BCs se preparam para turbulência no mercado
Os mercados globais estão hesitantes desde maio, quando o Fed começou a sinalizar que poderia reduzir as compras de bônus, de US$ 85 bilhões por mês. Os juros de hipotecas aumentaram nos EUA e as moedas e ações de várias economias emergentes caíram.
Essa volatilidade é um sinal de que os efeitos dessa redução “podem não ser suaves”, disse o vice-presidente do Banco da Inglaterra, Charles Bean, durante o simpósio de política monetária do Fed de Kansas City em Jackson Hole, Wyoming.
O nome do simpósio, “Dimensões Globais da Política Monetária Não-Convencional”, tornou-se real demais para pelo menos um dos participantes que eram esperados no encontro. O presidente do Banco Central do Brasil, Alexandre Tombini, cancelou sua viagem a Jackson Hole num momento em que o real registrava forte depreciação. Na quinta-feira, o BC anunciou um programa de US$ 60 bilhões para interrompera queda da moeda. O diretor de Assuntos Internacionais do BC, Luiz Pereira Awazu, participou do encontro no lugar de Tombini e assegurou aos participantes que o Brasil tem condições de administrar a situação.
Investidores injetaram muito dinheiro nos emergentes nos últimos anos, enquanto a economia dos EUA se recuperava lentamente e os juros estavam em mínimas históricas. Agora, eles estão tirando dinheiro dos emergentes por causa da perspectiva de juros mais altos nos EUA e do fortalecimento da economia. A volatilidade é agravada pelas incertezas sobre quando o Fed vai começar a cortar as compras de bônus, que têm como objetivo impulsionar o crescimento por meio do corte dos juros.
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Pedidos ao BNDES sobem só 6% e podem afetar investimento
Valor Econômico
A insegurança que ronda a economia brasileira pode ter afetado também a disposição dos empresários para planejar novos investimentos. No primeiro semestre deste ano, o valor dos novos pedidos de financiamento que foram apresentados ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) superou em apenas 6% as consultas apresentadas no mesmo período de 2012.
O avanço se dá sobre uma base alta de comparação, mas mesmo assim, para economistas ouvidos pelo Valor PRO, o serviço de informação em tempo real do Valor, o dado reafirma um cenário econômico de incertezas, com lenta recuperação da indústria e da confiança do empresário. As alterações regulatórias, especialmente no setor de energia, também contribuem para um alongamento da desconfiança dos investidores.
O superintendente da área de Planejamento do BNDES, Cláudio Leal, disse que o banco não percebe tendências decrescentes gerais, mas reconhece a existência de um ambiente de instabilidade, com necessidade de “superar expectativas que tragam de novo tranquilidade para a decisão de investir”. Para Leal, o segundo semestre será melhor, com a chegada dos projetos decorrentes das concessões na área de infraestrutura. Nos últimos dez anos, em média, 68% das consultas feitas em um ano se transformam em desembolsos nos 12 meses seguintes, embora essa relação oscile de um ano para outro.
“Se olharmos pela ótica dos desembolsos, eles cresceram bem. É verdade que a indústria não está bem, mas o volume de desembolsos no primeiro semestre deste ano é um fator positivo. Já o avanço das consultas em geral indica que a economia não está bem. O aspecto dos novos pedidos de financiamento condiz com o que estamos observando na economia”, disse o economista-chefe do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Rogério César de Souza.
As consultas feitas ao banco de fomento no primeiro semestre deste ano somaram R$ 124 bilhões. Na comparação como igual período de 2012, o detalhamento das consultas mostrou que 16 setores, de um total de 45, demandaram menos ao banco. As quedas ficaram, principalmente, com os segmentos da indústria extrativa (queda de 47,41% em relação ao primeiro semestre de 2012), química (recuo de 41%), equipamentos de informática, eletrônico e ótico (queda de 77,68%) e telecomunicações (recuo de 36,35%).
Segundo Leal, esse movimento reflete, em parte, ciclos de investimentos de determinados segmentos industriais, com oscilações normais, como telecomunicações e papel e celulose, por exemplo. Outras indústrias, como a extrativa, provavelmente fizeram fortes investimentos no passado recente, na avaliação do Souza, do Iedi.
