BIS aponta risco em excessiva dependência das exportações

O Banco Internacional de Compensações (BIS) aponta uma relativa degradação de crescimento dos mercados de exportação do Brasil e de outros países para os próximos anos, se as previsões de expansão medíocre se confirmarem.

O banco dos bancos centrais estima que dois terços das exportações brasileiras estão direcionadas para mercados nos quais o PIB poderá cair entre um e dois pontos percentuais entre 2011 e 2015. O outro terço das vendas estariam destinadas a países com queda de 3% do PIB, comparado com o período 2003-2007.

O BIS fez essas estimativas para alertar os países sobre a excessiva dependência de exportações em relação a mercados cujo crescimento deverá se desacelerar nos próximos anos. A conclusão é que apenas o México e o Canadá, entre 28 economias emergentes e desenvolvidas, podem contar com o crescimento mais rápido de seus parceiros comerciais nos próximos quatro anos.

Todas as outras economias deverão sofrer degradação, às vezes sensível, no crescimento de seus mercados de exportação nos próximos anos, se as previsões de expansão econômica fraca se confirmarem.

Países como o Brasil, Estados Unidos e Japão estão no grupo dos menos sensíveis à evolução externa, porque são grandes economias, nas quais as exportações representam uma pequena parte do PIB. Em particular, Canadá, México e EUA poderão escapar em grande parte dos efeitos nefastos de um crescimento medíocre em seus parceiros, porque têm importantes trocas comerciais entre eles e esperam uma expansão vigorosa.

A China e a Alemanha estão entre os mais vulneráveis entre os principais exportadores, diante das consequências negativas da queda de demanda de vários parceiros. O ritmo de crescimento das exportações chinesas tende a diminuir, mas as importações devem aumentar diante do foco na demanda doméstica, segundo as autoridades de Pequim.


País eleva vendas para vizinhos que estão fora do Mercosul

Valor Econômico

A queda das exportações à Argentina, em função das medidas protecionistas adotadas pelo governo de Cristina Kirchner, fez com que o Mercosul diminuísse as compras de produtos brasileiros entre janeiro e maio. Por outro lado, o Brasil aumentou as vendas a parceiros não tão tradicionais, como Colômbia e Venezuela, fazendo com que os países fora do bloco ganhassem importância na pauta de exportações brasileiras para a América do Sul.

De janeiro a maio, as exportações para Argentina, Paraguai e Uruguai encolheram 10,3% em relação ao mesmo período do ano passado, segundo estatísticas do Ministério do Desenvolvimento (Mdic). Dos US$ 9,4 bilhões gerados com as vendas ao bloco, US$ 7,5 bilhões vieram da Argentina, maior parceiro sul-americana – a Venezuela aparece em segundo lugar, com US$ 1,9 bilhão.

Nos cinco primeiros meses de 2011, os argentinos compraram US$ 8,4 bilhões do Brasil. Essa queda em relação ao ano anterior praticamente corresponde à perda de US$ 1 bilhão nas vendas para todo o bloco, porque o Paraguai manteve US$ 1 bilhão em compras, e o Uruguai recuou de US$ 932 milhões para US$ 838 milhões.

O restante do continente apresentou tendência inversa, com as exportações crescendo 9% e alcançando um total de US$ 6,9 bilhões. A diferença pode ser explicada como uma forma de os exportadores buscarem mercados alternativos, na visão de José Augusto de Castro, vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).

“As empresas estão procurando novos compradores, pois todos os cenários são péssimos, já que a economia argentina está em desaceleração e não há perspectivas de incremento nas trocas com Paraguai e Uruguai”, explica Castro. “Sabendo disso, elas não vão esperar piorar o comércio para se mexer, sendo que há espaço em outros mercados, que também são próximos e contam com relativa facilidade de acesso.”

O principal salto neste início de ano foi dado pelos venezuelanos, que compraram US$ 557 milhões a mais, impulsionados pela maior demanda por carne e máquinas e aparelhos mecânicos brasileiros. Os colombianos, por sua vez, importaram US$ 1,1 bilhão, soma 11,5% maior em relação a 2011. As importações brasileiras de toda a América do Sul mantiveram-se estáveis ao redor de US$ 12 bilhões.

