BNDES facilita pagamentos de Eike
Uma das prorrogações foi assinada a apenas quatro dias do prazo em que a empresa deveria ter feito o pagamento. Em 15 de setembro de2012 a UTE Parnaíba, que tem a MPX como sócia, deveria ter pago ao BNDES R$ 242,7 milhões. No dia 11 de setembro de 2012, porém, um aditivo mudou o pagamento para março de 2013.
O adiamento ocorreu também em contrato de R$ 240 milhões firmado em dezembro de 2009 com a empresa UTE Porto de Itaqui Geração de Energia S.A., que tem a MPX como sócia. O contrato original previa amortização equivalente a cinco parcelas em junho de 2012, mas um aditivo postergou a quitação em 13 meses.
Outro acordo, com a Porto do Pecém Geração de Energia, na qual a MPX está envolvida, o BNDES prorrogou a exigência de desempenho técnico em seis meses: de dezembro de 2011 para junho de 2012.
Juros baixos
No entanto, as vantagens oferecidas a projetos ligados ao empresário não se resumem a adiamentos. O maior dos contratos individuais entre BNDES e empresas de Eike, de R$ 1,4 bilhão, foi firmado em julho de 2009 para a implantação de uma termoelétrica dentro do complexo industrial de Pecém, em São Gonçalo do Amarante (CE), que tem como acionista a MPX.
A unidade está em operação e, segundo o contrato, os pagamentos do financiamento do BNDES serão realizados até junho de 2026. Os juros cobrados são de 2,77% ao ano acima da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), atualmente em 5% ao ano. A taxa é inferior à Selic, que foi elevada pelo Banco Central para 8,5% ao ano na semana passada, usada pelo Tesouro para levantar recursos no mercado.
Há taxas de juros ainda mais favoráveis ao grupo. Em dezembro de 2009, um contrato de R$ 407,7 milhões com a LLX Sudeste para a compra de equipamentos para a construção do porto de Sepetiba, em Itaguaí (RJ), tem juros fixos de 4,5% ao ano.
Na época da assinatura do contrato, a Selic era em 8,75%. O BNDES justifica que, em linhas específicas, outras empresas também receberam juros subsidiados (leia mais abaixo).
Garantias
As garantias também chamam a atenção. Penhor de ações das próprias companhias, cartas de fiança assinadas por empresas do grupo e bens que ainda seriam comprados estão entre as garantias ofertadas pelo grupo EBX.
Num contrato que assina como pessoa física, no valor de R$ 1,344 bilhão, para a construção de um estaleiro pela OSX, Eike oferece entre as garantias dividendos uma de suas empresas, com sede na Holanda. Firmado em 2012, o contrato prevê amortizações a partir de 2016 e pagamento até 2034. Projetos de infraestrutura, como estaleiros, usinas e portos, geralmente são financiados no longo prazo. No caso de Eike, a maior parte dos empréstimos vence na próxima década.
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BNDES aponta ‘benefício social’ em projetos de Eike
O Estado de S. Paulo
O BNDES afirma que as alterações em contratos decorrem de “especificidades” e que as condições facilitadas são resultado de benefícios sociais provocados pelos investimentos. Ressalta ainda que suas operações são acompanhadas por órgãos de controle, como Tribunal de Contas de União, Controladoria-Geral da União e Banco Central. “Cada projeto tem suas próprias especificidades e por vezes é necessário realizar postergação de alguns prazos para refletir os novos cronogramas de implantação dos empreendimentos, desde que tecnicamente justificáveis”, diz o banco, em nota.
A instituição justifica a concessão de empréstimos com juros facilitados pelo uso da linha para Investimentos Sociais de Empresas (ISE), que tem como objetivo a exploração do potencial de geração social dos investimentos feitos. Em relação à taxa de 4,5% do contrato com a LLX Sudeste, o banco afirma ter usado esse porcentual dentro do Programa BNDES de Sustentação do Investimento – BNDES PSI e acrescenta que outras companhias se beneficiaram dessa taxa.
O BNDES diz que as garantias são “estruturadas de forma a mitigar o risco de crédito da operação, obedecendo às normas e práticas bancárias vigentes”. O banco recusou-se a informar o valor já pago a título de amortização nos contratos.