Já setores mais ligados ao mercado externo, como química, farmacêutica e equipamentos de informática – que também apresentaram recuo nas consultas em relação ao primeiro semestre de 2012 – podem ter movimento explicado pelo cenário externo desfavorável e pela competição com produtos importados no mercado nacional, ainda na análise de Souza.
Para o economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Mansueto de Almeida, ainda não é possível fazer uma leitura definitiva dos dados apresentados nas consultas para afirmar que há redução no apetite por investimentos por parte dos empresários. “A maioria dos setores que tiveram consultas maiores no primeiro semestre do ano passado, na comparação com 2013, teve padrão de consumo mensal irregular”, disse Almeida. Ou seja, tiveram um mês ou outro com consultas muito elevadas, sendo o restante em média similar a observada nos primeiros seis meses deste ano.
Se por um lado não é possível afirmar que consultas menores em alguns setores são suficientes para, sozinhas, refletirem redução no apetite dos empresários, por outro elas servem como alerta para um cenário econômico que já não está tão favorável. Segundo economistas, esse recuo em alguns setores pode refletir que o esperado crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) está mais lento do que se previa inicialmente.
A demora na recuperação da indústria e redução no ritmo de expansão do emprego e do comércio, observadas nos resultados das pesquisas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) ao longo deste ano, podem estar retardando a retomada da confiança do investidor. Para o Iedi, a expectativa dos empresários industriais em relação aos seus negócios precisa ficar mais firme e positiva para se observar efetivo aumento nas consultas ao BNDES. “Redução nas consultas em setores ligados a indústria de transformação indicam mercado interno mais fraco. Ninguém pretende investir se não houver cenário claro de recuperação econômica”, diz o economista do IBMEC/ RJ, Gilberto Braga.
Para o diretor do instituto de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Carlos Frederico Rocha, a incerteza regulatória também influencia a decisão de investimento. As alterações no marco regulatório de petróleo e de energia elétrica, diz, deixaram empresas reticentes quanto à taxa de retorno dos projetos.
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Múltis brasileiras perdem ânimo com o país e investimento desaba
Valor Econômico
Há três anos, a tabela à esquerda dificilmente poderia ser publicada nesta página, tamanha a relação de novos investimentos brasileiros na Argentina. Hoje, diante de estatizações recentes e dificuldades impostas pela Casa Rosada à saída de dólares, os anúncios de investimentos de multinacionais verde-amarelas no país vizinho cabem em um pedaço de papel: no primeiro semestre, foram só sete projetos, que somam US$ 303 milhões.
Se esse ritmo for mantido no segundo semestre, terá sido o menor volume de investimentos brasileiros em território argentino em pelo menos seis anos, segundo a consultoria portenha Abeceb. Em 2008, os anúncios foram de US$ 941 milhões. O auge foi atingido em 2010. Naquele ano, a Vale tocava a todo vapor o projeto de exploração de potássio Rio Colorado, na Província de Mendoza, e o Banco do Brasil fechou a aquisição do Patagônia.
Esses dados compõem um quadro desfavorável, nos últimos meses, para multinacionais brasileiras que vinha atuando no mercado vizinho. Em junho, a presidente Cristina Kirchner rescindiu os contratos de concessão da América Latina Logística (ALL), que operava oito mil quilômetros de ferrovias no país.
Na semana passada, um executivo da ALL afirmou que a saída da Argentina “acabou sendo boa”. “Era uma operação que demandava caixa e o prazo de concessão era curto”, disse o diretor de relações com investidores da empresa, Rodrigo Campos.
A Vale suspendeu o projeto Rio Colorado e afetou, com isso, planos de três gigantes brasileiras da construção que haviam sido contratadas pela mineradora para implantá-lo: Odebrecht, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez. Com exigências de fornecimento local e sem o tratamento tributário esperado, o projeto extrapolou o orçamento da Vale e chegava perto de US$ 6 bilhões.