Para Fabio Silveira, sócio-diretor da RC Consultores, o desaquecimento das economias mais desenvolvidas impede um crescimento mais expressivo do comércio entre o Brasil e seus vizinhos. Segundo ele, o continente depende da flutuação do preço das commodities e da demanda de outros parceiros para gerar receitas, que por sua vez possibilitam mais importação.

“Há uma evolução positiva nos mercados fora do Mercosul, mas em valores não é muito significativa. O resultado de agora acontece mais pelo enfraquecimento do mercado doméstico argentino, que está gerando esse protecionismo. A adoção de barreiras faz parte da cultura deles. Sempre quando o cenário muda, eles dificultam”, diz Silveira.

O momento econômico da América do Sul favorece as vendas brasileiras. “O continente está com média de crescimento maior do que outras regiões. Por ser um polo, o Brasil se beneficia desse aumento de demanda. A única exceção é a Argentina”, afirma Rafael Bistafa, economista da Rosenberg & Associados.

A projeção de elevação do Produto Interno Bruto (PIB) da Colômbia e da Venezuela para este ano é maior que o da Argentina. Dados da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) apontam crescimento de 4,5% para os colombianos e 5% para os venezuelanos, enquanto os argentinos estão com estimativa de 3,5%.

A maior demanda desses países é movida principalmente por dois setores, na visão de Sandra Manuelito, economista da divisão de desenvolvimento econômico da Cepal: petróleo e construção civil. “Além de ser ano eleitoral na Venezuela, a commodity ainda está sendo vendida a um patamar alto. A Colômbia está exportando volume maior do produto e tem expansão puxada pela habitação”, diz a economista.

O ritmo mais intenso aumenta a capacidade de consumo desses mercados internos. “Há um redirecionamento também por causa do cenário externo. Mas ainda enfrentamos sérios problemas de infraestrutura e integração física. Isso tira competitividade dos produtos em relação aos asiáticos, o que dificulta uma expansão maior ou mais sustentada”, afirma Sandra.

O primeiro trimestre do ano mostrou a diferença na estimativa da Cepal. Na comparação com o mesmo período de 2011, o PIB venezuelano cresceu 5,6%, enquanto o argentino teve expansão de 4,8%. A Colômbia ainda não divulgou os dados dos primeiros meses de 2012.

O “fator Argentina”, como define Castro, deve fazer com que, para o resto do ano, a tendência seja de encolhimento do Mercosul e aumento ou estabilização do patamar de crescimento dos outros países. Desde 1º de fevereiro, encabeçada pelo secretário de Comércio Interior, Guilhermo Moreno, A Argentina reforçou políticas de controle às importações. A equipe econômica de Cristina Kirchner deseja manter o superávit de cerca US$ 10 bilhões alcançado na balança comercial do ano passado. Não fosse o Brasil, o resultado poderia ser melhor. Em 2011, a relação foi superavitária para os brasileiros em US$ 5,8 bilhões.

Aproveitando o alto preço da soja no mercado internacional, os argentinos venderam boa parte da safra nos primeiros meses de 2012, segundo Castro. De agora em diante, as exportações argentinas devem ter desempenho pior, afetando o nível de importação. “De janeiro a maio, as vendas brasileiras para eles caíram 11%. Como eles estão fazendo o possível para zerar o déficit com o Brasil, a queda deve se acentuar e fechar o ano em torno de 20%.”


Queda de commodities afetará Brasil

Valor Econômico

Os preços das commodities no mercado internacional cairão consideravelmente, afetando toda a América Latina, inclusive o Brasil. Esse será o principal impacto da desaceleração da economia chinesa na região avalia o economista-chefe do South Centre (órgão internacional de países em desenvolvimento com sede em Genebra, na Suíça), o turco Yilmaz Akyüz. Ele, que veio ao Brasil para a Rio+20, lembrou que, num momento em que os países da zona do euro estão em crise e os Estados Unidos, com baixo crescimento torna o cenário mais grave.

