Cursinhos populares incomodam a burguesia

imagemHenrique Suricato – militante da UJC-SP e do PCB-SP

Marcelo Bamonte – membro da Comissão de Comunicação e Jornalismo do PCB

O jornal curitibano Gazeta do Povo, em tempos recentes, redigiu uma matéria acerca da “doutrinação marxista” nos cursinhos populares [1]. Como de costume, atiram para todos os lados. Atacam nossos camaradas Jones Manoel e Raquel Luxemburgo por sua participação no Cursinho da ACEPUSP, em São Paulo, além de promoverem ataques à rede Emancipa, dos companheiros do PSOL, aproveitando, igualmente, para depreciar Paulo Freire como referência de metodologia de ensino. Ao fim, pode-se resumir como um ataque à educação do país, bem como a seus educadores.

Com uma linha editorial abertamente de direita, quebrando assim qualquer pretensão de imparcialidade – inexistente em qualquer jornalismo inserido na lógica de mercado da informação – não é de se surpreender que este jornal liberal vulgar venha a realizar uma matéria com este teor de abordagem. Mas sempre é necessário expor aos lutadores as mentiras caluniadas por aqui, com claro objetivo de depreciar os cursinhos populares e seu trabalho junto à juventude precarizada.

Vemos que a hipocrisia é deliberada, pois não somente organizações de direita têm “cursinhos” parecidos [2], como mesmo tradicionais cursinhos de pré-vestibular mais conhecidos possuem clara conduta política. Sobretudo quando olhamos para suas apostilas e sua abordagem acerca dos fatos históricos.

A psicopedagoga consultada, “politicamente neutra”, como colocado na reportagem, só comprova o que já constatamos há muito tempo: que não existe ciência neutra, e os especialistas, técnicos e cientistas manifestam posições de classe – conscientemente ou não –, o que inevitavelmente influencia suas constatações. Afirmam que estes cursinhos ensinam valores “contrários ao livre mercado e à liberdade de troca”! Nem disfarçam sua posição dentro da hegemonia de informação. Aliás, o livre mercado da informação é controlado por famílias, com ações na Bolsa. Liberdade para se noticiar o que convém às elites? Pelo jeito, sim.

Atacam o método de ensino que, “apesar dos pesares”, segundo eles, ainda conquista bons resultados, conseguindo inserir muitos alunos nas faculdades. Em vez de reconhecer a eficiência de um método de ensino que, aliado à iniciativa militante, oferece aos estudantes pobres, que passaram quase toda a sua vida escolar em precárias condições de ensino, a chance de se inserir no ensino superior, responsabilizam a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e o Ministério da Educação (MEC) por permitir que suas grades curriculares tenham brechas (!) para que tais ideias esquerdistas (!!) consigam penetrar e corromper a jovem mente dos vestibulandos (!!!).

Não sabemos se tais linhas foram escritas pelo mais importante jornal paranaense ou se é uma típica corrente de Whatsapp bolsonarista, temperada pelo fenômeno recorrente da disseminação de informações falsas. Difamação típica da cartilha anticomunista da imprensa dos tempos da guerra fria, suficiente para enganar e gerar engajamento da mesma direita que se pinta de verde amarelo e sai às ruas em defesa de Bolsonaro, ou, no caso de alguns envergonhados jornalistas liberais curitibanos, protestam conta o desmanche do mito local Sergio Moro.

Mas aqueles que são diretamente beneficiados com esses cursinhos, ao conseguir ingressar na faculdade – antes reservada à elite – e poder proporcionar uma condição melhor de vida a si e aos seus familiares, saberão bem que tal reportagem não passa de pura calúnia, e os lutadores precisam ficar de sobreaviso para não permitir uma difamação baixa produzida por essa imprensa marrom. Pelo jeito, os cursinhos preparatórios populares incomodam muito.

Dentro das universidades, em contraponto ao que reproduz a cartilha elitista, onde supostamente o ensino seria de “melhor qualidade”, longe dos tentáculos ideológicos das iniciativas populares, a situação não é a das melhores. O estudante de jornalismo moderno, das melhores e mais caras instituições de ensino, tem o rabo preso com a palavra que, ao invés de libertar e supostamente democratizar o conhecimento, o escraviza: o fato. O fetiche e a busca por uma narrativa imparcial, coisa inexistente e demonstrada nos primeiros dias de curso, permeiam o imaginário do aspirante a mensageiro como um dogma. O problema? O fato de que nada serve se pautado apenas em si. O modelo de negócios do jornalismo, dominado por corporações e famílias, é ditado pelo interesse subjetivo e econômico de determinada classe, passando longe da busca pela informação.

Dada a lógica da precarização do fazer crítico, explícita na crítica ao local onde jovens podem se formar para ao menos terem a chance de entrar no ensino superior, os profissionais em formação, em meio ao turbilhão de desinformação, se deparam com acontecimentos e desdobramentos políticos como se fossem estopins de uma espontaneidade histórica quando, se conhecessem o mínimo, não se surpreenderiam tanto. Não há questionamento, intervenção ou, ao menos, aprofundamento de alguma questão intelectual. Há a redução do aguçamento crítico em prol da manutenção da não popularização e inserção da consciência de classe no fazer jornalístico.

Com o ataque aos camaradas, vemos exatamente isso: o jornalismo burguês – que pouco pode ser considerado jornalístico – é preenchido por dois tipos de agentes: o reprodutor acrítico de versões, bradando em defesa do que desconhece e finge conhecer; o que reconhece a dinâmica como favorável ao seu combate político, promovendo justamente a desorganização da classe em prol de interesses superiores a si, sendo um mero fantoche de um jogo que nem ele próprio compreende.

1 – https://www.gazetadopovo.com.br/educacao/cursinhos-populares-preparacao-vestibular-marxista-estudantes-baixa-renda/

2 – https://liberal.com.br/cidades/americana/universitarios-da-regiao-criam-cursinho-gratuito-de-preparacao-para-o-enem-1285053/