ONU: Brasil perdeu 25% das riquezas naturais

Na contramão de todo o desenvolvimento econômico de 31% nas últimas décadas, o Brasil perdeu 25% de suas riquezas naturais per capita nesse período. Na América do Sul, o panorama é ainda mais desanimador: o continente registrou uma perda total de 33%. Os números constam do relatório Índice da Riqueza Inclusiva, divulgado ontem no Riocentro pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e pelo Programa de Dimensões Humanas para Mudanças Ambientais Globais, ligado às Nações Unidas.

O documento, inédito, compilou dados coletados entre os anos de 1990 e 2008.

O diferencial dessa análise é que foram levados em conta para o resultado capitais manufaturados, humanos e naturais — e não só os tradicionais indicadores do Produto Interno Bruto (PIB) — para avaliar o nível de riqueza dos países pesquisados.

Os 20 países avaliados — Austrália, Brasil, Canadá, Chile, China, Colômbia, Equador, França, Alemanha, Índia, Japão, Quênia, Nigéria, Noruega, Rússia, Arábia Saudita, África do Sul, Estados Unidos, Reino Unido e Venezuela — representam 56% da população mundial e 72% do PIB do planeta.

Tentativa de mudar forma de medir crescimento

O objetivo é criar um mecanismo mais abrangente de pesquisa, capaz de proporcionar dados sobre o desenvolvimento a longo prazo.

Trata-se de uma tentativa de mostrar que a observação de dados econômicos isolados não reflete o verdadeiro crescimento de uma determinada nação. Fatores como educação, infraestrutura, investimentos, florestas, agricultura e combustíveis devem ser incluídos em qualquer análise conjuntural.

— É um primeiro passo, crucial, para mudar o paradigma econômico global, pois nos força a reavaliar nossas necessidades e objetivos como sociedade — afirmou ontem o professor Anantha Duraiappah, diretor do Programa de Dimensões Humanas para Mudanças Ambientais Globais e responsável pela pesquisa.

Para Partha Dasgupta, professor emérito de Economia da Universidade de Cambridge, os números da pesquisa representam um grave sinal amarelo: — Um aumento total da riqueza não necessariamente indica que as futuras gerações podem consumir nos mesmos níveis desta geração — advertiu Dasgrupta.


Brasil não aceita medidas punitivas

Valor Econômico

O principal avanço da Rio+20, a ser lembrado daqui a 20 anos será a decisão de se criar, até 2014, metas claras que garantam crescimento com combate à pobreza e proteção ambiental, acredita o ministro de Relações Exteriores, Antonio Patriota, na coordenação das negociações da conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável. O Brasil está preocupado, porém, em evitar que essas metas – os chamados Objetivos de Desenvolvimento Sustentável- abram espaço para medidas discriminatórias ou punitivas aos países com dificuldades.

“Os objetivos não podem ser transformados em obstáculo; isso é uma preocupação”, disse Patriota, em entrevista exclusiva ao Valor, em seu gabinete no Riocentro, de onde acompanha as discussões e contacta ministros de alguns dos 193 países da ONU. Outro resultado possível será a decisão de iniciar um processo de negociação que proteja a biodiversidade nos oceanos e regule a exploração dos recursos genéticos em alto -mar.

O ministro descartou a proposta defendida por países europeus e apoiada pelas nações africanas de transformar em uma agência das Nações Unidas o Pnuma, o braço ambiental da ONU, que hoje é um programa sem orçamento definido, força política e participação de todos os países. O provável será fortalecer o Pnuma, sem torná-lo uma agência, como a Organização Mundial da Saúde, por exemplo, já que existe forte oposição dos EUA. “É uma ideia divisiva”, diz. A seguir, os principais trechos da entrevista:

Valor: O que pode garantir, na Rio+20, o financiamento às metas de desenvolvimento sustentável?