Ele falou com exclusividade ao Valor e disse que a redução no preço dos produtos básicos mostrará que o Brasil viveu, durante os últimos anos, duas bolhas: uma relacionada à própria valorização das commodities, que garantiu o saldo positivo na balança comercial, e outra que sobrevalorizou o real, com a forte entrada de dólares no país. Na visão do economista, o Brasil se caracterizou como um grande produtor de commodities, bens que atraíram recursos estrangeiros ao país, inflando o real. Com o fim do ciclo de alta das commodities, ele diz que o fluxo de capitais para o país poderá ficar comprometido.

“O Brasil precisa ter cuidado com o balanço de pagamentos. O problema é que o fluxo de capitais e as commodities estão além do poder do governo. Ou seja, o Brasil não pode adotar medidas para os preços das commodities subirem e não pode, facilmente, adotar medidas para atrair capitais para o país”, diz ele, acrescentando que o processo de queda das commodities foi iniciado há dois meses. “Com isso, há um deslocamento rápido de recursos dos países emergentes e suas moedas se desvalorizam”.”

Na avaliação do economista, o governo deveria praticar ações domésticas. Entre elas, destaca, deveria preparar-se para fazer controle de capitais e ser mais “seletivo na importação”.

“Meu conselho é: não usem as reservas cambiais, a não ser para investimentos, produção e importação de bens essenciais”, afirma ele, para quem o real ficou valorizado por muito tempo, situação que impôs ao país a desindustrialização. Na época em que o real se valorizou, Akyüz diz que o governo deveria ter elevado o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) de maneira menos “tímida”. “Aumentar 3%, 4% é ineficiente. Quando se aumenta imposto cambial, tem de se aumentar 10%, 12% para ajudar a indústria”, diz.

Akyüz conta que, em 2008, quando a crise financeira estourou, a China manteve o patamar de preços das commodities e funcionou como “a fábrica do mundo”. Ele diz que, agora, isso acabou, porque as exportações chinesas estão perdendo mercado na Europa e nos Estados Unidos. Em razão disso, avalia, a China deverá mudar seu padrão de crescimento. Além de investimentos em infraestrutura, algo que o país já faz, seu governo terá de aumentar os esforços para promover a elevação do consumo da população.

“A China não voltará a crescer 9,5%. Acho que o país crescerá algo em torno de 7,8% em 2012 e sustentará esse patamar nos próximos anos”, diz. “É um crescimento bastante decente. Muitos países adorariam ter uma taxa de crescimento dessa, inclusive, o Brasil.”


‘União bancária na Europa poderia restabelecer confiança na moeda única’

Valor Econômico

O Banco Internacional de Compensações (BIS) avalia que para superar a crise, a Europa precisa recapitalizar os bancos, fazer a união bancária e o reequilíbrio fiscal.

Embora a tarefa seja considerada por analistas quase impossível no momento, diante da falta de vontade política, o BIS diz que isso “frearia a interação nefasta entre o setor bancário e o risco soberano e suprimiria outras interdependências responsáveis pela gravidade dessa crise”.

“Os bancos da Europa precisam se tornar bancos europeus”, diz o BIS, estimando que união bancária “restauraria a confiança na moeda única”.

Em relatório para sua assembleia anual, que reuniu até ontem bancos centrais de boa parte do mundo, o BIS avalia que economias desenvolvidas e emergentes se encontram espremidas “em círculos viciosos, geradores de distorções”.

Aponta três grupos que devem fazer ajustes: o setor financeiro deve reconhecer suas perdas e se recapitalizar; os governos devem enquadrar as finanças públicas “em trajetórias sustentáveis”; e as famílias e empresas devem reduzir seu endividamento. O problema é que sem uma desalavancagem sincronizada, o que um grupo faz agrava o problemas dos outros dois.

