“O BCE está jogando o truco da história”

Se o futuro das atuais políticas – tanto do Brasil quanto no resto do mundo – é nebuloso, no curto ou médio prazo, a bolsa, principalmente as ações de consumo, podem se beneficiar de uma economia mais aquecida. Como a inflação ainda é uma ameaça, na renda fixa há os papéis indexados ao IPCA, as NTN-Bs. Essas têm sido estratégias adotadas há algum tempo pelo gestor Luis Stuhlberger, da Credit Suisse Hedging-Griffo Asset Management, no lendário fundo Verde, um dos mais antigos do mercado (ver gráfico ao lado).

Confira mais trechos da entrevista ao Valor.

Valor: O senhor aposta num aquecimento da economia…

Stuhlberger: Desde 2004, temos um gráfico [ele mostra o papel] de vendas no varejo sobre renda real. Olhando política monetária, fiscal, parafiscal (bancos públicos acelerando o crédito) e pegando a taxa de juro real menos a taxa neutra defasada em seis meses e as vendas do varejo, a conclusão é que em dois ou três meses esta linha vai dar um salto e surpreender o governo. Teremos uma reaceleração da economia, com uma reaceleração da inflação muito forte a partir de julho, agosto.

Valor: Puxada pelo consumo?

Stuhlberger: É. Pode ser que isso não ocorra. Mas isso nunca deixou de acontecer [mostra o gráfico]. Como a gente acredita muito nisso a gente acha que provavelmente essa sazonalidade da inflação, que está sendo superbenigna nos primeiros quatro meses do ano, se inverte. A confiança das pessoas vai voltar. Nós estamos há seis meses com problemas dos EUA e da Europa, em que tudo parou. Uma desaceleração enorme. E os sinais que a gente vê agora é que isso está mudando.

Valor: E o PIB acompanha?

Stuhlberger: Ainda estamos na ponta de que o PIB vai ser 4% este ano e não 3,5%. Estaremos muito bem este ano, mas obviamente isso vai resultar sempre em uma inflação de equilíbrio maior do que a gente pensa. E esta alegria vai durar pouco. Temos um problema estrutural para crescer. Com uma Selic de 8,5% e uma inflação de 6,5%, obviamente o câmbio de equilíbrio não é este. Aí você começa a reequilibrar o sistema. Não pela eficiência que os americanos e asiáticos conseguiram, mas por inflação e depreciação de câmbio. É o perigo desta política: não é que o governo não vai tomar medidas para corrigi-la, mas ele acredita que só com as medidas macroprudenciais ele corrige isso, se necessário for. Conclusão: esticando o modelo no limite, ou o que a gente chama de apagando o fogo com gasolina. A economia vai voltar a ficar aquecida, e vamos ter novo número de inflação.

Valor: As suas estratégias estão baseadas nisto?

Stuhlberger: Acho que este é um dos hedges assimétricos que a gente tem. A gente entende a razão do governo de fazer isso, combater as causas o tornaria impopular.

Valor: Hedge assimétrico significa que a estratégia tem pouca probabilidade de não se concretizar?

Stuhlberger: Assimétrico é pouca perda e muito potencial de ganho. Não é que é uma moleza, isso aí já foi muito mais barato no passado. É que dado o “shift” [a mudança] dramático na política monetária e nas prioridades, está se testando um novo modelo sem ter feito a lição de casa.

Valor: O senhor disse que acertou na estratégia no fundo em 2011…

Stuhlberger: No último relatório de setembro eu digo exatamente que eu achava que o governo iria reduzir o juro real de 6,5% para 4% e agora ele está em 4%. A gente foi bem o ano passado com isso. Agora estou vendo as consequências do que ele fez e provavelmente será mais inflação. Mas vejo muita gente inteligente dizendo que isso é sustentável, que os juros podem ficar em 9% por dois, três anos ou até abaixo disso. E o mercado acaba se equilibrando porque ele pega a média das expectativas dos agentes econômicos aqui e no exterior no momento.

Valor: É uma estratégia combinada de pré  com inflação?

Stuhlberger: Isso, renda fixa. NTN-Bs. Não tem mistério. O que tem no Brasil é pré e NTN-B. É uma estratégia combinada disso.

Valor: E na bolsa?

