A organização classista dos portuários

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A estiva em nossas mãos

“Somente a união da estiva dará voz à realidade da lingada”

Fragmento do programa ‘estiva em nossas mãos’ dos estivadores do porto de Santos

Marcelo Schmidt – militante da Unidade Classista e do PCB-RJ

A ‘lingada’ é o nome que se dá ao trabalho dos estivadores no porto. Assim como a realidade da lingada determina a realidade do porto e da sua organização, a realidade do trabalho também determina a organização do mundo. No meio disso está o poder. Os estivadores portuários são a ponta da lança dos trabalhadores do porto, e o porto é a porta de entrada de quase todos os bens e mercadorias que entram e saem do Brasil. A organização destes trabalhadores não significa apenas poder de parar a classe portuária, mas significa literalmente ‘poder parar’ e poder para o conjunto da classe trabalhadora.

Segundo o depoimento do estivador Lênin Braga no seu livro “Memórias do cais, cartas de um bagrinho”, o povo trabalhador brasileiro precisa compreender a importância da categoria dos estivadores e de todos os trabalhadores que movimentam o porto fazendo girar a economia brasileira. “Estivador é operário que trabalha nos portos, no serviço de carga e descarga dentro dos navios, transportando as mercadorias ou arrumando-as. Um trabalhador no porto de Santos tem orgulho de trabalhar no maior porto da América Latina e sabe que a maior parte da riqueza do seu país passa pelas suas mãos, sabe que a economia da cidade depende muito deste porto, que tem sua própria vida”. O posicionamento do porto é estratégico como território em disputa para o conjunto dos trabalhadores, e esta disputa que começa no mar, passa pelo porto, termina com o enraizamento de pessoas e de mercadorias até os territórios mais distantes do Brasil. O conflito de classes tem no porto um importante capítulo da guerra de classes. Por isso o ataque do inimigo globalizado privado, intermediador de cargas entre governos e trabalhadores no porto é grande, e são sucessivas as leis gestadas internacionalmente para parar o poder da estiva e retirar o senhorio governamental de organizar o sistema.

O que acontece no Brasil acontece no mundo. A dispensa em massa dos estivadores na Espanha em 2019/20, trocados por ‘trabalhadores modernos’ sem direitos, formação e poder não fecha apenas as portas para a organização dos trabalhadores, mas impõe uma lógica de mecanização e robotização, de engenharia e gestão de ‘portões fechados’ para a organização do poder da estiva e abertos para a gestão capitalista. O poder popular não é entrave para a modernização produtiva, mas é entrave para a gestão capitalista.

Segue o maior ataque aos trabalhadores nos setores de transportes no presente. O objetivo da burguesia patronal no setor é varrer a organização dos trabalhadores, e ao mesmo tempo destruir qualquer presença gestora do setor público, que em quase todo mundo, serve para organizar a logística do transporte de bens e cargas nos países. A nova lei dos portos no Brasil repete todas as outras leis desde o governo Sarney: ‘é chamada de modernização’, mas quer regredir o país ao período colonial e entregar os portos ao capital monopolista internacional. Sem governo, exclusividade, trabalhadores organizados, segurança; a pauta privatizante impulsiona a ‘otimização portuária’, uma gestão maximizando o lucro, o aumento da exploração capitalista. Foi anunciada a privatização do porto de Santos até 2021, assim como Vitória, São Sebastião e Itajaí.A organização dos trabalhadores da estiva e da classe portuária enfrenta um dos maiores desafios da sua história: continuar existindo, ousar ir além e fazer isso inspirando poder para toda a classe trabalhadora. No Brasil, os sócios locais da burguesia internacional apontam o porto como um gargalo, ‘o ponto fora da linha’ da logística nacional de transportes no sistema globalizado. No país de ‘dominantes dominados’, os sócios do imperialismo são as elites dependentes locais e os atravessadores que precisam muito da destruição da força dos estivadores e portuários. O verdadeiro motivo do ataque é destruir o poder dos trabalhadores de interromper localmente a circulação do sistema mundial de mercadorias. Controlar integralmente o fluxo e a logística das mercadorias. O objetivo da defesa é o contrário: construir o contra-ataque pelo controle obreiro no porto, para além do porto, sendo co-gestor da logística e do poder estatal operário.

É neste sentido que propomos apresentar um projeto da base da estiva de Santos, que responde aos anseios da estiva no Brasil e no mundo: ‘tomar a estiva nas próprias mãos’. Enfrentar o ataque com sua própria proposta unificadora gestora do porto, rechaçar a proposta patronal apresentada pelos governos dos capitalistas; apresentar uma proposta modernizadora de construção de união da estiva e planificação nos portos; que contrataria diretamente os melhores técnicos e unificaria todos os trabalhadores estrategicamente posicionados e envolvidos na logística de mercadorias do porto. A união dos trabalhadores estratégicos a partir da união dos trabalhadores de transportes depende da unificação dos trabalhadores estivadores em Santos e no Brasil. Unificar os trabalhadores para desenvolver as forças produtivas, na gestão sem patrão; contratar os melhores técnicos, planificar os setores estratégicos, suplantar a competição do capital.

Para alcançar a vitória da unificação é preciso apresentar um projeto ou programa que unifique a atual defesa fragmentada, suplante lideranças desagregadoras e separatistas por uma vanguarda que valorize a profissão e enxergue a conexão do estivador com os demais trabalhadores do sistema. É preciso mostrar o grande perigo no projeto da nova lei dos portos, que ao contrário do que ela promete, é encarecer a logística e o transporte de bens e mercadorias que chegam às casas e nas mesas do povo trabalhador. A proposta da vanguarda trabalhadora propõe tomar ‘em suas mãos’ os problemas da profissão, do trabalho e do sistema logístico; unificar, tomar e gerir os problemas da produção e circulação de bens, mercadorias e trabalhadores do país. Organizar e tomar ‘a estiva em nossas mãos’ é um manifesto do porto, e significa construir um projeto completo, que enfrenta o problema de frente e pela base; elimina o atravessador e a competição no porto, para na sua pauta máxima gerir, controlar o sistema de ponta a ponta: o exercício do controle obreiro da produção, da circulação, e do poder popular.

Esta proposta de unificação para a luta nasce na frente dos trabalhadores de transportes no Rio de Janeiro, que na prática, vem da própria necessidade de luta dos trabalhadores no ascenso dos enfrentamentos da crise de 2008/12, mas se refinou a partir de 2016, na greve geral em 2017 resistindo às contra-reformas de ‘Temer’, e na marcha para Brasília no mesmo ano. O seu programa classista e estratégico, para além das reivindicações próprias das especificidades dos trabalhadores de cada setor é de mais longa maturação, sendo construído também como um resultado da luta nacional no porto de Santos.

Para além das diferenças entre as centrais sindicais, existe o fortalecimento do trabalho de base crítico, da formação de quadros organizativos, classistas e internacionalistas. Existe um histórico de união dos trabalhadores em transportes na ITF – Federação Internacional dos Trabalhadores em Transportes, na FSM (Federação Sindical Mundial), e no IDC – Conselho Internacional de Trabalhadores Portuários. Existe um esforço de fortalecimento e união de federações e sindicatos do setor de transportes e estratégicos no Brasil, aqueles capazes de parar a produção global localmente, e da CONTTMAF, Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transporte Aquaviário e Aéreo, na Pesca e nos Portos, uma das últimas entre as grandes confederações históricas no Brasil.

A proposta de construção de um programa unificador da classe estivadora para além da classe tem por objetivo trabalhar criticamente a base, recuperando a ferramenta sindical para a luta classista, investindo na formação política e sindical para a consciência na luta concreta na luta de classes, mas também constituir conselhos e comissões de base destes trabalhadores. Os trabalhadores nas formas mais simples e complexas disputando, negociando, assumindo poder. Recuperar ou otimizar a ferramenta sindical no ano do maior ataque à estiva, aos trabalhadores da estiva no contexto do ataque de 2020 aos trabalhadores do porto, mas também do mar é uma realidade que não pode deixar de ser confrontada imediatamente. Fortalecer a direção para a luta concreta na luta de classes, para a unidade, para a criação de poder popular.

Precisam destruir o exemplo da gestão diferente do modelo privado, paralela ao modelo Estatal, destruir o modelo anticapitalista que ousa ir além do presente modelo Estatal, no exercício de outro modelo de sociedade. Os trabalhadores necessitam da defesa organizada; o exercício de confronto do poder global-local com o poder local-global, que enfrenta o ataque com defesa e contra-ataque.

A grande derrota do projeto patronal global-local só pode ser feita por um grande projeto da classe, o seu programa precisa combinar ação organizacional federada em um grande movimento local da classe, que unifique primeiramente sindicatos e federações de transportes através de frentes de trabalhadores de transportes. Por isso o programa ‘estiva em nossas mãos’ é tão importante, porque unifica a vanguarda no porto, para além das famílias tradicionais existentes no porto, coloca o programa acima das lideranças, prepara a unificação da estiva nos locais onde o ataque está sendo gestado; avança na parte mais estratégica, constrói a proposta de unificação dos estivadores e portuários a partir das suas pautas concretas; vai além da estiva na ação concreta com os trabalhadores estratégicos, a partir do gargalo local-mundial: age do porto até a ponta.
Os patrões precisam domesticar ou destruir os estivadores, que pela força da ‘lingada’ abrem e fecham o gargalo do Brasil.

O Projeto estiva em nossas mãos é o projeto do trabalho de base crítico da unidade da estiva para além da estiva

Infelizmente este programa carece de quadros organizadores para colocá-lo em prática. Faltam quadros suficientemente conscientes, em número certo para organizar a base em torno do programa, falta a institucionalidade no programa para dar apoio logístico e suporte. A estiva tem condição de criar acúmulo e consciência, mas leva tempo; e leva ainda mais tempo para organizar para além da estiva. Ocupar o território / tempo pela organização da união e construir a consciência para o programa torna-se o desafio ideal-concreto: Construir conselhos de base, recuperar a ferramenta sindical, organizar, debater o programa por ‘equipes de vinculados’, ou ‘turma’ (equipe de trabalhadores organizados), na e para além da estiva.

Depois de unificar o programa é preciso unificar a sua divulgação, combater o déficit organizativo de quadros para explicar e debater, e de conselhos para discutir o programa à exaustão. O programa necessita chegar às bases organizadas, todos conscientemente necessitam debater o programa dos trabalhadores; que precisam estar suficientemente organizados e apoiados para defender o programa na base geral. E depois, além do porto, junto com os trabalhadores de transportes, estratégicos, conscientes, precários e periféricos no conjunto da sociedade. É preciso utilizar a estrutura sindical classista como apoio e vanguarda motorizada, blindada, móvel para avançar na estrutura logística do país. O desenvolvimento das forças produtivas requer o desenvolvimento de cada elo da produção e logística, principalmente os elos da infantaria massiva nesta guerra.

Desenvolver na estrutura móvel blindada sindical classista o apoio logístico à vanguarda e a massa trabalhadora que organiza e disputa a logística do país. Não basta recuperar a ferramenta sindical, é necessário otimizá-la para cumprir tal tarefa, torná-la classista e aportar recursos para a luta de classes. Fazer com que através dela, o programa seja debatido, estudado, emendado, modificado, aprovado nas bases organizadas, e aponte para a base geral. Que não fique dentro do muro do porto. Dar voz a ‘lingada’ é dar voz ao programa dos trabalhadores da estiva e do porto até a ponta do sistema, passando por todos os trabalhadores, inclusive aposentados e desempregados no conjunto da classe trabalhadora. Do mais fortalecido ao mais fragilizado, apoiando ‘quadros organizativos’, conselhos, com o programa transformado na base organizada, organizando a base geral.

Tudo que enumeramos já acontece e se torna concreto, mas tem dificuldades de acontecer mais vezes e melhor, mais profundamente pelos problemas acima elencados; falta o programa ser aplicado, faltam quadros suficientes para colocar em prática, estruturas capazes de apoiar sua logística organizativa, unidade classista, prioridades, dificuldades. Falta enraizar, transformar, otimizar, recuperar, constituir conselhos de trabalhadores e comissões de base, elevar a consciência geral, pelo trabalho de base crítico organizativo da base organizada; e depois reproduzir adaptando fora do porto.

Leve o tempo que levar, leve o tempo necessário. Não há tempo mínimo ou máximo para o trabalho de base crítico de um programa. Significa avançar na ferramenta sindical no apoio logístico classista, na constituição de conselhos, suprir a falta de quadros com qualquer trabalhador disponível; fazer a avaliação correta do tamanho, profundidade das bases conscientes e organizadas em toda a cadeia logística, estratégica, consciente, precária, periférica do sistema. Adequar o programa aos quadros, território e tempo.

A luta do estivador mundial tem uma grande oportunidade na luta do estivador brasileiro se o estivador brasileiro pensar como trabalhador de todo porto, para além do porto e como trabalhador mundial. O programa exige unificação da luta com marítimos, caminhoneiros, ferroviários, petroleiros e rodoviários nas cidades dos maiores portos para a construção da maior greve já feita nos últimos 50 anos no setor. O exercício desta greve é tão pedagógico como o processo organizativo de gestão do trabalhador através dos conselhos e das sucessivas bases organizadas. Faltam quadros para organizar um contra ataque que defenda profundamente, contra ataque massivamente, maciçamente. Que possa acrescentar a nova vanguarda, aumente a inserção do programa nos portos. Falta chamar a massa para recuperar e otimizar a ferramenta; organizar, e fazer conselhos para pensar o problema da estiva na raiz e nas possíveis formas de superação.

O déficit organizativo da estiva é um déficit organizativo do porto e da classe. Não se trata apenas da insuficiência de quadros, mas da sua formação qualitativa e quantitativa para a revolução, das estruturas de apoio e da verdadeira operação onde o sistema é mais exposto e frágil. Mas o maior problema imediato, que se apresenta neste ataque, é: de superar a falta de acesso ao programa nos locais de trabalho e moradia. O estivador tornou-se uma ‘ferramenta trabalhador’ integrada ao sistema; mas a organização classista libera o ‘trabalhador ferramenta’ para organizar a clássica e a nova classe trabalhadora, transforma o quadro para atacar o déficit organizativo dos trabalhadores.

Um quadro estivador possui todo um histórico e bagagem de poder geral da classe porque domina o trabalho como forma superior de organização. O organizador quadro pode apresentar a teoria, mas é o trabalhador organizado que a transforma para uso. O programa existe para resolver o problema concreto e fazer a discussão do poder na base. O quadro opera o programa da classe no cais e para além dele, agora e historicamente como o programa da base organizada, de conselhos de trabalhadores, da maturação e da tomada de consciência e assimilação crítica. A classe toma a ferramenta nas mãos, faz o contra ataque na plenitude coletiva, insurge e golpeia na parte mais sensível do sistema.

O programa da revolução brasileira foi construído na história dos estivadores, nas primeiras greves do Brasil, no trabalho do homem livre que era escravo e no trabalho do imigrante, na luta elementar do trabalho. O programa radical e revolucionário da estiva é a voz da unidade cultural e da luta popular brasileira, nos conselhos, na base, na ferramenta sindical, na classe portuária e na classe trabalhadora. Os estivadores têm experiência revolucionária, participaram da primeira greve geral, do levante popular comunista em novembro de 1935 em Recife. A excelência organizativa está na greve insurrecional para a revolução brasileira desde o ascenso anarquista, a luta por direitos, por “reformas de base”; resiste ao golpe de 1964, sobrevive, constrói uma defesa anti-neoliberal à partir dos anos oitenta, e esteve nos maiores conflitos até os dias de hoje.

A história do porto do Rio de Janeiro se confunde com a história do Brasil. Nesta história, existe uma particularidade muito especial na estiva do Rio de Janeiro: quem entra no salão nobre do sindicato verifica que todos os quadros de ex presidentes da estiva são trabalhadores negros; o que configura uma coisa quase única no contexto das lideranças sindicais e políticas do Brasil. Para você que não compreende o que isso significa, caminhe pela rua e observe o rosto da população brasileira no vai e vem pendular da manhã e da tarde no caminho do trabalho e de casa. Agora faz a mesma coisa nos espaços de poder, os espaços de liderança, dos juízes, militares de alta patente, parlamentares e governantes; nos sindicatos também, mas principalmente observe os patrões do porto, os capitalistas do Brasil. Faltam trabalhadores negros nos espaços de poder. A formação da classe estivadora no Brasil teve forte participação do trabalhador negro nos portos, e felizmente no Rio de Janeiro houve também nas suas lideranças.

Qual é o programa da luta concreta na luta de classes? Unificar a estiva em torno do trabalho na pauta concreta na luta de classes e valorizar sua história de poder; derrotar os patrões e o governo, se defender organizadamente do ataque, preparar o contra ataque, como ponta de lança do projeto classista de unificação dos trabalhadores de transportes, estratégicos, e do conjunto da classe trabalhadora, para lançar uma contra ofensiva combativa, unitária, classista, internacionalista pela própria natureza do porto.

O programa da classe tem no programa da estiva um passo concreto, na necessidade de rodízio das lideranças sindicais para que estas estejam mais próximas do trabalho e das necessidades diárias do trabalho, na constituição de conselhos de trabalhadores, para que a ação da direção seja ampliada pelos conselhos, pelos próprios trabalhadores organizados, e por fim pela liderança sindical renovada. O exercício de criação de poder popular, portanto, nasce da necessidade imediata de trazer a direção para a base, para que esta veja a direção diretamente na base como forma superior da sua representação.

O programa é maior do que qualquer representação. É pelo programa mais específico que se constroem as grandes bandeiras da classe trabalhadora. Os quadros organizativos, aqueles que debatem o programa na base precisam estar à altura da sua defesa, o programa na forma de defesa prepara o contra ataque, surpreende, enfrenta o inimigo com uma estratégia de defesa profunda, para quando o inimigo pensar que venceu encontrar mais gente para defender, para quando cansar diante da defesa, ter pela frente um maior contra ataque, parando seu ataque, derrotando suas forças locais, através do programa da estiva, do porto, do transporte, dos estratégicos e da classe trabalhadora. O programa da estiva obriga a adaptação, a descer ao porão, praticar, lingar, cooperar. O programa da classe necessita incorporar para suplantar o atacante.

A resposta final está na ação paciente da vanguarda inserida na classe, pelos conselhos, pela ferramenta sindical no programa, na linha do programa; para a base geral dos milhares de estivadores, do fórum local de sindicatos das cidades do entorno do porto, dos movimentos populares e de juventude; aglutinando a esquerda socialista, para operar a criação de poder popular; construindo união nos Estados, como uma frente estratégica construindo greves de solidariedade e políticas a partir da estiva, do porto de Santos, do Rio de Janeiro, do Brasil. Enfrentando o déficit de organização pela ação, compreendendo as deficiências organizativas da base, conselhos e ferramentas sindicais.

A especificidade do porto de Vitória. Se o capitalismo não possui um plano B, mas possui apenas um movimento de ataque direto e de expansão em direção ao mundo do trabalho, o exercício maior é o da defesa, da defesa organizada. Mais do que a exclusividade, os capitalistas querem destruir o exercício de poder. No porto de Vitória, os estivadores ao longo de muitos anos de luta na última síntese de lutas, conseguiram agrupar esforços e ocupar espaços no porto organizado público e disputar no porto privado. Segundo lideranças locais, a experiência do ‘Porto Céu’ se mostra uma experiência de gestão direta e de controle obreiro dos estivadores e portuários através dos sindicatos. A experiência cooperativada e assemblear, e o exercício de poder direto de gestão ou controle obreiro se configuram hoje, na falta do ascenso revolucionário como a experiência de maior exercício e criação de poder popular, ao lado da recuperação e otimização das ferramentas sindicais, da organização e educação das bases e da formação de conselhos de trabalhadores. Acabar com o atravessador no porto é um exercício de pauta máxima dos estivadores, mas organizar a base é a tarefa diária.