No cenário de crise, e sem os governos fazerem o dever de casa, o BIS adverte que os bancos centrais estão excessivamente expostos a riscos, com programas de aquisição de títulos para sustentar a liquidez bancária. Os BCs são praticamente obrigados a prolongar os estímulos monetários face à demora dos governos, o que retarda o ajuste. Os balanços dos bancos centrais chegam a US$ 18 trilhões, equivalente a 30% do PIB mundial, duas vezes mais que há dez anos.

Para o BIS, taxas de juros nominais próximas de zero conjugadas a um apoio de liquidez maciço e quase incondicional “não incitam muito o setor privado a limpar seus balanços nem as autoridades fiscais a limitar seus financiamentos”.


Alta dos imóveis é foco de preocupação, na avaliação do BIS

O Estado de S. Paulo

A expansão do crédito no Brasil tem levado a um boom imobiliário que, segundo o BIS, ameaça repetir o cenário de colapso registrado nos últimos anos nos EUA, Irlanda ou Espanha.

A entidade constata que os preços de imóveis no Brasil quase dobraram desde a crise do subprime. Casos como o do Rio de Janeiro, com mais de 100% de aumento, e de São Paulo com incremento de 80% são destacados pelo BIS, além da situação em Pequim e Xangai. Para a entidade, esses valores bateram recordes históricos.

Um dos impactos seria a expansão desproporcional do setor da construção. “O aumento de preços das propriedades leva ao aumento rápido da construção. Esses desequilíbrios precisam ser resolvidos se essas economias querem ter um crescimento sustentável”, alertou.

O BIS lembra que, na Europa, o colapso do setor imobiliário escancarou fraquezas estruturais de países. O banco lembra que, na Irlanda, o colapso do setor imobiliário elevou o desemprego de 8,6% em 1997 para 13% em 2007. Na Espanha, passou de 10% para 24%.

Dívida. Outra preocupação decorrente desse cenário de expansão turbinada por crédito é o tamanho dívida doméstica de emergentes. “A porção do PIB que famílias e empresas no Brasil, China e Índia estão alocando para o serviço da dívida está em seu nível mais alto desde o fim dos anos 90”, apontou.

“Medidas do custo do serviço da dívida sugerem que níveis altos de dívidas podem ser um problema”, indicou o banco. “Nesses mercados emergentes, desequilíbrios parecem estar se construindo”, diz. “Em vários casos, preços de imóveis e de outros ativos aumentaram, enquanto o endividamento privado e custos do serviço da dívida aumentaram bem acima da tendência.”

A dívida pública dos emergentes é outra fonte de preocupação. “Na superfície, a situação fiscal das economias emergentes parece bem melhor que as economias avançadas”, indicou.

“Mas a posição fiscal dos emergentes pode não ser uniformemente saudável como aparenta”, alertou o BIS. Um dos motivos é a pressão cada vez maior para aumentar gastos com aposentadorias e saúde.

Mais uma vez, a expansão de créditos está camuflando problemas. Segundo o BIS, as contas de vários países emergentes estão sendo falsamente fortalecidas por booms potencialmente insustentáveis de crédito e ativos.

O BIS não poderia ser mais claro: se a economia dos emergentes perder ainda mais fôlego, esses problemas se transformarão em crise. “Se os recentes sinais de desaceleração da economia persistiram, o horizonte fiscal para as economias emergentes poderia rapidamente escurecer.”

Bancos. O BIS ressaltou também que o boom de créditos e de ativos pode estar inflacionando o real valor dos bancos de países emergentes, considerados até agora como imunes à crise.

“Apesar do bom desempenho de bancos nos mercados emergentes, existem dúvidas sobre a base dessa força”, alertou o BIS. Assim como ocorreu na Espanha, o temor é de que os bancos tenham um crescimento forte graças aos preços de ativos e de créditos que sofreram um boom.


Grandes bancos voltam a apostar na alavancagem

Valor Econômico

Depois de ter cortado US$ 5 trilhões em créditos internacionais desde o começo da crise, os bancos estão voltando a ter o perfil de alto risco que tinham antes da pior crise econômica dos últimos tempos, alerta o Banco Internacional de Compensações (BIS).