Stuhlberger: Esse cenário se reflete em priorizar novamente as ações de consumo. Que vai ser o grande beneficiado. Não estou aqui dizendo que comprar inflação a 6% pelos próximos dez anos é o melhor negócio do mundo. Isto aqui funciona no conceito assimetria de risco e hedge da carteira de ações. Como é que é o raciocínio? Se a inflação não for 6% for 5,5% talvez eu perca dinheiro nisso. Em compensação, a carteira de ações vai subir muito. A lógica no final é o resultado inteiro do portfólio. Se num quesito eu ganho e noutro eu perco pouco está bom.

Valor: Mas as ações de consumo não estão caras?

Stuhlberger: A gente teve um “catch up” [recuperação] de tudo. Foi um movimento mundial provocado pelo ECB [BCE, o banco central europeu]. Foi um presente de Natal do BCE. Achamos que todos os setores ligados ao incentivo do consumo terão dois ou três anos extremamente bons. É uma coisa que eu já tinha na carteira, porque eu já acreditava que o BC ia fazer isso [baixar o juro e ter inflação um pouco maior], o que não achei é que fariam de uma maneira tão forte.

Valor: Essas políticas do BC geraram certa perplexidade…

Stuhlberger: Em agosto o Tombini ganhou uma credibilidade, no sentido de ver o que ele chamou de mudança abrupta do cenário internacional e as consequências disto antes dos outros. Na hora ele foi muito criticado. No retrovisor do quarto trimestre o BC tem razão, mas essas coisas viram rápido. Agora, a conjuntura internacional mudou, quer dizer, por uns três anos. O BCE está jogando o truco da história.

Valor: Então, essa recuperação da bolsa não foi momentânea?

Stuhlberger: Acho que pode durar muito. Para estragar isso, vamos dizer, este ano, só os políticos italianos, franceses espanhóis. Algo político mesmo. O que isso quer dizer? Uma greve enorme, por exemplo.

Valor: Como fica a Europa? A Grécia continuará no Euro?

Stuhlberger: “Ceteris Paribus” [tudo mais constante], suponho que a Europa vai ficar bem por um tempo. Mas ela precisa de reformas. Grécia e Portugal vão estruturar a dívida, isso aí já está no preço. E provavelmente vão continuar no euro. Vai gerar um pouco de estresse, mas não é nada assim… A questão grande hoje é França, Itália e Espanha. Eles são muito grandes e juntos devem 4 ou 5 trilhões de euros, o que não é pouca coisa.

Valor: Isso graças ao BCE?

Stuhlberger: Agora, é o truco final. Se deu certo deu certo, se deu errado a gente vai ter uma nova ordem mundial. Mas é cedo para dizer isso. A conclusão é que este truco dura tempo. Ninguém começa um negócio deste, dá um trilhão de euros e diz: agora não tenho mais um trilhão. Porque é um dinheiro que não existe mesmo, que diferença faz um, dois ou três trilhões? E o Brasil, que é altamente sensível à melhora econômica, provavelmente vai estar “booming” [crescendo] em três ou quatro meses.

 


Remuneração com ações estreia no BB

Valor Econômico

Com seus mais de 200 anos de história, o Banco do Brasil deve fazer nas próximas semanas seu primeiro pagamento de remuneração de executivos em ações. O banco estatal paga participação nos lucros e resultados aos diretores estatutários desde 2002 e começou a dar bônus em 2010.

A mais recente mudança na estrutura de remuneração é consequência da adequação antecipada do banco à resolução 3.921 do Conselho Monetário Nacional (CMN), que foi editada em 2010, mas que passou a ser obrigatória para as instituições financeiras somente neste ano. Entre os grandes bancos do país, o BB é um dos que deve ser mais afetado pela nova regra, uma vez que possui um sistema de remuneração baseado em salário fixo e em uma parcela variável apenas de curto prazo, paga em espécie. Itaú Unibanco e Santander já praticavam modelos mais próximos ao exigido pela autoridade monetária, mas também terão que fazer ajustes.

O Bradesco, que até 2011 pagava eventualmente uma “gratificação” à diretoria (para todos os diretores ou para nenhum), decidiu acabar com a prática. Esse valor foi incorporado aos salários, e o banco passou a ter apenas remuneração fixa, o que lhe desobriga de seguir uma série de regras da nova resolução. Para 2012, o orçamento para despesa total com os mais de cem administradores foi mantido em R$ 556 milhões (inclui R$ 56 milhões de INSS), depois de ter subido 47% em 2011.

