Manifesto da Unidade Classista no ANDES: unidade e luta!

Por que cantamos?

se estamos longe como um horizonte
se lá ficaram as árvores e céu
se cada noite é sempre alguma ausência
e cada despertar um desencontro
você perguntará por que cantamos
cantamos porque chove sobre o sulco
e somos militantes desta vida
e porque não podemos nem queremos
deixar que a canção se torne cinzas.

Trechos do poema de Mario Benedetti

Num cenário de crescentes tensionamentos no campo internacional e na política interna, há um evidente avanço de forças neofascistas, potencializado pelo recente triunfo
eleitoral de Trump e de outras forças políticas semelhantes em vários países da Europa e também da América Latina e do Caribe. Além do genocídio que está se acentuando desde 2023 contra o povo da Palestina por parte do governo sionista de Israel, temos novos capítulos da ofensiva imperialista contra Cuba e a Revolução Cubana.

No Brasil, o bolsonarismo mostra grande vitalidade impondo uma agenda cada vez mais conservadora e neoliberal à sociedade. As ações do governo Lula-Alckmin estão assumindo um caráter de submissão às exigências dos agentes financeiros locais e internacionais, com a autoimposição da pauta do “controle do déficit fiscal” e de controle da inflação via aumento descontrolado da taxa de juros.

O cenário atual indica um processo de decomposição do bloco de forças políticas do campo democrático-popular. Esse processo não afeta tão somente o PT, mas também outras forças que gravitam parcialmente nesse campo político, como acontece com alguns setores do PSOL, evidenciado pela última eleição para a prefeitura de São Paulo e pelo rebaixamento do horizonte programático desse campo. Há, neste sentido, deslocamentos políticos, para um lado e outro, que estão acontecendo, e que também se expressam na vida política do nosso sindicato.

As greves no campo da educação de 2024, nos estados e na esfera federal, deixaram em evidência o difícil cenário.
Fizemos uma greve forte e conseguimos conquistas relevantes, mas com limitações impostas pelo “novo arcabouço fiscal” e o Regime de Recuperação Fiscal nos estados e Distrito Federal, ambos unidos umbilicalmente às contrarreformas impostas pelo neoliberalismo, iniciadas a partir do governo Collor e acentuadas pelos sucessivos governos, incluindo os governos do PT.

As greves da educação mostraram deslocamentos importantes das forças políticas que operam no nosso sindicato,
retirando alguns setores de um estado de apassivamento frente às lutas sociais, e outros deslocamentos em sentido diverso, os quais entendemos que de alguma forma estão também acontecendo em diversas forças políticas e coletivos.

Entendemos, pela interpretação da conjuntura posta, que a luta exige avançarmos na construção de patamares superiores de unidade na categoria e na classe, perspectivando novas construções unitárias classistas que apontem para fortalecer o caminho da reorganização da classe trabalhadora, para que esta venha a se constituir no necessário sujeito político, o bloco de forças do poder popular, para realizar as transformações estruturais e
revolucionárias que a classe trabalhadora exige.

Para que isso venha a se materializar, não bastam as “condições objetivas”. Precisamos construir novos e mais elevados padrões de relações ético-políticas entre as forças políticas e os militantes independentes do nosso
sindicato. São essas considerações da conjuntura e da necessidade de um novo patamar de convivência que nos leva a considerar que precisamos construir novos caminhos de unidade e luta. Por esse motivo, decidimos e comunicamos que o nosso ciclo no interior do Coletivo ALB (Andes de luta e pela base) está encerrado. Foi uma decisão longamente meditada.

Tal decisão não se dá por ressentimento, nem mágoa, pelo contrário: temos um profundo reconhecimento do caminho de dez anos que transitamos juntos e das importantes lutas que construímos nesse percurso. Muitos militantes do coletivo ALB foram, são e continuarão a ser referência ético-política para nós. Mas chegamos à compressão de que é
necessário avançar para instrumentos e processos organizativos que possam produzir novas sínteses entre o necessário enraizamento na base da categoria e uma profunda relação de respeito e esforços de mediação entre
sujeitos políticos coletivos e militantes independentes.

Para este novo momento, precisamos construir uma política classista de reconhecimento mútuo, da parceria entre sujeitos políticos, que passe longe de práticas de hegemonismo e de tentativas de imposição de uma condição de subalternidade política. Nosso sindicato tem a maturidade necessária para rejeitar tentativas de “quebrar” militantes pelo seu pertencimento político, algo reivindicado e reiterado pelas práticas de solidariedade de muitos e muitas valorosas militantes deste sindicado, dos mais diversos coletivos ou fora deles. Entendemos que fazer política com sensibilidade, como temos tentado
praticar, em diálogo aberto com nossos e nossas companheiras de luta sindical, deve ser desejável.

Continuaremos conversando e procurando articulação com os diversos coletivos e forças políticas que legitimamente operam no sindicato, como já temos feito com todos aqueles e aquelas que participam e alimentam os debates com suas diversas práticas e concepções políticas.