Patriota: A proposta de estabelecimento de um processo intergovernamental, sob a égide da Assembleia Geral da ONU, com apoio do sistema ONU e em consulta de instituições financeiras regionais e internacionais para a mobilização de recursos, está sendo bem aceita.

Valor: Como é essa proposta?

Patriota: A ideia é a criação de um comitê intergovernamental que apresentará suas conclusões em 2014. Poderá se criar um processo que transcorrerá, dentro da filosofia do documento final da Rio+ 20, em paralelo à definição dos objetivos de desenvolvimento sustentável. Esperamos que seja lançado também um processo que culmine com adoção de objetivos específicos até 2015.

Valor: A Europa está sem dinheiro, os EUA terão eleição. Como a Rio+20 está sendo afetada?

Patriota: É óbvio que tudo é interligado. Aqui na Rio+20 o trabalho é voltado a prazos mais longos, tanto na avaliação do que foi ou deixou de ser feito desde 1992 como o que prevemos para o futuro. Teremos os objetivos de desenvolvimento sustentável, e queremos um desenvolvimento inclusivo, articulando-se com as metas do milênio. Isso já indica um pensamento mais no médio e longo prazo.

Valor: Sim, mas a Europa…

Patriota: A Europa tem uma crise imediata e urgente, mas não vai deixar de existir e continua sendo um centro extraordinário de poderio econômico, liderança política, conhecimento e tecnologia. Na Europa toda a temática do desenvolvimento sustentável, imbricação do meio ambiente com crescimento econômico e desenvolvimento social só vai ganhar importância. É um dos atores mais interessados em níveis elevados de ambição na Rio+20. É incontornável o fato de que ela terá de contribuir para esse esforço, mas há muito que os países poderão fazer em seus próprios territórios.

Valor: Países ricos têm pedido cada vez mais que os países emergentes participem mais…

Patriota: Eles estão fazendo mais. No Fórum Nacional de Mudanças Climáticas, a presidenta Dilma [Rousseff] disse que o Brasil tem condições de fazer muito nessa área, por características que lhe são próprias, que envolvem tanto o mérito das lideranças brasileiras na antecipação de desafios, com matriz energética mais limpa, política contra a pobreza, mas também por características do território, que permite diminuir gás de efeito estufa evitando desmatamento. Podemos talvez fazer até mais que alguns outros.

Já não se questiona a ideia da responsabilidade coletiva na articulação de um futuro sustentável

Valor: Na conferência de Copenhague, o Brasil assumiu um posicionamento corajoso em metas de redução de emissões. Está se pensando em algo assim na Rio+20?

Patriota: Esta conferência tem características próprias, é diferente de Copenhague e também da Rio92, onde havia o fechamento de acordos. Aqui estamos fazendo uma avaliação e planejando o futuro, a partir do documento “O Futuro que Queremos”, que é uma declaração e aponta direções. O embaixador Marcos Azambuja, que trabalhou na Rio92, disse outro dia que a proa está apontada na direção certa, falando em relação ao Brasil. É o que queremos fazer com esta conferência também: apontar a proa na direção da comunidade internacional.

Valor: Mas a questão é saber se a embarcação vai navegar, não?

Patriota: A embarcação está navegando. Já não se questiona a ideia da responsabilidade coletiva na articulação de um futuro sustentável. Também não se questiona a importância da erradicação da pobreza, da redução das desigualdades, na mudança de padrão de consumo. Na Rio92 foi considerada uma vitória se falar em meio ambiente e desenvolvimento. Hoje o segundo parágrafo do documento já diz que a erradicação da pobreza é central.

Valor: Como avançar, por exemplo, no capítulo de oceanos, uma área muito cara ao Brasil, mas onde os EUA se opõem? OS EUA sequer assinaram a convenção do mar…

Patriota: A secretária de Estado, Hillary Clinton, foi ao Congresso e está envolvida em uma mobilização política para que os EUA ratifiquem a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos do Mar. Não me cabe pronunciar sobre a dinâmica interna de um país, mas há uma dinâmica nos Estados Unidos em que o Executivo tem muito interesse em se associar a esta convenção. Na medida em que os negociadores são representantes do Executivo, podemos tirar as nossas conclusões. Aqui, nas negociações de agora, os pontos de discórdia são pequenos e superáveis.

