Clima eleva preço global de alimentos em 6%

O preço médio dos alimentos no mundo subiu 6% no mês de julho em relação a junho, depois de três meses de baixa. O sinal amarelo foi aceso ontem pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), cujo relatório aponta como vilões o preço dos cereais e do açúcar.

Enquanto o primeiro sobe por causa da seca nos Estados Unidos, o segundo sofreu o impacto das chuvas irregulares no Brasil. Com o aumento, o índice da FAO se aproxima do recorde de 2008, ano das revoltas provocadas pela fome na África e na Ásia.

O aumento foi verificado na cesta de produtos básicos que serve de parâmetro para os relatórios da organização. Em julho, a alta interrompeu uma sequência de três meses de baixas contínuas, e elevou o índice da FAO a um total de 213 pontos, 12 pontos a mais do que no mês anterior.

Por ora, a alta é considerada resultado de uma série de conjunturas climáticas desfavoráveis, como seca nos Estados Unidos, chuvas irregulares no Brasil e atraso nas monções (fenômeno climático que provoca chuvas intensas) na Índia.

O dado preocupante é que o nível atual se situa próximo ao pico de fevereiro de 2008, quando ocorreram as “revoltas da fome” – as manifestações violentas em países como Burkina Faso, Senegal, Costa do Marfim, Mauritânia, Egito, Haiti, Indonésia, Filipinas e Camarões.

Na época, o índice da FAO havia subido de 139 pontos para 219 pontos no intervalo de um ano, impulsionado por altas nos preços de cereais e de produtos derivados do leite.

“Quando 18 milhões de pessoas já sofrem de fome no Sahel (região do deserto do Saara), essa alta dos preços é muito alarmante”, diz Clara Jamart, da organização não governamental Oxfam. “A situação alimentar é muito tensa e a especulação continua agindo.”

Desta vez, os produtos que mais pesaram na balança foram o açúcar e os cereais. De acordo com as Nações Unidas, o açúcar teve alta de 12% em média em relação ao mês anterior, interrompendo uma baixa que se repetia desde março.

“O vigor da cotação do açúcar se explica pelas chuvas intempestivas no Brasil, primeiro exportador mundial, que atrapalharam a colheita de cana”, dizem os experts da FAO. “As preocupações ligadas ao atraso das monções na Índia e a falta de precipitações na Austrália também contribuíram para a alta da cotação.”

A tendência, no entanto, tende a se inverter nos próximos meses. Ontem, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), órgão do Ministério da Agricultura, apresentou suas projeções para a safra de cana-de-açúcar de 2012 e 2013, com previsão de aumento de 6,5% no Brasil, com uma safra de 593,63 milhões de toneladas, ante 560 milhões na temporada passada.

Cereais. Outro fator importante na inflação no preço dos alimentos foi a perspectiva de quebra parcial da colheita de milho nos Estados Unidos por causa da seca, o que fez o produto subir 23% no mês de julho. O trigo também sofreu forte alta, de 19%, desta vez causada por problemas na safra da Rússia e pelo aumento da demanda para alimentação de rebanhos.

Já o arroz fechou o mês com tendência estável. Com as altas, também o índice dos cereais, que agora chega a 260 pontos, se aproxima do ápice, “somente 14 pontos a menos do que seu recorde absoluto (em termos nominais) de 274 pontos em abril de 2008”.

A boa notícia do balanço da FAO é a redução, ainda que pequena, em torno de 1%, do preço das carnes bovina e ovina e de aves. No caso dos derivados de leite, a queda chega a 16% desde o início do ano.


Petróleo ganha nova agenda no governo

Valor Econômico

O governo está decidido a dar uma injeção de competitividade às empresas brasileiras – como uma das condições para garantir fôlego a um crescimento econômico mais robusto – e pretende passar a limpo as estruturas de formação de preços de importantes insumos da produção industrial no Brasil. Há semanas, cresce a expectativa com as definições que serão tomadas no setor de energia elétrica. Mas o governo está atento também a outra modalidade de energia tão relevante quanto a elétrica para alguns setores – a derivada do petróleo.

