Fortaleza: o retrato da desigualdade e a luta na periferia

Fortaleza: o retrato da desigualdade e a luta na periferiaPor Sousa Carneiro, estudante de Biblioteconomia e militante do PCB e UJC.

No último dia 20 de dezembro um dos grandes jornais do Ceará, O Povo, noticiou a pesquisa “Tipologia Intraurbana” realizada pelo IGBE, onde somos apresentados ao alarmante dado de que mais de 60% da população urbana de Fortaleza vive nas piores condições de vida, ou seja, cerca de 2,01 milhões de pessoas vivem em uma situação de inexistência de condições dignas de moradia [1], em situação de desemprego e sem acesso a direitos básicos como educação e saúde públicas de qualidade.

O dado choca pela sua crueza, mas ainda assim não traz nenhuma novidade a quem já conhece de perto a realidade (contraditória) de Fortaleza: uma das cinco maiores capitais do país, onde o setor de serviços, especialmente o de turismo, é conhecido internacionalmente, não deixa, no entanto, de ser uma das cinco capitais mais desiguais do mundo, sendo também a sétima mais violenta [2]. Ainda segundo a pesquisa do IBGE, apenas 12,1% da população está em uma situação considerada boa e apenas 2,9% da população é tida como rica.

Infelizmente, a situação não para por aí. Segundo o Ranking do Saneamento Básico 2017 50,96% da população da cidade simplesmente não tem acesso a saneamento básico e pouco mais de 15% da população sequer é atendida por serviços de abastecimento de água [3]. Mais especificamente em relação à moradia, são mais de 800 comunidades em situação inadequada.

Com estes índices, poderíamos ser levados a crer que a questão da moradia está na pauta do atual prefeito de Fortaleza, Roberto Cláudio (PDT), eleito em 2012 (derrotando o candidato Elmano de Freitas (PT), apoiado pela então prefeita e atual deputada federal pelo PT Luizianne Lins) e reeleito em 2016, com o apoio do PCdoB, tendo como seu vice Moroni Torgan (DEM), um dos políticos mais reacionários do Estado do Ceará, até então integrante da “bancada da Bala” no Congresso Federal e que historicamente propõe políticas altamente militarizadas para o Ceará, tendo como último ato no Congresso o voto a favor do impeachment de Dilma Rousseff. Ledo engano.

Apenas nos últimos oito anos, mais de 20 mil famílias sofreram remoções em Fortaleza. Apenas no ano de 2014, 1.898 famílias sofreram processos de remoção por conta de obras realizadas em prol da Copa do Mundo [4]. Um dos casos de remoção de maior notoriedade foi a comandada por Roberto Cláudio contra a Comunidade do Alto da Paz, em 2014. A Prefeitura chegou a usar a Tropa de Choque da Polícia Militar, que expulsou os moradores de suas casas através do uso de bombas de gás e balas de borracha. Tratores foram utilizados para a derrubada imediata da comunidade, que afirmou não ter sido sequer notificada da remoção [5], o que é prática comum da Prefeitura, uma vez que apenas no ano de 2017 68% nas remoções realizadas na cidade ocorreram sem nenhum tipo de ordem judicial e sem nenhuma espécie de notificação e em 55% dos casos houve uso de violência. O aparato repressivo sequer dá tempo aos moradores de retirarem de suas casas os poucos pertences que possuem. Estas remoções (lembrando, apenas neste ano) atingiram mais de 1.800 famílias apenas na Capital! [6].

Um dos casos de truculência mais recentes e também com grande visibilidade foi o ataque da Prefeitura de Fortaleza à Ocupação Gregório Bezerra, no dia 11 de novembro de 2016 [7], onde se utilizou de 200 guardas municipais, bem como de tratores e caminhões para a derrubada dos barracos. Apesar do ataque, a Ocupação bravamente resistiu aos ataques da Prefeitura e permanece firme e forte na luta pela moradia. Já são mais de 70 famílias na construção desta legítima experiência de Poder Popular.

É papel urgente dos comunistas e da esquerda socialista em geral fortalecer o trabalho de base e agitação entre o povo pobre da periferia pela luta por condições dignas de vida nos bairros. Fortalecer a luta em torno também das questões mais imediatas da vida da classe trabalhadora (como a luta por postos de saúde, iluminação pública de qualidade, reforma das escolas, construção de moradias populares, etc.) através, por exemplo, de brigadas populares ou comitês de luta nos bairros é, na prática, fortalecer a organização da classe, estando lado a lado diariamente, apresentando experiências concretas de Poder Popular. Dessa forma, daremos um enorme passo na organização da revolta popular contra todos os ataques do capital e da burguesia à vida e aos direitos historicamente conquistados pela classe trabalhadora.

1. https://www.opovo.com.br/noticias/fortaleza/2017/12/dois-milhoes-de-pessoas-estao-nas-piores-condicoes-de-vida.html

2. http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cadernos/cidade/uma-capital-de-encantos-e-desigualdades-1.995375

3. http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cadernos/cidade/online/mais-da-metade-da-populacao-de-fortaleza-nao-tem-coleta-de-esgoto-1.1807917

4. https://www20.opovo.com.br/app/opovo/cotidiano/2015/06/12/noticiasjornalcotidiano,3452394/desapropriacoes-para-a-copa-um-ano-de-mudancas-e-novos-lares.shtml

5. https://www20.opovo.com.br/app/fortaleza/2014/02/20/noticiafortaleza,3209611/batalhao-de-choque-expulsa-moradores-da-comunidade-alto-da-paz.shtml

6. http://www.oestadoce.com.br/geral/remocoes-em-fortaleza

7. https://www.opovo.com.br/noticias/fortaleza/2016/11/prefeitura-executa-demolicao-de-casas-em-ocupacao-no-conjunto-ceara.html