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Empresas de ônibus lucram até com vans
O Globo
O emaranhado de negócios dos empresários de ônibus do Rio, mostrado ontem pelo GLOBO, que inclui participação em agência de publicidade, terminais rodoviários e até no futuro VLT, transformou antigos adversários em fonte de receita. Em fase de legalização pela prefeitura, as vans já licitadas têm equipamentos de bilhetagem eletrônica, de modo a aceitarem vale-transporte e Bilhete Único Carioca (BUC). Só que esses aparelhos são fornecidos – e a receita é processada – por RioCard e RioCard Tecnologia da Informação, empresas criadas pela Federação das Empresas de Transporte de Passageiros (Fetranspor) para operar o sistema. Entre os dirigentes da entidade estão alguns dos maiores empresários do setor no estado, como José Carlos Reis Lavouras, Amaury de Andrade e Jacob Barata, que é conhecido como o “Rei dos Ônibus”.
Os motoristas de vans pagam taxa de 8% sobre as receitas, e as empresas filiadas à Fetranspor, R$ 0,0215 por operação (o que equivale a cerca de 0,8% do valor de uma passagem). Em nota, a federação afirmou que esse valor vem caindo, “por conta de maior eficiência e produtividade dos processos internos”. Mas os motoristas ainda mostram insatisfação com o processo de prestação de contas, que consideram pouco transparente. A Fetranspor argumenta que todas as informações estão à disposição deles.
A reclamação sobre a distribuição das receitas entre os 104 motoristas de vans já legalizados é a mesma que levou a Transportes Paranapuan, que opera na Zona Norte, a entrar na Justiça contra a Fetranspor, pedindo a apresentação das planilhas.
– Pelas nossas planilhas, o que a RioCard deposita é inferior ao que transportamos – diz o consultor Jorge Rodrigues, que faz a contabilidade dos motoristas de vans da Zona Oeste.
Secretário: dúvidas são naturais
A queixa é a mesma entre aqueles que, há dois meses, receberam autorização para ligar Rocinha e Vidigal ao asfalto. Outra dúvida é se os motoristas de lotadas vão ou não compartilhar os subsídios da prefeitura pelo transporte gratuito dos alunos da rede municipal. Só este ano serão cerca de R$ 55 milhões.
Isso motivou a intervenção da prefeitura. No sábado, após uma reunião na Rocinha com o secretário municipal de Transportes, Carlos Roberto Osorio, ficou combinado que uma comissão irá hoje à RioCard tirar dúvidas. Mas os motoristas da Zona Oeste reclamam que não foram convidados.
– A integração das vans é um processo novo, é natural que haja dúvidas. Desconhecia reclamações na Zona Oeste. Quanto à divisão das receitas, isso é um acordo feito entre as partes. Não é uma questão da prefeitura – disse Osorio.
Segundo os motoristas de vans, eles recebem R$ 1,49 por passageiro transportado sem integração e R$ 1,01 pelo usuário do BUC, ambos os valores já com o desconto de 8%. Em nota, a Fetranspor disse que esse desconto é maior que o das empresas de ônibus porque a RioCard assumiu as despesas de instalação e manutenção dos equipamentos das vans.
O Sindicato dos Proprietários de Vans afirmou já ter sido procurado por outras empresas de bilhetagem eletrônica, que ofereceram uma taxa menor do que os 8% da Fetranspor. Só que a legislação atual estabelece, nas operações de integração, que a administração do sistema é exclusiva das empresas de ônibus ou da entidade por elas escolhida.
A federação disse ainda que os custos pela operação da bilhetagem não são computados nas planilhas usadas para calcular as tarifas dos ônibus. Sobre a falta de acesso às planilhas, a Fetranspor disse depender de autorização do município.
Um fato curioso sobre o sistema de bilhetagem é que a RioCard Tecnologia foi criada há dois anos em sociedade com Homero Quintaes, que era responsável pelos serviços de informática terceirizados usados pela Fetranspor. Em nota, a Fetranspor disse ter convidado Quintaes por ele ser “profundo conhecedor da tecnologia necessária”.
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Defesa: dados estratégicos a salvo
O Globo
As fragilidades do sistema de criptografia de informações estratégicas para a defesa nacional estão entre as principais preocupações apontadas nas reuniões do ministro da Defesa, Celso Amorim, com os comandantes de Exército, Marinha e Aeronáutica na última semana. Os primeiros relatos dos comandantes ao ministro dão conta de que não há, por enquanto, evidências de invasão dos sistemas, mas as investigações prosseguem diante da vulnerabilidade na troca de informações oficiais. A pasta confirmou a realização das reuniões para apurar eventuais dados militares que podem ter sido alvo de espionagem do governo dos Estados Unidos, como O GLOBO revelou em reportagem publicada ontem.