Desde a divulgação do balanço da Petrobras no segundo trimestre, há praticamente uma semana, e que surpreendeu pelo primeiro prejuízo trimestral em 13 anos, alimenta-se a expectativa de que é iminente um aumento nos preços dos combustíveis. Na quarta-feira, a assessoria de imprensa do Ministério da Fazenda afirmou que “não há perspectiva de reajuste dos preços dos derivados de petróleo no horizonte”. A possibilidade foi aventada pelo titular do Ministério das Minas e Energia, Edison Lobão.

A ação da Fazenda, cujo ministro, Guido Mantega, também é presidente do conselho de administração da Petrobras, interrompeu a forte alta dos papéis da companhia, mas sequer esbarrou na principal questão: o preço da gasolina para o consumidor brasileiro está defasado?

Setores do governo que neste momento discutem como reduzir o custo Brasil – e aumentar sobretudo a competitividade industrial – ainda não chegaram a um consenso sobre a necessidade de elevar o preço da gasolina. E alguns dados estão sendo novamente colocados em pauta para avaliação.

Entre eles, o fato de o consumidor brasileiro pagar pelo litro do combustível entre 35% e 40% a mais que o americano. Mas esse diferencial é ainda mais representativo quando se leva em conta que a renda per capita do americano supera de três a quatro vezes a local. “O brasileiro é claramente esfolado nesse processo”, descreve uma fonte oficial ao Valor.

A tributação pesa sobre o custo de quase tudo no Brasil e não é diferente no caso dos combustíveis. O consumidor sabe e o governo também. Mas os preços dos combustíveis podem parecer “inflados” ou “defasados” pela interferência de outros fatores. No caso da gasolina, cálculos livres da incidência de PIS, Cofins e ICMS indicam que praticamente um terço do preço cobrado ao consumidor corresponde à margem média das distribuidoras mais o custo do frete. Isso significa dizer que, de cada litro de gasolina vendido a R$ 2,72 nos postos, R$ 0,90 vão direto para as distribuidoras.

Em meio à discussão de especialistas e investidores a respeito de quem perde e quem ganha com a política de preços dos combustíveis, o governo está empreendendo um esforço para mapear o que está efetivamente por trás da estrutura desses preços no Brasil.

Nesse quesito, as distribuidoras estão recebendo uma leitura particular, a exemplo do que vem ocorrendo com outros setores da economia com os quais o governo vem travando batalhas por queda de preços, planos de investimentos e cumprimento de políticas de atendimento à risca de contratos firmados com associados ou clientes. De abril para cá, ficaram na mira do governo Dilma os bancos, as seguradoras, os planos de saúde e as empresas de telefonia móvel.

Em tempo: o setor de distribuição de combustíveis é mais um na economia brasileira que exibe imensa concentração. Uma única empresa controla praticamente 40% das operações.


Comércio de crianças no mercado da bola

Correio Braziliense

“É só fechar o olho, é fácil”, disse Maguila a Paulo, em uma tarde como outra qualquer. Maguila era treinador de futebol, funcionário da prefeitura de Caratinga (MG) e coordenava uma escolinha em um campo simples. Paulo, na época com 14 anos, era um dos melhores atletas do grupo e, até por isso, a proximidade entre o professor e o pupilo não causava estranheza. Maguila era respeitado na cidade, levava com frequência os garotos para testes em clubes de expressão nacional, como o Atlético Mineiro e o Cruzeiro, e nele eram depositadas as esperanças de muitos pais em verem seus filhos como grandes ídolos. A frase inicial poderia se referir a uma instrução do professor ou uma orientação sobre um fundamento de futebol, mas, na verdade, foi a tentativa de Maguila para convencer Paulo a, mais uma vez, realizar programa com um dos clientes que tinha na região.