Valor: A ideia é se criar um processo que regulamente a exploração da biodiversidade do mar em águas muito profundas, que não pertencem a nenhum país, não é?

Patriota: Sim, tem a ver com a biodiversidade para além das jurisdições nacionais. Deve haver um processo negociador sobre isso.

Valor: Nas negociações de clima se pensa em um centro de tecnologia específico, e os países emergentes gostam dessa ideia. Aqui poderia sair algo parecido com isso?

Patriota: A seção sobre transferência de tecnologia é bastante genérica no texto. Mas, em paralelo, correm muitas iniciativas. Está bastante avançada a ideia de um centro de desenvolvimento sustentável com sede no Rio. Seria um instituto com patrocínio da ONU e que poderia também ser financiado por outras contribuições. Mas isso em paralelo à conferência, não será anunciado aqui.

Valor: Como o Brasil enfrentará essa agenda, rico em recursos naturais mas com uma população que quer consumir mais?

Patriota: O papel da educação é muito importante. É muito através da mudança da mentalidade que vamos avançar nessa direção. É o desafio político do momento em que vivemos. Exigirá coragem, liderança, capacidade de quebrar padrões aos quais estamos acostumados.

Valor: O Brasil tem adotado políticas como o estímulo ao consumo individual, sem cobrar mudanças da indústria, como nos incentivos ao setor automotivo.

Patriota: Que outro país tem uma frota de automóveis flex fuel como no Brasil? Não conheço nenhum. Isso aí tem implicação em relação à sustentabilidade.

Não queremos objetivos que sejam utilizados de maneira que possa ser discriminatória contra países mais pobres

Valor: Mas é transporte individual, quando a sustentabilidade pede estímulo ao transporte coletivo.

Patriota: São questões legítimas. Quem está fazendo mais tem de continuar fazendo mais; e temos de trabalhar para que quem está fazendo menos comece a fazer um pouco.

Valor: A dependência maior das reservas do pré-sal não ameaçam a economia verde no Brasil?

Patriota: Não é esse o espírito em que a presidenta, que entende muito de energia, pretende trabalhar. Temos conquistas importantes em termos de matriz energética renovável; não vamos deixar que essa característica da matriz brasileira sofra um retrocesso.

Valor: A Rio+20 será lembrada como daqui a 20 anos?

Patriota: Jeffrey Sachs acha que os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) são um tremendo ganho. É uma conquista da maior importância, desenvolvida no âmbito multilateral. Uma nova responsabilidade coletiva. É muito importante que os objetivos sejam encarados da perspectiva da articulação dos três pilares do desenvolvimento sustentável: não podemos ter um objetivo ambiental, outro social e outro econômico. Outro aspecto é: os objetivos não podem ser transformados em obstáculo. Isso é uma preocupação.

Valor: Pode detalhar?

Patriota: Não queremos objetivos que sejam condicionalidades, que sejam transformados em barreiras ao comércio, utilizados de maneira que possa ser discriminatória contra países mais pobres. A erradicação da pobreza tem que estar no centro das atenções. Estamos olhando para o futuro sustentável do planeta. Os objetivos têm de ser curtos e a governança que será criada tem de ajudar na sua implementação, de maneira construtiva, que apoie esforços bem sucedidos, que não se penalize os que têm mais dificuldade.

Valor: Quais as mudanças na governança institucional? Como estão as negociações?

Patriota: O que está sobre a mesa nesse momento é fortalecer o papel do conselho geral do Ecosoc, que já tem um pilar econômico e social e pode ganhar um papel na área ambiental. Existe a ideia de se criar um Fórum de Alto Nível sobre Desenvolvimento Sustentável, em substituição à comissão existente nessa área, a CDES, que seria turbinada, digamos assim. Ao mesmo tempo existe aquela ideia de fortalecimento do Pnuma.