Outro ponto muito importante é quando a formação dos trabalhadores é feita pelo sindicato ou estimulada ou patrocinada pelo mesmo, que acompanha a excelência do trabalhador, e faz na prática, que toda a intermediação do trabalho, passe pelo controle sindical, obreiro assemblear, da contratação, da demissão, da formação, e da excelência operativa se já feita diretamente pelos trabalhadores. É muito importante a experiência de Vitória, que faz com que ‘o bafômetro’ no porto seja da responsabilidade do sindicato no controle da qualidade do exercício da mão de obra e não do patrão. Quem controla a qualidade do trabalho é o poder do próprio trabalhador. É objetivo controlar a multifuncionalidade. A escalação feita por aplicativos sob controle dos trabalhadores no sindicato significa também controle dos trabalhadores por sobre a tecnologia do sistema. Quando os próprios trabalhadores controlam todos os processos do trabalho, o exercício do controle obreiro controla também os níveis de saúde, da produção, da organização e da luta dos trabalhadores porque todos estes pontos se comunicam.

A teoria geral da organização precisa compreender a teoria específica da organização. Como os quadros organizativos se submetem a base organizada e esta se submete a base geral onde a teoria é transformada. Existe uma enorme urgência organizativa diante do ataque inimigo; e ao mesmo tempo, diante do déficit organizativo. Mas somente o paciente, doído, diligente e disciplinado trabalho de base crítico pode gerar frutos e quebrar a fragmentação portuária na unidade classista da estiva, quebrar a fragmentação da estiva pela tomada da estiva por cada estivador. O trabalho institucional é complementar e o processo de renovação das lideranças, a consequência. A ferramenta sindical será recuperada e otimizada pelo projeto se as etapas não forem queimadas: Programa, conselhos, quadros, prioridades, base organizada e geral, sindicato classista.

Unir no programa com todo aquele que enxerga a urgência; sim, não se pode lamentar unir com a oposição para melhorar o programa. Unir neste momento de ataque direto significa unir no programa, nos conselhos e discutir o programa; organizar, otimizar a ferramenta sindical e o controle da logística no caminho de interiorização deste processo que vai dos estivadores e aponta para o Brasil. É preciso casar o trabalho de base crítico, com o trabalho institucional, internacional; isso é a estiva em nossas mãos. É urgente ‘o programa’ maior que o programa da estiva, e aplicado como programa de toda classe.

Desde os anos oitenta, ou seja, nos últimos quarenta anos, o ataque à classe portuária é uma realidade, o presente deste sistema é o ataque, tendo faltado um programa para a defesa organizada e revolucionária. No momento em que mais um ataque tramita no congresso nacional o objetivo é quebrar a defesa e a força dos trabalhadores do setor durante a pandemia de covid 19. Ao longo dos anos a defesa da classe portuária se adaptou, institucionalizou, obteve vitórias; porém insuficientes vitórias fragmentadas, atomizadas, sem renovar suficientemente seus líderes, e sem um projeto de defesa classista para além da atuação por dentro dos muros. O olhar para os trabalhadores do porto foi o olhar pra dentro da automação e perda do trabalho, mas a solução é o controle político do processo logístico. Trabalho e poder para todos. Diante da crise pandêmica como crise do capital, a resposta correta é controlar a organização produtiva.

Existe um enfraquecimento da capacidade da classe portuária de parar o país que não reside apenas na sua fragmentação, hoje a capacidade de parar o país está compartilhada com os demais trabalhadores de transportes e estratégicos. Ao mesmo tempo, a despeito de recordes no movimento de cargas nos portos, inclusive durante a pandemia, há mais de dez anos o salário, o trabalho e o poder dos estivadores só despencam; se uma razão é a divisão e o sectarismo de direções isoladas, a outra razão é a incapacidade de conectar a luta concreta com a luta estratégica e classista na luta de classes. ‘Estiva nas mãos’, não pode ser apenas da estiva, mas objetiva conectar o concreto com o histórico.

Para além da obtenção de um plano de saúde e da segurança existe um projeto de poder. Toda melhoria social, estruturas, direitos e até os instrumentos de cidadania de uma cidade portuária, saúde, educação, transportes, etc tiveram a participação da luta dos estivadores, o acúmulo da luta dos trabalhadores do porto. A melhoria social da cidade foi possível por causa da luta coletiva e da participação de um pequeno número de trabalhadores comparado ao número de habitantes da cidade. Grande parte dos avanços possíveis se deve a luta coletiva e classista nas cidades portuárias que precisa retornar. Os estivadores são aqueles que se referem a eles mesmos como aqueles que se orgulham da profissão. Aqueles que colocam o colete no trabalho, mas os usam nos protestos de rua, porque existe um longo caminho para que a profissão tenha o valor que deve ter.

Do lado contrário, existe uma nova cultura no porto de ‘cada um por si’, ela corrói todo ganho acumulado que os estivadores e portuários já conquistaram, isso ganha corpo desde o golpe de 1964 piorando a vida e envenenando os trabalhadores do porto. Os que envenenam o trabalhador no individualismo também criam uma unanimidade: O porto é caro no Brasil, o trabalhador ganha mal, e paga-se bem o atravessador do porto. Os patrões dizem que o valor do trabalho do trabalhador TPA é caro, mas o lucro deles é o valor não pago ao estivador, e propõem afogar os TPA no mar da precariedade. O porto é caro por causa do patrão, dos atravessadores patronais; se o porto fosse comandado por cooperativas e os mais preparados técnicos fossem contratados sob poder dos trabalhadores tudo seria barato inclusive o porto. Eis a questão chave do poder gestor.

O maior desafio do estivador portuário é levar adiante o seu velho projeto histórico, de controlar a admissão e a demissão dos trabalhadores, o controle obreiro, o controle dos portos, o de serem ‘trabalhadores sem patrão’. Não existe possibilidade de avançar sem recuperar a unidade dos trabalhadores da estiva e para além da estiva. Tudo foi feito com unidade. A história local da sociedade é a história da construção da união da classe.

Compreender o estivador é compreender a natureza do seu trabalho no porto. O desafio que se coloca é a transformação do amor pela profissão, pela classe estivadora em amor pela classe trabalhadora. Outro desafio é a compreensão de que o porto organizado pelos trabalhadores é um porto sem precariedade, sem trabalhadores ‘cadastro’, mas um porto onde todos sejam ‘registro’; ousar construir e lutar por trabalhadores gestores, um porto sob controle dos trabalhadores sem intermediários e sem patrões. Um porto humanizado onde a máquina serve à classe trabalhadora, com a cidade e o porto sob controle obreiro.

A história do porto na luta de classes é a história do ataque patronal e da defesa dos trabalhadores

Durante a pandemia de covid 19 a autoridade portuária sob as ordens da patronal olhou o trabalhador como um corpo estranho na operação portuária. Perguntamos-nos se foram fornecidos os EPIs corretamente nos portos. O ataque aos aposentados, aos ativos de mais de 60 anos que são a referência foi um ataque ao conjunto. Desde o governo Sarney que a ‘modernidade’ intensificou seu massacre, quase todas as leis retiraram direitos e atacaram a unidade dos trabalhadores; com o poder patronal aumentando em todos os governos até nos mais populares. Hoje a pandemia provou que o patrão portuário não tem qualquer responsabilidade social. Seu egoísmo é o lucro. No momento de maior lucro, superexposição e superexploração, o governo tenta sacar o direito de greve. Mas hoje também existe a solidariedade da classe e da família portuária, com todos que se cotizaram para ajudar quem ficou sem trabalho.

O maior desarme dos últimos 40 anos é a maneira com que o estivador encara ser massacrado pelo sistema, como vai sendo influenciado, desorganizado, e amansado para acreditar no sistema; abandonando a união e a revolução como forma organizativa vitoriosa para os trabalhadores. As velhas formas de acomodação defensiva desarmam; a nova lei portuária é o ataque do governo patronal, do Estado patronal, então como acreditar nesta forma defensiva? O patrão e os governos nus necessitam o contra ataque direto, poderoso e massivo que só o conjunto da classe dará pela greve insurrecional e o trabalho de base crítico. Não é somente na hora que se mexe diretamente com os direitos da classe estivadora que se deve agir, mas antes, durante e depois construir a defesa e o contra ataque na guerra de classes. Os estivadores, os portuários já fizeram uma greve mundial na categoria, isso mostra a importância, posição estratégica e força.

Não adianta parar o porto e nem todos os portos sozinhos, como ficou evidenciado na recente greve dos correios. É preciso uma greve geral com os dispostos a lutar pelas pautas específicas, mas também contra o ataque que começou na crise de 2008, no bojo do ataque neoliberal e suas reformas que retiram direitos nos últimos 40 anos. Construir uma greve impactante como objetivo final. Precisa conscientizar antes. Os patrões brasileiros são dominantes dominados internacionalmente, se o porto funcionar, se encher navio, se tiver lingada nada muda. O trabalhador quando entra de cabeça e acredita nas leis do sistema tudo fica mais fácil para o patrão, porque ele controla o parlamento, o governo e as leis.

A cabeça brasileira patronal no porto é a cabeça do senhor de escravos. Quando este se torna capitalista não perde sua condição de senhor apadrinhado do poder, e quando moderniza a exploração o faz como elite nacional colonial dependente. No porto e no Brasil o trabalhador é a parte da equação que se corta. Se na origem o problema era a falta de mão de obra portuária especializada, para a elite hoje, o futuro é a redução de custos e automação com uma nova mão de obra especializada. No meio temos um porto mecanizado explorando a mão de obra ‘porque o atravessador tem que ganhar’. O porto nos ensina explicitamente porque o patrão é dispensável e como o portuário ganharia mais se o patrão fosse ‘dispensado do porto’, com a classe trabalhadora no Estado operário, na forma de cooperativas estivesse cogerindo a autoridade portuária operária.

O patrão continua roubando o mais valor da mão de obra, mas agora leva também a terra pública nos portos. A grilagem junto com a superexploração é o roubo duplo, do bem público, da coisa pública e do trabalho precário nos portos super explorados. A falta de operação planejada no porto joga nas mãos do Estado a bagunça, e faz o trabalhador trabalhar mais ganhando menos. Hoje o Estado é o operador número um; e amanhã a solução é ‘acabar com a burocracia’ acabando com o operador ‘Landlord’ estatal do porto, mas sem tirar a obrigação do Estado de socorrer eventual prejuízo, que será pago pelo povo trabalhador na sociedade. O privado não pode ser ‘síndico’ e muito menos planejador da logística. O programa dos trabalhadores propõe o controle estatal, o controle estatal operário e o controle obreiro dos portos. Desde o início no Brasil a operação portuária ‘foi coisa de amigos’, está na hora de deixar de ser amiga do capital.

O imperialismo não coloca sua própria sorte nem seu sistema logístico nas mãos do privado, se este não estiver sob seu controle ‘landlord’. Mas nos países periféricos o imperialismo tem seus ‘sócios locais’ nas republiquetas bananeiras para impedir o controle popular local. A pressão privada começa nos anos sessenta e se intensifica nos anos oitenta, que troca o modelo estatal da ditadura pela ‘liberdade do neoliberalismo’. Os atravessadores logísticos apadrinhados causadores do gargalo logístico vociferam soluções para retirar o porto público, ocultando que eles mesmos contribuíram para o seu estrangulamento. Mas enquanto existir estrangulamento logístico, este pode servir ao controle obreiro e desenvolver as forças produtivas no porto. É possível enfrentar os patrões e a privatização criando uma ‘Termópilas no porto’, uma batalha onde um pequeno grupo pode parar o projeto do capital. O limite da luta está além da negociação, se as forças vitoriosas compreenderem sua posição estratégica no sistema. O problema central é a criação do poder em torno do respeito da profissão pelo próprio trabalhador.

Lutar, pelo trabalho de base crítico, significa acabar com a ilusão de que o patrão precisa ganhar para ‘eu ganhar’, o dar lucro para o empresário para que eles possam repartir o bolo; enquanto isso o estivador só faz perder. Agora querem retirar o direito ao trabalho. Chegou o momento de o trabalhador determinar seu próprio salário na cooperativa do porto. Quem tem que controlar o trabalho no porto é o trabalhador no porto. Quem tem que negociar a carga no porto é o trabalhador, através do seu governo no Estado operário, este tipo de ousadia precisa voltar a ecoar na beira do cais. Na própria formação da profissão a ousadia precisa estar presente. A mesma formação de excelência para manusear a carga precisa ensinar a fazer o sistema fluir e a fazer parar.

Hoje a luta não é possível apenas nos limites do capitalismo. A pandemia provou que quando o sistema retira o trabalhador da equação a soma se torna zero, não existe produção. Estes argumentos são irrefutáveis, mas somente se houver a formação dos trabalhadores para apresentá-los. Por isso o porto precisa estar sob controle obreiro; sua formação, produção e gestão sob controle do Estado e conselhos e cooperativas que se exercitam na criação do poder popular. A transição é a disputa do governo do porto e do Estado no porto. Através do controle obreiro e estatal administra-se a transição e o saber da utilização da máquina, o fazer da máquina humanizada e também o domínio da máquina, planejando e planificando a poligonal; otimizando o trabalho, a máquina e o desenvolvimento das forças produtivas. Para não perder seu trabalho, o estivador precisa tomar o porto nas mãos. Descobrir que o único valor zero na soma do porto é o patrão.

O poder do patrão é internacional e a sua resistência também precisa ser. A luta do estivador é igual no mundo como a luta dos ‘dockers’, pelas normas, pelas leis e pelo poder dos estivadores e portuários. A solução é a luta por uma única lei mundial, são as normas internacionais de proteção, a luta internacional e local por uma classe e poder. É fundamental ensinar o trabalhador a ser amigo da sua profissão e da classe a partir do controle da estiva em suas mãos, e que para além das suas mãos está toda a humanidade.

O grande passo educacional não é a defesa da profissão apenas, mas a defesa do poder / gestão do porto. Mas para exercer o poder local é preciso um programa classista que aponte para o exercício do poder global brigando por um único acordo coletivo global. Se o estivador e o portuário são os mesmos também poderia ser o seu aprendizado: da profissão e do poder. A diferença entre os trabalhadores é o acesso à informação para poder brigar pela profissão e a consciência do seu poder. O estivador através da sua cooperativa, sindicato, empresa sob controle obreiro aprenderiam a negociar com quem traz a carga sem atravessador, pelo controle gestor e obreiro da classe trabalhadora.

No caminho do trabalhador na estiva e no porto existe o patrão. O patrão é inimigo da Cipa, da saúde, da organização, do salário e do poder de compra; inimigo da cidade, dos direitos, mas também do aprendizado profissional, porque ama a ignorância do peão. É preciso aprender a comandar a estiva e a comunidade através da prática coletiva e humanizada. Um exército de profissionais que o patrão reclama de pagar 3,5 salários, enquanto no resto do mundo um ‘bagrinho’, trabalhador novinho ganha até 30 salários. O lucro é do patrão. Não existe prejuízo no Porto, mas ‘trabalhador e governo perdendo e intermediários ganhando’. No pico da pandemia nunca se movimentou tanto dinheiro ou poder.

No caminho da formação do trabalhador também existe o patrão, porém existe um mundo de possibilidades para o trabalhador se ele ousar compreender a sua condição de classe. O patrão no auge de uma safra faz corte no porto, então ele não será parceiro de qualquer formação que não seja fundamental para reproduzir a produção. Somente o trabalhador pode controlar, financiar e operar uma formação emancipadora, fazer os investimentos em cursos trazendo mais saber e mais poder; mais saúde e fluidez no porto. Ensinar que a operação da estiva é excelência, que o trabalhado no porto não é repetitivo, mas alia a técnica com a improvisação baseada na experiência do saber no porto. O que o patrão quer retirar, com suas metas absurdas e impossíveis de lucro, o estivador não pode dar, ninguém vive humanamente sem trabalho. No porto cada dia é diferente, requer adaptação, profissionalismo no caleidoscópio das atividades. O mundo não existirá sem máquinas, mas aquele que opera a máquina com excelência e faz dela parte do seu corpo é como Mozart, Einstein e Pelé; um presente para a coletividade, que somente existe quando se aprende em conjunto com milhares de horas de treino.

A luta para passar de cadastro para registro começa na formação e continua na educação para a luta de classes. Hoje o dinheiro da formação do estivador e do portuário precisa ter o controle do trabalhador; auxiliado pela marinha, a administração portuária e o controle do sindicato; assim como no modelo dos trabalhadores marítimos olhando para a sua formação, com força política e amor pela sua profissão. Quando a universidade do trabalhador do porto for uma realidade, o estivador vai passar pela porta e colocar a multifuncionalidade sob controle obreiro e não empresarial, o Estado sob controle dos trabalhadores, e o sindicato sob controle dos TPA. O trabalho deve servir aos trabalhadores sob o sindicato, nos conselhos e a gestão portuária sob os trabalhadores. Só existe estiva e qualificação se a estiva tomar o trabalho nas mãos. Falta um plano de carreira como proposta dos trabalhadores contra a própria precarização, tudo educação, política e o trabalho. O patrão só vai ceder se for obrigado pela força organizada.

Apresentar o programa ‘estiva em nossas mãos’ é construir pontes de diálogo no mais local com olhar para o mundo (local-global), para enfrentamento local-global contra o maior ataque à estiva e à classe trabalhadora, mas a união não pode ser a qualquer custo. O custo da derrota inimiga não deve superar as possibilidades da maior vitória, que é construir o mundo novo socialista. Qualquer vitória precisa somar para o poder popular.

O capitalismo nasceu tanto nas fábricas como nos portos e reina no mundo onde seu ataque não para. O mundo real ainda é comandado pelo sistema capitalista e o sistema capitalista precisa dos portos para funcionar. De acordo com estudos e fontes dos próprios patrões, os capitalistas prevêem aumentar a capacidade do porto de Santos em 50% de 160 milhões para 240 milhões em 20 anos. Outros estudos, falam de sair de 140 milhões para 215 milhões de toneladas em 2040. Os patrões querem chegar a isso aumentando a participação da ferrovia de 33% em 2020 para 90% em 2040. Fazendo o porto de Santos chegar a 100% da região de influência, gerando 2400 postos de trabalho em terminais, mas que tipo de trabalho? O crescimento do patrão é com precariedade.

A capacidade ferroviária de Santos é de 50 milhões de toneladas e hoje em 2020 se movimenta 45; a malha paulista 35 milhões de capacidade, a malha sudeste 10 milhões. A ampliação serra acima visa atingir a meta da malha paulista de 100 milhões de toneladas, mais o que puder se atingir na malha sudeste. Desta forma, retornamos ao século XIX onde toda expansão ferroviária e portuária na colônia visava atender o interesse do império colonial. O objetivo da patronal sócia menor no imperialismo é adequar à capacidade do porto nesta nova realidade; onde o porto se junta à ferrovia atingindo a marca de 100 a 120 milhões de toneladas por ferrovia, integrado na cidade de Santos, com investimentos de mais de 2 bilhões de reais nos próximos 5 à 10 anos.

A patronal almeja o desenvolvimento ferroviário e portuário para a carga de Santos. Os patrões são tão egoístas que no projeto não cabe um único passageiro. De novo, é como se tivéssemos andado para trás 200 anos, no que se refere ao passageiro, “que desçam a serra de mula”. O planejamento de mercado abocanha parte de tudo que entra e sai do Brasil. Se os patrões pudessem abocanhavam o ar. O medo patronal é ver no porto de Santos o gargalo do sistema ferroviário então pensam resolver isso na margem esquerda do canal do porto. Mas isso abre uma oportunidade, conhecendo os planos do inimigo fica mais fácil assumir e bloquear “a margem esquerda” do conflito de classes. O medo patronal é a perda da competitividade no maior porto da América Latina e do hemisfério sul. O trabalhador deve encarar esta oportunidade estudando a logística do sistema.