Jovens aspirantes a jogadores não estão sujeitos somente ao abuso de pedófilos, mas também a redes que geram lucro para os envolvidos. A exploração sexual se difere do abuso por haver uma organização, que envolve aliciadores e clientes. A semelhança entre as duas situações está na forma de atrair meninos e de conseguir o silêncio: a promessa de uma carreira brilhante e lucrativa no esporte e, depois, a ameaça de tirá-lo do time, caso o garoto denuncie o crime.

Chefe da rede, Maguila se estabeleceu em Caratinga, município de 85 mil habitantes no sudeste de Minas Gerais, na busca por pequenas vítimas. A escolinha onde lecionava, como funcionário da prefeitura, era vista por garotos da região como a grande possibilidade de se tornarem fenômenos como Ronaldo ou Neymar. A proximidade com os meninos, as viagens, não chamavam a atenção. Para ser atleta era necessário dedicação, os testes e as peneiras exigiam deslocamentos e, para os pais, não havia nada de errado ali. Nem sequer a inexistência de talentos revelados por Maguila era motivo de suspeita, já que nenhum de seus alunos chegou a um grande clube do país.

Segundo o inquérito da Polícia Civil de Caratinga os encontros aconteciam nos mais variados lugares, desde o motel da cidade a funerária, onde um dos abusadores trabalhava. Em troca, os garotos ganhavam camisetas de futebol, chuteiras, cordões e, às vezes, quantias em dinheiro — nada além de R$ 50. Maguila, no entanto, recebia quantias mais vultosas. Chegou, inclusive, a negociar a venda de Paulo por R$ 5 mil para Celso Pereira, professor universitário do município de Santa Bárbara, portador do vírus da Aids. O dinheiro pago garantiria a exclusividade sobre o menino, mas, por causa de um briga com Celso, Maguila não fechou o negócio.

Com a proximidade e influência que tinha com os garotos, Maguila os convencia de que os abusos eram normais e necessários para se tornarem grandes jogadores de futebol. Caso contrário, o treinador ameaçava tirá-los do time. Ele também usava o medo dos jogadores de ficarem estigmatizados e fazia ameaças de falar sobre os encontros para as namoradas e a família. “Aí gostoso, vou te “caguetar”. Maguila não vai te dar moral”, intimidou certa vez um dos menores.

O esquema poderia ter continuado durante anos, não fosse a denúncia de Osvaldo e Rosa, pais de Daniel, 13 anos. O jovem, ao contrário da maioria dos meninos nesta idade, nunca teve muito interesse por futebol. Desde pequeno, ajudava os pais a complementar a renda de R$ 2 mil mensais que sustentava os três e o irmão mais velho. Havia até interrompido os estudos para vender picolé nas ruas da cidade. Um dia, telefonou para casa pedindo para viajar a Bom Jesus, município vizinho, para jogar bola com um amigo. A mãe estranhou e não autorizou. Daniel foi assim mesmo.

No dia seguinte, o irmão mais velho, em frente ao computador, chamou a mãe: “Mãe, vem cá ver uma coisa. O Daniel mentiu pra nós. Ele tá no Rio de Janeiro”. Nas fotos estavam Daniel, um vizinho também de 13 anos e dois homens, que Rosa desconhecia. Os suspeitos eram Celso e João Maranhão, apontado pelo inquérito como o financiador do esquema liderado por Maguila. No caso de Daniel, não foram necessárias promessas de uma brilhante carreira. O garoto se encantou com a possibilidade de conhecer o Rio de Janeiro e por presentes —óculos caros, tênis e roupas novas. Quando voltou, após um fim de semana com os abusadores, Daniel justificou: “Mãe, eu menti porque você não ia deixar se eu falasse que estava indo para o Rio de Janeiro. O Celso bancou tudo”. E já anunciou a programação de viagem, desta vez para o Maranhão. Apavorada, Rosa procurou a polícia.