Em seu relatório anual, alerta que os grandes bancos seguem interessados em aumentar sua alavancagem sem se preocupar suficientemente com as consequências de um colapso. Pelo seu peso sistêmico, as instituições aparentemente continuam a confiar no socorro vindo do dinheiro público.

Outro sinal preocupante, segundo o BIS, é que a atividade de tesouraria, após uma breve pausa, está voltando a ser uma das principais fontes de renda para os grandes bancos.

Numerosas instituições financeiras continuam fortemente alavancadas. Mesmo as que são, à primeira vista, suficientemente capitalizadas mostram exposição “desproporcional” em derivativos, que já resultaram em perdas colossais.

O BIS estima que algumas iniciativas vão alinhar os interesses do mercado ao interesse geral. O banco cita a reforma nos sistemas de remuneração dos bancos, além da obrigação para que investidores (acionistas) paguem a fatura quando o patrimônio líquido de um intermediário financeiro se tornar negativo.

“As autoridades devem levar os bancos a adotarem modelos operacionais menos arriscados, mais viáveis e mais em conformidade com o interesse geral”, diz o BIS.

O BIS adverte que a exigência de ajustes às novas condições, como recapitalização ou regulações adicionais, está longe de ter chegado ao fim. O BIS considera que, no momento, a prioridade é assegurar que bancos cheios de ativos depreciados limpem seus balanços, contabilizem as perdas e se recapitalizem.

Além disso, em breve os bancos vão ser obrigados a melhorar sua liquidez. Um estudo de impacto do Comitê de Basileia mostrou que metade de 205 estabelecimentos examinados deve rever suas estratégias. Esses bancos apresentaram insuficiência de €1,760 trilhão em termos de ativos líquidos (3% do total dos ativos examinados) e de € 2,780 trilhões em termos de recursos estáveis.

Pressionados a reforçar os fundos próprios, bancos reduziram em US$ 5 trilhões seus créditos internacionais desde o começo da crise em 2008. A contração foi particularmente severa por parte de bancos europeus. Instituições alemãs, belgas, francesas, italianas e holandeses reduziram suas posições no exterior em mais de US$ 6 trilhões, ou 43% do total. Desse montante, a redução de US$ 1,3 trilhão ocorreu no segundo semestre de 2011, quando a crise da dívida soberana na Europa se intensificou.

No entanto, foram parcialmente substituídos por grupos australianos, espanhóis, japoneses e suecos, que aumentaram sua exposição externa em mais de US$ 850 bilhões.

Bancos de emergentes também aproveitaram o recuo de europeus em crise. Embora sua parte no bolo do crédito mundial seja de apenas 1,4%, essa fatia vem aumentando. Entre 2009-2011, bancos de emergentes concederam empréstimos a consórcios internacionais estimados em US$ 1,1 trilhão, 10% do total de novas operações, em comparação a parcela de menos de 25% dos bancos da zona do euro.


Real figura entre “piores” moedas

Valor Econômico

Graças ao salto de 21% no preço do dólar em relação ao real desde a cotação mínima registrada em fevereiro até o pregão de sexta-feira, no acumulado de 2012 a moeda brasileira figura como destaque mundial de baixa em diversas linhas de comparação. É a pior moeda entre os países dos Brics, entre os principais vizinhos da América Latina e outros emergentes comparáveis, como Austrália, México, Polônia e Hungria.

No ano, o real cai 9,66%, segundo dados da “Bloomberg”, enquanto o iene, segundo pior em uma cesta com 16 moedas, recua 4,38%. Em 12 meses, o quadro é ainda menos favorável, o real tem queda de 23%.

Como nada é simples no mercado de câmbio, não há apenas um fator que explica como o real saiu de destaque mundial de alta até o fim de fevereiro para destaque de baixa. Entre eles, certamente é preciso mencionar a forte queda da taxa de juros básica no país.

