindo efeito, mas isso não é suficiente para reverter a fragilidade da atividade econômica.

A indigestão provocada pelo risco prefixado também atrapalhou a venda de LTN e NTN-F pelo Tesouro. Por causa da dispersão de taxas, parte das ofertas dos investidores foi recusada nos últimos dois leilões. No caso das NTN-Bs, título indexado ao IPCA, nenhuma proposta foi aceita na terça-feira da semana passada, o que não acontecia desde 2004.

A alta do dólar também teve seu papel na zeragem do risco prefixado, na visão de Rocha. “O câmbio, que chegou a bater R$ 2,10 no dia 23, gerou muito desconforto por conta do risco de trazer inflação”, diz. Além disso, para o investidor estrangeiro que detém mais de 12% da dívida mobiliária do país, a alta da moeda americana implica uma desvalorização da carteira em dólar.

Mas boa parte da zeragem, acredita Rocha, veio de investidores locais, como os fundos. “Pelas variações das cotas na semana passada, eles sofreram bastante com a abertura das taxas no mercado futuro.”

Levantamento do economista Marcelo d”Agosto, do blog “O Consultor Financeiro”, do Valor, com dados da Economática, confirma que as carteiras de renda fixa encerraram a semana passada com perdas. Os mais prejudicados foram os fundos de renda fixa índices, que carregam NTN-Bs, com prejuízos de até 4% na semana.

A exposição do investidor ao risco prefixado vem ganhando corpo desde o início do ano, com base nas indicações de que esse é um objetivo do governo. A mudança na caderneta de poupança abriu a porta para apostas mais agressivas, que tratavam uma Selic de 8% como “teto”. Depois, veio a frustração com os indicadores econômicos, traçando um quadro de atividade mais frágil do que se imaginava. Esse ambiente, aliado à piora do clima no exterior, fez os juros futuros derreterem, e a curva a termo passou a contemplar uma Selic em 7,5% ainda neste ano.

Esses fatores reforçaram a demanda por risco prefixado em todas as esferas. As vendas de LTNs e NTN-Fs nos leilões semanais vinham mostrando crescimento desde o início do ano, permitindo ao Tesouro, inclusive, alongar o prazo de sua dívida.

Neste ano, 70% das vendas de títulos públicos foram de prefixados. Em igual período de 2011, essa fatia era de 57% das ofertas. Paralelamente, a venda de NTN-Bs também cresceu, de 21% para 23% dos lotes ofertados. Isso ocorreu porque as apostas em corte da Selic não foram acompanhadas por alívio nas projeções de inflação.

 


Dilma quer ‘choque’ nos investimentos

O Estado de S. Paulo

A presidente Dilma Rousseff encomendou um “choque” nos investimentos, preocupada com o resultado ruim da economia no início do ano e com os sinais de piora na crise europeia. A equipe econômica detectou sinais de enfraquecimento dos investimentos privados e a ideia é o governo liderar o processo de expansão.

O governo busca dados positivos para se contrapor ao resultado do Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre, que será divulgado na sexta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

É nesse contexto que o governo rompeu um tabu e começou a discutir a possibilidade de fechar o ano com um resultado primário (diferença entre receitas e despesas exceto gastos com juros) menor. Até o mês passado, a ordem era perseguir a meta de 3,1% do PIB sem recorrer ao desconto de 0,5% do PIB em gastos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) permitido em lei. Ainda não houve mudança nessa diretriz, mas ela já não é mais algo incontestável.

Pelo contrário, ganha força a ideia de que reduzir o primário ajudará a fortalecer os investimentos. A mudança teria ainda outra função: a de abrir espaço para acomodar frustração de receitas. Há indicações de que a queda na atividade econômica afetará a arrecadação com maior intensidade do que a admitida até agora, que é de queda de R$ 10 bilhões ante o previsto.

A principal justificativa para o governo manter a determinação de alcançar a meta fiscal sem descontos, também chamada de “meta cheia”, era a repercussão no mercado financeiro. Ou seja, como os bancos e corretoras avaliariam um governo menos austero, pois o resultado primário serve para pagar a dívida pública.

Ontem, o Estado mostrou que alguns analistas veem de forma positiva uma redução de 0,5% da meta fiscal, se for para aumentar investimentos.

Dúvidas. A opção de investir mais tornou-se importante também porque especialistas duvidam que o pacote anunciado na semana passada, centrado no aumento do consumo, consiga ativar a economia a ponto de a taxa de crescimento do PIB ficar acima dos 3% este ano. O próprio ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse na ocasião que o governo estaria estimulando o consumo como forma de animar o setor privado a investir.