Valor: Por que o Brasil não apoia a transformação do Pnuma em uma agência, com maiores poderes?

Patriota: Não há um consenso sobre a agência. A ideia da agência especializada é divisiva. Aqui estamos trabalhando com as maiorias. Chegando perto de um acordo, com uma voz ou duas dissonantes, a gente empurra para aquela direção. Quando há divisão, que não vai ser resolvida em dois dias, a gente vê como pode lidar. Uma maneira é trabalhar pelo fortalecimento, como fazer o Pnuma aberto à participação universal que hoje é limitada a poucos países.


Queda na produção afeta o setor de bens de capital

O Estado de S. Paulo

Embora venha se recuperando na margem, o subsetor de caminhões e ônibus registrou quedas de dois dígitos na produção por quatro meses consecutivos, puxando para baixo o setor de bens de capital, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

O segmento de caminhões começou 2012 com uma queda de 65,5% em janeiro, seguida por perdas também em fevereiro (-34,6%), março (-14,3%) e abril (-23,7%), sempre na comparação com o mesmo mês do ano passado. “Isso impactou nos bens de capital”, ressalta Fernando Abritta, analista da Coordenação de Indústria do IBGE.

Em janeiro, a produção de bens de capital recuou 13,1% em relação ao mesmo mês de 2011. Assim como ocorreu com a produção dos caminhões, a categoria ainda experimentou novas quedas em fevereiro (-16,0%), março (-6,2%) e abril (-4,1%), sempre na mesma base de comparação.

O resultado foi uma redução nos investimentos no primeiro trimestre de 2012. Como a aquisição de caminhões é classificada como investimento, a redução tanto nas vendas quanto na produção levou a uma queda de 2,1% na Formação Bruta de Capital Fixo no primeiro trimestre do ano, em relação ao mesmo período de 2011.

“Caminhões é praticamente tudo investimento. Então, isso afetou negativamente nos investimentos”, explica Rebeca Palis, gerente da Coordenação de Contas Nacionais do IBGE.

Retomada. O presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Cledorvino Belini, admite que o desempenho do segmento nos primeiros meses deste ano é fator de preocupação. Mas também aposta que as medidas de estímulo do governo ao setor automotivo vão levar a indústria de caminhões a uma retomada das vendas e da produção a partir de julho. “Dentro de 30 a 60 dias vão aparecer os efeitos dessas medidas.”

Segundo a Federação Nacional da Distribuição de Veículos (Fenabrave) e as montadoras, a demanda por veículos novos tem a ajuda do uso de caminhões para o escoamento das safras de soja, milho e cana-de-açúcar, bem como das obras de infraestrutura. “Ainda existe muita safra a ser colhida e, no caso da infraestrutura, o Brasil precisa ainda ser “construído”. Há demanda de caminhões para isso”, afirma Alarico Assumpção Júnior, presidente executivo da Fenabrave.


União eleva proteção para confecções

Valor Econômico

O governo publicou decreto no Diário Oficial que eleva de 8% para 20% a margem de preferência a vestuário, calçados esportivos e alguns produtos têxteis de produção nacional nas compras federais. Agora, quando for aberta uma licitação, o produto brasileiro que tiver custo até 20% maior do que o estrangeiro continuará com preferência de compra.

Essa é mais uma medida adotada para proteger a indústria e aumentar a produção no país. A adoção da margem de preferência aos produtos nacionais começou no ano passado como parte das ações do Plano Brasil Maior.

A aprovação da lei agradou ao presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit) Aguinaldo Diniz Filho, que acredita que o setor vai começar a sentir os efeitos no segundo semestre, dependendo do ritmo de licitações realizadas. Segundo ele, as compras governamentais representam “um volume relevante para a indústria”, mas sem apontar números específicos. “Com a queda dos juros, a desvalorização cambial, a desoneração na folha de pagamentos e mais essa medida, esperamos resultados positivos. O governo está demonstrando vontade política”, afirma.