Um governo patronal não pode olhar a logística como um todo porque está atendendo as necessidades patronais que são da minoria. A patronal quer assumir o governo logístico para que a prioridade seja mais lucro. Um plano logístico geral não cabe na proposta patronal porque um porto vai acabar competindo com o outro. O modelo ‘novo’ significa transformar o país inteiro nos portos privados que já existem, cada um cuidando do seu interesse particular e a patronal ganhando mais dinheiro, o trabalhador perdendo, e o governo do lado de fora até tudo colapsar. Se não der certo o Estado paga a conta, e se der o lucro fica privado. Um planejamento portuário correto precisa olhar a poligonal, o porto organizado, a profissionalização dos trabalhadores para assumir o controle público, privado, dos retro-portuários. Em 2019 houve no porto de Santos – 58 movimentos diários ou 12850 por ano. Em 2024 serão 54 movimentos diários e 11700 no ano, mostrando uma diminuição; diminui porque cresce o tamanho dos navios.

A patronal portuária, a FENOP Federação nacional das operações portuárias e seus ‘parceiros’ têm solução contra o atraso da modernidade e farão o porto ‘competitivo’: Vendendo o espaço público do porto a partir de uma bela ‘marquetagem’. O tal plano de ‘marketing’ inclui os trabalhadores como uma fazenda de café incluía seus escravos no século XIX, assim está ‘a venda’ dos portos no Brasil. A tal da ‘venda do patrimônio’ da sociedade visa colocar o porto no século XXI, ágil e integrado como no século XIX. A receita de aeroportos que se tornaram ‘shoppings’ cheios de lojas e vazios de aviões.

Neste sentido o patrão tem uma resposta: vamos melhorar a logística e o tempo da operação pela otimização e melhora do sistema de transportes; obviamente sem perguntar aos trabalhadores do porto e aos demais trabalhadores de transportes. Em todo o planejamento o trabalhador só aparece como custo. Nunca como trabalhador criador de riqueza e muito menos como gestor. Os patrões não podem fazer o porto funcionar sem os trabalhadores, mas os trabalhadores podem fazer o porto funcionar sem os patrões. Este é um mundo ao inverso, onde o porto funciona com o trabalhador, mas é dirigido pelos patrões. Portanto, a verdadeira pergunta que se coloca é como o trabalhador dirige o porto através da consciência, do conhecimento e da experiência.

Por um bom tempo o sistema precisará transportar grãos e quem manuseia grão no porto é estivador; por um lado, o sistema vai ter que lidar com estivador até que tudo seja automatizado. Privatização significa capitulação e a resposta de luta é um programa que ataque o problema na raiz. O estivador trabalhador consciente precisa tomar para si o porto até o dia em que tudo será automatizado. O tempo do trabalho de base crítico é o tempo do avanço do ataque que visa eliminar completamente o custo /trabalho, leia-se OGMO, organização da mão de obra portuária no porto organizado. O território desse enfrentamento é dentro do muro do porto e para além do porto. Não há muito tempo.

O estivador já está consciente da luta, mas ainda muito ‘tomado de surpresa’ com o ataque. ‘Nunca temos paz, quando teremos paz’. É o que se ouve na estiva, percebe-se o misto de raiva e de cansaço. Ao mesmo tempo em que brigam para que o portão do porto não seja fechado na cara da estiva, a defesa precisa canalizar a raiva, organizar a vanguarda, e dar ânimo novo ao espírito de luta histórico da classe estivadora. De um lado o programa precisa ser conhecido, do outro os patrões correm para que navios com menor e maior calado atraquem no porto. Agora querem navios de 22 mil contêineres e de calado alto atraquem no porto, amanhã eles vão querer o dobro com a metade dos trabalhadores. O problema da segurança é um problema que não pode ser resolvido. ‘A medida tomada é limitar o uso de celulares para que todo este processo de desgaste humano e maquinário não sejam filmados e registrados’. Vamos explicar porque a classe estivadora, portuária e trabalhadora precisa fiscalizar a produção: para não acidentar e para não morrer. A proposta patronal para a estiva é continuar a superexploração até o fim.

Nas palavras do estivador Simão militante e estudioso da estiva e do porto: “O processo de automatização passa a quilômetros da realidade portuária. Importante ferramenta de convicção. Num roteiro de ficção científica que se vende para a sociedade local. Numa linguagem liberal argumentada nas salas e nos bares como verdade absoluta. Num porto onde o seguro é para a carga e não para o ser humano. Os estivadores dedicam parte considerável de suas existências trabalhando, militando, o mecanismo de exploração do trabalho através da extração de mais valor”.

Não existe o trabalho sem o estivador e o portuário, mas é contra ele o ataque que adoece, explora, acidenta e mata. E toda a eficiência é um jogo ganho para quem controla e conduz o processo de operação portuária, e todo acidente tem uma causa humana e cai na conta do trabalhador. A falta de eficiência e as falhas são humanas da classe trabalhadora porque ela se posiciona como elo fraco na equação. A resposta da classe estivadora, portanto, precisa tornar o elo fraco em elo forte com todos os trabalhadores do porto, do transporte, estratégicos, conscientes, da massa trabalhadora, precária e periférica. O elo fraco precisa ser elo forte da corrente do poder operário.

Não existe colaboração nem sociedade com a patronal porque ela não é sócia na doença, na exploração, no acidente e na morte. A família portuária pode ficar com a cadeira patronal vazia. O programa precisa apontar objetivos imediatos, mas também históricos. Alem disso, qualquer mudança que ataque seus privilégios são enfrentados pelos empresários com o grito: ‘vamos respeitar contratos assinados porque é a lei do mercado’, mas os trabalhadores somente têm uma única saída: vencer a patronal. Colocar no seu horizonte o seu controle político do porto. Aprender a confiar na operação portuária em suas mãos, planejar e planificar, aprender a mandar na confraternização e na disciplina da sua sabedoria, gerir o porto pelo seu controle, e abolir a presença da patronal, abolir a ‘investidora’, abolir o controle do capital.

A história da estiva tem um horizonte do poder ou a aniquilação, ainda que na transição e na construção do poder da estiva para o poder popular precisemos verificar a velocidade desta operação. A velocidade é lenta, mas pode ser apressada no calor das lutas. O verdadeiro desafio se coloca da seguinte forma: diante do ataque patronal a saída é apresentar uma defesa organizada no porto organizado. Buscar o enfraquecimento inimigo, apresentar um contra ataque organizado cessando seu lucro e atuando no gargalo. Por fim a construção classista, construir o poder paralelo na base, um contra ataque maciço através da greve insurrecional, sob o conjunto das forças estratégicas ao lado da vanguarda, o longo caminho da estiva só pode parar no fim.

O lado patronal já enfraqueceu os marítimos, aniquilou a hegemonia ferroviária, e debilitou fortemente os trabalhadores da aviação; contribuindo também para o esfacelamento dos caminhoneiros e dos trabalhadores rodoviários. O alvo imediato é o porto, mas prepara-se um ataque frontal à representação petroleira, velado aos marítimos, e direto contra trabalhadores da Eletrobrás e dos Correios. Ninguém pode enfrentar a patronal sozinho sob pena de ver suas forças serem completamente vencidas. O escárnio é tão grande que um dos projetos de ‘estudo da patronal’ copia o ‘Porto Gente’. Os patrões querem ‘uma visão de Porto’ como antigamente, com menos direitos para os trabalhadores, e estes completamente ausentes do processo decisório. Os patrões querem no porto um grande fazendão colonial onde o Estado os dá dinheiro para organizarem os peões ‘libertos’ das amarras do OGMO e da organização centenária, para que abracem a ‘modernidade’ do mundo sem direitos, contrato, registro, cadastro, um porto aparentemente ‘não organizado’, mas muito bem organizado pelo capital.

Os capitalistas no porto querem um planejamento organizado na forma de um porto não organizado onde só tem um senhor: o patrão. Um grande patrão para gerir uma multidão de TUPs, terminais privados, que aparentemente competem entre si, como lobos de uma mesma alcatéia pelo mesmo butim. Um planejamento privado “a la gestão estatal” (planejamento e repressão dos trabalhadores), onde o Estado paga seu ‘sócio’ para que ele opere com liberdade a gestão do sistema mundial localmente. Este processo não é novidade, ele começa com estradas, aeroportos, em uma ‘cesta de desestatização’, concessões, tudo que fuja da palavra privatização, até que ela possa ser gritada na praça. A secretaria de portos já em 2013 era ‘poder concedente’, como nos aeroportos, ferrovias e rodovias, tudo com gestão privada e domínio privado na forma de PPP parcerias público privada. Mas aquilo que aparentemente traz em si muita força, também tem muita fragilidade. O terminal de Santos é estratégico para a balança comercial, portanto, o conjunto dos trabalhadores estratégicos pode causar mais danos.

“A partir da promulgação da nova lei dos portos número 12815, de 2013, várias mudanças foram promovidas nos portos brasileiros, competitividade, modernização e redução no número de estivadores”. Mas também a partir da crise de 2008, e do ascenso das lutas de 2012-2013, houve um aumento da organização da luta na estiva e uma renovação para a luta concreta na luta de classes, o que cria poder e esperança. Hoje o TCU, tribunal de contas da união e MPT, Ministério público do trabalho se digladiam pela forma da privatização dos portos, o olhar do ministério público mais condescendente com os trabalhadores TPA, citando a constituição federal, leis portuárias, convenções da OIT, como a 137, a NR 29 do antigo ministério do trabalho, mostrando que o TCU que ‘morde e assopra’ é parte da estrutura patronal e tem lado. Não existe trégua ou paz no cais, sob ataque a estiva agora é “categoria essencial”.

O novo sindicalismo, com sua prevalente forma organizativa montada nas fábricas e na metalurgia automobilística do ABC paulista assiste a mudança da classe trabalhadora, e do desafio da sua organização como um enigma a ser decifrado. Diante disso, os trabalhadores estratégicos dos transportes, do petróleo e os trabalhadores soldados estão trabalhando mais e mais depois da crise de 2008, e da pandemia de 2020. Os estivadores portuários estão sob grande pressão e sentem diariamente como a economia não parou durante a pandemia, longe disso; na mesma hora que recebem um forte ataque.

O governo baixou uma MP (medida provisória) que “modifica” a greve do setor durante a pandemia. A intenção do governo é fazer passar a nova lei dos portos que visa substituir o sistema de ‘landlord’ estatal por uma administração privada nos portos que não tem paralelo no mundo. Isso como cavalo de Tróia para destruir qualquer possibilidade de controle. É como se o Estado saísse e só voltasse para pagar as contas. Este segundo ponto é destruir o poder da estiva no seu controle do próprio trabalho, destruir o seu exemplo de rebeldia, e finalmente controlar um possível foco de insurgência em um setor muito sensível à interrupção do trabalho nas engrenagens do capitalismo. Tudo se resume ao poder de fazer produzir e circular bens, pessoas e mercadorias sem travas.

Unidade ou perecer. O trabalho das federações é a unificação de maior abrangência no setor. “O isolamento é a morte” segundo Ernani Duarte, presidente dos estivadores do Rio de Janeiro: Retirar os mais fortes de uma falsa particularidade e isolamento, e os mais fracos da fragilidade. Homogeneizar a luta da estiva e dos portuários seguindo o movimento mundial de unificação, mas não se esquecendo da ‘sabedoria da estiva’, ou das especificidades de cada função no porto presentes nas intersindicais. O sindicalismo unitário moderno requer uma federação unitária forte como interlocutor nacional e internacional da luta dos trabalhadores sem anular as particularidades dos sindicatos na base que podem politicamente exercer a sua vinculação que mais serve a organização de base. É tempo de passar por cima de possíveis diferenças, inclusive de finanças / dívidas e colocar todo esforço em um único lugar de mais ênfase na arrecadação do que nos gastos ou nas dívidas. Unificar todas as diversidades restaurando o poder central.

A política da federação precisa ser a unificação fazendo respeitar as decisões colegiadas. Unificação com respeito aos sindicatos menores, mas valorizando um melhor trabalho nos lugares onde o sistema capitalista pode sofrer um maior impacto devido à capacidade local de parar o sistema mundial. É importante o objetivo de pauta máxima de poder, mas será necessário abandonar velhas formas anacrônicas de privilégios do passado. É papel de uma federação incentivar os chamados ‘cinturões’ das regiões, sudeste, nordeste, sul, etc cujo objetivo é não deixar que as especificidades regionais dos trabalhadores sejam usadas pelos patrões para dividir os trabalhadores, enfrentar a precariedade na força unitária, autônoma, a greve de impacto, na construção do PUA pacto de unidade e ação e do CGT comando geral dos trabalhadores, e manter a tarefa institucional diplomática na secretaria dos portos.

Uma das três federações do setor, a Fenccovib é a federação representante dos arrumadores, conferentes, trabalhadores de bloco, consertadores, vigias, e amarradores de navios; todos muito parecidos com os estivadores, como se fossem uma grande família, uma grande classe no porto. De acordo com Mário Teixeira, presidente da federação, “depois da lei 8630/93 houve um retrocesso, uma desunião entre os sindicatos na negociação coletiva, aquilo que era organizado na forma de negociação nacional e acordos coletivos de âmbito nacional, tornou-se estadualizado fragilizando a unidade. Os patrões comeram os sindicatos um por um. O problema do portuário hoje não são as leis. A 8630/93, a convenção 137 da OIT de 1993, a lei 9619/98, a lei 12815/13, e agora a lei 1447/20. O grande problema é a falta de unidade, é preciso unir o porto, os portos. Mas esta união precisa recriar o PUA a partir dos transportes e o CGT”. Existe uma crescente aproximação entre as federações. Já existia uma maior aproximação entre a FNE, federação histórica dos estivadores e a FENCCOVIB, a outra federação, FNP (Federação Nacional dos Portuários) se aproxima ainda mais agora.

As federações portuárias, as três, unificadas, lançam um manifesto sobre a privatização dos portos. Neste nosso estudo não objetivamos falar das particularidades de cada categoria no conjunto da categoria portuária, mas é importante dizer que, os ataques da patronal objetivam e tem se mostrado muito competentes até o momento em: eliminar quase que por completo os trabalhadores envolvidos na administração pública do porto; almejando ou eliminando aqueles que têm maior formação e escolaridade; e finalmente um ataque frontal à estiva pela sua capacidade e história de poder no conjunto do porto.

Um resumo do documento conjunto de 28 de outubro de 2020 aponta para reconhecer a magnitude do ataque, para a dificuldade de unificação das três estruturas, ainda que reconheça que todas as entidades patronais estejam solidamente unidas e que a continuação da reforma trabalhista acabe com a representação por categoria e determine a necessidade de uma nova representação por setor. Neste caminho elencam uma série de exigências de manutenção do caráter público e de ‘LANDLORD’ do porto.

Enquanto isso, as entidades governamentais, praticamente todas do lado da destruição do porto, estão aliadas às entidades patronais no discurso e na forma: sem o porto público como ente organizativo da produção e de circulação de mercadorias nos portos. O documento das federações aponta para discutir novas formas de mobilização, mas ainda não para a construção de uma greve no setor ou para a greve geral, a unidade é o centro do documento: “Ficou explícito e patente que a organização patronal, integrando todos os setores, através da chamada coalizão entre FENOP, ATP, ABRATEC, e ABTP, está buscando união e posicionamento conjunto no processo de privatização e para a mudança da legislação portuária, contando ainda com o respaldo em entendimentos favoráveis às suas teses (de órgãos governamentais) do TCU tribunal de contas da união, ANTAQ agência do setor – e até da SNTPTA, em alguns casos”.

Os trabalhadores sob ataque direto têm um histórico de negociação das federações e entidades do setor, mas necessitam mais do que trabalho institucional e parlamentar de excelência para o enfrentamento, que ganha tempo, mas que não ataca o problema na raiz. Uma hora o ataque estará tão perto que precisará encontrar a defesa organizada e o contra-ataque’. Organizar a defesa é defender o programa da base, um programa radical dos estivadores, defender a construção da união da estiva para além da estiva e do porto para além dos trabalhadores do porto, a união na forma de frentes de trabalhadores de transportes que se convertam no PUA, pacto de unidade e ação com os trabalhadores estratégicos e finalmente no CGG e CGT, comandos gerais de greve e de trabalhadores.

A única forma de derrotar o patrão, a privatização, o fim da profissão é o enfrentamento direto na forma de uma defesa organizada e profunda, que prepare um contra ataque. Isso se evidencia na necessidade de parar completamente o porto e toda cidade portuária, parando também a logística do porto e para além do porto; além de no mesmo dia construir uma greve dos setores de transportes, dos setores estratégicos (com ênfase no petróleo energia e correios), nos setores conscientes (professores e funcionalismo público sob ataque pela reforma administrativa), e finalmente fazer um trabalho de enraizamento nas massas trabalhadoras através dos movimentos populares, da juventude, e dos poucos sindicatos tornados classistas para construir a greve geral.

Isso não será possível se ambos, estrutura sindical e programa radical não convergirem no sentido de abraçar o porto e tomá-lo como se ocupa a casa e o local de trabalho, com toda ajuda que se possa buscar. De um lado fazendo o trabalho de enraizamento do programa e buscando a unidade classista com os trabalhadores do entorno do porto na forma de frentes geográficas locais de trabalhadores; na forma de construção de frentes de trabalhadores de transportes, e finalmente do PUA, do CGG e CGT. Mas tudo isso começa no porto, intramuros, dentro do porto para dialogar no porto do início ao fim.

Como fazer o trabalhador compreender o seu papel no controle da engrenagem do porto, valorizar sua profissão e tomar consciência do controle do poder para fazer funcionar o porto, parar qualquer processo de transformação tecnológica que não seja controlado, controlar cada processo que não seja do benefício da classe, impulsionar o desenvolvimento das forças produtivas a partir de si mesmo, e aliar o controle da classe ao benefício do conjunto dos trabalhadores brasileiros é a grande questão. Controlar a logística do porto, o trabalho no porto, a logística do país através do controle do porto em solidariedade com os trabalhadores de transportes, estratégicos e a massa da classe.

A virtude da existência de inúmeras frentes de luta no Brasil, outras tantas frentes sindicais, com destaque para frente sindical de Santos pela frente com o porto é a possibilidade de construção da frente dos trabalhadores de transportes do Estado de São Paulo, a partir da experiência classista de Santos. Isso foi feito no Rio de Janeiro e por causa disso também foi possível a greve geral mais forte no dia 28 de abril de 2017. Aquilo que serve de experiência classista para o conjunto dos trabalhadores pode juntar na luta de classes o que é estratégico. A partir do porto abrem-se todas as portas.

A frente dos trabalhadores de transportes do Estado do Rio de Janeiro é uma experiência nascida das frentes que existiam na cidade, no calor das lutas entre 2012-2017, apontavam para a necessidade de constituição da conexão dos trabalhadores mais estratégicos para a luta. Existe um pioneirismo nos trabalhadores da estiva do Rio de Janeiro e de Santos que deve ser aproveitado pelo conjunto da classe trabalhadora, principalmente para fazer avançar o projeto organizativo onde ele é mais necessário: avançar para o conjunto da massa trabalhadora, incluindo os mais precários e periféricos.