Silêncio

Quando a queixa chegou à Delegacia da Mulher de Caratinga, os investigadores associaram os nomes a uma denúncia feita ao Disque 100, da Secretaria de Direitos Humanos. O inquérito foi montado após meses de investigação e 50 dias de escutas telefônicas. Para a delegada Nayara Travassos, responsável pelo caso, não há dúvidas da existência da rede. Todos os garotos, no entanto, negaram os abusos. “O Maguila era um cara querido. Não sei se é pelo medo, mas todos os menores estão defendendo o treinador.”

Seis suspeitos foram indiciados e estão presos preventivamente. O caso está sendo julgado no Fórum do município. Os advogados usam a negativa dos garotos para derrubar as denúncias e não há previsão de uma sentença. Mesmo depois das denúncias, o sonho de se tornarem grandes jogadores de futebol ainda continua na cabeça de alguns desses meninos, que permanecem treinando sozinhos, sem treinador, no campinho da cidade.


Com lucro menor e inadimplência, arrecadação deve crescer abaixo do PIB

Valor Econômico

O desempenho da arrecadação federal no primeiro semestre, a queda no lucro das empresas (ou os prejuízos) e a atividade econômica ainda fraca fizeram crescer, entre os especialistas, o receio de que o recolhimento de tributos da União cresça abaixo da evolução estimada para o Produto Interno Bruto (PIB) em 2012. Essa estimativa está hoje em torno de 2% e o crescimento real da arrecadação pode ser ainda menor. Uma das razões é que o efeito da desaceleração econômica costuma bater antes na arrecadação tributária, sob a forma de inadimplência.

Em 2003 e 2009, quando houve desaceleração, lembra o economista Amir Khair, a arrecadação administrada da Receita cresceu abaixo do PIB. Em 2003, a economia cresceu 1,1% e a arrecadação teve queda real de 2,7%. Em 2009, o PIB recuou 0,3% e a receita tributária federal encolheu 3,05% em termos reais. Os dados levam em consideração o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). “As empresas preferem atrasar os tributos do que o pagamento a fornecedores.”

Para Khair, a redução de arrecadação em junho não é vista como fato isolado, mas como parte de uma curva de desaceleração da arrecadação federal nos últimos meses. Influenciada por um crescimento de 42,7% no recolhimento do ajuste de Imposto de Renda das empresas – que ainda refletiu os resultados de 2011 -, a arrecadação administrada da Receita teve crescimento real de 10,18% em março, na comparação com o mesmo mês do ano anterior. Sem receitas extraordinárias tão relevantes, em abril e maio o crescimento perdeu fôlego, com elevação real de 2,59% e 3,35%, respectivamente.

Everardo Maciel, sócio da Logus Consultoria e ex-secretário da Receita Federal, lembra que a queda de 6,83% em junho precisa ser relativizada. Em junho de 2011, o governo federal recolheu R$ 6,7 bilhões em receita extraordinária com o chamado Refis da Crise. Em junho deste ano, essa receita gerou apenas arrecadação de R$ 1,2 bilhão. Mas, mesmo excluindo a receita extraordinária da comparação, houve queda real de arrecadação de pouco mais de 2%.

Outros fatores também influenciaram a arrecadação de junho. Por exemplo, a redução da Cide-combustíveis e o benefício dado a 13 segmentos, adiando o recolhimento de PIS/Cofins de maio e junho para novembro e dezembro, respectivamente.

Para Maciel, porém, benefícios temporários, como o adiamento do PIS/Cofins, não garantem que a Receita Federal conseguirá repor a arrecadação ao fim do ano. Com a economia desacelerada, lembra, as empresas poderão ter dificuldades para recolher esse PIS/Cofins em meio a despesas sazonais, como o décimo-terceiro salário. “As empresas terão de fazer o recolhimento de dois meses nesse período.”