O “choque” encomendado por Dilma tem por objetivo dar mais velocidade ao PAC, que vem patinando desde o ano passado e agora enfrenta problemas porque tinha na construtora Delta, alvo da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) do Cachoeira, sua principal executora.

Os dados sobre investimentos divulgados mensalmente pelo Tesouro Nacional e os balanços do PAC mostram um quadro positivo, mas isso só ocorre por causa do programa habitacional Minha Casa Minha Vida – que, até o ano passado, nem contava como investimento e sim como custeio. Os demais investimentos estão em queda desde 2010.

Sem contar o programa habitacional, os investimentos deste ano estão na casa do 0,9% do PIB, ante 1,2% de 2010. Em 2011, eles ficaram em 1% do PIB.

Dados internos do governo já mostravam, no final de 2011, que a orientação de perseguir a “meta cheia” tinha de ser revista para não prejudicar o crescimento econômico. Para alcançar o resultado, o governo segurou os empenhos (que são a primeira etapa do gasto público) e postergou pagamentos. Isso ajudou a alcançar a meta, mas agravou a lentidão com que a máquina pública realiza investimentos.

Do ponto de vista técnico, o governo não conseguirá investir 0,5% do PIB a mais este ano, mesmo que decida reduzir a meta fiscal. Até as engrenagens ganharem velocidade, dezembro já terá passado. Mas poderá haver um aumento de 0,3% do PIB e o restante acomodaria as receitas menores do que o estimado. Uma alternativa para atenuar a lentidão dos investimentos públicos é liberar os chamados “restos a pagar”. São despesas iniciadas em anos anteriores cuja execução passou para 2012.

 


“Nova” classe média ganha até R$ 1.019 per capita

Valor Econômico

A Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) divulgou ontem estudo que estabelece novos critérios para a identificação da classe média brasileira e a define como o grupo composto por famílias com renda per capita entre R$ 291 e R$ 1.019, segundo dados da composição da renda em 2009. Atualmente, esse universo representa 54% da população do país.

Em parceria com um corpo de especialistas nas áreas de economia, sociologia e pesquisas de opinião, foram adotados diversos critérios para definir as faixas de renda da classe média, que foi dividida em três subgrupos, como a alocação e a composição da renda. Segundo a SAE, o principal critério observado foi o da vulnerabilidade, ou seja, a chance que a população tem de sofrer decréscimo na renda, e assim retornar à condição de pobreza.

A nova classificação vai servir para o governo tomar medidas que sustentem a emergência da classe média na sociedade brasileira. Em 2001, o percentual da população que se encaixava nesse perfil era de 38%. Já em 2009, a classe alta representava 18%, enquanto a baixa correspondia a 34%. “A expectativa é que a gente entenda melhor e mapeie essa nova classe, que ascendeu nos últimos dez anos e se transformou na maioria da população brasileira”, afirmou Moreira Franco, ministro da secretaria.

A nova classe média foi dividida entre a “baixa classe média”, com renda per capita entre R$ 291 a R$ 441, “classe média”, com ganho entre R$ 441 a R$ 641, e “classe média alta”, com rendimento entre R$ R$ 641 a R$ 1.019.

Os trabalhos para realizar a nova medição começaram em dezembro último, com o último encontro sendo realizado ontem para definir as diretrizes finais. A intenção do governo é fazer com que a nova classe média permaneça como maioria na população brasileira e tenha mais estabilidade, segundo o secretário de Ações Estratégicas da secretaria, Ricardo Paes de Barros.

“A inserção na nova classe média se deu pela expansão do emprego formal. Agora queremos garantir um segundo empurrão nesse mercado de trabalho: a geração de empregos mais estáveis”, afirmou para depois explicar que o foco é o aumento da produtividade do grupo. “Hoje há muita rotatividade nas empresas, o que é ruim tanto para o empregador como para o empregado. O primeiro não investe no funcionário e o segundo dá um retorno menor, pois fica pouco tempo.” Para tanto, o governo estuda políticas específicas, como a criação de incentivos a funcionários e empresas que mantenham vínculos mais longos.

Além da três subdivisões de classe média, mais cinco foram feitas para enquadrar as diferenças de renda no país. A faixa “extremamente pobre”, com renda de até R$ 81, a “pobre mas não extremamente pobre”, com renda entre R$ 162 e R$ 291, a “vulnerável”, com renda entre R$ 291 e R$ 441, a “baixa classe alta”, com renda entre R$ 1.019 e R$ 2.480 e a “alta classe alta”, com renda acima de R$ 2.480. Os valores que compreendem essas denominações foram corrigidos de 2009 até abril deste ano.