Conforme a nova regra, sempre que a instituição pagar algum tipo de remuneração variável aos administradores (leia-se conselheiros de administração e diretores estatutários), no mínimo 50% dessa parcela deve ser “em ações ou instrumentos baseados em ações, compatíveis com a criação de valor a longo prazo e com o horizonte de tempo do risco”. Até 2010, o BB não usava pagamento baseado em ações. No Itaú, esse percentual tinha sido de 26% naquele ano, e, no Santander, de 17%. A resolução diz também que no mínimo 40% da remuneração variável “deve ser diferida para pagamento futuro, crescendo com o nível de responsabilidade do administrador”.

Até 2009, o BB tinha uma remuneração baseada majoritariamente em salário fixo e benefícios, com a participação nos lucros representando perto de 25% do total pago aos diretores estatutários, num total de pouco menos de 40 pessoas. A partir de 2010 foi introduzida a política de pagamento de bônus, em espécie, que teve peso de 5% na remuneração da diretoria, além dos 29% de PLR.

E embora a obrigação de se cumprir a regra do CMN só entre em vigor para os pagamentos referentes ao exercício de 2012, o banco quis se antecipar para se acostumar com a nova filosofia de remuneração. “Desde que saiu audiência pública, em março de 2010, o banco já vem trabalhando em cima desse assunto. Algumas coisas já fizemos e outras ainda precisamos fazer para completar o processo de transição”, afirmou Amauri Sebastião  Niehues em meados de janeiro, quando ainda era diretor de gestão de pessoas do BB, pouco antes de se aposentar.

Uma das medidas que o CMN exige é  a criação de um comitê de remuneração estatutário. No caso do BB, ele será formado por quatro membros. Três deles serão do conselho de administração, sendo que já foi definido que um deles será o presidente da instituição, Aldemir Bendine. Um segundo componente será indicado pelo Ministério da Fazenda, que representa o controlador, e um terceiro representará os minoritários. Não foram definidos ainda os nomes dos conselheiros, nem a origem do ocupante da quarta vaga, que pode ser de dentro ou fora do banco, mas sem ligação com a administração.

Em relação ao pagamento em ações, Niehues disse que o banco preferiu esse sistema ao de opções. “Comprar o papel era mais fácil e mais simples de administrar”, explica o executivo.

Pelo sistema, o banco vai reservar uma parcela do que seria pago como bônus para a compra de ações, que será feita em até 30 dias, pelo preço de mercado. A partir desse momento esse valor fixo se transforma em ações, que ficam bloqueadas. A liberação para venda ocorre paulatinamente, sendo um terço a cada ano.

Falta ainda o BB adaptar seu modelo de avaliação de resultados ao que pede a resolução. O banco já  leva em conta o resultado da instituição e o da equipe para determinar o pagamento da fatia variável, mas precisa agora desenvolver um modelo de avaliação individual. O executivo disse que o banco já tem mecanismos que medem o desempenho de cada funcionário, mas que eles não são aplicados hoje para remuneração.

A norma exige ainda que se crie um sistema separado de remuneração para executivos da área de risco, que não pode ser atrelado ao desempenho do banco.

Itaú e Santander enviaram apenas notas dizendo que vão cumprir a resolução do BC. O Bradesco não quis se pronunciar.

 


Compras de têxteis crescem e preocupam

Valor Econômico

Enquanto as exportações do setor eletroeletrônico brasileiro para a China caíram 1% no ano passado, em comparação com o ano anterior, as importações subiram 15%, e chegaram a duplicar para produtos como celulares, cujas importações aumentaram 133% nesse período, ou quase triplicar, como no caso dos modems, cujas compras tiveram aumento de 174%, segundo dados levantados pela Associação Brasileira da Indústria Eletroeletrônica (Abinee).

Esses dados alimentam a demanda dos empresários por medidas de proteção contra a concorrência chinesa, considerada particularmente ameaçadora no caso do setor têxtil, segundo comentavam ontem autoridades brasileiras.