A defesa não é recente, apresentamos as demandas dos estivadores e trabalhadores portuários como parte das demandas da Frente dos Trabalhadores em Transportes do Estado do Rio de Janeiro no seu documento do dia 14/3/17 e 28/9/18, que serviu de base para enfrentamento da reforma trabalhista através da greve geral de 28 de abril de 2017. Do ‘ocupa Brasília’ capitaneado pelo movimento sindical e popular em 24 de maio de 2017 com 200 mil pessoas em Brasília, e o ascenso sindical, popular classista até 2018. Depois do ascenso da greve e da marcha à Brasília um líder estivador se pergunta e desabafa: Porque paramos no meio? Não se avança? Precisamos refletir, debater, agir. Era tarde.as:

“―Garantia da presença do Poder Público, através da Autoridade Portuária, em todas as atividades do setor, sejam nos Portos Organizados ou nos TUPs Terminais de Uso Privado, tendo em vista se tratar de atividade de interesse social, econômico e de segurança nacional.
―Saneamento e reequilíbrio urgente do Fundo de Pensão PORTUS, e, consequentemente, a implantação de novos planos, bem assim a adoção de uma política de gestão que garanta a participação dos associados, de modo a tornar efetiva a complementação de aposentadoria para os contribuintes, para isso, deve-se viabilizar a inserção no sistema de novos associados, inclusive de outras empresas e entidades do setor portuário.
―Implantação de uma política pública de desenvolvimento do transporte de CABOTAGEM, tanto para carga, quanto para passageiro, bem assim da construção naval de embarcações em nossos estaleiros, gerando emprego no país, inclusive para o transporte de longo curso, inibindo a evasão de divisas nacionais com a indesejável prática de afretamento de navios estrangeiros.
―A preservação dos portos organizados como meio de regulação do comércio internacional por via marítima, visando à garantia da prevalência de áreas para a exploração portuária pública, sobretudo para as médias, pequenas e micro empresas; garantia da preservação da Autoridade Portuária Pública, como também o restabelecimento do poder deliberativo ao Conselho de Autoridade Portuária. Preservação da soberania nacional com participação majoritária do capital nacional no âmbito das empresas portuárias concessionárias ou autorizadas, respectivamente, dentro e fora dos portos organizados.
―Garantia de representação sindical dos trabalhadores portuários aos sindicatos das respectivas categorias profissionais portuárias diferenciadas, nos termos da legislação portuária vigente, quais sejam: estivadores, arrumadores, portuários, trabalhadores de bloco, consertadores de carga, vigias portuários e conferentes de carga, tanto nos portos públicos, quanto nos terminais de uso privado, respectivamente, dentro e fora da área do porto organizado.
―Garantia da preservação do trabalho portuário aos trabalhadores das categorias acima mencionadas registrados e cadastradas nos OGMOs, Órgãos Gestores de Mão de Obra, tanto às relações de trabalho avulso, quanto às de vínculo empregatício; garantia de Centros de Ensino e Treinamento para trabalhadores portuários avulsos e com vínculo empregatício, registrados e cadastrados no OGMOS.
―Cumprimento da Convenção nº 137 da Organização Internacional do Trabalho, já ratificada pelo governo brasileiro, porém, precisa ser efetivado o seu cumprimento, tanto pelo governo, quanto pelos empresários do setor portuário”.

O programa ‘estiva em nossas mãos’, de alguma forma complementa tanto o trabalho das lutas da frente dos trabalhadores de transportes no documento acima, como o trabalho institucional das federações, para ganhar tempo para o acúmulo de forças e o enfrentamento patronal. O programa é um projeto de fortalecimento dos trabalhadores mais organizados e conscientes da classe estivadora em Santos, que, pela base, se organizam para recuperar a ferramenta sindical dos estivadores de Santos para a luta concreta na luta de classes; e para construir uma unidade classista, dos trabalhadores da estiva, dos portos, de transportes e estratégicos, aqueles capazes de parar a economia global localmente, a partir do porto de Santos, nas estivas, portos do Brasil, e finalmente, no conjunto dos trabalhadores em transportes e estratégicos de São Paulo, do Brasil, e no mundo. Seu objetivo imediato é a recuperação do respeito do estivador portuário, no contexto do conjunto da classe trabalhadora. Conquistar direitos e o poder da estiva colocados à serviço da classe trabalhadora.

O programa se unifica às demandas das frentes para ser trabalhado nas bases. Se o objetivo é educar os trabalhadores, essa educação precisa se basear no mais importante: Cada setor precisa de um programa, e quanto mais abrangente o programa mais ele vai se parecer ao projeto da ‘estiva em nossas mãos’. Neste sentido, ser sindicalista é menos do que ser classista, e ser classista é menos no sentido de ser político da construção da revolução brasileira; porque construir a união da estiva, das estivas, dos portos, dos trabalhadores em transportes e dos trabalhadores estratégicos, chegando até os mais precários e periféricos no conjunto da classe trabalhadora, somente se materializa na tomada do poder político por parte da massa trabalhadora com a derrota final do poder patronal e a sua substituição pelo poder popular. Ser classista é mais importante que a corporação, e ser revolucionário é brigar para ter trabalho no mundo sem patrões.

O projeto da luta do estivador é um projeto da educação dos trabalhadores do porto. A pedagogia do porto não pode existir sem a pedagogia da estiva, e ambas necessitam do controle do trabalhador. O estivador e o portuário são a mesma coisa no mundo e necessitam da luta pela valorização da profissão, a profissão é o porto. O programa pede o controle do trabalho sobre a educação do trabalho. O processo educativo do estivador precisa estar nas mãos do estivador. É possível uma universidade com a marinha e o Estado sob condução dos trabalhadores do porto. O programa educativo do trabalhador está no projeto ‘estiva em nossas mãos’. O programa é a educação para a cooperação.

O programa precede o operador, as histórias, os apitos, os cheiros; as técnicas do trabalho no porto aproximam o programa da base; o programa coloca o horizonte da classe em palavras compreendidas; resume os pontos para compreender o poder da classe estivadora. Na ‘estiva em nossas mãos’, o portuário importa no processo, ele constrói o poder da classe. O conselho inicialmente criado para debater problemas concretos da realidade concreta constrói no processo o conselho armado da crítica e no seu amadurecimento a crítica das armas, um conselho forte em uma coletividade de conselhos, uma base organizada e uma direção operam do mais numeroso para o mais especializado e vice versa. A estiva em nossas mãos é o programa do agora e do futuro.

Um dos objetivos do programa é a construção de uma estrutura sindical guarda-chuva para apoiar quadros, conselhos de trabalhadores e operar através de bases organizadas na base geral. Um sindicato poderoso e classista apoiando quadros organizativos, os trabalhadores na base organizada, na base geral; por solidariedade a massa trabalhadora precária, periférica, organizada ou não. Quando se prioriza a ocupação dos espaços internos da estiva e do porto se aumenta a possibilidade de organização dos espaços externos de solidariedade. O trabalho de base crítico local também é internacional.

A recente explosão no porto de Beirute no Líbano mostra o risco na profissão. Trabalho, segurança no trabalho, fortalecer e defender a participação democrática dos estivadores e trabalhadores no porto sem a interferência patronal na determinação de quem trabalha e quem não trabalha, de quem tem direito ao trabalho, quem não tem; e como trabalha. O mundo no cais sem a intermediação, os atravessadores e o mando patronal são como bandeiras históricas não apenas da estiva, mas da classe. O quadro organizador na base, interagindo com o líder de parede, o líder de turma de trabalhadores, a equipe de vinculados, o líder sindical na base, a formação dos conselhos de trabalhadores, e outras formas de organização classista visam o enfraquecimento patronal e a estratégia de construção do poder popular, a partir da defesa da vida e do poder dos trabalhadores.

Neste sentido o projeto ‘estiva em nossas mãos’ é um projeto marcadamente simples da teoria crítica e do movimento organizativo dos trabalhadores: através do trabalho de base crítico, pela luta mais imediata, como a escalação justa, até a discussão do poder de parar o país como parte de uma ação insurgente na greve geral. O objetivo é mudar a ‘lingada’, o trabalho do estivador, pelo bem da estiva, valorizar a profissão: Através da luta pela recuperação da ferramenta sindical, para a organização combativa, unitária, classista e internacionalista dos trabalhadores da estiva; mas para além da estiva, até que por solidariedade, do mais organizado ao menos; do mais estratégico vá ao mais periférico, precário, a organização e enraizamento do trabalho de base crítico da estiva.

Sucumbir ou lutar. Este é um grande momento organizativo para se lutar para recuperar a ferramenta sindical, para aperfeiçoar, construir unidade na estiva para além da estiva, independência de classe, enfrentamento do inimigo capitalista, direção na base, para criar comissões de trabalhadores em cada turma da estiva, para incluir todos os trabalhadores no sistema sob controle dos trabalhadores. Recuperar o respeito e o poder da classe intervindo no treinamento e no regramento do trabalho, garantindo saúde, trabalho e renda a todo o momento; negociar e enfrentar a conjuntura de livre requisição pelo poder organizativo do trabalhador, investir no desenvolvimento das forças produtivas e na eficiência do porto sob o controle dos trabalhadores valorizando a estiva e demonstrando que a existência da intermediação do patrão encarece o porto e a vida. Unificar e recuperar a ferramenta sindical objetivando a conquista de respeito e poder.

Neste momento, precisamos fazer a transição do programa dos trabalhadores para o ataque patronal, e do ataque fazer a transição para a cultura, história e a superação. Nutrir com a cultura da solidariedade, mas o poder da classe junto. A existência mesma dos estivadores é desde tempos imemoriais mitológica nos rios Nilo, Eufrates, no Amarelo, no Ganges, no lago Texcoco, no mar Mediterrâneo, no oceano Atlântico, nos portos de Ostia, Calecute, Liverpool, Dakar; nos maiores portos do mundo uma existência baseada na organização e valorização do trabalho técnico e coletivo, porque a má arrumação da mercadoria em um navio pode significar que ele não chegará ao destino. Este pioneirismo histórico precisa ser assumido no projeto organizativo, porque é fruto de muitas lutas e construções de poder organizativo, que hoje recupera e unifica o trabalho ao respeito e poder. A ousadia no processo é materializar esta tradição nas turmas, nos turnos, na base organizada e na base geral no porto, para ir além da estiva.

Um programa para inspirar os outros, para debater com os trabalhadores, para ver o programa transformado pelos próprios trabalhadores, para ver sua mensagem resumida, para conhecimento da estiva, do porto, da classe e de cada brasileiro. A base da ação é o programa unitário, mas somente a unidade classista na prática pode combinar o programa e a prática de união dos trabalhadores diante do inimigo capitalista, que combine a ação defensiva organizada com um contra ataque massivo, maciço, completo.

De todos os jogadores no tabuleiro da guerra de classes, o estivador é o melhor colocado no conflito de classes, porque pode abrir ou fechar o gargalo logístico do país. Ao mesmo tempo, a superestrutura age firme na cabeça de cada trabalhador para separar cada um do seu poder coletivo, o trabalhador recebe a mensagem do patrão como sua e a interioriza, dá para o patrão o seu poder, que ele usa para retirar trabalho, sua saúde, a renda e a vida do estivador. O grande poder do patrão amparado pelo poder governamental do patrão nos portos somente pode ser vencido por uma ação combinada de trabalho de base crítico na estiva e trabalho classista para além da estiva, um poder classista, para tomar o poder da elite no porto, no governo e virar o Estado em operário.

Neste sentido o processo organizacional na sua estratégia de criação de poder popular é permanente para recuperar e usar a ferramenta coletiva, construir conselhos e exercício de coletividade e poder, organizar segundo o processo respeitoso de maturação da consciência e assimilação crítica por parte da base organizada, para a base geral, para a classe e para o conjunto da sociedade. No início, no meio e no fim acercam-se os fatos e a luta específica, o cimento são as experiências de poder, e os blocos coletivos sustentam estruturas e experiências organizativas coletivas formais e autônomas de diálogo nos comitês de trabalhadores, que cobrem toda a enorme extensão do porto.

Um programa classista se constrói na base com as maiores especificidades. A forma do diálogo e a autonomia dos conselhos de trabalhadores é uma delas. Onde se posicionam os quadros organizativos externos que têm um conhecimento maior da luta de classes, e os internos que são especialistas da luta concreta na estiva, para trabalharem juntos na base organizada; em como se divide o processo organizativo. No caso da estiva por turmas. Os comitês de base vão autonomamente discutindo o programa que se torna seu programa e também da classe, quanto mais longe vai, mais especificamente diferenciado fica, sem perder conteúdo de programa. Neste sentido é a capacidade coletiva de organizar no modo infantaria, no sentido compacto e de massa, onde cada um sabe seu lugar no trabalho, na solidariedade, no socorro, na defesa e no ataque.

O objetivo é a forma determinante de cobrir completamente a base geral a partir da base organizada, do pequeno número de quadros até o maior número de trabalhadores organizados. O caráter excepcional do modus organizativo não exime a consideração da forma organizativa clássica convergindo para forma específica e mais eficiente para que o exercício da solidariedade faça cobrir todo o terreno /tempo convergindo em cada um.

Uma discussão de grupo de trabalho, que quando afiada multiplica, uma discussão multiplicada do programa, na estratégia de multiplicação, que convence individualmente e mapeia coletivamente, com a mensagem de uma página na mão; a rede social não substitui o olho no olho, e cada quadro organiza o seu grupo, e o conjunto de quadros na base organizada uma turma, a partir de um grupo original, visando o ponto de chegada o conjunto dos trabalhadores na base geral de uma determinada estiva, dialogando também com o conjunto dos portuários; porque a mensagem é da estiva para além da estiva e para a classe, determinando os passos, os fatores, a priorização, os apoios, as estruturas, o poder, a formação, a exortação, a mensagem, o programa. Cada programa tem os seus desdobramentos no papel na prática, do mais forte e do mais organizado para o menos.

O esforço coletivo faz com que o indivíduo desagregador seja vencido pela ação organizativa coletiva do programa. De alguma forma fica o desafio da inclusão da grande massa. Vencer o inimigo, pela sobrevivência da estiva, o desenvolvimento das forças produtivas, pelo controle do processo do trabalho, do comando do trabalho, em um grande PUA, pacto de unidade e ação, e um CGT, comando geral dos trabalhadores.

Das coisas mais básicas: Manter o trabalho, o campo de trabalho, a estiva, intervir na construção das leis do trabalho na estiva, na segurança, na não interrupção da renda, na ação institucional, forçando a direção na base, construindo conselhos, tomando a formação nas mãos, unificando a carreira da estiva; se confundem com a ação histórica de controle do trabalho, do seu poder, de pensar o porto no espectro da logística do Brasil no contexto da América Latina e do mundo. Tudo isso é faina, o trabalho é poder. Das coisas mais básicas começa a caminhada e organização para o poder mais histórico.

Não existe contradição entre compreender a faina, a lingada e o poder. Entre perceber a urgência da defesa organizada do porto organizado diante do ataque patronal, e a necessidade de compreender que o correto tempo de maturação do trabalho de base crítico com elevação da consciência e transformação da teoria em prática crítica leva tempo. Leve o tempo que levar, agora é preciso agir com o que se tem, e não parar o processo organizativo com o que se tem, e o que se tem é muito se comparado a outras categorias. O acúmulo é grande para convocar para a luta e terminar a paz dos vencidos para impor a guerra da maioria. Tomar consciência é ação da ‘estiva em nossas mãos’.

No final, nós podemos comparar a atual situação de ataque imediato da estiva, do porto, do conjunto dos trabalhadores de transportes e estratégicos ou mesmo da massa precária e periférica brasileira em um diálogo com que Lênin possivelmente faria uma alegoria e descreveria a vida de gerações de estivadores e portuários: “onde o estivador diz nunca houve paz e Lênin responderia vamos organizar esta guerra”. Lênin e o estivador discutem a consciência.

A primeira tarefa é a constituição da vanguarda real. Os estivadores são como a infantaria, que avança compacta através da história; um pequeno grupo de trabalhadores diante dos trabalhadores do mundo. Um grupo seleto, compacto, que escolheu um caminho difícil, segurando literalmente cada um pelas mãos. Cercado por todos os lados, e marchando debaixo de fogo, eles caminham unidos pelo trabalho, pelo objetivo de debater e agir, por uma decisão tomada, precisamente a fim de combater o inimigo e não tombar na beira do cais ou na faina diária diante das ofertas generosas do sistema.

No processo de apresentar o programa da classe estivadora para a classe em geral, alguns os culpam de terem formado um grupo à parte e estratégico porque eles preferiram valorizar o ofício, o caminho da luta especializada. Enquanto muitos se perderam, a vanguarda pensou por anos em como apresentar e preparar este enfrentamento estratégico e final. Diante da luta espontânea e puramente imediata, responderam muitas vezes sim e outras não à conciliação. Fora e dentro do porto o mundo muda e gritam: Vamos aderir ao sistema! Se a história da estiva mostra que estão errados, respondem que ‘esta parte mais à vanguarda’, é feita de ultrapassados no mundo mecanizado, robótico, digital e de ‘home office’. Que não há alternativa. Mas se uma pequena parte resolve lutar por tudo e vencer, a outra é de ‘trabalhadores livres dentro da superestrutura’, submetidos para fazer o sistema girar e que se esquecem que os braços na roda tem poder para fazer a roda girar, parar e quebrar. O centro do debate é debater o poder da classe com a classe.

Os que têm poder para girar e para não girar a roda, têm até poder para abrir mão do poder, e tem todo o direito de lutar do outro lado, do governo e da patronal, que aparentemente tudo controla através do sistema capitalista mundial. Nada pode ser mais urgente que a escolha do lado. A vanguarda mais consciente precisa procurar aqueles que querem resolver todo este problema e deixar o outro lado tomar o seu destino. É muito importante separar os que querem defender seus direitos, respeito e poder dos que não querem neste primeiro momento. A classe trabalhadora necessita separar e largar de mão aqueles que jogam do outro lado, para unir as mãos e os esforços com os que sinceramente querem tomar a ‘estiva em suas mãos’, que têm lado do trabalhador.

A estiva necessita fazer as perguntas corretas para obter as respostas corretas. A resposta para o trabalho, o poder e respeito está no debate destas questões. Aqueles que não querem debater têm todo direito de se colocar do lado do patrão, mas é preciso largar a mão daqueles que querem debater trabalho e poder. Por isso é preciso pedir com todo respeito que ‘larguem as mãos dos que querem a estiva nas mãos’. Que parem de atrasar o debate verdadeiro da revolução por causa do patrão e diálogo social, a miséria, a submissão no pântano do capital. É preciso debater o programa dos trabalhadores. Os patrões querem poder para lucrar, os estivadores tempo pras suas famílias, para a cultura, para o lazer, por isso precisam da ‘estiva nas mãos’, com liberdade para abraçar o poder e chegar onde quiserem, combatendo o sistema e os que negam poder à estiva, que negam até seu próprio poder de classe e abraçam o poder patronal do capital.

Programa estiva em nossas mãos:

Somente a união da estiva dará voz a realidade da lingada. Estiva em nossas mãos é unificar a estiva, o ‘lingadeiro’, o da casa, o tratorista, o que tem outro emprego, o vinculado, o aposentado em uma estiva unitária, combativa, classista, solidária e internacionalista.

1- Unidade da estiva de Santos, dos trabalhadores nas estivas e portos do Brasil; união para além da estiva na unificação dos trabalhadores em transportes e estratégicos, através da criação da FRENTE DOS TRABALHADORES DE TRANSPORTES DO ESTADO DE SÃO PAULO. Fortalecer o trabalho classista, junto a marítimos, caminhoneiros, ferroviários e todos os trabalhadores de transportes, os petroleiros e outros estratégicos, e por solidariedade com toda a classe trabalhadora para contra atacar a tentativa de destruição da estiva; faremos este enfrentamento juntos com todo tipo de trabalho, inclusive nossa luta diária.

2- Ter independência de central sindical, para poder alinhar a base de Santos, com as outras bases do Brasil, e voltar a ter o diálogo e protagonismo junto com a federação. Ser independente na conjuntura política atual, também facilitará tanto a luta como um diálogo com o governo. E por outro lado aumentará muito o trabalho institucional no congresso, sem deixar de ter lado na luta de classes. Desfiliação da força sindical, voltar para a FNE, filiação a IDC, FSM e ITF. Vamos juntar nosso poder com os portos do Brasil, da América Latina e do mundo.

3- Trabalho institucional em Santos, em São Paulo, no congresso em Brasília, na OIT em Genebra para enfrentar a nova lei dos portos como lei da morte da estiva; pelo fortalecimento de uma estratégia nacional e classista para os estivadores e trabalhadores brasileiros. Convencer os estivadores a se tornarem a vanguarda no porto para recuperar o nível de compra de 20 anos e arrancar dos patrões os valores corretos referentes a 100% dos dias parados durante a pandemia; o trabalhador não pode pagar por esta crise.