Maciel prefere não fazer estimativas, mas acredita que a arrecadação não irá cumprir o desempenho estimado no início do ano, quando a Receita chegou a prever elevação real de recolhimentos de 4% a 4,5% em 2012.

Para Mansueto Almeida, especialista em contas públicas, os benefícios têm efeito marginal na arrecadação federal total. A evolução da receita tributária, diz, reflete a atividade econômica. Almeida lembra que, em julho, algumas receitas devem surpreender de forma positiva. Com base em dados preliminares do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi), o analista diz que em julho a Receita registra recolhimento de R$ 6,21 bilhões em juros de mora, devidos por atraso no pagamento de tributos. Até junho, essa receita gerou em média cerca de R$ 250 milhões mensais.

Com o desempenho indicado pelo Siafi até agora, diz ele, o acumulado de julho com esse tipo de recolhimento deve ficar em R$ 7,84 bilhões. No mesmo período de 2011, a Receita recolheu R$ 2,05 bilhões com esses juros.

Entre as receitas não tributárias, Almeida lembra que as compensações por exploração de petróleo e gás ainda continuam com bom desempenho. Até julho, acumulam R$ 20,7 bilhões, enquanto no mesmo período do ano passado somavam R$ 16,87 bilhões.

Mesmo assim, acredita Almeida, a receita tributária não deve se recuperar tão rapidamente. “A evolução mostra que é provável um crescimento real de arrecadação menor que a evolução do PIB”, diz. Ele estima o crescimento do PIB entre 1,5% e 2% para 2012.

Mansueto diz que o governo ainda pode recorrer ao recurso legal dos restos a pagar, segurando pagamentos para 2 de janeiro de 2013 e assim chegar a um resultado primário de 3,1% do PIB. Mas ele acredita também que não seria problema fechar o ano com primário menor, de 2,9 % do PIB, já que o resultado nominal terá melhora significativa.

“Com a redução dos juros básicos, o déficit nominal deve chegar a 1,9% do PIB.” No ano passado, lembra, foi de 2,6%. O economista Amir Khair tem raciocínio semelhante. “Um resultado nominal melhor é importante.” Para ele, o déficit nominal pode cair para 2,2% ou 2% do PIB.


Suspensas as licenças na área mineral

Valor Econômico

Mineradoras ouvidas pelo Valor cogitam entrar na Justiça para terem seus direitos minerários reconhecidos pelo governo. Há quase um ano, o Departamento Nacional de Pesquisa Mineral (DNPM) e o Ministério das Minas e Energia (MME) mantém suspensas as outorgas de autorização para pesquisa mineral (alvará de pesquisa) e liberação de novas concessões para abertura de minas (portaria de lavra) para exploração de novas jazidas minerais no país. Até agora são mais de 5 mil alvarás de pesquisa e 55 portarias de lavra pendentes das assinaturas do diretor-geral do DNPM, Sérgio Dâmaso, e do ministro Edison Lobão, do Ministério das Minas e Energia, apurou o Valor.

A suspensão desses procedimentos foi determinada por “instrução verbal da Casa Civil” para evitar especulação com títulos minerários antes da entrada em vigor do novo marco regulatório, informaram fontes do setor de mineração. A medida é considerada inconstitucional pelo Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram). Em consequência disso, a pesquisa mineral e a mineração de novas lavras estão paralisadas no país desde novembro de 2011. Procurado para explicar a medida, o MME, informou por sua assessoria que “quem pode falar sobre o assunto é o DNPM”. O DNPM, consultado, informou, também por seu assessor, que não vai comentar o assunto e sugeriu ouvir o MME.

Paulo Sergio Machado Ribeiro, subsecretario de Política Mineral e Energética do Estado de Minas Gerais, tachar a decisão oficial de puro “nonsense”, já que o novo código de mineração ainda nem chegou ao Congresso e não tem data para entrar em vigor. Ele crê que a decisão do Planalto de travar o processo de reconhecer novos direitos adquiridos na área mineral pode ser explicada pela principal mudança que aponta no novo marco regulatório: a entrada em vigor do processo de licitação de direitos minerários por preço. Hoje, é por ordem de chegada no DNPM.