Levantamentos encaminhados ao governo mostram um crescimento acima da média para produtos têxteis e confecções, que tinham participação pequena na pauta de exportações da China ao Brasil, segundo comentou um diplomata ao Valor. Para o governo, esse resultado indica que está havendo um deslocamento, para o crescente mercado brasileiro, de exportações que antes eram dirigidas aos mercados desenvolvidos, dos Estados Unidos e Europa.

O temor de um “deslocamento de exportações” foi levado pelos brasileiros às autoridades chinesas, na reunião realizada ontem pela Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível (Cosban), e foi explicitado, em discurso, pelo vice-presidente, Michel Temer. Presidente da seção brasileira da Cosban, Temer queixou-se de que 80% da pauta brasileira de exportações par a China é composta de soja em grão, petróleo e minério de ferro. “A atual composição dessas exportações, além de gerar número relativamente limitado de empregos, é ainda vulnerável à flutuação de preços, de demanda e condições climáticas”, criticou.

“A cooperação brasileira não  é só para cinco ou dez anos”, reagiu o vice-primeiro-ministro chinês Wang Qishan, que visita o Brasil, ao discursar em almoço com Temer. Os chineses, além de anunciar aumento dos investimentos no Brasil, planejam atuar mais fortemente no mercado financeiro.

Wang Qishan incluiu como um dos principais pontos da pauta de discussão dos chineses na Comissão Sino-Brasileira de Alto Nível a autorização do Banco Central para que o Industrial and Comercial Bank of China (ICBC) possa operar com carteiras comerciais e de investimento no Brasil. Esse pedido foi feito em abril do ano passado, e, segundo autoridades brasileiras, deve receber resposta positiva dentro de pouco tempo.

 


Justiça concede liminar que favorece renovação de concessões em portos

Valor Econômico

A Justiça determinou, em primeira instância, que a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) publique a resolução que permite a renovação dos contratos portuários anteriores a 1993. A liminar concedida pelo juiz substituto da 3ª Vara Federal, Bruno César Apolinário, sustenta que um parecer da Advocacia-Geral da União “expressa anuência com a redação do ato a ser publicado”. A decisão é do dia 25 de janeiro e estipula que a Antaq edite a resolução em até 30 dias. A decisão é em primeira instância. Cabe recurso.

O pedido de liminar foi protocolado pela Associação Brasileira de Terminais Portuários (ABTP), que tem entre suas associadas empresas cujas concessões estão vencidas ou prestes a expirar. São 77 terminais – o equivalente a quase um quarto das 326 instalações portuárias arrendadas no país – espalhados por 15 portos.

Em julho de 2011, a AGU publicou um parecer admitindo que os contratos assinados antes da Lei dos Portos (8.630/93) sejam prorrogados pelo prazo máximo igual ao originalmente pactuado. O objetivo é permitir sua adequação à lei, reduzindo as diferenças em relação aos arrendamentos firmados depois da lei. Apoiada no parecer da AGU, a diretoria da Antaq aprovou, em 29 de setembro de 2011, uma minuta de resolução para regular as prorrogações, mas o texto nunca foi publicado. Na liminar, o juiz afirma que “não há razão plausível para o retardamento na promulgação do novo ato”.

“Nós aguardamos praticamente dois meses e resolvemos impetrar o mandado de segurança para suprir uma omissão. Depois que o processo decisório dentro da agência se encerra, o que ela decidiu tem de ser publicado”, explica o advogado Igor Sant”Anna Tamasauskas, do escritório Bottini & Tamasauskas Advogados, um dos que representam a ABTP na ação.

Em matéria do dia 19 de janeiro, o Valor destacou que a resolução esbarrou na Casa Civil, que defende a relicitação dos terminais uma vez finalizado o prazo de arrendamento. A posição da pasta foi acompanhada pelos ministérios dos Transportes, da Fazenda e do Planejamento, e pela Secretaria dos Portos (SEP). “O parecer da AGU é cristalino. Temos uma decisão do poder judiciário federal no sentido de que esses terminais arrendados têm direito à adaptação dos contratos”, diz Wilen Manteli, presidente da ABTP.

Para ele, se o governo acena com a intenção de renovar as concessões do setor elétrico, faz mais sentido ainda pensar o mesmo para o setor portuário. “Se fosse pensar em licitar, iríamos ter o famoso apagão elétrico. Agora, no sistema elétrico precisa haver alteração na lei para que a renovação seja feita. No portuário, não. A Lei dos Portos prevê esse direito”.