Para o professor da PUC-RJ, Márcio Garcia, o país estava supervalorizado no mercado internacional. O crescimento forte de 2010, as perspectivas de investimento, bem como o calendário esportivo alçaram o país à condição de “queridinho” do capital internacional.

No entanto, diz Garcia, parece que os investidores se deram conta de que há aspectos negativos a considerar. Apesar de fazer parte dos Brics, o Brasil, assim com o a Rússia, está longe de apresentar a dinâmica de crescimento de Índia e China. Agora em 2012, as revisões para baixo nas previsões de crescimento foram quase que constantes, e a chance de o PIB crescer ainda menos que os 2,7% de 2011 é cada vez mais real.

A deterioração nas perspectivas de crescimento se alia a um ativismo do governo no “front” cambial. Algo que faz diferença, na visão de Garcia. “Quando você trata o estrangeiro mal, e tem países tratando bem, é natural que você seja deixado de lado”, diz.

Segundo o professor, mesmo que o governo retire todos os controles cambiais, pode ser que seja observado um fenômeno de “fadiga”, de quebra de confiança, pois o investidor fica desconfiado com as constantes mudanças nas regras.

Isso ocorre mesmo com as restrições sendo impostas aos ingressos, algo que não é tão agressivo quanto o controle de saídas.

“A maioria dos investidores não gasta muito tempo estudando o Brasil. Se tem dificuldades e muita burocracia, ele pode desistir.”

Se o governo quer crescer a taxas de 4% a 5% ao ano, precisa de poupança externa, pois essas taxas de crescimento não se sustentam com a poupança interna de no máximo 18% do PIB. “Entre não crescer e crescer com a poupança externa, o melhor é crescer”, diz o especialista.

Além do fator crescimento e da recente piora da crise externa, que tira atratividade dos ativos de risco, Garcia aponta as “barbeiragens” do governo como mais um fator a pesar na taxa de câmbio.

Para Garcia, existe uma ignorância do governo com relação ao mercado de derivativos. Ao manter o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) de 1% sobre a ampliação de posição vendida, o governo mantém os agentes privados fora da ponta de venda, ou seja, ele não tem “parceiro” para conter a valorização acentuada do dólar. “Quanto se quer evitar a apreciação, a medida é boa, mas, quando se está na ponta contrária, ela é péssima. E essa é uma possibilidade para a qual o governo não estava preparado”, diz.

Para Garcia, a equipe econômica parece desconhecer a importância do mercado de derivativos no Brasil. É lá que o preço é formado, particularidade inerente ao mercado brasileiro. Não adianta olhar o fluxo de dólar à vista.

Ainda de acordo com Garcia, o Brasil está migrando para uma política de banda informal no câmbio. O modelo de pisos e tetos para o dólar parece funcionar bem enquanto a inflação não representa um problema. Mas, quando o mundo voltar a crescer e as commodities tomarem fôlego, são outros os problemas que vão aparecer, avalia ele.

“Tem de se começar a pensar nesses cenários para se montar uma estratégia. Mas a estratégia por aqui parece ser a seguinte: peça para frente que xadrez é sorte”, conclui Garcia.

De visão semelhante, o professor da FEA-USP, Carlos Eduardo Gonçalves, acredita que a lua de mel do investidor externo com o Brasil está acabando. Para ele, o grau de intervenção do governo Dilma Rousseff na economia é bem maior do que nos mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva. Há a sensação de ingerência em grandes empresas como Petrobras e Vale e a “pirotecnia” foi longe demais no mercado de câmbio.

No curto prazo, diz Gonçalves, o câmbio é a variável mais difícil de se explicar com qualquer tipo de modelo. Feita essa ponderação, o professor aponta que, considerando o diferencial de juros do mercado local e externo, a volatilidade do mercado e o comportamento das commodities, a taxa de câmbio está acima do que seria considerado justo. A taxa de câmbio seria mais para R$ 1,95 do que para os atuais R$ 2,05. “Pode ser erro estatístico, mas minha interpretação é que essa diferença reflete a mão do governo no mercado cambial.”