A suspensão trouxe instabilidade e incerteza para a mineração e já ameaça prejudicar investimentos. Pelo menos dois grandes projetos na área de minério de ferro, o da Manabi Holding e o da Bamin -Bahia Mineração, que juntos somam mais de R$ 10 bilhões – R$ 6 bilhões e R$ 5 bilhões, respectivamente -, temem atraso em suas partidas e seus executivos estão preocupados de levar insegurança aos acionistas e financiadores dos empreendimentos caso o governo não garanta os direitos adquiridos das empresas no negócio.

Para José Viveiros, CEO da Bamin, controlada pela ENRC, mineradora global com sede em Londres e ações na bolsa local, “esta situação está contribuindo para atrasos do nosso projeto no Brasil e não está permitindo iniciar os investimentos programados, avaliados em R$ 5 bilhões (US$ 2,5 bilhões)”. Ele teme alterações no cronograma do projeto, com início de operação datado para 2015 para produzir 20 milhões de toneladas ao ano. A Bamin, informou, está numa fase de início de desembolso do investimento a ser feito pelo acionista. “Vejo com bastante preocupação essa situação”.

Tadeu Moraes, presidente- executivo da Manabi Holding, cujo projeto está em início de desenvolvimento, concorda com Viveiros. “Estamos muito preocupados. Qualquer autorização de pesquisa e portaria de lavra que as mineradoras precisam no DNPM não anda. Entramos com pedido de alvará de pesquisa há seis meses e não tivemos resposta. Estamos começando um investimento sem saber se podemos ir mesmo em frente. É uma complicação que precisa ser resolvida. O mais grave é que não tem uma ordem de suspensão no papel”, avalia Moraes.

O projeto da Manabi, tocado por ex-executivos da Samarco, Vale e MMX, prevê produzir 25 milhões de toneladas de minério de ferro a partir de 2016 na mina de Morro do Pilar e mais 6 milhões de toneladas no Morro do Escuro, em Minas Gerais, além de um mineroduto e um porto em Linhares, Espírito Santo. O negócio tem como acionistas e investidores financeiros fundos de private equity como o brasileiro Fábrica Participações e um FIP coreano e mais um fundo de pensão canadense. “São investidores estrangeiros que apostam na nossa competência. Precisamos ter a credibilidade deles para ter recurso para tocar o projeto”.

A Manabi deve entrar com pedido de portaria de lavra no DNPM até o final do ano, estima Moraes. “Será que quando chegar este momento vamos ter que apelar para a Justiça para ter a concessão?”, indaga o executivo, ao saber que algumas empresas estão cogitando tomar essa atitude extrema contra o governo.

Fernando Coura, presidente do Ibram, define a situação como “inédita na história da mineração brasileira”. Em visita ao DNPM, recebeu do diretor-geral a explicação de que “foram ordens superiores”. O Ibram está fazendo tratativas junto ao Executivo e ao Congresso para derrubar o travamento de outorgas e portarias de lavra. “Pelo menos, o governo deveria adotar critério na suspensão. Separar o investimento especulativo do investimento sério”. A entidade começou a pesquisar possíveis perdas com investimentos. Até agora, a pesquisa aponta para valores acima de R$ 20 bilhões de projetos ainda no papel e que podem ser abortados pela suspensão de outorgas e portarias de lavra.


Itaipu não opõe Brasil ao Paraguai

Valor Econômico

Um discurso político feito na terça-feira pelo presidente do Paraguai, Federico Franco, com o anúncio de que não “cederá” mais energia a Brasil e Argentina mobilizou ontem o Congresso brasileiro. Foi classificado de “infeliz” pelo presidente da Comissão de Relações Internacionais do Senado, Fernando Collor, mas não despertou preocupação no Executivo.