Até 1993, a operação portuária pelo setor privado limitava-se quase a um contrato de locação de área. A Lei dos Portos instituiu a necessidade de licitação para essa operação e limitou o tempo de concessão em até 50 anos. Antes dela, os arrendamentos eram feitos sem leilão e podiam ser sucessivamente renovados. O novo marco regulatório impôs ainda critérios mais rígidos para a concessão, como a movimentação mínima de carga, e determinou que os contratos antigos fossem adaptados a ela no prazo de 180 dias, por meio da incorporação das novas cláusulas. Entre elas, estava a possibilidade de prorrogação por uma única vez, por prazo máximo igual ao originalmente contratado. O governo, porém, não conseguiu adaptar todos os contratos no período.

Procurada, a Casa Civil disse que a AGU “posicionou-se a favor de realizar licitações”. Questionada sobre a suposta diferença de tratamento do governo entre as concessões elétricas e portuárias, não se manifestou. A Antaq não retornou até o fechamento desta edição.

 


Investimento vai superar 20% do PIB, prevê Fazenda

Valor Econômico

Os investimentos vão saltar quase 11% neste ano, levando a formação bruta de capital fixo (FBCF, que contabiliza os investimentos em máquinas e equipamentos e em construção civil) a atingir 20,8% do Produto Interno Bruto (PIB), prevê o Ministério da Fazenda.

Apesar disso, o ministério reduziu ontem a estimativa para o avanço do PIB no ano – de 5% para 4,5%, de acordo com o documento “Economia Brasileira em Perspectiva”, estudo realizado pela Secretaria de Política Econômica (SPE) que divulga as previsões mais recentes para o ano.

A taxa de investimento vai superar, segundo a equipe econômica, pela primeira vez em dez anos, o patamar de 20% do PIB. De acordo com a SPE, a formação bruta de capital fixo será  equivalente a 20,8% do PIB ao fim deste ano – em 2011, segundo a Fazenda, foi de 19,6% do PIB. A taxa de investimento passará por um avanço de 10,8% neste ano, mais que o dobro da alta de 5,3% verificada entre os três primeiros trimestres de 2011 com igual período do ano anterior. Se a projeção se confirmar, a taxa de investimento terá saltado 4,4 pontos percentuais, como proporção do PIB, de 2002 (16,4%) para cá.

A estimativa da Fazenda também serviu para comprovar o ritmo lento que os investimentos tiveram no ano passado. A FBCF cresceu apenas 0,1 ponto percentual entre 2010 e 2011, mesmo em cenário de avanço mais fraco da atividade, que, segundo o ministério, cresceu apenas 3,2% em 2011 – em 2010, o PIB saltou 7,5%.

O avanço dos investimentos será  impulsionado, dentre outros canais, pela redução do custo de crédito para as empresas. Os cortes contínuos na taxa básica de juros, a Selic, produzidos pelo Banco Central (BC) desde agosto do ano passado, terão efeito concentrado, estimam os economistas do governo, a partir do segundo semestre deste ano.

Parte deste recuo, avaliam os economistas, deve também forçar novas reduções nos juros cobrados pelos bancos das companhias que tomam dinheiro emprestado para investimentos e capital de giro. A diferença entre o custo de captação de recursos dos bancos (taxa Selic) e os juros cobrados das empresas – o spread bancário – deve cair.

Atualmente, o spread embutido nas taxas de juros cobradas das empresas pelos bancos é de 18 pontos percentuais sobre o custo de captação. Segundo dados do Banco Central, compilados no documento do Ministério da Fazenda, a taxa de operação passiva é de 10,28% ao ano, mas a taxa média cobrada pelos bancos (taxa de operação ativa) é de 28,23% ao ano.

“Houve em 2010 uma redução [no spread] de 0,2 ponto percentual e em 2011 uma redução de 0,4 ponto percentual. O spread incentiva a realização de captações externas por empresas brasileiras que possuem acesso ao mercado internacional”, diz o documento divulgado pelo ministério.

A Fazenda também aproveitou para fazer um “exercício estatístico” com a inflação, ao estimar o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 2011 com a nova estrutura de ponderação do índice, válida a partir de janeiro. O IPCA seria de 6,1% e não de 6,5%, caso fosse aplicada a nova Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF 2008/2009).