Peru quer atrair mais empresas brasileiras

Valor Econômico

Com a maior taxa de crescimento e a menor inflação dos últimos cinco anos na América Latina, o Peru quer entrar em um novo momento de desenvolvimento, de maior interligação com parceiros da região. Em visita ao Brasil, onde ficará até o fim do mês, Jose Carlo Burga, presidente do Conselho Empresarial do Peru – uma agência de fomento a investimentos no país andino – está em busca de empresas brasileiras que desejam se instalar em terras peruanas. Trabalhando em conjunto com Antonio Castillo, que participou do corpo técnico da equipe econômica do governo de Alberto Fujimori (1990 a 2000) e hoje é conselheiro econômico-comercial da embaixada peruana no país, Burga crê em um novo momento na relação bilateral, baseado em investimentos de longo prazo e maior integração produtiva.

Em entrevista ao Valor, Burga e Castillo falaram sobre a “invasão” das grandes empresas brasileiras nas obras de grande porte do país para os próximos anos e fizeram o prognóstico de que, em 2017, “o Brasil deve se tornar o maior investidor estrangeiro no Peru.”

Diferentemente dos países com quem possui relações históricas mais intensas, como Espanha e Estados Unidos, a maré de investimentos brasileiros acontece em áreas que se interligam, como mineração, energia, petroquímica e transportes. Para Castillo, o maior intercâmbio entre as duas economias é condição básica para um crescimento sustentável. “Os investimentos brasileiros são de longo prazo, de 30 anos, o que mostra esse novo tipo de relação que está sendo criada.” Confira os principais pontos da entrevista.

Valor: O investimento brasileiro no Peru praticamente triplicou entre 2007 e 2010, sendo que no ano passado o Brasil se firmou com o sexto maior investidor no país. Qual a projeção para este ano?

Jose Carlo Burga: Até agora foram anunciados pelo menos dois grandes investimentos. Um da Braskem em parceria com a Petrobras, de US$ 4,5 bilhões, e outro da Odebrecht com a CSN, de US$ 1 bilhão.

Antonio Castillo: A perspectiva é que os investimentos brasileiros alcancem US$ 20 bilhões daqui a cinco anos. A diferença com relação aos outros países é que não são investimentos só em matérias-primas ou em um setor, mas também em desenvolvimento de produtos de maior valor agregado, como a Vale, que está produzindo fertilizantes ao invés de apenas comprar o fosfato. A Petrobras não está só extraindo gás, mas construindo um parque petroquímico. O Brasil precisa de zinco, então a Votorantim está fazendo produtos ligados ao produto. Há investimentos em aço com o grupo Gerdau e a CSN. E todos esses projetos estão com o setor privado.

Valor: O Brasil é o novo parceiro estratégico peruano?

Castillo: A perspectiva é que em cinco anos o Brasil se torne o maior investidor direto no Peru.

Burga: Nossa economia não está mais ligada apenas a produtos primários, estamos avançando na indústria secundária. O que me surpreende na relação entre Brasil e Peru é que há oportunidades em muitos setores que ainda não foram explorados, como a agroindústria. A Odebrecht está trabalhando em um projeto de irrigação de milhões de hectares potencialmente produtivos na costa norte peruana. Isso vai permitir que grandes empresas agrícolas brasileiras possam se instalar na região, em um processo de abertura de uma nova área de produção.

Valor: Quais são as áreas com potencial de investimentos ainda pouco explorados?

Burga: Em mineração e infraestrutura temos relações consolidadas, tradicionais. O potencial de investimentos no Peru é de cerca de US$ 90 bilhões. Apenas em mineração, há oportunidades de US$ 53 bilhões, pois 10% das reservas de minérios ainda não foram exploradas. Em infraestrutura, o total de obras em andamento somam US$ 15 bilhões, sendo que precisaremos de US$ 40 bilhões para suprir nosso déficit nessa área nos próximos anos.