4- A diretoria executiva precisa fazer rodízio de 3 meses, trabalhando junto com a classe estivadora. Mudar o estatuto para fortalecer uma diretoria colegiada com maior participação da categoria. Redução da ajuda de custo ao sindicato de 7%, para 4%. A passagem direta do recolhimento dos associados da ativa via OGMO do 1% do aposentado para a associação dos aposentados da estiva, ficando a cargo do sindicato somente a fiscalização da distribuição justa da ajuda social.

5- Mudança da estrutura do diretor de parede, a função ficaria igual ou similar a de um líder de turma, seria a voz da diretoria executiva junto aos trabalhadores e vice versa. Fortalecimento do trabalho de base visando fortalecer a união do estivador. Estimular a construção de comissões e conselhos de trabalhadores independentes em cada turma; que em parceria com a direção sindical poderiam discutir direitos na luta concreta na luta de classes.

6- Regrar a escalação ‘on line’, dar os ajustes que têm que ser feitos. Fortalecer e defender a escalação sob controle da estiva com a participação democrática dos trabalhadores sem interferência da patronal. Recuperar a bandeira histórica dos estivadores e lutar pelo controle obreiro na “detenção de mão de obra por parte do sindicato” na contratação, demissão e organização dos estivadores. Combater a contratação de estivadores de fora do nosso sistema. Incluir nos acordos e convenções coletivas a multifuncionalidade.

7- Construir respeito e o poder do trabalhador estivador e do porto; disputar o planejamento e logística deste setor com a patronal, representar através da união intersindical todos os trabalhadores do porto. Para isso, regrar os termos de trabalho do trabalhador vinculado, formação e requalificação interna, o crescimento profissional e os degraus salariais, a exemplo do cargo do guincheiro e do líder.

8- Lutar para a saúde e segurança do estivador ser a questão central do trabalho diário sem deixar que diminuam o salário do trabalhador. Preparar um farto material para a recuperação pela luta e o trabalho institucional a aposentadoria especial do estivador e do portuário, na busca por insalubridade, periculosidade e risco portuário.

9- Fazer um acordo com a DP Word, sair desta conjuntura de livre requisição. Abrir a mesa de negociação. Abrir negociação com a VLI e USIMINAS, tentar fechar um acordo para a volta da mão de obra, com um regramento rígido para evitar problemas do passado. Discutir um DPV, conforme a lei, no artigo 40, inciso 1,2,3,4,5 e 6 utilizando a verba do Fundo de Desenvolvimento do Ensino Profissional Marítimo FDEPM.

10- Fortalecer a qualidade e eficiência do serviço prestado pelos estivadores junto aos operadores portuários e TUPs privados, investindo na parceria com institutos na formação, requalificação, equipamentos, turmas operacionais de movimentação de carga que complementariam nossa formação em parceria com a marinha de guerra.

Mudar a lingada para o bem da estiva: Propostas para desenvolver a dignidade, o respeito e o poder dos estivadores portuários, mudar para o poder da estiva.

Fazer a transição para a cultura, história, a superação dos estivadores para além do porto, a transição do programa e movimento da base para derrotar o patrão, a transição na luta concreta para a histórica, da ‘estiva em nossas mãos’ para operários sem patrões. É preciso unificar cada trabalhador do porto, cadastro e registro, fortalecer a representação política dos trabalhadores; unificar o conhecimento dos outros portos, valorizar a memória, as grandes greves como a ‘greve do navio espanhol’, lembrar que nesta pandemia a taxa de exploração e de superexploração dos trabalhadores de transportes e de estivadores foi maior, que voluntariamente nenhum deles parou; e que contra vontade, alguns foram impedidos de trabalhar enquanto outros trabalharam mais.

Os patrões empurram ‘um sistema S portuário’ onde eles controlariam os fundos de formação profissional. A marinha de guerra resiste. A formação a partir do fundo da marinha é um exercício de gestão. A proposta dos trabalhadores é a co-gestão através de uma universidade dos trabalhadores com gestão compartilhada com os trabalhadores militares. Recuperar a formação e a aliança entre trabalhadores dos transportes e trabalhadores soldados, criar gestores trabalhadores e soldados na formação. A realidade é que toda mudança da nova lei dos portos é para pior e dificultaram a greve. Neste momento, ir para a rua, fazer passeatas, sem preparar a ida, sem planejamento é destruir a força ofensiva dos trabalhadores por nada. Com o devido tempo é necessário ocupar os espaços institucionais e a base, os espaços classistas, a mídia, a educação, a cultura, as ruas da cidade e do porto. Se as demandas são claras a mobilização fica mais fácil.

‘Estiva em nossas mãos’ é um movimento de unificação de toda a estiva, do porto, de outras estivas, portos e trabalhadores de outras categorias e outros setores, inclusive internacionalmente. Estiva nas mãos dos trabalhadores está também na ‘BR do mar’, o ataque aos trabalhadores marítimos, na destruição da Petrobrás, na privatização das ferrovias, do metrô. É o ‘PUA’, que precisa incluir o metroviário na maior cidade do país, o caminhoneiro e o rodoviário. Estiva em nossas mãos é o ENCLAT, o encontro nacional de toda a classe trabalhadora, dos movimentos populares e da juventude. Se a patronal propõe mudar o traçado no porto, as poligonais, o pdz (zonal) determinando o que é público e privado, determinando como isso atinge a estiva, e os TPA, é preciso que isso seja sentido por todos trabalhadores organizados. O porto organizado precisa organizar o Brasil ou vai perder toda a organização da classe no porto e fora dele.

Se a estiva permanecer lastimando os detalhes da sua perda, se a patronal vai ou não requisitar estivador, ela vai perder o trabalho, o respeito e vai acabar, se não brigar pelo poder de existir no porto. Defender a ‘estiva’ x estiva em nossas mãos é a falsa polêmica, porque sem um programa de organização e mobilização e enfrentamento não haverá vida no porto, somente o capital. O programa propõe a estiva nas mãos do estivador para ele determinar o que será dela e para além dela. Unificar a estiva, unificar as estivas, unificar a classe estratégica: o PUA, CGG e o CGT. Unificar e vencer. Unificar para enfrentar a patronal unificada com o governo patronal; educar nas diferenças de propostas, no programa do poder de destruição capitalista e do outro o poder de gestão dos trabalhadores, e apontar as diferenças claramente. A estiva em nossas mãos é um movimento de valorização do trabalho da estiva nos portos, o controle do trabalho, poder e unidade, estiva em nossas mãos é um programa de construção de poder popular, porque o gérmen da luta na estiva está construindo o poder da classe.

Tecnicamente a organização para apresentação e debate do programa se divide na organização das turmas pela recuperação e otimização do sindicato tornado combativo, unitário, classista e internacionalista. Paralelamente, a constituição de comitês ou conselhos de base em cada turma a partir de pequenos comitês de discussão por ‘faina, ou equipe de vinculados estimula o debate e o controle dos trabalhadores sobre o porto, faz pensar o porto a partir da demanda concreta no trabalho, debate o programa, e o poder do programa. Encara o déficit organizativo e pensa a greve a partir da primeira demanda. Para os três, quatro, dez mil trabalhadores; os primeiros vinte trabalhadores na ferramenta mais vinte na vanguarda nos conselhos que organizam a defesa do porto. A direção próxima da base com um responsável por cada turma encontra, por outro lado, um grupo organizado na forma de conselho por turma. Um equilíbrio entre conselho e direção no número de centenas na vanguarda, de milhares na base organizada fazendo o núcleo do porto, de três mil com a estiva, até dez mil no porto; para a vanguarda em Santos, milhares, milhões na forma da frente sindical, popular e de juventude da cidade do porto e do entorno metropolitano do porto.

De dezenas e centenas a dezenas e centenas de milhares, e milhões. Da estiva ao porto, do porto para além do porto, do transporte ao estratégico, do consciente (professores e funcionários públicos), para a massa precária e periférica, movimentos populares e juventude. Diante ao ataque e violência da elite, o programa pode construir um contra-ataque violento de massa estudando a necessidade numérica exata de cada trabalho de base crítico, a partir do estudo de caso concreto. Por exemplo, através da simulação:
20 – 20 – Vanguarda no porto de Santos na diretoria do sindicato e nos conselhos

100 – Vanguarda na estiva e nos portuários

3000 – base organizada

10000 – base geral

x

10000 – Vanguarda na classe trabalhadora em Santos e na região metropolitana de Santos

100000 – base organizada

1000000 – base geral

Porto de Santos: Vinte na vanguarda do sindicato e 20 nos conselhos (20 turmas), três mil estivadores, dez mil trabalhadores no porto de Santos; do outro lado, organizando dez mil localmente é um passo na organização para a centena de milhar e os milhões de trabalhadores na luta de massas no Estado / Brasil. Pacientemente tudo pode conectar.

Existem trabalhadores na estiva que estão construindo o programa dos trabalhadores. Existe um acúmulo e passado onde outros trabalhadores também construíram o mesmo programa. A história tem um encontro de programas que se colocam um por sobre o outro, mas somente quem vive hoje pode aplicar o programa de hoje, se não esquecerem o acúmulo, vitórias, derrotas, avanços, recuos na luta de classes. O fazer da classe hoje é o debate hoje, se colocar à disposição para fazer o diálogo com a classe estivadora e portuária, em transportes com o programa de hoje sobreposto ao de ontem; unificar com os estratégicos, os mais organizados, conscientes, ir além e se dispor, por solidariedade a fazer o debate com toda a classe, a massa precária e periférica que está na ponta.

A história dos trabalhadores está determinada pelas suas lutas concretas na luta de classes, mas quando isso se inverte, no momento de ascenso, as prioridades estão na responsabilidade histórica do trabalhador estratégico para construir solidariedade ao trabalhador precário e periférico, a massa revolucionária da classe. A condição do trabalho do estivador determina a organização política e sindical, a solidariedade de classe, a vitória da classe. Neste sentido encontramos um ‘ethos solidário’ sindical e político além desta sociedade capitalista, que constrói com a classe o futuro socialista.

O ethos sindical classista é revolucionário, o programa dialoga com a estiva em nossas mãos para além do ethos da estiva. ‘O ethos sindical classista ou político’ apresenta o programa classista e político para os defensores do ‘ethos capitalista’. Os estivadores têm responsabilidade com sua agenda concreta de sobrevivência, mas sobreviver apenas só vai ganhar tempo, o fantasma da destruição se concretiza no avanço e ataque do capital, se não ousarem tomar os meios de produção eles estão condenados ao desaparecimento. Não se pode ‘tomar o destino sem tomar a estiva’, e não se pode tomar o porto sem a unidade estratégica, a solidariedade de toda a classe para derrotar os patrões do porto, da cidade, do Brasil, da América Latina e do mundo no porto. A solidariedade da estiva apresenta o programa, organiza a luta, anuncia localmente ‘o mundo do trabalho em nossas mãos’. Os estivadores chegaram a um ponto sem retorno, daí pra frente ou se vence ou perde. Prevalecer ou cair. Mas existe um oceano de trabalho de base no meio.

O tempo do estivador é o tempo do cais. ‘A organização precisa do tempo passado, mas precisa mais ainda do tempo presente da transformação real. Um estivador pertence, por exemplo, a uma ‘turma’, tem o tempo de cais e também o de associado; portanto, pode ser antigo de cais e novo de associado, “poder ser um bagrinho” , um cadastro e depois se tornar mais antigo no porto, se tornar registro, e ademais tem as famílias, a tradição que traz peso na estiva. Existe toda uma tradição que precisa encontrar o século XXI. Acabar com a ‘pax patronal’ é questão de vida e morte para a estiva no porto. O estivador que constrói conselhos na base, discute a necessidade de derrotar o inimigo hoje, trabalha, dialoga na base, leva o pão para casa, opera greves mundiais, pertence à luta local e ao mesmo tempo/espaço sua luta é logística nacional e internacionalista.

O estivador sob ataque se volta para a sua história, o ataque segue, os atravessadores e o agronegócio têm muito lucro, o seu lucro pode ser a fragilidade dos governantes. A dependência de gerar mais lucro ‘para o setor’. Enquanto o inimigo, seguindo a tendência mundial da superexploração neoliberal, em conjunto com o imperialismo anuncia ‘leis de modernidade portuária’ para arrancar o que resta do estivador e do portuário; o estivador pode aproveitar esta tendência ‘de rapidez do sistema’ para concentrar suas forças no embarque / desembarque destas mercadorias e inventar o seu novo poder. Um poder unificador do trabalhador bagrinho, até seus laços na a marinha de guerra, passando pela quebra da ignorância da força da classe pela sabedoria da própria classe; da unidade classista, do projeto ‘estiva em nossas mãos’, sob controle dos trabalhadores para recuperar a educação coletiva da classe, aprendendo a ser gestores e conselheiros do fundo de desenvolvimento da educação do porto na forma de uma universidade para os portuários e soldados do mar.

Um fundo para a educação dos estivadores e portuários e marítimos e aeroviários e aeronautas, ferroviários, todos os fundos dos trabalhadores recuperados depois de serem roubados e usados para pagar juros, enquanto as migalhas enriqueceram os gerentes do sistema. Está na hora de recuperar o dinheiro para seu fim devido, formar em excelência a classe trabalhadora. Toda ação de mudança e a gestão do fundo dos trabalhadores não pode ser personalizada, mas é preciso retornar à cultura do trabalhador, sua história cooperativada, a união deve estar constituída sob um programa e apoiada sobre um coletivo. A união da estiva se expressa na história, na cultura e na formação do porto.

Nas palavras do estivador “Estiva em nossas mãos , o nome já diz , é a estiva na mão da lingada, é a mão do vinculado, do que trabalha da casa, do trabalhador antigo, do trabalhador aposentado retornado, é dos trabalhadores cadastros que estão aí; estiva em nossas mãos é a junção de todos que estão aí no dia a dia, do tratorista, estiva em nossas mãos é a ideia de unificação, de unificar a categoria em si, mas não apenas isso, unificar no porto, mas também unificar no contexto geral, ter um diálogo fraterno com outros trabalhadores, a categoria unificada com outras, a união da estiva e das outras estivas, no seu nível federativo e internacional; a estiva em nossas mãos se unifica para resgatar o PUA, e o PUA hoje unificaria o transporte enfrentando o ataque neoliberal”.

“Somos um grupo que não apenas pensa a unificação local, mas também a geral; nós não podemos perder nosso trabalho e identidade, mas devemos pensar e unificar para além, unificar o nosso setor porque ninguém pode sozinho; as outras categorias dos transportes foram massacradas, hoje a bola da vez é o trabalhador do porto infelizmente. Estiva em nossas mãos é unificar a estiva, as estivas e o PUA, a união pelo nosso trabalho e nossos direitos porque juntos somos mais fortes”

Quanto mais se escuta o trabalhador, o peão, o bagrinho, o cadastro, o registro mais se compreende o programa, “Estiva em nossas mãos é a luta por trabalho, a resposta do trabalhador através da garantia do trabalho e do poder do trabalho. Se você analisar todos os ataques verá que a defesa é tomar o nosso trabalho em nossas mãos. A união da lingada é a estiva na mão do estivador, do vinculado, do cadastro, do tratorista. É a unificação do trabalho dos trabalhadores do porto para aumentar seu poder. Agora precisamos retornar ao passado, escutar as vozes do passado, subir nos ombros de titãs. Fazer respeitar a vida dos trabalhadores no porto. Recuperar o tempo que enfrentávamos patrões e presidentes, quando o termômetro da luta de classes era a intervenção dos fuzileiros navais no porto, quando a coisa esquentava mesmo havia intervenção federal”.

Osvaldo Pacheco não foi um estivador qualquer, suas histórias ecoam na estiva, no porto, para além do porto, nos setores estratégicos, nos mais conscientes; e no tempo em que ele viveu também na massa precária e periférica trabalhadora. O trabalho hoje, para além do programa, é contar a história da luta de classes através da história da luta da classe estivadora. A contribuição de Osvaldo Pacheco, como da vanguarda anterior ao período histórico da sua militância no ascenso anarquista, e do ascenso posterior, do período democrático popular do novo sindicalismo, tudo ensina na estiva e na classe. Os estivadores precisam hoje mais do que nunca de toda sua história, da sua cultura, do seu respeito e do seu poder. Abaixo fragmento da memória sindical de Santos 1930-64.

“Oswaldo Pacheco da Silva – Membro do Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro foi um dos maiores líderes sindicais dos portuários brasileiros. Sergipano, foi presidente do sindicato dos Estivadores de Santos, da FNE Federação Nacional dos Estivadores, do PUA (Pacto de Unidade e Ação), do Fórum Sindical de Debates, deputado constituinte em 1946 e (sempre) militante comunista. O líder do Porto de Santos, sem dúvida nenhuma, é uma referência não só do movimento sindical dos portuários de Santos, mas de toda a classe trabalhadora. Um exemplo. Nos momentos mais difíceis e sofridos não esqueceu dos companheiros: “Tentaram me tirar do presídio, e todos os presos que lá estavam se mobilizaram no corredor da saída e declaram para a direção: Só tiram o Pacheco daqui se matarem todos nós”. Exilou-se no México em 1964, depois retornou ao Brasil, Santos, foi preso na época da ditadura militar, torturado sob o regime dos generais e faleceu em 1993”.

Imortalizado no romance ‘Agonia da Noite’ do escritor Jorge Amado, segundo volume da Trilogia “Os subterrâneos da liberdade” descreve como os estivadores santistas se recusam a carregar um navio de café oferecido pelo governo de Getúlio Vargas à Espanha franquista. As histórias de Oswaldo Pacheco eram como lendas entre os estivadores. Ao mesmo tempo, depoimentos de trabalhadores na estiva hoje demonstram que a memória de Oswaldo Pacheco é muito viva, e a característica principal que vem à mente era o seu trabalho de base crítico, a sua acessibilidade para os trabalhadores na base, e a capacidade de conversar com todos os trabalhadores no porto, sabendo ouvir suas demandas imediatas e com grande habilidade as conectando com a luta de classes, Oswaldo como descreve J. Amado era muito querido pela estiva.

“Eram quase duas e meia quando Oswaldo e Aristides, o primeiro-secretário do sindicato — também ansiosamente procurado pela polícia — apareceram no cais, cercados pelo grupo de camaradas. Os estivadores, reunidos em frente ao armazém, prorromperam em aplausos. Os policiais postados nas imediações se movimentaram. Mas antes que pudessem se aproximar de Oswaldo e Aristides, esses já tinham sido envolvidos pela multidão, que os cercava em ruidosa demonstração de estima”.

Quando Oswaldo Pacheco foi entrevistado pelo NPC Núcleo Piratininga de comunicação nos anos 1990 ele foi descrito como alguém de olhos brilhantes, cheios de vida e sonhos, de fala mansa, professoral como educador popular, como militante que carrega sabedoria e um discurso muito firme. Falava da saudade das lutas memoráveis dos anos quarenta, de quando se filiou ao sindicato da estiva em 1943 e do auge da força dos trabalhadores estivadores, de transportes, e estratégicos nos anos de 1960. Os trabalhadores comunistas ocuparam um lugar político no parlamento burguês brasileiro, que se transformou em tribuna também para a classe trabalhadora. A diferença é que a sua candidatura nasce em uma assembleia de trabalhadores como mandato coletivo.

Oswaldo Pacheco foi eleito com uma das maiores votações no Estado, e quando o PCB foi cassado, o partido indo para a ilegalidade, o camarada volta a exercer o seu trabalho na base, continuando a participar das assembleias e das lutas conforme nos ensina a experiência da ‘Comuna de Paris’: Cada trabalhador representante direto dos trabalhadores atua com mandato reversível pelo voto popular, recebe vencimento médio do trabalhador, e quando seu mandato direto termina volta à base de onde veio.