 


Consumo voltou a puxar economia, dizem analistas

Valor Econômico

A expectativa para a indústria é  que 2012 seja melhor do que foi o ano passado, quando o setor amargou crescimento de apenas 0,3%. Ainda assim, é novamente o consumo que vai levar a atividade econômica a ganhar ritmo em 2012, segundo economistas consultados pelo Valor. Esse efeito, dizem, já poderá  ser percebido no resultado do Produto Interno Bruto (PIB) do quarto trimestre de 2011 e mais ainda ao longo deste ano.

Para Aurélio Bicalho, economista do Itaú Unibanco, um impulso relevante ao consumo virá de três frentes. O mais importante é o aumento real de 7,5% do salário mínimo, mas a desoneração de produtos da linha branca, que deve vigorar até o fim de março, combinada à redução da Selic pelo Banco Central dá “condições positivas para o consumo no primeiro trimestre”, afirmou Bicalho. O economista ressalta ainda o recuo mais rápido dos juros de mercado, com efeito importante sobre os índices de confiança, que deram sinais de retomada neste início de ano.

Essa combinação deve trazer a inadimplência, que alcançou 7,3% em dezembro do ano passado, para baixo, abrindo caminho para que o consumidor continue a ser o motor da economia.

A expectativa dos analistas consultados pelo Valor é que o PIB pela ótica da demanda já seja mais positivo no quarto trimestre do que foi no terceiro trimestre do ano passado, quando a economia ficou estagnada. Naquele período, o setor externo deu a principal contribuição para que a atividade não fosse negativa. Na comparação com o segundo trimestre, na série com ajuste sazonal, o consumo das famílias, do governo e os investimentos recuaram 0,1%, 0,7% e 0,2%, respectivamente.

O consumo das famílias deve ser ponto importante dessa inversão. O economista-chefe do HSBC, André  Loes, estima que a redução da inadimplência aliada às medidas de estímulo do governo, como o desmanche de parte das medidas macroprudenciais pelo BC, terá efeito considerável sobre o consumo, com expectativa de alta de 0,5% no último trimestre do ano passado, na comparação com o período imediatamente anterior, sempre com ajuste sazonal. Em 2012, diz Loes, esse efeito será potencializado, o que explica em parte sua projeção mais otimista do que a média do mercado para o crescimento deste ano, de 3,7%.

Para o Santander, o consumo das famílias deve ter crescido 0,8% no quarto trimestre de 2011. Fernanda Consorte, economista do banco, projeta que a alta do rendimento médio real nos últimos dois meses do ano passado deve ter turbinado esse resultado. Fernanda ainda projeta que o consumo do governo e o setor externo devem ter dado contribuições positivas, com expectativa de que o PIB no período tenha avançado 0,4%. A exceção, pelo lado da demanda, será  o investimento, que deve continuar negativo, segundo a economista do Santander. Para ela, a Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF, a medida das contas nacionais do que se investe em máquinas e na construção civil) deve até piorar na passagem trimestral, passando de queda de 0,2% para menos 0,4%.

Bicalho, do Itaú, também ressalta que o investimento não deve ter reagido no quarto trimestre do ano passado e um dos indícios é a atividade industrial, que teve queda mais forte em outubro, na comparação com setembro. O segmento de bens de capital, por exemplo, registrou baixa de 1,8% na produção naquele mês. Assim, apesar do resultado positivo nos dois meses subsequentes, o PIB industrial no trimestre deve ter sido negativo, segundo o Itaú, e a estimativa é que o país tenha crescido apenas 0,2% no último trimestre de 2011, mesma taxa esperada pelo HSBC.

Luis Otávio Leal, economista-chefe do banco ABC Brasil, tem expectativa um pouco menos otimista para o comportamento da demanda. Apesar de também esperar um crescimento do PIB próximo a 0,4% no quarto trimestre, sempre na comparação com o terceiro trimestre, na série com ajuste sazonal, o economista avalia que o consumo será  “levemente positivo”, mas pouco surpreendente. O endividamento das famílias, afirma, deve ter impedido atividade mais robusta, apesar da injeção de renda com o pagamento do 13º salário e a redução da inflação acumulada em 12 meses.