Valor: O Brasil também tem problemas com infraestrutura deficitária e não tem conseguido tocar todas as obras a que se propõe. E são as empresas brasileiras que estão ligadas a essa expansão no Peru. Elas vão conseguir fazer os projetos nos dois países?

Castillo: O tempo que as empresas brasileiras levam para construir no Peru é muito menor do que no Brasil, pois temos menos burocracia e instituições mais ágeis. O Brasil tem algumas dificuldades para desenvolver os projetos, mas as empresas possuem competência para isso. Tanto é que agora estamos desenvolvendo um grande cluster petroquímico, com a participação da Petrobras na exploração do gás, da Odebrecht na construção do gasoduto, e da Braskem na construção do polo petroquímico. Temos usinas elétricas sendo feitas por empresas brasileiras. Conversei há cerca de duas semanas com um grupo de empresários da Zona Franca de Manaus. Eles me disseram que estavam demorando só 12 dias para importar autopeças da Ásia e a um custo 35% menor de frete ao usar um porto peruano e a rodovia Transoceânica para levar os produtos à região. O Brasil vai precisar desenvolver isso se quiser aumentar as exportações. Usar a saída peruana para o Pacífico para escoar para a China a produção de soja e minérios traz mais competitividade e rentabilidade ao produto brasileiro.

Valor: Então para chegar à Ásia a produção brasileira vai passar antes pelo Peru…

Castillo: Não só isso. Estamos falando de construção de dutos de gás, dutos de soja entre os dois países, com as economias ficando mais interligadas. A Espanha, que é o maior investidor no Peru, só tem alguns projetos, e todos em serviços e bancos, que estão tirando os investimentos por causa da crise. Os Estados Unidos estão mais concentrados em mineração. Os investimentos brasileiros são de longo prazo, 30 anos.

Burga: O Brasil não está comprando apenas uma mina de zinco, ou fazendo uma rodovia. O Porto de Bainova, que está em construção, vai movimentar oito milhões de toneladas ao ano. É investimento brasileiro para escoar a própria produção.

Valor: Nos últimos sete anos o PIB peruano cresceu a uma taxa média de 7%. A piora externa e a desaceleração da economia brasileira não podem frear esse crescimento e minar os investimentos?

Castillo: A nossa projeção de PIB para os próximos anos é de 6%. Nossa inflação é uma das menores do mundo, devendo ficar em 3% nesse ano. Nosso nível de endividamento do PIB é de 26% e nosso superávit fiscal é de 1,5%. Nossas reservas devem chegar a US$ 57 bilhões no fim do ano. Pela base, temos uma economia estável. O nosso problema não é crise e sim fazer novas reformas. Para esse salto para atividades mais diversificadas precisamos criar infraestrutura e novos focos de crescimento.

Burga: A crise nos afeta no sentido de que não controlamos pressão na inflação, ou nossas vendas de algumas exportações. Mas nosso crescimento é baseado em demanda e exploração de riquezas internas, com uma base estável que favorece o investimento. Só os projetos em infraestrutura garantem um crescimento entre 3% e 4% do PIB.

Valor: Mas o Brasil está com projeção de crescimento menor, o que deve afetar os investimentos privados. E o BNDES é o maior financiador desses projetos no Peru…

Burga: Não há sinais desse movimento dos empresários, pelo contrário. É justamente nessa hora que as empresas estão procuram novos projetos para crescer. E em relação ao financiamento, há também bancos multilaterais e um mercado de crédito a juros baixos no Peru. Financiamento não é problema.

Valor: A corrente de comércio entre os dois países estabilizou em US$ 3 bilhões desde 2008, com um leve crescimento no ano passado e superávit a favor do Brasil. Quais as perspectivas para essa balança?