O empresário kirchnerista Cristóbal López fez uma proposta de compra dos ativos da Petrobras na Argentina, que recusou, em maio. No mês anterior, quem desistiu de permanecer na Argentina foi a Deca, fabricante brasileira de louças e materiais sanitários. A empresa, do grupo Duratex, alegou “sucessivos prejuízos financeiros” e fechou sua fábrica na Província de Buenos Aires.
O consultor Dante Sica, diretor da Abeceb e ex-secretário de Indústria, diz que houve “quebra do ambiente de negócios” na Argentina. Ele lembra que, além de estatizações, como a da petrolífera espanhola YPF, há restrições para a saída de dólares. “Quem é que vai investir se não pode repatriar seus lucros?”, questiona.
De acordo com Sica, nos últimos dez anos, subiu de 60 para 350 o número de empresas brasileiras com alguma produção no país vizinho. Esse movimento foi interrompido, mas pode voltar no futuro próximo, assim que o ambiente melhorar. “Os ativos estão muito baratos. A Argentina é como uma boa estrada, mas cheia de neblina, o que leva os motoristas a encostar o carro. Quando a neblina passar, todo mundo pega a estrada de novo”.
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Consórcios ainda querem mudanças nas regras dos leilões de aeroportos
Valor Econômico
O governo tem recebido pressões de todos os lados por mudanças de última hora nas regras do próximo leilão de aeroportos, marcado para o dia 31 de outubro, que repassará para a iniciativa privada o Galeão (RJ) e Confins (MG). De um lado, consórcios já montados para a disputa argumentam que o volume de passageiros foi superestimado nos estudos do governo, sem ter levado em conta a crise instalada no setor aéreo. De outro, os atuais controladores dos primeiros aeroportos privatizados insistem na revisão das regras que restringem sua presença no leilão, percorrendo gabinetes de Brasília em busca de apoio à mudança.
Até agora, o governo e o mercado trabalham com a perspectiva de disputa entre pelo menos seis consórcios no leilão. Dois são novos: o grupo CCR, que tem Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa no bloco de controle, praticamente selou parceria com as operadoras dos aeroportos de Munique e Zurique. Estão avançadas também as negociações para o fechamento de uma aliança entre a operadora americana ADC Houston e três empresas brasileiras: Galvão Engenharia, o grupo Libra e a construtora mineira Fidens.
Os outros quatro consórcios repetem as formações do leilão realizado no ano passado: Odebrecht e Changi (Cingapura); Ecorodovias e Fraport (Frankfurt); Queiroz Galvão e Ferrovial (Heathrow); Carioca Engenharia e GP Investimentos junto com ADP (Paris) e Schiphol (Amsterdã). Fontes do mercado apontam o interesse de mais três operadoras estrangeiras em entrar na corrida pelo Galeão e por Confins. Todas administram aeroportos com mais de 35 milhões de passageiros por ano, conforme a exigência do governo, nos editais de licitação. São a espanhola Aena, a italiana Atlantia e a indiana GMR. Poucos, no entanto, acreditam que elas terão fôlego para concorrer sem parceiros nacionais.
Quem pode aumentar a concorrência, aliando-se a essas operadoras, são os atuais controladores dos três aeroportos concedidos no ano passado. Eles foram proibidos pelo governo, em um primeiro momento, de participar da segunda rodada de privatizações. Os grupos brasileiros Invepar (concessionária de Guarulhos), UTC (Viracopos) e Engevix (Brasília) estão fortemente interessados em engrossar a disputa pelo Galeão e por Confins.
No mês passado, o governo finalmente aceitou flexibilizar a proibição inicial à presença dos atuais controladores no leilão de outubro, depois de ter negado a possibilidade durante meses. Foi fixado, porém, um limite de 15% à participação desses grupos nos consórcios privados. O argumento oficial é que uma participação superior a esse limite pode comprometer a futura competição entre os aeroportos privatizados. A fatia de 15% cai à metade depois da associação obrigatória com a Infraero pelo vencedor do leilão.
O problema é que essa limitação desagradou à Invepar, à UTC e à Engevix. O Valor apurou que nenhum dos grupos têm a intenção de participar de consórcios com fatia tão minoritária.