A partir do primeiro trimestre deste ano, no entanto, as medidas de estímulo devem ganhar potência e a atividade começará a reacelerar, estimam os economistas. O crescimento entre janeiro e março deve ser de 0,8%, na comparação com o último trimestre de 2011 para o Itaú Unibanco e para o Santander. Para Aurélio Bicalho, mais uma vez o consumo deve crescer acima da variação do PIB, enquanto a indústria seguirá com avanço inferior à taxa de expansão da economia brasileira.

Para Bicalho, a indústria entrou em 2012 em primeira marcha por causa dos estoques ainda em patamares elevados. “Vamos ver o mesmo padrão observado nos últimos dois anos, em que um pedaço importante da demanda é atendida pelas importações”, segundo Luis Otávio Leal, do ABC Brasil.

 


KPMG espera menos fusões e aquisições em 2012

Valor Econômico

Mesmo com estrutura de capital equilibrada, as empresas devem reduzir seu apetite por fusões e aquisições ao longo deste ano no mundo. Essa tendência, aparentemente contraditória, está exposta num estudo da firma de auditoria KMPG – intitulado Global M&A Predictor – que mediu a capacidade das empresas para realizar transações e contrapôs ao nível de confiança do mercado.

A conclusão é de que chegou ao fim o crescimento gradual, ano após ano, da confiança do mercado desde o ponto mais baixo da desaceleração em 2009.

Segundo a pesquisa, há previsão de queda global de 12% no endividamento líquido e de redução de 18% nos índices de endividamento líquido sobre o Ebitda (lucro antes de juros, impostos, amortização e depreciação). Esses números poderiam significar uma expectativa de melhora das condições para captação de dinheiro no mercado.

Por outro lado, a redução da confiança no desempenho das empresas leva a KPMG a acreditar em uma desaceleração das fusões e aquisições. O índice que mostra a expectativa dos investidores, medido pela relação preço/lucro, recuou 14% desde janeiro de 2011.

Para Luis Motta, sócio da KMPG, o cenário de incertezas na economia global deve fazer com que as empresas retenham a sua geração de caixa para, por exemplo, reduzir o seu endividamento. “A percepção geral é de que o melhor momento para as compras pode não ser este”, explica.

Com o forte motor da economia doméstica, o Brasil desvia da rota de desaceleração global até certo ponto. Em algum momento, acredita Motta, as incertezas externas devem afetar o ritmo de operações no país. E isso pode ser sentido já no primeiro semestre do ano. “A crise, que começou no segundo semestre do ano passado, pode ter intimidado o início de negócios que poderiam ser fechados nos primeiros meses deste ano.”

Por isso, ele considera duvidosa a expectativa de que o Brasil supere o volume de fusões e aquisições do ano passado, um recorde de 817 operações.

 


Portugal: “Casas devolvidas aos bancos não podem ser avaliadas pelos próprios bancos”

Luís Branco – Esquerda.net

Endividamento das famílias portuguesas não parou de aumentar, alerta o Gabinete de Apoio ao Sobreendividado da Associação Portuguesa para Defesa do Consumidor (DECO). Natália Nunes, coordenadora deste gabinete sugere a famílias que tentem reestruturar suas dívidas o quanto antes e critica comportamento dos bancos: “As casas devolvidas aos bancos não podem ser avaliadas pelos próprios bancos”, afirma, em entrevista ao portal Esquerda.net.

Com a chegada das políticas da troika (FMI, Banco Central Europeu e Comissão Europeia) em Portugal, o endividamento das famílias não parou de aumentar, a avaliar pelos pedidos de ajuda dirigida ao Gabinete de Apoio ao Sobreendividado da Associação Portuguesa para Defesa do Consumidor (DECO). Em entrevista ao portal Esquerda.Net, Natália Nunes, coordenadora deste Gabinete, defende que quanto antes se reestruturar a dívida, mais hipóteses terá uma família para conseguir sair dessa espiral de empobrecimento.

Qual a situação de endividamento dos portugueses um ano após a entrada da troika?

Estamos bastante pior. Neste primeiro mês de 2012 verificamos um aumento significativo do número de famílias que nos bateu à porta a pedir ajuda. Aqui em Lisboa, o número de famílias em dificuldade que entrou em contato com a DECO mais que duplicou face a janeiro do ano passado. Isto mostra um agravamento da situação, mas é algo que infelizmente já estávamos à espera, dada a situação econômica que estamos a viver.