O Brasil, segundo lembrou ao Valor um graduado integrante do governo, já vem fazendo exatamente o que Franco disse querer, em seu discurso: criando condições para instalar indústrias no Paraguai e aumentar o consumo local da energia de Itaipu, hoje vendida – não cedida – ao Brasil.

O discurso de Franco foi visto no Palácio do Planalto como manifestação “para o público interno”. De fato, o governo paraguaio, segundo o Itamaraty, não enviou nenhuma notificação sobre Itaipu, e uma leitura atenta do discurso de Franco mostra que ele se referia à necessidade de criar, no Paraguai, demanda para a energia de Itaipu, hoje não usada pelo país.

Desde 2010, com financiamento de US$ 400 milhões do Fundo de Convergência Estrutural (Focem), do Mercosul, na maior parte bancados pelo governo brasileiro, os paraguaios constroem uma linha de transmissão de 500 quilowatts, de Itaipu a Villa Heyes, próxima à capital, Assunção. A linha faz parte do acordo firmado pelos ex-presidentes Luis Inácio Lula da Silva e Fernando Lugo, que a anunciaram como uma forma de aumentar o consumo de energia no Paraguai, com instalação de empresas no país para aproveitar a energia barata.

Franco e seu ministério são favoráveis a planos que vinham sendo negociados por Lugo com a Alcan Rio Tinto para instalar no país uma fábrica de alumínio primário e um polo industrial. A empresa não comenta o assunto, mas pessoas próximas às negociações, ouvidas pelo Valor, informam que os planos dependeriam do cenário econômico internacional e demandariam ainda anos para sua realização.

O aumento do uso de energia de Itaipu pelo Paraguai, dono de metade da usina, é algo “normal” e “previsível”, disse o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, encarregado de auxiliar o governo no planejamento energético.

No planejamento brasileiro, se estima uma redução gradual, mas não muito significativa, da oferta de energia de Itaipu, hoje comprada do Paraguai. Não há previsão para um aumento muito grande, mas esses planos podem ser revistos sem problemas, caso haja anúncio de instalação de indústrias no país vizinho, diz Tolmasquim.

“Um aumento de consumo no Paraguai não ocorrerá da noite para o dia, temos tempo para preparar alternativas aqui”, afirmou o executivo. Com a desaceleração da economia mundial, diz ele, a oferta prevista gera excedentes de energia no Brasil pelo menos até 2014. “Hoje, pagamos o preço de mercado, acima de US$ 50 o megawatt-hora (MWh) pela energia garantida de Itaipu”, informou.

Pela energia excedente, sem garantia de regularidade no fornecimento, Brasil e Paraguai pagam bem menos, em torno de US$ 9 o MWh. O Paraguai usa metade dessa energia excedente e recebe compensação adicional pela parte vendida ao Brasil.


Dilma pede ajuda a Lula para enfrentar as greves

Valor Econômico

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva vai ajudar o governo na negociação da greve geral dos servidores públicos. A intermediação do ex-presidente foi acertada durante conversa de Lula com a presidente Dilma Rousseff, na última terça-feira. Lula deve atuar principalmente no sentido de atenuar a radicalização do movimento, que beira a ruptura, como demonstrado ontem com a decisão da Central Única dos Trabalhadores (CUT) e outros cinco sindicatos de servidores de representar contra o governo federal na Organização Internacional do Trabalho (OIT).

A representação protocolada na OIT acusa o governo de “atitudes antisindicais”, segundo informou, em nota oficial, a Confederação dos Trabalhadores no Serviço público Federal (Condsef). A entidade argumenta que o PT faz isso “na tentativa de acabar com a greve legítima” dos servidores federais, de braços cruzados há mais de dois meses. A intermediação de Lula pode contornar um fenômeno que se cristalizou nos últimos dias: a impaciência dos sindicalistas com diálogos quase sempre sem um desfecho.