Nos encontros entre Amorim e os comandantes das Forças Armadas, ficou acertada a realização de um levantamento sobre eventuais vazamentos de informações sigilosas. Desde a revelação pelo GLOBO das supostas atividades de espionagem da Agência de Segurança Nacional dos EUA (NSA) no Brasil e na América Latina, estiveram no centro das discussões as deficiências do sistema de criptografia e o incipiente programa de defesa cibernética ligado ao Exército, implantado em 2011.
Em audiência na Comissão de Relações Exteriores do Senado na última quarta-feira, o ministro da Defesa afirmou que o sistema de criptografia oferece uma proteção “razoável” às mensagens trocadas e admitiu a situação de “vulnerabilidade” de informações estratégicas à segurança nacional.
Criptografia brasileira
As falhas do sistema de criptografia, que consiste em cifrar as mensagens trocadas e manter o sigilo das informações, também são discutidas no âmbito do grupo interministerial criado pela presidente Dilma Rousseff para avaliar a suposta espionagem americana no Brasil. Pelo menos duas instituições governamentais brasileiras produzem equipamentos que criptografam mensagens.
Uma é a Indústria de Material Bélico do Brasil (Imbel), vinculada ao Ministério da Defesa, que fabrica um transmissor utilizado pelas Forças Armadas no sistema de comando e controle, codifica voz e dados. Já o Centro de Pesquisas e Desenvolvimento para a Segurança das Comunicações (Cepesc), da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), fabrica telefones criptografados, equipamentos para criptografia em computadores e outros aparelhos que cifram dados. Os telefones fornecidos à presidente e a seus ministros são do Cepesc.
Mesmo com produção local, há uma alta dependência da tecnologia estrangeira. Entre as previsões dos ministérios da Defesa e de Ciência e Tecnologia para o setor cibernético, está a adoção de “soluções nacionais inovadoras”, em especial o desenvolvimento de “algoritmos criptográficos e autenticação próprios”.
Greenwald vai ao Senado
Sobre o baixo investimento em defesa cibernética – apenas R$ 11,3 milhões (12,5%) dos R$ 90 milhões previstos para este ano, a assessoria do Ministério da Defesa sustenta que a maior parte deve ocorrer no segundo semestre. A pasta diz que será possível gastar os R$ 90 milhões e que créditos adicionais ainda podem ser aprovados.
O jornalista Glenn Greenwald, do jornal britânico “Guardian” – o responsável por levar à imprensa o material vazado pelo ex-técnico da CIA Edward Snowden – será ouvido amanhã na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado. O presidente da comissão, senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), disse esperar que o jornalista detalhe um pouco mais como o monitoramento americano é feito.
– Queremos saber detalhes objetivos, como, por exemplo, se a NSA teve acesso a projetos estratégicos brasileiros, como o pré-sal e o FX-2, por exemplo – adiantou Ferraço, referindo-se ao programa de reequipamento e modernização da Força Aérea Brasileira.
Ferraço disse ainda que a comissão vai pedir ao jornalista que autorize o acesso ao material coletado com Snowden. O senador não poupou o governo de críticas:
– O governo tem sido absolutamente negligente e leniente no desenvolvimento de projetos necessários para a defesa cibernética. O governo não tem tratado o assunto com a necessidade que merece. Estamos aquém do básico do básico do básico.
A situação de Snowden – há três semanas na área de trânsito de um aeroporto de Moscou – também é motivo de preocupação. Organizações de defesa dos direitos humanos e movimentos de juventude de partidos planejam para quinta-feira o “Dia do Snowden”, com atos públicos na sede do Itamaraty, em Brasília, no escritório da Presidência da República, em São Paulo, e em consulados dos EUA, além de ações em redes sociais. O objetivo é convencer o governo brasileiro a se engajar em campanha para garantir que o ex-técnico da CIA viaje em segurança até um dos países que ofereceram asilo, como Venezuela, Bolívia e Nicarágua .
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Ex-diplomata dos EUA extrai diamantes no norte de MG
Valor Econômico
Durante parte do governo do ex-presidente George W. Bush, Roger Noriega foi embaixador dos EUA na Organização dos Estados Americanos (OEA) e sub-secretário de Estado para a América Latina e Canadá. A diplomacia deixou de ser sua atividade e, nos últimos anos, Noriega tem dedicado seu tempo a escrever artigos, a fazer palestras e a sua consultoria a empresas americanas que buscam oportunidades na América Latina. Desde o começo do ano, o próprio Noriega também tem interesses comerciais no Brasil. Ele é um dos diretores de uma pequena e recém-criada mineradora, com sede na Califórnia, que em janeiro começou a extrair diamantes numa área próxima ao Rio Jequitinhonha, no norte de Minas Gerais.