Sem terem desistido de uma participação maior, esses grupos ainda buscam uma mudança das regras, a fim de encabeçar consórcios. Os alvos são a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), que conduz o processo de licitação a partir de agora, e o Tribunal de Contas da União (TCU), que ainda analisa os estudos de viabilidade das concessões e os editais.
Por enquanto, os grupos não pretendem entrar na Justiça contra as regras impostas pelo governo e preferem apostar nas conversas, mas não descartam de antemão ir aos tribunais, caso fracassem nas tentativas. Para reforçar seus argumentos e superar as restrições, algumas propostas já foram levadas às autoridades.
O governo vê ameaças à competição caso mais de um dos aeroportos leiloados à iniciativa privada caia nas mãos do mesmo controlador. Um grupo nacional apresentou à Anac a ideia de “alternativas societárias” contra esse temor. Pela proposta, o acordo de acionistas pode incluir cláusulas exigindo “anuência prévia” da agência reguladora em decisões que envolvam “conflito de interesses” entre dois aeroportos operados pelo mesmo grupo.
Essa não é a única pressão enfrentada pelo governo. Os consórcios que já estão consolidados se queixam dos estudos de viabilidade econômica das novas concessões. Tais estudos preveem crescimento médio de 4,7% ano após ano, ao longo das próximas três décadas, no movimento de passageiros no Galeão e em Confins. Para os investidores, esse cenário pode ser demasiadamente otimista, em meio à crise vivida pelas companhias aéreas e à ameaça de aumento das tarifas, diante da tendência de desvalorização do real.
De fato, no primeiro semestre deste ano, o movimento ficou muito aquém dos números projetados pelo governo: houve recuo de 0,2% e de 4,5% no volume de passageiros, respectivamente, do Galeão e de Confins. “Os estudos do governo ficaram defasados”, diz um representante de um dos consórcios, que pede para não ser identificado. “Se somarmos o fato de que as empresas aéreas estão reduzindo capacidade e adiando o recebimento de novos aviões, temos cenário de crescimento quase nulo da oferta, nos próximos anos”, diz.
A eventual revisão das estimativas de crescimento da demanda nos dois aeroportos, conforme pedem os investidores, pode dar mais flexibilidade ao cronograma de investimentos exigidos nos contratos de concessão. Até abril de 2016, por exemplo, o Galeão deverá ter mais 26 pontes de embarque e desembarque (fingers) e Confins precisará de um novo terminal de passageiros. Para os grupos interessados no leilão, obras como a ampliação de pátios de aeronaves e novas pistas poderiam ser feitas com mais tempo, caso o crescimento “real” da demanda fosse considerado.
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Argentina volta a represar as exportações brasileiras
Valor Econômico
A indústria de calçados acaba de reacender um sinal de alerta em suas exportações à Argentina: pelo menos 350 mil pares de sapatos, tênis e sandálias estão prontos em fábricas brasileiras e já tiveram suas vendas fechadas ao país vizinho, mas não podem cruzar a fronteira por falta da declaração prévia que foi imposta pela Casa Rosada como forma de administrar o comércio exterior.
A declaração funciona como pilar do esquema “uno por uno” criado pelo secretário de Comércio Interior, Guillermo Moreno, no qual empresas argentinas só podem trazer um dólar em produtos importados com o compromisso de exportar outro dólar. Ela é conhecida como “Djai” – sigla para declaração juramentada antecipada prévia.
“Desde outubro do ano passado, vínhamos observando maior previsibilidade no comércio com a Argentina, mas voltamos a sentir pressões do governo argentino nos últimos 30 a 40 dias”, diz Heitor Klein, presidente da Abicalçados, associação que representa os produtores brasileiros.
Embora as restrições sejam de menor intensidade do que antes, segundo Klein, elas se somam a um mercado já em desaceleração e compõem um quadro negativo: a estimativa da Abicalçados é que as exportações à Argentina atinjam sete milhões de pares neste ano – 30% a menos do que em 2012. Em meados da década de 1990, os embarques ficavam em torno de 20 milhões de pares.
O secretário de comércio exterior do Ministério do Desenvolvimento, Daniel Godinho, confirma que alguns setores da indústrias começaram a relatar dificuldades novamente em exportar para a Argentina. “As reclamações haviam diminuído, mas continuaram acontecendo e agora voltaram a aumentar”, afirma.