Se olharmos para as causas dos pedidos de ajuda, vemos que têm origem no desemprego elevado que temos, no não pagamento de horas extraordinárias ou comissões, nos cortes salariais. São essas as grandes causas que estão a levar as famílias a entrar em dificuldade e a não conseguir honrar os seus compromissos.

E o descumprimento do crédito da habitação acompanha esse agravamento das dívidas?

As famílias que nos pedem ajuda estão  multiendividadas e em regra têm pelo menos cinco créditos, sendo que um é crédito à habitação. E quando batem à porta da DECO, todos esses créditos já estão em situação de descumprimento, ou seja, as famílias já o deixaram de pagar. E muitas vezes é extremamente difícil encontrar uma solução, porque essas famílias já deixaram passar muito tempo e os rendimentos que têm são insuficientes para se pensar em reestruturar os créditos. Mas por vezes existem possibilidades de se negociar com a banca e existem cada vez mais famílias a tomar consciência de que não têm capacidade econômica de manter aquele crédito à habitação, de manter aquela casa, e tentam negociar a entrega da casa ao banco para liquidar aquela dívida. E porquê esta solução? Porque já tentaram colocar a casa à venda e não conseguiram, porque o mercado está parado.

Aquilo que resta muitas vezes às famílias é tentar negociar com o banco a entrega da casa, para que o valor da avaliação seja tido em conta e para que termine um dos problemas das famílias. Mas muitas vezes não termina, porque se o banco decidir negociar vai confrontar o valor da avaliação com o valor em dívida. E o que assistimos muitas vezes é as famílias a negociarem a entrega das casas ao banco mas ainda ficarem com um problema que é  a diferença do valor da avaliação e o valor em dívida.

De qualquer forma, esta solução será  preferível a deixar avançar o processo para a via judicial, porque aí a incógnita sobre o que vai acontecer é muito maior para o consumidor. Mas infelizmente, o que nós verificamos são famílias a deixar avançar o processo para tribunal, a sujeitarem-se à  venda da casa por parte do tribunal. Assim ficam sem as casas e muitas vezes ficam com dívidas enormes, porque o valor da venda da casa pelo tribunal é insuficiente para liquidar ao valor em dívida.

E não  é estranho ser uma parte interessada – neste caso, o banco – a avaliar a casa?

Claro que sim. Essa é uma crítica que nós fazemos e uma reivindicação da DECO: temos de alterar o procedimento para que não seja o banco a fazer esta avaliação, mas sim uma entidade completamente independente face ao banco e ao consumidor. Porque o que vemos hoje são pessoas em situação de verdadeiro desespero a contactarem os bancos para entregarem as casas, muitas vezes de forma errada, convictos que com a entrega da casa ficam libertos das dívidas, quando isso não é verdade. E depois é o próprio banco que vai decidir se aceita ou não a entrega da casa que vai ele também fazer a avaliação.

O que está acontecendo é  que as famílias que contrataram o crédito à habitação há  cinco ou seis anos são confrontados com um valor de avaliação hoje que é muito inferior ao do momento da contratação do crédito. Aquilo que nós reivindicamos é que esta avaliação seja feita, mas por uma entidade terceira completamente independente.

O que pode fazer quem hoje se encontra desempregado e atolado em dívidas que não vai conseguir pagar?

Eu diria que ela já antes deveria ter feito algo. Mal ela tenha informação que vai ter uma alteração do seu rendimento e se tiver créditos, deve imediatamente contactar as entidades de crédito e confrontá-los com a situação em que se encontra. Porque as entidades de crédito também têm interesse em encontrar uma solução. O que os consumidores não devem fazer – e infelizmente fazem-no – é deixar passar muito tempo antes de contactarem essas entidades, o que só vão arrastar e agravar mais a situação em que se encontra.

Se se verificar que não há qualquer viabilidade na reestruturação nem qualquer hipótese de haver uma alteração dos rendimentos a curto prazo, então o consumidor ou a família deve ponderar bem a sua situação e ver se não terá que partir para uma outra solução, que poderá passar pelo recurso a tribunal, requerendo a sua declaração de insolvência. De qualquer forma tem de ser bem analisada a situação para ver se vale a pena requerer essa declaração.

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