Compreendemos que a unidade se constrói a partir de consensos programáticos. Alguns elementos que
queremos ressaltar como parte da nossa política para contribuir para o debate eleitoral do sindicato são:

Solidariedade internacional:
A solidariedade com a revolução cubana é um elemento fundamental na nossa compreensão acerca da política internacional do sindicato. Entendemos que não pode haver ambiguidades. Cuba é um divisor de águas para a esquerda latino-americana e mundial. Defendemos a participação do ANDES-SN na Federação Sindical Mundial (FSM), sem que isso seja excludente da participação em outros espaços classistas e anti-imperialistas de articulação internacional. Hoje a pauta internacional mais presente é sem dúvida o enfrentamento ao sionismo, ao fascismo e a solidariedade com o povo da Palestina. O imperialismo, na sua forma atual, é a chave para compreender as relações internacionais. Neste sentido, também podemos avançar para amplas articulações no campo internacional, com a luta de trabalhadores e trabalhadoras de África e Ásia que possuem experiência histórica anti-imperialista.

Política educacional:
Entendemos que é necessário avançar para além da formulação tradicional do projeto de Universidade Pública “socialmente referenciada”, para o da Universidade Popular, uma concepção ancorada na melhor tradição da história das lutas dos estudantes, trabalhadores da América Latina e do Caribe. Também
temos uma compressão da importância da construção do Encontro Nacional da Educação (ENE), que, para nós, é um caminho concreto (e não só um evento) na perspectiva da construção do Encontro Nacional da Classe Trabalhadora (Enclat) e do Poder Popular. Não temos grandes problemas
com a participação do sindicato em espaços institucionais, mas sem o esforço de construir poder popular, nos
espaços extra-institucionais, o sindicato fica vulnerável à cooptação pelo empresariado e os governos burgueses.

Direitos Humanos:
Temos também uma profunda preocupação pela política de memória, verdade, justiça e reparação, e de direitos humanos. A Comissão da Verdade é um poderoso instrumento de unidade e luta para enfrentar o fascismo de ontem e de hoje, nas suas diversas
formas. Na atualidade, lutamos contra a anistia para os golpistas do 8 de Janeiro de 2023, mas também contra a Lei de anistia para quem praticou o Terrorismo de Estado no período da ditadura empresarial-militar.

Formação política e sindical:
Já temos chamado a atenção sobre a importância da formação política e temos apresentado a proposta de formulação de uma Escola de Formação Política.

Arte e cultura:
O instrumento do Festival de Arte e Cultura precisa ser impulsionado e redimensionado para extrair todo o potencial que pode oferecer. Assim, experiências como o Teatro do Oprimido e semelhantes podem ser resgatadas das experiências da classe trabalhadora para alavancar também a luta sindical.

Opressões:
A pauta da luta contra as opressões, desde uma perspectiva classista, é de singular importância para compreender a classe de uma forma multidimensional e com a riqueza de sua vida concreta. Estamos cientes dos desafios que temos neste campo e nos esforçamos para avançar na superação, reforçando as lutas antirracista, antiLGBTfóbica, antimachista e anticapacitista.

Concepção de sindicato:
Temos uma compreensão de que o sindicato precisa ser classista, autônomo e organizado a partir da democracia de base. Para nós, a autonomia significa independência de classe, ou seja, independência com relação à classe burguesa, e não neutralidade política. De fato, entendemos a necessidade de a classe trabalhadora se constituir em sujeito político e, portanto, vemos a importância dos partidos políticos operários, para superar os limites de uma prática economicista do sindicato, e essa é a razão de ser dos partidos operários, dentre eles o PCB.

Pauta sindical:
Obviamente, a pauta corporativa é fundamental e temos trabalhado muito fortemente na construção do projeto de carreira única, que unifique as carreiras de EBTT e Magistério Superior, e nossa luta salarial e pelas condições de trabalho. Do mesmo modo, a carreira única tem importância para nossa defesa de uma universidade popular nos estados, municípios e no distrito federal. São centrais nossas pautas em defesa dos serviços públicos e dos direitos dos servidores contra a lógica privatista do capital. Salários, carreira, condições de trabalho, combate ao assédio de todo tipo, orçamento público são temas que devem articular as dimensões econômicas com o sentido ético-político mais amplo do nosso projeto de sociedade.

Finalmente, sublinhamos a importância dos espaços políticos das seções sindicais, dos Grupos de Trabalho, dos
seminários, Conads e Congressos. Lutamos para que o sindicato nacional se empenhe na construção de uma posição de independência de classe em relação ao governo e à burguesia, que lute pelas reivindicações imediatas da categoria, que construa o ENE, o Enclat e que tenha protagonismo no processo de reorganização da classe trabalhadora.

Unidade classista, futuro socialista!

Vitória, 31 de Janeiro de 2025