Godinho prefere enfatizar, no entanto, o fato de que o comércio entre os dois países tem crescido neste ano. De janeiro a julho, segundo estatísticas do ministério, as exportações brasileiras à Argentina aumentaram 8,3%. No sentido inverso, as vendas argentinas ao Brasil tiveram expansão de 18,2%. “Até agora, o ano foi positivo e o comércio bilateral flui bem”, destaca o secretário.
Na semana passada, funcionários do Ministério do Desenvolvimento e do Itamaraty receberam um relato detalhado da situação política e econômica do país vizinho: Dante Sica, ex-secretário de Indústria e hoje diretor da consultoria portenha Abeceb, mostrou pessoalmente às autoridades brasileiras um diagnóstico de 73 páginas sobre a Argentina.
A estratégia brasileira deve ser de “controle de danos” no comércio com a Argentina, segundo o consultor, sem a expectativa de recuperação do espaço perdido no mercado local. “Nos próximos dois anos, o governo da presidente Cristina Kirchner não tem como retirar ou aliviar as restrições comerciais”, resume Sica.
O problema está no fato de que as portas do mercado internacional continuam fechadas à Argentina, impedindo a Casa Rosada de tapar o buraco das contas externas com financiamento ou investimentos diretos estrangeiros. Por isso, o país precisa de um superávit comercial perto de US$ 10 bilhões por ano para não entrar em um “abismo” cambial, que só é alcançado com a imposição de travas às importações.
Sica veio a Brasília – depois de uma escala na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) – com números contundentes na bagagem: a participação dos produtos brasileiros no total das importações argentinas desabou, em 19 de 21 setores pesquisados, nos últimos dez anos.
A comparação foi feita entre 2003 e o primeiro semestre de 2013. Em todos esses setores, houve forte avanço de mercadorias chinesas no mercado argentino, caracterizando desvio de comércio. Um dos casos mais dramáticos ocorreu na indústria têxtil e de confecções: a participação dos produtos brasileiros, em dez anos, diminuiu de 56% para 23%. Enquanto isso, a China elevou sua fatia de 2% para 31%.
“Esse é o nosso maior inconformismo”, diz Heitor Klein, da Abicalçados. O discurso do empresariado, que antes cobrava uma posição mais firme das autoridades brasileiras com o parceiro do Mercosul, foi vencido pela percepção de que restou apenas a alternativa de “controlar danos” sugerida pela Abeceb.
“Não podemos pedir do governo brasileiro mais do que ele já está fazendo”, diz o coordenador da área internacional da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), Domingos Mosca. “A verdade é que a Argentina está à beira de um colapso cambial. As reservas mantidas pelo Banco Central, de US$ 35 bilhões, não cobrem nem seis meses de importações. Só resta a opção de administrar o comércio de forma absolutamente imprevisível”, avalia.
A perda de competitividade da indústria nacional certamente influi no retrocesso dos produtos brasileiros no mercado argentino, segundo reconhece Dante Sica, mas ele ressalta que aparentemente tem havido maior tolerância da Casa Rosada com mercadorias chinesas. O ponto de inflexão parece ter sido um mal-estar, em 2010, entre a Argentina e a China. Os asiáticos alegaram problemas técnicos para suspender, por sete meses, as compras do óleo de soja argentino. Isso gerava um prejuízo potencial de US$ 2 bilhões ao país. Nos bastidores, comentava-se que era uma retaliação de Pequim à avalanche de barreiras comerciais adotadas por Buenos Aires. Desde que a suspensão ao óleo foi retirada, a Argentina não impôs mais nenhuma medida antidumping a produtos chineses, comenta o ex-secretário Sica. “Ficou a impressão de que houve um acordo informal entre os dois países.”
Mesmo com todas as barreiras, a Argentina continua sendo o principal mercado para manufaturados brasileiros. Neste ano, a previsão da Abeceb é de um saldo bilateral de US$ 1,5 bilhão, a favor do Brasil. Há chances de que o superávit brasileiro fique no nível mais baixo desde 2003.