Um exemplo de luta na estiva e para além da estiva, a luta pelo fortalecimento do trabalho de base crítico, sendo uma liderança agregadora da classe estivadora e portuária no Brasil inteiro. A história demonstra como a estiva unificada unifica o Brasil, como a luta concreta hoje pode beber na fonte da excelência na luta de classes. Foi possível ontem. Pode ser possível hoje. O Projeto estiva em nossas mãos é o projeto do trabalho de base crítico da unidade da estiva para além da estiva, inclusive o passado. Existe uma ponte no porto entre as vitórias passadas e o presente. A história do porto na luta de classes é a história do ataque patronal e da defesa dos trabalhadores. Voltar a excelência organizativa é nas palavras de Lênin dar um passo atrás para dar dois para frente. A cultura do porto é uma história de superação e de operários sem patrões, o dever de suplantar o inimigo da estiva não é apenas da estiva, mas de toda a classe.

“Procuramos sempre trabalhar a base. As assembléias eram o ponto mais importante para as decisões e as formas de luta. No período do Pacto de Unidade e Ação (PUA), com vitórias maiores ou menores, íamos acumulando forças na unidade de ação… Após várias lutas e vitórias a nível nacional, com todas as categorias dos portos, ferroviários, marítimos e aeroviários e aeronautas, e apoiávamos também lutas de outras categorias, até que chegamos ao Comando Geral dos Trabalhadores. O objetivo do PUA… era organizar o movimento sindical a nível nacional para sermos uma força capaz de avançar na cidade e no campo, pelos direitos econômicos, políticos e sociais… Lutamos pelos direitos da cidadania, a democracia, liberdade e autonomia sindical. Lutávamos também pela defesa da soberania, limitação de remessa de lucros para o exterior, reforma agrária, reforma tributária, participação dos trabalhadores na administração do patrimônio público” depoimento de Oswaldo Pacheco.

A construção de acúmulo para responder ao ataque nacional e internacional patronal atinge nos anos 1960 o seu auge na construção da proposta de ‘reformas de base’ capitaneada pelo movimento sindical unitário, combativo, classista e nacionalista. No dia 19 de fevereiro de 1964 um edital de assembleia geral convoca os trabalhadores brasileiros para manifestarem “sua inabalável disposição a favor das reformas de base”. O edital assinado pela comissão tinha Oswaldo Pacheco como destaque, o presidente da FNE federação nacional dos estivadores, era representante do PUA e do CGT. Mais de 150 mil trabalhadores participam e apenas 18 dias depois o golpe burguês civil-militar é deflagrado para interromper os avanços sociais, as reformas de base, e o poder popular. O exemplo histórico mostra que é possível unir a estiva e liderar a classe trabalhadora.

A maior contribuição de Oswaldo Pacheco segundo José Adilson atual presidente da FNE federação nacional dos estivadores foi a sua visão de futuro, era uma liderança à frente do seu tempo. Ele foi capaz de visualizar as mudanças no mundo do trabalho, dentro e fora do porto à frente das outras lideranças. É dele a frase que se referia ao seu tempo, mas apontava para as vicissitudes do momento que estamos vivendo hoje. “É melhor ser um bagrinho estivador combativo dentro de um movimento de lutas no seu porto pequeno, do que um presidente em um grande porto burocratizado”. A sua acessibilidade e carisma e visão no meio da estiva foi algo incomparável.

Operários sem patrões, recuperar esta palavra de ordem, atualizar a mensagem através do programa “estiva em nossas mãos” é aquilo que se coloca imediatamente para trabalhar a base da estiva, mas também toda a classe trabalhadora, sobre a massa trabalhadora precária e periférica a partir dos trabalhadores em transportes e trabalhadores estratégicos, para desenvolver as forças produtivas e o poder popular. A fusão entre um programa da classe hoje com a palavra de ordem histórica dos trabalhadores no porto encontra espaço de diálogo, debate no cais e no entorno do porto.

A questão que se coloca não pode ser apenas discutir o controle dos trabalhadores sobre o processo de organização do trabalho apenas na estiva mas em toda a classe, sobre quem trabalha, não trabalha, sobre o desenvolvimento das forças produtivas, a divisão da riqueza do trabalho, pleno conhecimento da cadeia do trabalho e sua logística; a construção do poder do trabalho, da nova ética do trabalho, na nova sociedade, a partir das aspirações e da cultura do trabalhador hoje, o passo a partir do concreto; o programa pronto para o quadro trabalhar nas bases organizadas a elevação da consciência, nas condições subjetivas para as condições objetivas, em uma sociedade madura no capitalismo, para a revolução brasileira e para a nova sociedade socialista.

O programa estimula a valorização da profissão e a cultura do trabalho como organização do trabalho, seus conhecimentos específicos no contexto do estudo do trabalho; do estudo da associação, sindicalização, organização, a ferramenta sindical, a base organizada, os conselhos de trabalhadores. O programa busca nas palavras de ordem ‘operários sem patrões’ o posicionamento frontal na luta de classes, a partir dos valores culturais da estiva: sua luta, solidariedade, treinamento, profissionalismo, união.

A história da organização dos trabalhadores remete aos seus elementos centrais: a concentração de trabalhadores na construção civil e no transporte marítimo até o século XIX, na indústria e no transporte sobre trilhos e rodas que fazem parte história do século XX e XXI. Os estivadores nascem ombreados com a força desta história, têm seu auge na organização comunista entre o pós-segunda guerra e o golpe de 1964; historicamente importantes, seguem sendo, mas diminuiu sua capacidade organizativa da classe, para além da classe, no conjunto da classe trabalhadora consideravelmente, porque aumentou o seu isolamento classista e alcance político. Do outro lado, aumenta a capacidade do capital de controlar o processo de carga e descarga no porto. Quando a estiva recuperar a capacidade política através das suas qualidades voltará a ser como foi: a ponta da lança, a capacidade técnica do trabalho, a continuidade das lutas, o controle obreiro; em sindicatos fortes, classistas, capazes de alcançar toda a logística do porto e mais além. Quando a estiva recuperar sua capacidade classista toda classe trabalhadora será beneficiada.

É tradição, é cultura é história. A estiva conseguiu conquistar e manter direitos e normas para garantir a regulação da contratação e do exercício profissional do trabalho. Os estivadores arrancaram de pouco em pouco, ao longo dos anos, o poder da patronal em toda parte. Mesmo hoje em dia são capazes de parar a precarização como no porto de Barcelona. O objetivo é serem vinculados à profissão, não a um contrato precário, de ser vinculado ao ofício valorizado na logística geral do país, encontrar propósito, pertencimento profissional, o controle do trabalho e o exemplo deste controle para os demais trabalhadores. O poder operário depende de condições objetivas, da cultura e da consciência dos trabalhadores, mas cada geração escreve um capítulo da história.

O objetivo hoje é sair da condição de isolamento, de pura luta concreta trade unionista, quando não pelega afundada no banditismo e na corrupção, para um sindicalismo classista, internacionalista, político para a construção da revolução brasileira. Constituir uma política eficaz de alianças que faça operar as forças mais radicais nos lugares mais difíceis; sair do isolamento pela qualidade dos quadros organizativos promovendo a politização dos trabalhadores, por meio de práticas conectadas aos desejos mais concretos e imediatos dos trabalhadores. A politização no seu processo é uma ponte entre a demanda concreta realizada e a sua conexão com a pauta histórica de poder.

A organização política de base não tem logrado se apresentar como ação da grande política a partir da discussão de pequenas vitórias concretas, existe um vazio de discussão nacional e internacionalista, existe a perda da cultura da solidariedade na estiva. A estiva não vive sem o exercício da solidariedade. Precisa dialogar com aquilo que está enraizado na cultura política do trabalho, transformar a teoria crítica geral, debater, dialogar, observar os trabalhadores interferem na transformação da teoria pela base organizada, a partir da sua cultura política, a partir da democratização do controle, da justiça do acesso ao trabalho, sem ‘panelas’ favorecendo os protegidos da profissão.

Uma das características do controle obreiro é a distribuição equitativa e assemblear do acesso ao trabalho e renda. A forte fiscalização dos acidentes e da produção. Interferir no embarque e desembarque das cargas politicamente. Isso significa voltar a ‘estudar os trabalhadores no porto’ como fizeram os comunistas no passado, que adotaram práticas concretas por meio de vitórias concretas, ao mesmo tempo em que estimulavam práticas classistas que impactavam a realidade concreta dos trabalhadores, somente neste momento a grande política ganha um destaque todo especial, sem deixar de lado o resto.

Existe uma relação de excelência de construção do poder obreiro entre o trabalho do ‘quadro político e organizador’ nos moldes clássicos como no grupo de Oswaldo Pacheco e o trabalho de base crítico na base organizada, para a base geral, para a massa periférica, para o conjunto dos trabalhadores na sociedade. Este trabalho atemporal, como observado se configura em três momentos de atuação dos quadros que significam um único momento e ação: Em primeiro lugar o quadro assistente: a assistência externa do quadro formulador, experiente, especialista na luta geral e na grande política da classe, mais preocupado com as questões do Brasil e do mundo. Em segundo lugar o quadro externo: intermediário, organizativo, conhecedor da luta geral, mas técnico da luta concreta do setor, na específica missão organizativa dos estivadores e portuários, dos estratégicos; elo organizativo entre a luta histórica e imediata. Finalmente o quadro interno: especialista nos trabalhadores do setor, da estiva / porto na luta e ação concreta na luta de classes. Observa-se que a organização política clássica seja uma exceção hoje, mas nos setores estratégicos capazes de parar o sistema ela continua a regra. No meio disso o cimento dos conselhos de trabalhadores onde vanguarda e base se encontram, e seguem juntas na direção da base organizada e da base geral.

Na base organizada do período clássico, a forma organizativa se dava pela constituição na base de uma célula, com um comando trino: um secretário político, um organizador prático, um tesoureiro; para de forma planejada e planificada constituir uma base organizada, fazer bom uso da ferramenta sindical para o conjunto dos trabalhadores do setor. Hoje objetiva utilizar esta ferramenta para a luta classista, promovendo a frente única dos trabalhadores, e a abertura destes espaços para dialogar a pauta estratégica da sociedade; e finalmente promover o exercício mais legítimo de poder paralelo como estratégia de construção do poder popular, a construção de conselhos de trabalhadores em cada turma na estiva, garagem de ônibus, estação de trem, de metrô, no navio, setor do aeroporto, e base de pilotos e aeronautas. Em cada lugar: equilibrar a espontaneidade das bases com a disciplinada entrega integral e racional do saber prático dos comunistas.

Nos dias de hoje a estiva não pode prescindir do estudo para além da estiva: Ampliar a organização do trabalho, constituir conselhos, organizar base, atuar através de quadros, recuperar ferramentas sindicais, otimizá-las, torná-las classistas, submeter a teoria crítica para a base organizada na cultura do porto, negar a cultura política do desarme, apresentar a revolução brasileira, constituir a frente única dos trabalhadores. Utilizar o método crítico de estudo da realidade, o método em Marx, a constituição da ação política, o ethos sindicalista, a crítica da economia política, a estratégia de construção do poder popular, a correta política de quadros, a defesa da totalidade da teoria crítica das experiências socialistas, a defesa incondicional do poder próprio da estiva, popular, a partir da observação da estiva na classe, estudar o micro local, atuando na América Latina. E o ataque macro global ao micro local executado pelos seus sócios locais capitalistas no porto brasileiro e latino-americano, da constituição da defesa local e micro para a ação macro internacionalista. A micro-macro revolução latino-americana.

A análise concreta da situação concreta é compreender a conjuntura, o processo histórico, no território / tempo, na linha de enfrentamento prático, no conflito de classes na guerra de classes. O concreto, o argumento, a partir daquilo que investigamos. A estiva estudando e investigando. A investigação científica precisa ser minuciosa, é preciso muita paciência para determinar o conjunto das evidências do processo organizativo dos trabalhadores, para determinar o déficit organizativo da revolução brasileira a partir do porto, do concreto, e partir para apresentar o programa. Com muito trabalho, muita investigação, procura-se determinar o aspecto singular da pesquisa, a característica especial dos trabalhadores da estiva e do porto na sua contribuição para os trabalhadores em transportes, estratégicos, e para o conjunto da classe trabalhadora. A especificidade do trabalho determina também a sua crítica do trabalho de base. Felizmente o estudo dos trabalhadores não é acadêmico apenas, mas é rigoroso nas tentativas práticas para a transformação prática da sociedade. Investigar é agir na estiva.

Desde o início da organização anarquista, comunista, e democrático popular, os comunistas particularmente, estavam determinados a atingir o máximo de trabalhadores, mas havia uma estratégia, que consistia em construir um pequeno grupo tecnicamente preparado; que a partir daí organizava uma parte importante da base, que se convertia em base organizada, esta coincidia com os trabalhadores mais organizados no sentido da sindicalização, nas assembleias, participação nas discussões concretas e nas greves que as conectavam com as discussões mais importantes na luta de classes. A organização de uma política de quadros no porto e o debate na base aponta para a organização da frente única dos trabalhadores, a frente única econômica, a organização por setores dos trabalhadores com uma federação unitária. E isso se discute hoje na fusão de federações.

No passado, o que caracterizou a organização comunista dos trabalhadores na estiva e no porto foi a ação da vanguarda por sobre o grupo de trabalhadores organizados; hoje, a partir da vanguarda e base organizada na base geral, para além da base geral, na massa trabalhadora geral, precária e periférica, e no conjunto da sociedade. Um grupo seleto de revolucionários, bem apoiados, bem preparados, com autonomia, no número correto, e que respeitam o tempo de maturação e assimilação crítica de transformação do conjunto da teoria crítica na luta concreta na luta de classes. Desta forma foi possível constituir juntamente com a base organizada um programa e uma linha de atuação de implementação da linha política que balizaria o conjunto da atuação prática no meio das diversas tendências ideológicas, com foco classista, recuperando a ferramenta sindical, organizando os trabalhadores e construindo conselhos de trabalhadores nos locais de trabalho e de moradia. A investigação mostra que o caminho organizativo não mudou.

As especificidades do Brasil no contexto da América Latina pedem a constituição de sindicatos que ao mesmo tempo interagem com conselhos, com outros sindicatos, com movimentos populares, associações, e juventude. Nestes sindicatos, mais estratégicos, o desenvolvimento do trabalho de base crítico, na luta concreta, econômica, na luta de classes, a construção da luta política, vai além da organização sindical; passa pela organização classista, e se constitui na organização política dos quadros, um grupo seleto “com grande capacidade de resistência e maior espírito de sacrifico”; ou seja, um alto teor de entrega militante, de disciplina revolucionária, de estudo específico e prático do conflito de classes no contexto da teoria da guerra de classes, e de solidariedade para com a construção do desenvolvimento das forças produtivas dos trabalhadores.

Para a constituição do porto de ‘operários sem patrões’, a atuação dos comunistas no seu início esbarrou no declínio da organização anarco-sindicalista e na atuação dos reformistas, mas a estratégia da frente única com os trabalhadores, incluindo ambas as forças, se mostrou melhor preparada e adaptada para assumir a vanguarda organizativa e viver o período de ouro da organização do porto vermelho entre os anos da pós-segunda guerra até o golpe de 1964, agindo na completa tomada das três principais posições na luta de classes: A eleitoral burguesa utilizando o parlamento como tribuna, e agitação e propaganda. Ocupando o espaço institucional jurídico-burguês para pressionar e obter vitórias, direitos mediatos e imediatos. A organizacional, recuperando as ferramentas sindicais para a luta de classes, organizando trabalhadores, e constituindo conselhos. E a constituição de frentes únicas de trabalhadores estratégicos, e para além deles, do PUA, de trabalhadores urbanos, rurais e soldados, acumulando greves para o comando CGG e o CGT, um comando geral dos trabalhadores para a greve geral política e insurrecional.

A organização para esse fim significa suplantar de um lado, a ‘ação direta anarquista’ que trazia no seu bojo um revide de terra arrasada da patronal, antes que houvesse um amadurecimento da base organizada; e do outro o viés principal ‘jurídico e institucional’ dos sindicatos pelegos. Objetiva-se um meio termo / tempo de construção sólida de organização. Nas palavras de Lênin, a arma da crítica e a crítica das armas, que arma a classe trabalhadora para um fim insurrecional, ao mesmo tempo em que através de pequenas e médias vitórias acumulam para as vitórias históricas através da estratégia de construção do poder dos trabalhadores, do poder popular. O mérito da organização comunista junto aos trabalhadores da estiva respondeu a anseios que somente o pensamento mais refinado da luta de classes podia alcançar. Ao mesmo tempo em que atendia os desejos mais importantes da classe estivadora: a democratização do acesso ao trabalho e o fim do favorecimento seletivo dos escolhidos pela patronal para comandar a organização, e o controle da produção do trabalho em um acúmulo e ousadia da classe.

A organização dos trabalhadores da construção civil e dos transportes está na gênese da organização dos trabalhadores estratégicos e de toda a classe trabalhadora; a organização dos trabalhadores estivadores no porto de Santos está apoiada nos ombros da organização dos trabalhadores da construção civil nos anos vinte e trinta. O início verdadeiramente organizativo dos comunistas é o BOC (bloco operário) uma frente única institucional, política, classista, sindical. Desde o início os comunistas baseiam suas ações organizativas no princípio de constituição de conselhos de trabalhadores, que são recrutados nas bases dos sindicatos; isso objetivava antes de recuperar a ferramenta sindical para a luta de classes ‘quebrar a pasmaceira dos sindicatos’, agitar suas bases, ‘unificar e organizar os trabalhadores desorganizados’. Portanto, desde o início o objetivo que continua agora na ‘estiva em nossas mãos’ é o mesmo: recuperar a ferramenta de luta, organizar a base e constituir conselhos de trabalhadores.

Neste caminho, o foco na priorização do local da organização, a quantidade de estruturas sindicais classistas apoiando o esforço organizativo, e principalmente a quantidade / qualidade de quadros no processo organizativo revolucionário determinam a vitória ou a derrota do processo de organização. O déficit organizativo de quadros organizativos determinando o déficit revolucionário. Na atual conjuntura, de ataque concentrado nos setores estratégicos, são eles mesmos, os quadros, que precisam assumir esta vanguarda defensiva para a constituição da defesa profunda (formada de diversas camadas); o que significa que o contra-ataque precisa ser organizado nos marcos da luta de classes sem esquecer-se da luta concreta, para além da luta corporativa sindical econômica e trade unionista, mas para uma luta classista e política insurrecional. O papel do quadro político organizativo é determinante na organização pelos ‘seus conhecimentos de tática e organização’, que conhece a estiva e além dela. Organizar centenas ou milhares de estivadores juntos significa qualidade e quantidade.

A frente única de democracia dos operários e trabalhadores se inicia nos setores mais estratégicos, pela frente dos trabalhadores de transportes e estratégicos, aqueles capazes de parar localmente o sistema capitalista global; daí para os setores mais conscientes da luta de classes, na frente dos trabalhadores organizados; para então cobrir por solidariedade os mais precários e periféricos, e o conjunto da classe trabalhadora, no conjunto da sociedade. A massa de trabalhadores em geral, incluindo os trabalhadores precários, periféricos, precisa ser necessariamente organizada a partir dos trabalhadores estratégicos, que através de uma política de quadros possa construir mais quadros organizativos, especializados na inserção da massa geral, precária e periférica; e através do seu número, estruturas classistas, apoio aos movimentos populares e de juventude, priorizando as ações estratégicas segundo as especificidades da luta concreta na luta de classes, para cobrir toda a classe trabalhadora, em bases menores destacadas e massa.

Uma reivindicação concreta dos trabalhadores pode e deve ser elevada em uma reivindicação da classe, a reivindicação política que retorna para a base através de grandes debates nos locais de trabalho e de moradia. A organização pode iniciar com um número restrito de quadros, mas não pode terminar o processo organizativo desta forma. O processo organizativo precisa levar o tempo que levar para coincidir com os ascensos da luta de classes, e neste sentido, elevar o número de quadros do conjunto da esquerda revolucionária de centenas para milhares e milhares para dezenas de milhares; e de dezenas para centenas de milhares, e daí para milhões, que inseridos na massa trabalhadora geral, precária, periférica organizam com a massa a revolução brasileira. A luta da estiva no bojo da luta de classes pode até começar pequena, mas não pode terminar esta jornada desta forma. A cultura da estiva precisa falar para todo o Brasil.