Castillo: Se você olhar os números, o Brasil estagnou em cerca de US$ 2 bilhões, enquanto as vendas peruanas estão crescendo principalmente em manufaturas, que antes não vendíamos. Mas com o aumento dos investimentos e a consolidação dos que já estão em andamento, a troca de produtos deve se intensificar.


Investimento federal reage e cresce mais em maio

Valor Econômico

Os investimentos públicos deram em maio um primeiro sinal de reação. De acordo com levantamento feito pela Tendências Consultoria com base em dados do Siga Brasil, sistema de informação do Senado sobre orçamento público, o pagamento de investimentos públicos pela União passou de R$ 592 milhões em abril para R$ 1,03 bilhão no último mês – crescimento de 46% em termos nominais sobre igual mês de 2011.

Se somados também os restos a pagar de outros exercícios, que em 2011 representaram cerca de 60% do total das despesas com investimento da União, os investimentos públicos somaram R$ 3,7 bilhões em maio deste ano, alta de 21,9% em relação a igual período do ano passado. Nos quatro primeiros meses de 2012, a média de gastos nessa rubrica foi de R$ 2,6 bilhões.

Felipe Salto, economista da Tendências, pondera que os dados referem-se a apenas um mês e, por isso, é cedo para traçar um cenário de recuperação dos investimentos públicos, que patinaram nos primeiros meses. O governo, diz ele, “está tentando ampliar dispêndios com investimentos, mas vai ser difícil por causa da arrecadação federal, que desacelerou.”

No primeiro trimestre, a receita, que crescia 7% em termos reais ante igual período do ano passado, passou para um avanço de 3% em abril, na mesma base de comparação. “Se essa taxa for observada ao longo do restante do ano, ainda será possível cumprir a meta de superávit primário e manter o nível de gastos previsto. Mas esse crescimento não comporta aceleração dos investimentos”, afirma Salto.

Em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), o investimento público diminuiu na comparação anual. Entre janeiro e maio deste ano, a relação foi, em média, de 0,98%, inferior ao 1,15% observado no mesmo período de 2011.

Os dados não consideram as inversões financeiras e nem as despesas com subsídios ao Minha Casa Minha Vida, que desde janeiro deste ano passaram a ser computadas pelo Tesouro Nacional como investimentos. Antes, eram classificadas como despesas de custeio. Caso o programa habitacional fosse considerado, avalia Salto, a relação entre investimentos públicos e o Produto Interno Bruto (PIB) seria mais alta, de cerca de 1,3%.

O baixo crescimento da economia no primeiro trimestre deste ano, de apenas 0,2% sobre os últimos três meses de 2011, elevou a preocupação do governo com a atividade neste ano. Em algumas pastas, houve reação mais forte ao fraco desempenho do começo do ano. O Ministério dos Transportes, por exemplo, acelerou as despesas. Nos quatro primeiros meses do ano, a pasta, responsável por executar uma parte importante do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), gastou apenas R$ 41,8 milhões, além de outros R$ 2,1 bilhões em restos a pagar. Apenas em maio, as despesas com investimentos aceleraram para R$ 212 milhões. Os restos a pagar, por sua vez, ficaram em linha com o observado nos dois meses anteriores e somaram R$ 616 milhões.

O Ministério da Educação, que no ano passado foi responsável por um volume de investimentos inferior apenas às pastas das Cidades e da Defesa, também apresentou aceleração do ritmo de gastos com essa finalidade. Entre janeiro e abril, em média, a pasta dispendeu R$ 500 milhões em investimentos, número que saltou para R$ 825 milhões em maio, considerando pagamentos e também restos a pagar.


Maioria absoluta fortalece Hollande

O Globo

O presidente François Hollande conquistou ontem as melhores condições para governar em seu início de mandato: o Partido Socialista (PS) obteve nas eleições legislativas a maioria absoluta de deputados na Assembleia Nacional. O resultado evita que o novo governo necessite do apoio de outros grupos de esquerda para aprovar no Parlamento suas reformas econômicas e sociais, as quais deverão incluir medidas de austeridade para conter o déficit público do país, como cortes no Orçamento e aumento de impostos. No plano europeu, o Palácio do Eliseu se fortalece politicamente em seu embate com a Alemanha da chanceler federal Angela Merkel pela aplicação de um programa de crescimento na zona do euro.

