Os EUA e a intervenção na Venezuela
No âmbito de uma guerra global de classes expansionista e agressiva, nos últimos 20 anos, durante quatro sucessivas presidências de democratas e republicanos na Casa Branca – William Clinton, George W. Bush, Barack Obama e Donald Trump -, a diplomacia de guerra dos EUA tem impulsionado uma política de mudança de regime na Venezuela contra os governos constitucionais e legítimos de Hugo Chávez e Nicolás Maduro.
A ação aberta e clandestina dos EUA inscreve-se na dominação de espectro amplo, noção concebida pelo Pentágono antes dos atentados terroristas do 11 de Setembro de 2001, que abarca uma política combinada em que o militar, o político, o econômico, o jurídico/para-institucional, o midiático e o cultural têm objetivos comuns e complementares. Uma vez que o espectro é geográfico, espacial, social e cultural, para impor a dominação é preciso fabricar o consentimento. Ou seja, colocar na sociedade determinados sentidos comuns que de tanto repetirem-se incorporam-se ao imaginário colectivo e introduzem, como única, a visão do mundo do poder hegemônico. Isso implica a formação e manipulação ideológica (doutrinamento) de um grupo e/ou uma opinião pública legitimadores do modelo.
Para a fabricação do consenso tornam-se chaves as imagens e a narrativa dos meios de difusão em massa, com seus mitos, meias verdades, mentiras e falsidades. Apelando à psicologia de massas e à propaganda negra impõe-se à sociedade a cultura do medo. A fabricação social do temor inclui a construção de inimigos internos.
Manuais do Pentágono dão grande importância à luta ideológica no campo da informação e ao papel dos media e das redes sociais (Internet e telefones móveis) como armas estratégicas e políticas para gerar violência e caos planificado. Um desses documentos assinala que as guerras modernas têm lugar em espaços que vão além de simplesmente os elementos físicos do campo de batalha. Um dos mais importantes são os meios de comunicação nos quais ocorrerá a batalha da narrativa. A percepção é tão importante para o seu êxito como o próprio evento. No final das contas, a percepção do que aconteceu importa mais do que o que se passou realmente.
A percepção pode ser criada com base numa notícia falsa e ser imposta às massas mediante campanhas de operações psicológicas nos media e/ou nas redes da Internet (guerra social em rede), ou mediante tanques de pensamento (thinktank), centros acadêmicos, fundações, ONG e intelectuais orgânicos, a partir de matrizes de opinião elaborados por peritos de inteligência e militares. As campanhas de intoxicação (des)informativas exploram os preconceitos e as vulnerabilidades psicológicas, econômicas e políticas da população de um país objectivo e manejam um guião propagandístico desestabilizador, com eixo em denúncias de corrupção e repressão, etiquetando o regime de turno como ditadura e agitando como bandeiras a defesa dos direitos humanos, a liberdade de imprensa e a ajuda humanitária.
Antes que Hugo Chávez chegasse ao governo, em 2 de Fevereiro de 1999, já se havia começado a construir sua lenda negra e nos media hegemônicos classistas e racistas venezuelanos referiam-se a ele como El Mono Chávez,Gorila vermelho, um negro em Miraflores, e os seus seguidores eram chamados de hordas chavistas.
A seguir, e ao mesmo tempo que a Agencia Central de Inteligência (CIA) criava a organização sérvia Otpor (Resistência) e treinava seus membros nas técnicas do golpe suave com o objectivo de derrubar Slobodan Milosevic na ex-Iuguslávia, foi-se forjando o golpe de Estado de 2002 na Venezuela, que como parte de uma guerra não convencional e assimétrica de quarta geração, utilizou a Internet e os meios de comunicação de massa (Venevisión, Globovisión, Radio Caracas Televisión e, entre outros, os jornais Tal Cual, El Nacional e El Universal) para promover matrizes de opinião antichavistas e projetar informação manipulada, distorcida e falsificada, com a intenção de desacreditar o governo bolivariano.
Fracassado o golpe, o lockout (encerramento patronal) das corporações empresariais da Venezuela agrupadas na Fedecámaras e Conindustria, e a sabotagem da gerontocracia da PDVSA (a empresa petrolífera estatal), em 24 de Março de 2004, ao prestar testemunho perante o Comité de Serviços Armados da Câmara de Representantes estado-unidense, o general James T. Hill, chefe do Comando Sul do Pentágono, cunhou a denominação populismo radical numa referência clara a Hugo Chávez. De imediato a expressão foi usada para fins de propaganda maciça e adaptou-se no México a Andrés Manuel López Obrador, o messias tropical (E. Krauze dixit ).
Em dezembro seguinte triunfava na Ucrânia a revolução laranja de confecção estadunidense e, em 2005, com financiamento de Washington, eram enviados ao Centro de Ação e Estratégias Não Violentas Aplicadas (CANVAS), da Universidade de Belgrado, na Sérvia, cinco líderes estudantis venezuelanos para treinarem-se nas políticas de mudança de regime segundo as técnicas insurreccionais das revoluções coloridas e nos golpes suaves de Gene Sharp. Entre eles figuravam Yon Goicochea, Freddy Guevara e Juan Guaidó.
29/Março/2019 O original encontra-se em www.lahaine.org/mundo.php/eeuu-y-el-cambio-de
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