Além dele, dois ex-embaixadores fazem parte do corpo diretivo da mineradora, a Brazil Minerals: John Bell (que foi cônsul do Canadá em São Paulo e embaixador no Brasil entre os anos 70 e início dos 90), e Paul Durand (ex-embaixador do Canadá na Costa Rica, Chile e OEA entre os anos 90 e 2000).
Quem está à frente da companhia é Marc Fogassa, um brasileiro-americano de 46 anos, que estudou no MIT e fez carreira nos EUA em empresas de venture capital e em negócios do setor de saúde. Fogassa vive em Los Angeles, Califórnia. Em 2011 começou a avaliar o negócio com a área em Duas Barras (MG), a área nas margens do Jequitinhonha. Os donos eram os canadenses da Valdiaam, que no fim da década passada foi uma produtora importante de diamantes no Brasil.
Em entrevista ao Valor durante passagem por Belo Horizonte, Fogassa contou que a Brazil Minerals tem interesses em outros minerais no país. Um deles é o fosfato, numa área no município de Lagamar, no oeste mineiro. Também numa área onde haveria reservas de titânio, vanádio e minério de ferro no Piauí e ouro em uma região de difícil acesso perto do município de Apuí, no Amazonas.
Mas de todos os projetos em vista, é o de diamantes que está mais desenvolvido. E o único em produção. No primeiro trimestre, Brazil Mineral retirou de uma área alagada, separada por uma faixa de vegetação do rio, cerca de 350 quilates; no segundo trimestre, segundo comunicado ao mercado americano, foram aproximadamente 900 quilates. A Brazil Minerals tem ações negociadas no “over to counter” (OTC) nos EUA – um tipo de mercado de papéis do qual geralmente empresas menores participam.
A Brazil Minerals foi formalmente criada em 18 de dezembro de 2012. E Fogassa se mostra surpreso com o número crescente de acionistas. Em 13 de junho, por exemplo, eram 2.160; no dia 28 já eram 2.452 – 95% deles são americanos, diz o empresário, e entre eles há pequenos hedge funds e family offices. A possibilidade de diversificar investimentos, de apostar em recursos minerais numa empresa com a transparência do mercado americano e com uma equipe operacional e técnica brasileira parece ser o apelo da Brazil Minerals, diz Fogassa. E há também o atrativo pelo carro-chefe, o negócio com diamantes.
“Os diamantes voltaram a ser a coisa mais sexy do momento”, disse Fogassa, com seu sotaque americano, ao lado do geólogo Paulo Amorim, ex-funcionário da Vale, e agora parte da equipe da nova mineradora. O mercado sofreu um recuo com a crise de 2008, mas foi recuperando espaço. “Quase todo dia tem gente me procurando interessada em comprar diamantes. Eu até fiz uma lista outro dia dos brokers de diamantes brutos que já me escreveram, pessoas de Dubai, do Canadá, do Reino Unido, Estados Unidos, Bélgica, Rússia e Itália.”
A produção de Duas Barras está sendo vendida, até agora, apenas para intermediários no Brasil. Mas o plano de negócios da mineradora passa também por lapidar uma parte menor, talvez 20%, da produção. Uma possibilidade seria vendê-la para joalherias de médio porte nos EUA. O valor de um diamante lapidado costuma ser algumas vezes maior do que o de um bruto, mas no Brasil a lapidação de diamantes em escala é um tipo de atividade que praticamente desapareceu. O custo na Índia, considerada especialista em pedras menores, por exemplo, é uma fração do encontrado no Brasil. Mas Fogassa acha que vale apostar. Sua equipe, diz, já começou a entrar em contato com lapidadores que ainda resistem.
A reserva indicada e inferida de diamantes de Duas Barras, segundo o empresário, é de 432 mil quilates; a de ouro – também em início de produção – 491 quilos.
Por e-mail, o ex-embaixador dos EUA Roger Noriega falou de sua participação no negócio. Disse que seu envolvimento “está diretamente relacionada à confiança” que tem em Fogassa, a quem descreve como um “brilhante jovem empreendedor brasileiro-americano” que conhece muito bem o Brasil e sua economia. “Espero que minha experiência diplomática traga benefícios à Brazil Minerals porque eu entendo os desafios e oportunidades de se fazer negócios no Brasil.” Noriega disse que também é conselheiro de Marc num fundo de investimento, o Hedgefort, voltado para o Brasil.