Os socialistas e seus aliados conquistaram 314 cadeiras, um resultado confortavelmente superior ao patamar mínimo de 289 assentos para a obtenção da maioria no Parlamento. Os conservadores, liderados pela União por um Movimento Popular (UMP), do ex-presidente Nicolas Sarkozy, ficaram com apenas 229 assentos. A votação foi marcada por um patamar recorde de abstenção.

O campo socialista sofreu uma emblemática derrota nas urnas: Segolène Royal, candidata do partido na eleição presidencial de 2007 e ex-companheira de Hollande, não alcançou a maioria de votos para se eleger. Embora também tenha ficado de fora do Parlamento, a líder do partido de extrema-direita Frente Nacional (FN), Marine Le Pen, comemorou a eleição de dois candidatos da legenda, entre eles sua sobrinha, Marion Maréchal-Le Pen, que aos 22 anos se tornou a mais jovem deputada da Assembleia Nacional.

François Hollande preferiu manter a discrição e não misturar sua condição de presidente do país com as questões partidárias. Coube ao seu primeiro-ministro, Jean-Marc Ayrault, se dirigir aos eleitores que, com a votação de ontem, conferiram uma maioria socialista nas duas casas parlamentares, o Senado e a Assembleia:

-Vocês confirmaram a vontade de mudança. Vocês escolheram a coerência, e os engajamentos do presidente da República poderão ser colocados em obra – disse o premier socialista em pronunciamento na televisão francesa.

O governo também pôde comemorar a vitória do primeiro-ministro e de todos os ministros candidatos no pleito legislativo, poupando demissões por causa de derrota eleitoral, uma regra previamente determinada por Jean-Marc Ayrault. Já o desânimo era visível no lado perdedor.

– É um dia de derrota, e é preciso reconhecê-la. Uma coisa está clara: nós perdemos – admitiu Jean-François Copé, atual líder da UMP.

Além da perda da maioria na Assembleia, o partido da direita não conseguiu eleger alguns de seus caciques, como os ex-ministros Claude Guéant, Nadine Morano e Michèle Alliot-Marie. O partido de centro, o MoDem, também saiu derrotado ao não conseguir reeleger seu líder, François Bayrou.

Brasileiro naturalizado francês terá um assento

Malograda em sua intenção de entrar para a Assembleia, a líder de extrema direita Marine Le Pen procurou minimizar seu fracasso pessoal, valorizar o desempenho do partido e alfinetar a direita tradicional da UMP:

-Não posso estar decepcionada quando se faz 49,9% contra todos. Perdi por apenas 114 votos de diferença. Mas o fato de estarmos representados na Assembleia é um enorme sucesso. A UMP pagou um alto preço por suas contradições ideológicas e seus compromissos políticos – declarou.

O Brasil, de uma certa forma, estará representado na Assembleia Nacional francesa. O gaúcho Eduardo Cypel, 36 anos, naturalizado francês em 1998, ganhou a eleição na 8ª circunscrição da região de Seine-et-Marne, com 52,77% dos votos, e terá um assento no Parlamento, em Paris. Emocionado, e assegurando estar ciente da “honra e da responsabilidade” de cumprir um mandato legislativo, o brasileiro disse que a difícil tarefa que o governo terá pela frente foi facilitada pelas urnas.

– Nosso negócio agora é trazer crescimento novo. Já tínhamos dito que haveria medidas para a diminuição da dívida. Mas é preciso ter também medidas para estimular o crescimento econômico, tanto na França como na Europa. E é claro que se governa melhor com uma maioria dependendo unicamente de sua própria família política. Mas o que conta é a esquerda dentro desta Assembleia, que hoje é bastante majoritária – disse Cypel ao GLOBO.