Os estivadores em coalizão com os ferroviários há cem anos compreenderam na prática que a construção da sua paralisação funciona como um torniquete local na estrutura de circulação global do sistema capitalista; mas demoraram a atingir as condições objetivas e subjetivas para por isso em prática: ‘a adesão, a paralisação assumia uma dimensão ainda maior por estrangular o sistema de escoamento de mercadorias entre São Paulo e Santos’. Hoje, a situação se torna mais complexa, não basta a pauta corporativa porque o conjunto da sociedade estaria contra. É preciso disputar o conjunto da sociedade, a partir de alianças classistas entre os setores estratégicos, os setores mais conscientes, disputar os setores mais precários e periféricos e a massa trabalhadora para este debate; vencer com os movimentos populares, os sindicatos, a juventude, e o conjunto da sociedade. Hoje os estivadores e os ferroviários (caminhoneiros) seriam derrotados se lutassem sozinhos; como foram os trabalhadores dos correios. Porém, estes seriam vitoriosos como fizeram os portuários e ferroviários franceses em 2019, que venceram a reforma da previdência do presidente Macron porque cumpriram todo o processo organizativo. Organizaram de forma unitária a luta do setor estratégico, o movimento popular (coletes amarelos), a juventude e o setor consciente nas universidades, e no processo disputaram e ganharam a sociedade, que também defendeu a greve.

O objetivo de um movimento classista sempre foi centralizar a ação da classe no local, na comunidade, ‘centralizar a ação dos sindicatos na cidade’. Para isso existe o tempo de ‘jogar forças contra forças’, e o tempo de maturação do trabalho de base crítico para a assimilação critica da base organizada; a constituição de uma defesa profunda, parte do paciente trabalho constitutivo e resistente e resiliente e constante de construção organizativa; para então na forma de contra-ataque ‘jogar forças contra forças’. Uma maior flexibilidade na ação, uma maior constância na organização, e a construção de um contra ataque superior, que prepara um ainda maior contra ataque de massas, para aterrar o inimigo capitalista, que é superado pelo conjunto das forças locais, ainda que continue superior globalmente. Todo este trabalho é silencioso e somente se mostra na hora certa. O atacante precisa ser aterrado pela força da organização de base e discussão do programa, nos quadros organizativos em novas bases organizadas e novos conselhos.

A ampliação da luta no interior dos sindicatos se reverte na organização da base organizada e geral, mas somente a recuperação da ferramenta, por solidariedade pode ‘destacar quadros políticos’, para a base consciente e organizada no sentido de constituir o PUA e uma frente única de trabalhadores, e continuar girando e destacando quadros organizativos para a massa geral, precária, periférica. O resultado das lutas impactam diretamente fortalecendo a inserção dos quadros num maior espectro de cobertura. São as vitórias concretas, as pequenas vitórias que determinam o avanço dos quadros no processo organizativo na base organizada e para além dela. As vitórias parciais da luta pavimentam as conquistas históricas da categoria, e estas apontam os objetivos históricos. A vitória da posição dos quadros operativos precisa acontecer na operação prática. A orientação do programa no PUA e na frente única dos trabalhadores pode ser traduzida na correta política de quadros e na construção do ENCLAT, o encontro da classe trabalhadora, dos movimentos e da juventude, e parte da discussão no porto.

Toda greve precisa ser razoavelmente bem preparada, todo trabalho de base crítico também, ‘procurando evitar que qualquer corporação vá isoladamente à greve desgastante e procurando conhecer psicologicamente cada ambiente, os componentes, e as aspirações individuais’ que também se exercitam na greve. É um equilíbrio constitutivo de forças. Isso somente é possível de se atingir com o conhecimento completo dos quadros internos que atuam em determinada base organizada, da própria base organizada, e um razoável conhecimento da base geral, da priorização de atuação na massa geral dos trabalhadores para além da base geral em direção aos trabalhadores precários e periféricos; dos aliados classistas e dos atores políticos por sobre o tabuleiro do território / tempo do conflito de classes, na guerra de classes. A linha do conflito de classes precisa ser estudada com os atores envolvidos, na construção do front social. A linha do conflito de classes precisa ser estudada a partir da linha histórica e política.

O front social é como o muro do porto que precisa ser superado. A proposta de união sindical, intersindical portuária, ou frente única dos trabalhadores no porto é uma proposta para se estender como proposta de frente dos trabalhadores que está sendo debatida dentro do programa. A frente é a proposta nos limites da classe trabalhadora. O objetivo é congregar as entidades sindicais, oficiais ou não, inclusive os pelegos. É na totalidade, na maioria esmagadora que a linha classista precisa ser exercida. É na correta de ação dos quadros, base organizada, conselhos e nos sindicatos classistas pautando a ação do coletivo, do conjunto. Superar o front social é superar o inimigo localmente.

Precisamos falar da organização de massas, da ANL (Ação nacional libertadora) que foi a maior organização político sindical de massas na história da esquerda brasileira. A sua virtude é a absorção de nacionalistas, humanistas, esquerda revolucionária de diferentes matizes, sociais democratas e reformistas. Sua luta e eficácia contra o fascismo, o imperialismo e também contra o capitalismo foi muito importante. No seu viés sindical, os comunistas se aproximavam com os socialistas, reformistas e ministerialistas (aliados do governo), a fim de desenvolver um sindicalismo unitário, ‘um trabalho de unificação sindical’. A participação dos estivadores de Santos foi no seu lançamento em um teatro. O lançamento da frente de massas em um estádio, teatro, grande praça púbica nos anos trinta tem uma simbologia que aponta para a toda a sociedade. A intelectualidade e a cultura são fundamentais para isso. O seu braço sindical é um congregamento de união sindical da classe e as principais bandeiras são discutidas, o grande exemplo para o hoje.

No seu aspecto político, a construção da radicalização sindical, social e política a radicalização no seu objetivo, ‘todo poder a ALN’ não pode ser resumida a um manifesto, mas ao trabalho permanente de construção do poder popular, o trabalho de base crítico. Leve uma semana, um ano, dez anos, um século, a educação popular é a base da revolução popular. O debate em torno da política e da estratégia precisa estar acessível à classe trabalhadora, mas também disputar a hegemonia no conjunto da sociedade. Os inimigos da ANL continuam bem atuais, o latifúndio, o imperialismo, o fascismo, o capitalismo. O programa central na ANL é central hoje. A situação de polaridade na sociedade entre direita e esquerda, o debate e a questão militar, a unidade da esquerda revolucionária, a incorporação da outra esquerda, a incorporação das mais diversas lutas, a mensagem popular, o indivíduo na luta geral, na luta de classes. A diferença é compreender que a revolução no Brasil capitalista hoje é socialista.

‘O caráter radical da ANL está explicitado no seu programa’ que incorpora outras tantas radicalidades’. Hoje, uma grande frente de massas incorporaria direitos das mulheres, negros, indígenas, LGBTTI, dos estudantes e da juventude; dos idosos, dos migrantes e estrangeiros; dos direitos e garantias democráticas, direitos de cidadania, políticas afirmativas, garantia republicana com o funcionalismo público; das questões nacionais e o poder dos salários e dos trabalhadores contra a carestia, o desemprego, pelas garantias das mais diversas categorias na luta pelos seus direitos. A frente acumula e ganha tempo para organizar a defesa no contra-ataque e incorporar as demandas revolucionárias.

A frente de massas coloca nas massas a tarefa violenta de transformação da sociedade. Os trabalhadores organizados precisam ser a força de transformação e liderar o processo. O núcleo dos comunistas estivadores portuários na ANL era o maior da cidade de Santos. Eles partiam do concreto. Os trabalhadores organizados tinham na ANL um lugar privilegiado para debater suas pautas imediatas e históricas. Na frente de massas é preciso debater a exaustão a linha política entre: a ação concreta insurrecional com data marcada, para além da defesa, no contra-ataque; e a paciente defesa e o trabalho de base crítico para acúmulo para ser usado apenas quando a massa claramente passar da defesa para o contra ataque; e incluir por inércia os que não querem avançar, por medo de serem derrotados ou perderem o que adquiriram, e os que mostram oportunismo. Quando chegar o furacão no porto a defesa da estiva precisa estar pronta.

O programa, projeto, estratégia popular, nacional revolucionária e socialista é mais eficaz na estratégia de trabalho de base crítico. A sua coluna mestra é o trabalho sindical classista, aquele que amplia seu escopo com os movimentos populares, a juventude, associações de moradores, para a greve geral insurrecional; para a formulação, a agitação e propaganda, a cultura, o trabalho de base organizativo e crítico, a criação de unidade aguardando o ascenso revolucionário. O exemplo do passado para a atualidade coloca um acúmulo para enfrentar o inimigo que almeja a destruição no porto hoje.

O conhecimento da ANL pelo movimento classista hoje corresponde a um renascimento das forças organizativas dos estivadores e portuários, agora sob hegemonia de um programa, a ‘estiva em nossas mãos’; para recuperar um excelente trabalho de base crítico na estiva, para a estiva e para além da estiva; onde é preciso construir a frente única, fazer da organização um caminho para tomar o Estado, a mensagem para a sociedade a serviço dos trabalhadores, a disputa do governo, do Estado e estabelecer hegemonia na sociedade; estabelecer uma frente das trabalhadoras e trabalhadores no sentido “daqueles que vivem do próprio trabalho”; o poder popular como a direção dos trabalhadores na sua principal força dirigente, e os estivadores neste comando. Os estivadores antes isolados constroem agora um movimento da classe e para a classe.

Quando a ANL foi fechada circulou um boletim dos estivadores exigindo sua abertura. Quando a ANL foi fechada o trabalho de base em bases sólidas continuou de outras formas com o acúmulo adquirido nos setores de transportes, e de juventude, isso garantiu as futuras bases de florescimento do movimento político, sindical e classista a partir da organização acumulada nos seus setores mais estratégicos. Depois de 10 anos acumulando, trabalhando a base, inclusive no setor militar, a partir de 1944 / 45 até 1964 os frutos são colhidos como frutos da melhor qualidade no processo organizativo.

A constituição do trabalho de base crítico no porto precisa necessariamente da presença de ‘um elemento da prática da categoria, um fator constitutivo de sua própria cultura e experiência’. A cultura do porto não pode desaparecer, a sua liderança sindical, classista, política, necessita combinar a experiência maior da luta de classes com a experiência específica dos trabalhadores do setor, que quando organizados exprimem suas próprias respostas organizativas, a partir da transformação da teoria crítica geral na luta concreta na luta de classes. O programa, o movimento classista, a mensagem e base.

A continuidade, o acúmulo organizativo crítico é a melhor maneira de construção do ascenso revolucionário das massas. A soma de ferramentas sindicais classistas, quadros, bases organizadas e conselhos de trabalhadores são uma soma de excelência. O maior anseio histórico da estiva ‘trabalhar como operários sem patrões’ precisa de uma estratégia de ruptura e histórica para que isso ganhe concretude nas pequenas lutas, como também na estratégia de construção do poder popular. Neste caminho é preciso a condição objetiva da estrutura de ganho de espaço e consciência subjetiva no acúmulo e elevação da consciência, para vencer as lideranças traidoras e eliminar os patrões.

O próprio projeto pode se tornar um fator de orgulho, se tornar ‘operários sem patrão’. A atividade coletiva coordenada se refere ao trabalho de base crítico que organiza concretamente individualidades em coletividades, sem anular as aspirações individuais, mas acrescentando aspirações simbólicas coletivas. Existe cultura em cada estivador, nos muros do porto e para além dele na cultura organizativa da classe. A influência se refere diretamente na concretude da linha política que precisa ser constantemente avaliada nas bases organizadas na presença de quadros. Contar a história da luta na luta.

É preciso contar as histórias da estiva com a simplicidade da classe; ouvir a linguagem popular, suas lutas, alegorias, “a história das três barrigas de contra mestres”, quando o trabalho de distribuição de serviços na parede com o preceito de que o trabalho caiba, equitativamente, a todos”, e visa eliminar o favoritismo na parede. Foi assim: Quando a lei instituiu o salário por produção, cabia uma cota ao trabalhador, uma cota e meia ao contra mestre auxiliar, uma cota por porão até o limite de três cotas para contra mestre geral do navio. Daí “três barrigas porque comem por três bocas, pois não se compreende um homem a serviço do patrão perceber três cotas retiradas do montante dos ternos, onde cada trabalhador, a custa de muito labor, só consegue ganhar uma cota.”

É genial como o trabalhador consciente analisa a exploração que incide sobre ele, e jocoso, debochado inventa formas de transformar aquilo em indignação, chacota e luta concreta. O contrário da exploração é mostrar a justa divisão a partir do justo trabalho e da justa responsabilidade compartilhada na execução do trabalho; tudo isso é o exemplo de excelência que a profissão da estiva ensina para as demais profissões; porque a partir desta excelência e respeito vem também, para além da reivindicação de salário, a reivindicação de poder. Fazer do trabalho um direito para todos, ‘acabar com os ‘ganhos’ e fazer com que o trabalho fosse um direito para todos’; e fazer das ‘barrigas’ uma necessidade individual significa no fim apontar a inutilidade dos atravessadores patronais do porto, e, portanto o controle obreiro no Estado operário. O trabalhador cuida da carga do início ao fim, fiscaliza, trabalha, contrata, demite, paga e gerencia.

Uma estiva sem favorecimento e solidária de um lado, do outro uma estiva com poder. O período do porto vermelho com Oswaldo Pacheco e ‘Chuvisco’ é o período de ousadia na luta de classes, mas com plena garantia de que o direito mais imediato seria atendido, sendo considerado ‘o processo civilizacional na estiva’. Os comunistas, os socialistas, classistas no porto significaram: organização, direitos chave, enraizamento, trabalho de base crítico, constante, paciente, com empatia, exemplo, conectado às aspirações mais justas das condições do trabalho, da ‘faina diária’. A partir daí poderia então ser dirigida a estratégia de radicalização da cidade. Uma vez organizado o setor estratégico, conectando isso com outras categorias organizadas; pode-se então partir para a organização da massa geral, periférica, dos desempregados, a massa trabalhadora. A radicalização precisa chegar da ponta da lança (estiva) até a ponta da classe (precários e periféricos). De ponta a ponta a proposta radical precisa ser apresentada para toda a sociedade. Uma marcha de operários sem patrão até o centro com a ‘estiva nas mãos’.

Com a garantia do trabalho, ‘rodízio’ na sua própria classe, pode-se então apontar para a classe geral, lançar um objetivo mais alto, a proposta de trabalhar sem patrão, o controle obreiro ser apresentado nas praças, nas escolas, outros sindicatos e grêmios, “com a implantação do rodízio seria reforçado entre muitos trabalhadores o ‘orgulho de ter trabalho e não ter patrão’ na medida em que são trabalhadores, fiscais, contramestres, de seu próprio ofício, determinando quem trabalha em quanto tempo e em que condições”. O ato sindical traz para a convenção coletiva o ato classista e se apresenta a outros sindicatos. O ato político apresenta a cidade, a sociedade, as leis, a pedra das ruas ao estivador, que enquanto pensar na sua vitória não vai pensar na derrota da classe.

A hora se faz urgente para a cultura e a consciência da classe estivadora. A condição da consciência também é obra de elevação e de exercício do ofício “é implícito o ‘direito’ operário de recusa à execução de um serviço organizado fora das regras convencionadas, tornando comum a paralisação ou o atraso na execução do trabalho. A mesma consciência como já vimos, para o país e o mundo. O exercício do controle e da gestão obreira determina o poder de parar. A greve dos locais de trabalho, das condições de trabalho, classista de solidariedade com direitos comparados, a greve política da insurreição política e revolucionária para ser organizada nos conselhos. A garantia do trabalho, da sabedoria da estiva, da congregação e da união da classe.

A cultura da gestão operária e o controle da produção. “Resistir às ordens dos empregadores quando forem violadas as regras de trabalho tornava-se fonte de orgulho e auto-estima, … faça a coisa certa para estar entre seus companheiros, um homem que levasse para seu navio sua media de energia, qualificação, experiência, robustez, engenhosidade, estaria expressando seu senso de fraternidade e comunidade com seus companheiros”. Isso é para ser ensinado em toda parte, nas praças e escolas para toda a humanidade. O trabalho, o respeito, o poder, a humanidade. “A razão disso era simples: sua contribuição na execução do trabalho tornava as operações de carga e descarga menos difíceis e perigosas; sua reputação de ‘bom membro do sindicato’ unia-se a de ‘um bom estivador no trabalho’. Assim, uma atividade considerada brutal e degradante podia se transformar em criativa experiência ética, os ternos (grupos de trabalho) da estiva podem ser definidos como ‘pequenas sociedades cooperativas”. A experiência da estiva aponta para outra ética, de outro sistema, impossível sob o capitalismo.

Nesta rede cooperativada a ajuda mútua, o cuidado solidário, a vida em comunidade saía do local de trabalho para o local de moradia, os laços de amizade e de família se estreitavam, esta é uma das grandes características da estiva como resposta a um mundo cada vez mais individualizado, ‘uberizado’, fragmentado, ‘além do envolvimento, os colegas são os maiores censores’, não pelo sentido crítico apenas, mas do cuidado integral e educativo. Daí para experiências do poder popular foi um passo, com verdadeiros julgamentos entre os próprios trabalhadores, no sentido de resolver problemas concretos de convivência no trabalho e para além dele. “A corte (justiça dos trabalhadores) deveria ser ainda suficientemente democrática para ouvir trabalhadores e chefias, e todos deveriam estar prontos para julgar e ser julgados”. A justiça laboral e comunitária foi fruto das experiências dos trabalhadores no porto até o golpe de 1964, e deveria ser estuda hoje como verdadeira proposta de criação de justiça e poder popular.

Os estivadores, os portuários ainda que sendo pioneiros no conjunto dos trabalhadores de transportes, e dos trabalhadores da construção civil, nas lutas da classe trabalhadora brasileira, bebem na fonte do conjunto das lutas populares e da classe trabalhadora, na luta das mulheres tecelãs, dos gráficos, dos escravos. De todos não organizados, em todas as comissões e conselhos de trabalhadores, que não tinham a mínima chance de verem suas reivindicações atendidas, porque não possuem poder. A classe trabalhadora tem no seu longo processo organizativo muito mais fracasso para contar do que vitórias. O inimigo capitalista é mais forte que reis, senhores feudais e o conjunto da aristocracia, mas a classe trabalhadora também é mais forte do que os escravos e os servos da gleba.

É preciso unificar experiências. As razões da derrota do conjunto das lutas populares, na história da classe, da estiva na primeira síntese das lutas organizadas no Brasil sob as lideranças anarquistas foi ‘o anti-clericalismo libertário (anti-religião), a divisão organizativa entre trabalhadores qualificados e não qualificados, a forma de apresentar o programa revolucionário, a crítica da presença das mulheres nas fábricas, ou a intervenção estatal nos sindicatos’ que levou ao distanciamento de lideranças e base. Os estivadores viveram seu auge na forma organizativa sob os comunistas, e após o fim da hegemonia em 1964, o velho sindicalismo continuou organizando e resistindo em conjunto com a estiva brasileira. Nos anos oitenta mais resistência sob o novo sindicalismo que foi hegemônico até 2008 e em 2016, quando atinge o seu esgotamento. Os estivadores e a classe vivem hoje um intervalo para a construção organizativa de um programa unitário, classista que precisa estar adaptado às condições presentes e futuras.