Na conversa que teve com Lula na última terça-feira, Dilma queixou-se da relação das centrais sindicais com a presidente, segundo informaram ao Valor fontes do PT. Lula prometeu ajudar nas negociações. As entidades de classe dos trabalhadores estimam que há mais de 350 mil servidores públicos federais de braços cruzados.

Servidores públicos fizeram manifestação em frente ao prédio da Justiça Federal, em São Paulo

Segundo avaliação de petistas ligados à CUT, a greve geral está se transformando num verdadeiro “tsunami” e o governo precisa agir rapidamente para encontrar uma solução. O problema é que a base dos sindicatos dos trabalhadores tem reagido a intermediações mais ponderadas dos dirigentes e líderes. Os dirigentes sindicais, inclusive da CUT, também se queixam do tratamento recebido do Palácio do Planalto desde a troca de Lula por Dilma.

Como exemplo, conta-se no PT que, na campanha eleitoral de 2010, a CUT e seu ex-presidente Arthur Henrique foram acionados três vezes no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por fazerem campanha ilegal para a então candidata Dilma Rousseff (PT). A conta de multas de Arthur Henrique teria chegado aos R$ 50 mil. No entanto, quando Dilma chegou ao Palácio do Planalto não teria retribuído como esperavam as centrais.

Em um primeiro encontro protocolar, Dilma teria se comprometido a manter diálogo permanente com a central dos petistas, o que não ocorreu. A intermediação passou a ser feita com Gilberto Carvalho (Secretaria Geral). Mais tarde, Carvalho chamou para assessorá-lo um dos vice-presidentes da CUT, José Vicente Feijóo.

Após breve período de trégua, o ambiente voltou a ficar tenso com a progressiva radicalização da greve dos servidores. A interlocução com o movimento grevista passou para o Ministério do Planejamento. Em síntese, o governo afirma que prefere manter o atual nível de emprego a ceder a pressões por reajustes que não podem ser suportados agora pelos cofres públicos. As concessões serão apenas as já prometidas na proposta orçamentária para 2013.

Um fato ocorrido em julho também agravou os ressentimentos dos sindicalistas da CUT com Dilma: convidada para participar do Congresso da central, a presidente mandou como representante o ministro do Trabalho, Brizola Neto, que é do PDT, partido vinculado à Força Sindical, a central que disputa com a CUT a hegemonia do movimento sindical. Essa foi a leituras feita não apenas na central ligada ao PT, como nas demais.

O PT também viu aumentar a concorrência no movimento sindical: o PCdoB tem influência sobre a Central dos Trabalhadores do Brasil (CTB) e o PSTU, partido de extrema esquerda, na Conlutas. Ainda assim o Partido dos Trabalhadores – e a CUT – detém hoje o controle da maioria dos sindicatos. Alguns cálculos falam em 70% dos sindicatos.

“É o mundo de pernas para o ar, a CUT contra o PT”, disse ontem o diretor jurídico do Sindicato Nacional dos Servidores das Agências Nacionais de Regulação (Sinagências), Nei Jobson, uma das cinco entidades que assinam a ação protocolada na OIT.

Segundo Jobson, “o PT aperfeiçoou os instrumentos de negociação com o trabalhador que ele sempre lutou contra”, disse, referindo-se ao decreto 7.777.

Além do Sinagências, Condsef e CUT, acionaram a OIT, contra a regulamentação, o Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil (Sindifisco), Confederação dos Trabalhadores no serviço público Federal (Condsef), Sindicato Nacional dos Fiscais Federais Agropecuários (Anffa) e a Federação Nacional das Associações de Servidores da Previdência Social (Fenasps).

O decreto permite que servidores públicos federais em greve sejam substituídos por funcionários estaduais ou municipais equivalentes, medida já desencadeada pelo governo federal. “Está pior negociar com o PT do que com a direita”, disse Jobson.

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