Para o professor, mesmo com uma forte melhora de quadro externo, o dólar não deve voltar à linha de R$ 1,90 no curto prazo.


Brasiguaios pedem que Dilma apoie novo líder

Valor Econômico

Os “brasiguaios” – agricultores brasileiros que vivem no Paraguai – comemoraram a deposição de Fernando Lugo, apoiam o novo governo, mas estão preocupados com a reação de Brasília, principalmente no caso de se confirmar a já cogitada suspensão do país vizinho do Mercosul.

Ontem, cerca de 200 agricultores estiveram no consulado do Brasil em Ciudad del Este e entregaram um documento ao cônsul-geral, embaixador Flavio Bonzanini, manifestando apoio ao presidente Federico Franco.

“Solicitamos que o governo do Brasil reconheça o novo governo paraguaio e restabeleça a fraterna relação que sempre existiu entre Brasil e Paraguai. Essa decisão é sumamente necessária para dar tranquilidade ao povo paraguaio e a esta grande comunidade brasileira”, diz o documento, que Bonzanini se comprometeu a encaminhar hoje ao Itamaraty.

Marilene Sguarizi, que representa a comunidade brasileira no Paraguai, disse ao Valor que “é unânime o apoio dos imigrantes brasileiros ao novo governo”. E que interlocutores de Bonzanini já entraram em contato para manifestar o desejo de Franco de se reunir com lideranças brasiguaias, o que deve ocorrer nesta semana.

Lugo era tido pelos brasiguaios como alguém que levou instabilidade ao campo, incentivando ou fazendo vistas grossas à invasões e aumentando a instabilidade jurídica. Nos últimos meses, a tensão com grupos camponeses locais – conhecidos como “carpeiros” – se acirrou, com uma onda de invasões às terras de brasiguaios.

Produtores ouvidos pelo Valor dizem que a primeira reação da comunidade foi de “alívio” e “felicidade”, com a notícia da queda do ex-presidente, e de “esperança” com relação ao novo governo. “O povo [brasiguaios] está um pouco aliviado. A tensão no campo era grande. Não se sabia o que iria acontecer”, afirmou Jair Graeff, que planta 1.500 hectares de soja em Mbaracayu, a 65 km da fronteira com o Brasil.

Graeff, que está no Paraguai desde 1987, é um dos muitos brasileiros – responsáveis por 70% da produção de soja do país – que tiveram o título de suas propriedades contestado nos últimos anos. Segundo ele, somente em Mbaracayu, 30 famílias passam pelo mesmo problema. A disputa, contra a empresa Benita S.A. – que se diz a verdadeira dona das terras – está na Suprema Corte paraguaia.

“Acho que uma suspensão do Paraguai do Mercosul seria um gol contra do Brasil. Há mais de 300 mil brasileiros produzindo no Paraguai, e eles seriam os maiores prejudicados”, disse ele. “Grande parte da nossa produção é escoada pelo Brasil e pela Argentina. Os insumos, como fertilizantes e outras matérias-primas, também vêm de lá”, disse Graeff, que espera um diálogo entre os dois governos.

“Espero que a presidente Dilma Rousseff possa interagir com o governo paraguaio. Os dois têm que se sentar à mesa e ver qual é a melhor saída”, disse Graeff. “Acredito que o novo governo consiga demonstrar para os países vizinhos que o que aconteceu foi para o bem do Paraguai.”

Para Abel Simões Filho, filho de um brasiguaio e que trabalha como engenheiro agrônomo no Paraguai, a queda de Fernando Lugo foi uma boa notícia para o setor. “Se você perguntar, 99,9% dos brasiguaios eram contra o Lugo. Sempre houve disputa pelas terras, mas os governos anteriores sempre apoiava os imigrantes”, disse.

Para ele, a deposição do presidente trouxe aos produtores “uma sensação de felicidade, mas também de insegurança, pois ninguém sabe o que vai acontecer”.

“Estamos na expectativa de ver como o governo brasileiro vai se posicionar. E sobre como esse novo governo vai agir com relação aos brasiguaios”, afirmou.