A previsão de Paes de Barros é que estudos com a nova metodologia sejam anunciados nos próximos meses.

 


Santander rejeita vender a operação brasileira

Valor Econômico

Marcial Portela Alvarez: “Não existe qualquer negociação para venda do banco e a matriz não quer vender”

O presidente do Santander Brasil, o espanhol Marcial Portela Alvarez, é taxativo ao dizer que o banco não está à venda. “Não existe qualquer negociação para venda do banco e a matriz não quer vender”, afirmou ao Valor, em referência a especulações recentes sobre negociações para venda do controle ou parte do banco no país. O Santander é o terceiro maior banco privado do país.

Em conversa na sede do banco, em São Paulo, o executivo descartou também uma venda de participação minoritária relevante. Portela chegou ontem de Madri, onde esteve reunido com Emilio Botín, o presidente do conselho do grupo, e Alfredo Sáenz, o executivo-chefe.

“O grupo não precisa de capital”, argumentou o executivo. Além de ter atingido antecipadamente o novo patamar de índice de capital de melhor qualidade exigido pela Autoridade Bancária Europeia (EBA, na sigla em inglês), de 9%, o grupo deve ultrapassar o índice de 10% com a planejada abertura de capital do Santander no México, argumentou.

Da mesma forma, Portela disse que já está equacionada a necessidade de fazer provisões adicionais para a carteira de crédito imobiliário de € 5 bilhões, uma exigência do Banco de Espanha. “Não é pouco, mas já está resolvido.” Parte dos recursos já está reservada e outra será coberta com o resultado gerados neste ano, segundo explicou.

Agora, o banco aguarda a condução da auditoria que o governo espanhol fará em todos as instituições do país para diagnosticar a necessidade de novas provisões para as carteiras imobiliárias. Portela disse acreditar que não haverá problema para atender a eventuais novas exigências das autoridades.

Poucas horas depois de chegar a São Paulo, ontem, onde está morando desde o ano passado quando assumiu a presidência da subsidiária brasileira, Portela afirmou que a única intenção da matriz é vender uma pequena fatia de 1% a pouco mais de 2% do banco para atender à exigência da BM&FBovespa de que o banco atinja um “free float” mínimo de 25%, aplicável a companhias listadas no Nível 2 de governança da bolsa.

O grupo Santander tem hoje 75,61% das ações do Santander Brasil e, a rigor, precisaria vender fatia de 0,61% até outubro, quando termina o prazo para se adequar à regra. Segundo ele, no entanto, a fatia a ser vendida deve ultrapassar um pouco o mínimo necessário, para que o banco não volte a ficar desenquadrado em caso de uma recompra de ações.

Pelo tamanho do negócio, que pode atingir US$ 600 milhões se forem considerados fatia de 2% e o atual valor de mercado do banco, Portela explicou que o mais provável é uma colocação privada e não uma oferta pública. “Nosso desejo é fazer isso antes de outubro, se as condições de mercado forem favoráveis”, disse. A instituição já solicitou à BM&FBovespa uma prorrogação do prazo, mas, segundo o executivo, não gostaria de recorrer à possibilidade.

Na mesma linha de argumentação, em Madri, fonte da diretoria do grupo Santander insiste que o objetivo no Brasil “é crescer, não vender” o negócio local. Diz que não tem sentido abrir mão de um negócio que dá certo e é fundamental na diversificação geográfica do grupo.

O Brasil representa 27% do lucro total do Santander, comparado a menos de 10% na Espanha. No total, a América Latina faz 52% do lucro do banco. A diversificação é vista como um “colchão de proteção” para ciclos econômicos diferentes, como a crise agora na Europa, enquanto nos emergentes a situação é bem mais confortável. A direção espanhola insiste que não precisa vender ativos e, se precisasse, não venderia no Brasil, onde tem 10% do mercado e as condições para fazer o banco de varejo que deseja.

A direção também chama a atenção para uma diferenciação dentro do sistema bancário espanhol. Várias caixas estão afetadas duramente pelos ativos imobiliários tóxicos. Já o Santander nota que no ano passado gerou € 24 bilhões de lucros antes de provisões e impostos, resultando em € 6,4 bilhões de lucro líquido.

Em resposta a questionamento da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), ontem no fim da tarde Bradesco e Santander divulgaram comunicados ao mercado em que negam o teor de reportagem publicada no domingo pelo jornal “O Globo”, sobre supostas negociações para venda do Santander ao Bradesco.