O hoje-futuro-passado necessita associar as experiências de conselhos e comissões de trabalhadores com direções renovadas e estruturas recuperadas que apostem em uma base cada vez mais organizada. O programa revolucionário somente cabe na base organizada em torno da sua própria agenda concreta, mas precisa do programa classista. Somente cabe na luta concreta na luta de classes se a demanda concreta se transformar na demanda da classe. Existe uma linha complexa evolutiva ou cumulativa, da formação da classe trabalhadora na estiva até o ocaso do novo sindicalismo; hoje existem avanços e recuos e cada um deles merece ser estudado para ajudar a massa, a classe, à estiva que toma a estiva em suas mãos para enfrentar um modelo de porto completamente privado.

Aquilo que o conjunto dos críticos do velho sindicalismo colocava como o maior problema da organização classista, a clivagem entre os quadros e a massa geral da base geral, passando pela base organizada, talvez seja uma das maiores forças que se colocam hoje no novo período nascente. No meio existe o cimento dos conselhos de trabalhadores e populares. Os quadros de vanguarda organizativos inflexíveis contra o fascismo, o imperialismo e o capitalismo, preparados e flexíveis na tática, lutando, críticos do cupulismo e do aparelhamento focados na luta concreta e na luta maior histórica. A luta revolucionária precisa ser aprendida como desafio para uma correta política de quadros no porto, estes importantes aspectos são abordados pelo programa ‘estiva em nossas mãos’. Assim como a estiva precisa do poder de cada trabalhador organizado e coletivo, ela também precisa de quadros projetando um sindicalismo unitário, classista, combativo, internacionalista, que visa organizar a greve insurrecional; e da luta concreta a estratégia do poder popular e a revolução brasileira.

A experiência de ação direta tem muito que contribuir com a nova síntese popular, seu exemplo de educação política e consciência é absorvido pelos comunistas no seu projeto popular, nacional e insurrecional revolucionário, a ruptura organizacional; a história da profissão no seu processo de poder e valorização têm na síntese anarquista e comunista muita similaridade. O processo democrático popular traz uma ênfase na convenção coletiva, na ação jurídica, mas também tem luta econômica. Com a ênfase insurrecional esquecida e o setor de transportes submetido a uma lógica fabril metalúrgica, o centro gravitacional muda de lugar e a revolução brasileira entra por dentro da via negocial. “A colaboração de classes” nunca foi algo desconhecido no porto, mas este nunca foi o aspecto prevalente: Estiva é luta. O projeto democrático popular fechou o porto em si mesmo, seu declínio pode fazer o porto se abrir novamente.

Infelizmente, o principal aspecto do período de ouro da estiva até 1964 foi esquecido, a preparação em excelência de quadros externos vindos para auxiliar os quadros internos nas questões da luta concreta, mas principalmente da luta de classes foi colocada no segundo plano pela CUT Central única dos Trabalhadores, que ou não tinha estes quadros ou não priorizou os trabalhadores de transportes, quando colocou em segundo plano a centralidade do trabalho, a exploração da mais valia e a revolução. Quando abriu espaço para a hegemonia da organização burocrática, e isolacionista no maior porto do Brasil, quando desarmou a classe trabalhadora do poder da estiva e do poder popular. O que promoveu o isolacionismo e a ênfase negocial que resultou nas maiores capitulações teóricas e práticas na luta de classes teve como conseqüência a falsa crença na sua individualidade de poder, a cisão dos elos nacionais e internacionais, a capitulação do sindicalismo classista, a assunção e sua substituição pelo sindicalismo de resultados, de crença jurídica, de ‘colaboração empresarial’, ‘trabalho decente’ e sindicalismo recuado diante do inimigo.

O novo período a partir da crise de 2008 sob a nova síntese precisa da organização da defesa diante do inimigo, a unificação da estiva, dos portuários, que se faz necessária para substituir o isolacionismo nacional e internacional. Se o conjunto das forças existentes não se colocar frontalmente contra a patronal e o governo, a coalizão patronal / governo vai passar por cima da estiva e fazer do porto um condomínio fechado, seguindo o modelo dos portos privados. O sindicalismo classista começa a substituir o sindicalismo burocrático no maior porto, mas isso carece de tempo e passos firmes. A renovação coincide com a recuperação da ferramenta sindical, mas é preciso aperfeiçoar a ferramenta para organizar a classe para o enfrentamento classista. Os conselhos de trabalhadores são o amadurecimento do diálogo do problema na base neste passo.

A estiva começa a dialogar para se tornar a estiva nas mãos da estiva. Um grande movimento pode de forma organizada parar um grande ataque. Lembrar que o período de ouro não era aquilo que os comunistas, socialistas, trabalhistas traziam de fora para dentro do porto, mas aquilo que o porto levava de dentro para fora, para o conjunto da classe trabalhadora. Quando os quadros organizativos traduziram e deram voz à vontade imediata do trabalhador na luta concreta na luta de classes. “A influência gradativa do PCB (partido comunista brasileiro) entre os estivadores, em particular, evidencia também o enraizamento de seus militantes nas bases da categoria’. Porque foram eles que melhor traduziram as demandas por democratização da estiva, que lutaram ‘pela discriminação na dura parede de cada dia’. A nova síntese sob o projeto ‘estiva em nossas mãos’ começa daí, do acesso ao trabalho, do controle do trabalho, o longo caminho para o poder classista, o poder da classe, para além da classe. O problema organizativo hoje é um problema real e final.

A transformação da estiva em uma estiva sem patrões é um longo caminho, que a urgência apresenta como tarefa para hoje, agora. Foi o adensamento da cultura da solidariedade, o fortalecimento da estratégia de construção de poder popular através do controle obreiro e outras experiências que favoreceram o salto de uma geração de estivadores para ousar disputar o controle do trabalho para além do controle do trabalho somente na estiva. ‘Operários sem patrões’ precisa retornar como mensagem atual e o programa da classe estivadora e portuária hoje. Mensagem de porta de entrada para os conselhos, a “micro-sociedade política”; a participação, convivência e organização. Os desafios hoje pedem muita ousadia diante da destruição da profissão como a conhecemos. O inimigo sabe que se a estiva não preparar o contra-ataque será seu fim.

O contra-ataque é quando se decide o dia, se prepara para o dia, vem, vê, surpreende o inimigo, atacando com tudo que se tem. Se a profissão sobreviveu ao tempo, aos ventos liberais dos últimos quarenta anos misturados à repressão da ditadura militar, à tentativa de destruição da estiva sob o governo Sarney, a desregulamentação do setor portuário diante daqueles que ousam ‘viver sem patrões’. O passo está dado, a estiva cruzou o rio e não tem como voltar atrás. Diante de um inimigo global atuando localmente com sócios locais, nada menos do que uma defesa local atuando com a cabeça mais internacionalista possível, com alianças para além da estiva. Uma micro-macro revolução na estiva, a maturação e assimilação crítica na estiva, a recuperação das ferramentas, a construção de bases organizadas e de conselhos nas turmas é mais do que nunca agora um ato organizativo revolucionário. Este ato passa pela participação ativa no micro local ‘estiva’ da política visando a participação radical da consciência política nacional / global no contexto da América Latina. Nunca a situação do estivador portuário em Valparaízo no Chile foi tão vizinha da situação da classe no Brasil.

Unidade com todos aqueles que querem construir este programa na estiva. Toda a construção do trabalho de base crítico na micro participação embrionária associativa, no pequeno trabalho na equipe de vinculados, na turma, na parede, na lingada, no porto se torna a ‘parte organizada’ no porto organizado; a ‘mão no poder da estiva’ que aponta para a superação pela luta. Aquilo que aparentemente parece se associar ao reformismo, e se anular diante dele, pelo contrário, dá a linha, unifica a estiva em uma frente única de todos os trabalhadores e parte do programa revolucionário a partir do programa da profissão. Na história da estiva esta construção serviu para acabar com a violência, exercitar o convício social, a política educativa dos sindicatos, da classe; pela recuperação da ferramenta e sindicalização, os avanços e recuos, os aprendizados. Todo este múltiplo aprendizado foi fortalecendo a construção para um trabalho de base crítico mais sólido.

A crítica do trabalho de base na estiva significa o programa da estiva em nossas mãos. O programa nasce da estiva para a classe, a estiva através da sua cultura de solidariedade, valoriza a profissão, cria o poder da classe, modifica a teoria crítica, cria o poder no seu enfrentamento concreto; não mais sozinha, mas no conjunto da classe em movimento, da proposta revolucionária, que conhece e opera a cadeia organizativa por toda a rede de bens e mercadorias globais no local do conflito de classes. O micro-macro revolucionário que se evidencia pela ação organizativa da vanguarda tem como desafio uma ainda maior vanguarda de quadros operativos se quiser ir para além da estiva. Foi assim nos grandes ascensos no passado, do nascimento da estiva até 1917, em 1935, 45, 53, 58, 60, 62, 63, 64, 68, 78, 83, 87; nas leis 8630/93, 12815/13, e na nova lei dos portos 14047/20; sabendo que recuar nunca beneficiou o trabalhador e não vai parar, o próximo passo é a privatização dos portos, a destruição da classe estivadora.

A defesa organizada do trabalhador precisa causar um efeito devastador na cabeça do inimigo: ‘magnitude, impacto, visibilidade’. Começa como onda pequena e não pode parar de crescer. A defesa organizada precisa de profundidade para a onda crecer. Ser profunda para um contra ataque de surpresa, que prepara um contra ataque de grandes proporções. Este é o momento que se busca, o momento chave, que derrota o inimigo no território / tempo, sendo território a estiva e o porto, e o tempo antes que a privatização termine seu trabalho. A linha do conflito, no seu paralelo e conflito ‘jukoviano’ (Georg Jukov) diante de um inimigo invencível se apóia na linha da história e da política do local e do global no contexto latino-americano. E precisa se utilizar o tempo organizacional permitido pela pandemia de covid 19 para organizar a estiva para garantir o poder, a superioridade do poder político dos trabalhadores. Quando quadros, base organizada, base geral, trabalhadores de transportes, trabalhadores estratégicos (petróleo, elétrico e correios, cadeia logística do transporte), trabalhadores organizados conscientes (professores e funcionários públicos), trabalhadores da massa geral, precários, periféricos, não organizados, desempregados, aposentados, movimento popular e juventude se unem para defender o processo que eles mesmos criaram.

Este movimento, programa, ‘estiva em nossas mãos’, pode no contexto da unificação das lutas no Estado de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo, Paraná, (o que toca o pré-sal):resistir, defender, profundamente defender organizadamente para contra-atacar, e prevalecer no território / tempo, acumulando forças para uma mensagem da defesa da Petrobrás, a partir do porto, na BR do mar, na privatização da Eletrobrás e dos correios. Fazer isso, ao mesmo tempo em que serve de exemplo para movimentos populares, juventude e outras organizações políticas e sindicais. Atuando contra o desarme da classe, o neoliberalismo, o social liberalismo, a pasmaceira social democrata; diante do imperialismo, do neofascismo e do capitalismo. Propondo em conjunto um grande encontro da classe, agitação e propaganda local, nacional e internacional; e um novo ascenso de lutas para além da dinâmica eleitoral, mas aprendendo com ela. Ousar tomar o poder a partir da estratégia de construção de poder junto a classe, a isso se refere o programa ‘estiva em nossas mãos’. Tomar posse da organização crítica pela crítica do trabalho de base, na mensagem da estiva: ‘a estiva é nossa e ousamos viver sem patrão’.

Estamos diante do ultimato da patronal para a capitulação completa. O bom trabalho institucional pode ganhar tempo, mas somente a classe pode decidir o conflito de classes na guerra de classes. Os patrões exigem a rendição incondicional dos estivadores e portuários, enquanto avançam suas forças em direção dos marítimos, trabalhadores de transportes, a destruição da Petrobrás, da Eletrobrás, dos correios, adotando o trabalho intermitente, a precarização e a uberização na periferia da classe. O ataque é contra cada um dos trabalhadores. Somente o conjunto dos trabalhadores a partir da sua vanguarda inserida neste conjunto de forma organizada pode parar o ataque global no local.

Os estivadores vão precisar de toda sua cultura, tradição, história, sabedoria, chamar pela memória e pelo nome os heróis do passado e construir com os militantes presentes. Lideranças anônimas de escravos libertos, de imigrantes, de lideranças sob o anarco-sindicalismo, lideranças comunistas como Oswaldo Pacheco, Chuvisco, e lideranças posteriores como Abelardo, Luís Braga, José Adilson, Mário Teixeira, Ernani, Lênin Braga e Simão; outros tantos que se juntam às bases e constroem o programa hoje para lutar: Passados quarenta anos de luta defensiva e paz pactuada é preciso ousar recuperar a estiva nas mãos, a ousadia, o poder, a ponta da lança precisa voltar a furar o inimigo, e os trabalhadores estratégicos precisam avançar sua infantaria. O trabalhador no ascenso da luta compreende sua tarefa na guerra de classes. É isso ou capitular e aceitar perder.

Por fim, o grande processo da investigação concreta é este mesmo, o de intervir para verificar se o trabalhador recua ou avança, como se comporta sua vanguarda, como a classe concretamente enfrenta e constrói a sua história. Para além das especificidades do programa ‘estiva em nossas mãos’, existe uma mensagem, e se faz necessário estudar para avançar com ela de maneira simples e complexa, verificar se ela propõe superar o sistema, propondo a superação dos atravessadores do porto para o poder de quem manuseia e cuida de todo o processo logístico da carga. A apresentação do programa está no início, vamos precisar estudar se o programa aplicado na prática supera e vence a mensagem liberal na superestrutura do sistema capitalista. Esta superação começa por um diálogo franco e direto dentro de um grupo compacto, que ‘convive com o pão do ataque diário’, em turmas e turnos, que faz sua lingada junto. É contra estes que o ataque é direto, final e permanente; contra um grupo seleto e compacto que tem por missão defender a organização através da defesa profunda para contra-atacar o inimigo global – local, um inimigo na estiva, no porto e para além do porto que avança.

O desafio de tomar nas mãos o poder do trabalho no seu próprio tempo / território passa por declarar o poder, a profissão e o território como seus. O desafio de declarar o porto livre do capital, declarar que alguns quilômetros quadrados de área estratégica estão sob o controle dos trabalhadores, é mais do que um manifesto ou programa, é ação de construção de poder popular. Organizada a defesa, é preciso defender organizadamente o trabalho na beira do cais diante do inimigo invasor. Mas não se pode como até agora fazer isso sozinho, toda a classe precisa estar lá, e para além da classe, o conjunto da classe trabalhadora tem toda a possibilidade para aterrar o inimigo e impor a ele fragorosa derrota com unidade, solidariedade e poder.

Este é o longo caminho onde a unidade apesar de tudo é o objetivo mais esperado, como a vitória que não chega rápido, a unidade não chega rápido. O programa não acaba hoje. O processo de construção da unidade da classe tem caminhos que não compreendemos muitas vezes, por isso é muito importante estudar. Estudar a estiva para além da estiva. O estivador é como o aço que não se dobra na vitória e na derrota nos ensina: ‘Perder faz parte, hoje à noite a gente chora, amanhã levanta a cabeça e continua’.

Na beira do cais existem também dois mundos opostos, se um quer aniquilar o outro, o outro também precisa encarar a possibilidade de enfrentar e vencer o patrão. Começa na base com o programa da base, da estiva, e continua na luta de toda a classe. O inimigo avança com a proposta de privatização do território, do trabalho, da vida; do outro lado, a classe estivadora se coloca no caminho com mais do que a atitude defensiva, mas com seu programa e manifesto para além da estiva. Resta saber se ela vai vencer combinando o programa da classe com a vontade irredutível de construir um porto sem patrões. O poder estivador para além de si mesmo se torna poder trabalhador, apontando para que cada profissão possa valorizar sua ferramenta consciente de luta, organizar, participar de conselhos e comissões, como classe estivadora, de portos, de transportes, estratégicos, conscientes, solidários da massa, precária, periférica, no conjunto da classe trabalhadora com o programa e a proposta para vencer e ser uma classe sem patrões.

“Não consigo tirar meus olhos … dedilhando minha dor a cada degrau do agulheiro. Me matando suavemente com sua carga. Contando minha vida inteira. Eu senti toda a força da meu tempo… Me mantendo na beira do cais encontro minha mente. Num filme passa tudo. Que alegria estar vivo! Para poder fazer minha lingada. Honrando os que a pandemia levou. Pedindo proteção para o ganha-pão de cada dia e que todos os TPAs vão para seu trabalho e voltem para aconchego de sua família”.

Estivador José Simão em 29 de novembro de 2020

A cultura da classe estivadora como contribuição para a classe trabalhadora foi construída nas suas experiências históricas. A teoria da organização política tantas vezes transformada nos locais de trabalho é aprendizado comum; mas também disciplina organizativa crítica, exercício de poder, que uma vez compartilhado se soma como elo de poder comum no todo da classe, tornando-se patrimônio comum de poder da classe no porto e no entorno do porto, nas cidades e para além dos muros da atual sociedade. O programa e a mensagem já passaram dos muros do porto. A batalha contra o capital será compartilhada por todos. O programa da estiva nas mãos dos trabalhadores sem patrão. Não mais só da estiva. O desafio do ‘docker’ é internacional e está na construção dos ‘operários sem patrões’. O desafio organizacional da ‘estiva em nossas mãos’ está na construção do poder popular. O desafio da classe estratégica e do conjunto da classe é vencer o inimigo global-local na coalizão local-global. O desafio da classe é a partir da vitória local, mesmo que isso demore, ousar a vitória da classe, ousar a internacional.

Referências:

Manifesto dos Trabalhadores em transportes do Estado do Rio de Janeiro – FNTTAA – CONTTMAF – 14/03/2017, 26/09/2018

Propostas para o manifesto “Estiva em Nossas Mãos” junho 2020

Manifesto ‘Estiva em Nossas Mãos’ da Estiva de Santos – 2020

Teixeira da Silva, Francisco – Operários sem Patrões, Unicamp – Campinas – 2003

Amado, J. – Agonia na Noite – Subterrâneos da liberdade Vl 2 – CDL – São Paulo 1990

Bezerra, Gregório – Memórias – Boitempo – São Paulo – 2011

Jukov, Georgi – Memorias y reflexiones (Gueorgui Zhukov) URSS, 1969

Estatutos do sindicato dos estivadores de Santos, São Vicente, Guarujá e Cubatão, 2003

Documento conjunto da reunião das três federações dos portuários sobre a privatização dos portos: FNE, FECOVIB, FNP, de 28 de abril de 2020

Depoimentos do presidente da FNE – José Adilson e da FENCCOVIB – Mário Teixeira

Depoimentos de Estivadores de Santos – 2019/2020, agradecimentos Lenin Braga

Estivadores de Marselha – 2018/2019

Estivadores do Rio de Janeiro – 2016-2020, agradecimentos Ernani Duarte

https://www.marxists.org/portugues/dicionario/verbetes/s/silva_oswaldo.htm

Osvaldo Pacheco: porto-gente-que-luta

Trabalhadores dos setores estratégicos e a luta de classes

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http://joresimao.blogspot.com/2020/11/nao-consigo-tirar-meus-olhos.html?m=1

Encontro da INTERSINDICAL PORTUÁRIA AMPLIADA ,com o setor de Transporte e outras Categorias. Ação Unitária de Luta contra privatização/ desestabilização de empresas de prestação de serviço público, inclusive os portos nacionais.

https://us04web.zoom.us/j/77154358149?pwd=UE81UXlyNjBZQW9STHQxQXl5RDJzdz09

https://g1.globo.com/sp/santos-regiao/porto-mar/noticia/2020/08/27/caminhoneiros-protestam-contra-a-perda-de-trabalho-no-porto-de-santos.ghtml

https://jornalportuario.com.br/interna/destaque-portuario/eldorado-arremata-area-do-sts14-no-porto-de-santos-por-r-250-milhoes

Santos Brasil está com posição de caixa confortável para aquisições, destaca Ágora

https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2020/11/10/guedes-privatizacoes.htm

http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/medida-provisoria-n-945-de-4-de-abril-de-2020-251139750

https://siteantigo.portaleducacao.com.br/conteudo/artigos/administracao/as-caracteristicas-do-trabalhador-portuario-avulso-no-porto-de-santos/63434