A Brazil Minerals investiu US$ 2 milhões no país, segundo Fogassa, e pretende captar mais recursos este ano. O objetivo é chegar ao faturamento da antiga dona da área, cerca de US$ 10 milhões. Há duas semanas ele esteve nas margens do Jequitinhonha com dois executivos de um banco de investimentos de Nova York, interessados em conhecer de perto os ativos de uma empresa sobre a qual começam a acompanhar os resultados e a produzir relatórios, contou Fogassa. Os contatos com potenciais investidores estão em curso, afirmou. E para isso, ele conta com sua rede de contatos e com as dos ex-embaixadores. Sobre o colega americano, diz: “Noriega conhece as grandes empresas, muitos altos executivos na América Latina e ele me põe em contato com facilidade com eles.”
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Manobra garante melhora no perfil da dívida pública
O Estado de S. Paulo
O resultado das contas públicas não é o único item sob administração do Tesouro Nacional a se beneficiar de operações atípicas. Também os balanços sobre o perfil da dívida pública mobiliária federal mostram bons resultados à custa de manobras no bastidor, mostra estudo elaborado pelo economista Felipe Salto, da consultoria Tendências. “Só não dá para falar que é maquiagem porque dá para a gente ver o que aconteceu”, disse Salto.
Ele sustenta que, por trás dos números que mostram um endividamento de boa qualidade e bem comportado, está o Banco Central rolando a dívida pública (uma tarefa que seria do Tesouro). “A consequência disso é que estamos tendo uma despesa enorme de juros em troca de nada.” Questionado, o Banco Central, presidido por Alexandre Tombini, informou que não comentaria o estudo.
Dizem os manuais de economia que dívida pública boa é aquela que tem prazos longos e cujos juros, além de baixos, são prefixados – ou seja, o governo sabe de antemão quanto vai pagar. O governo passou a perseguir esse perfil de dívida nos anos 1990, depois de muitos anos com a dívida fora de controle, rolada diariamente em com juros pós-fixados.
A dívida mobiliária interna brasileira caminhou na direção dessas boas práticas, de forma que ostítulos pós-fixados, as Letras Financeiras do Tesouro (LFTs), corrigidos conforme a taxa dejuros básica Selic, representavam apenas 22,56% do total em maio passado. A maior parte dos papéis tem correção mais favorável ao Tesouro: ou são prefixados ou corrigidos por índices de inflação. O prazo médio do estoque estava em 4,19 anos.
Correção. “O problema é que o mercado demanda papéis atrelados à Selic”, disse o economista. “E o Banco Central vem suprindo.” Ele disse que não tem como provar isso. “Mas há evidências.”
Aprincipal delas estánas chamadas operações compromissadas. Elas são realizadas pelo Banco Central para retirar o excesso de dinheiro em circulação na economia, que poderia alimentar a inflação. Para recolher o dinheiro, a autoridade monetária oferece aos bancos títulos emitidos pelo Tesouro Nacional. E a preferência recai sobre as LFTs.
O volume de operações compromissadas aumentounos últimos meses: representava 3,3% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2006 e hoje está em 15,7% do PIB. Nesse mesmo período, a dívida mobiliária federal caiu de 45,3% do PIB para 39,8% do PIB. “Não faz sentido”, comentou o economista. “Não houve redução das necessidades de financiamento para a dívida ter caído.” Em outras palavras: se o governo ampliou os gastos e, se a arrecadação ficou abaixo do previsto nos últimos meses, era para a dívida ter aumentado, e não caído.
Por isso, ele acredita que parte do endividamento está sendo rolado pelo Banco Central, pelas operações compromissadas. Dessa forma, o governo vem captando dinheiro no mercado, mas aum custo mais elevado e a prazos mais curtos. Ou
seja, justo o contrário do que são os objetivos da administração da dívida. “Claramente, o BC está substituindo o Tesouro na tarefa de rolagem da dívida pública mobiliária federal.”
Na avaliação do economista, esse desarranjo tem uma origem clara: a recusa do governo em promover uma política fiscal com credibilidade no mercado. O conjunto de receitas e despesas forma, na visão dos agentes econômicos, uma combinação que não dá suporte à taxa de juros reaisde 2% perseguida como meta pelo governo.
O superávit primário, que é o saldo das contas do governo sem contar as despesas com a dívida pública, não é nada mais do que uma expressão da possibilidade do governo de honrar seus compromissos financeiros. Nada convencido da solidez do resultado, o mercado exige juros mais altos para rolar a dívida pública.