Governo admite mudar as regras da poupança

 

De olho no aumento do rendimento da caderneta, os investidores já estão promovendo uma ampla corrida para tal modalidade de aplicação. Segundo o BC, nos primeiros cinco meses do ano, a poupança registrou ingresso líquido (descontados os saques) de R$ 18,8 bilhões, um recorde para período tão curto de tempo. Além da perspectiva de remuneração maior, os poupadores priorizam a facilidade para depósitos e o fato de os ganhos não pagarem Imposto de Renda (IR). Nem mesmo o fato de os rendimentos estarem perdendo para a inflação nos últimos meses tem inibido as aplicações.

A certeza de que a caderneta voltará às regras antigas foi baseada na ata da reunião da semana passada do Comitê de Política Monetária (Copom), na qual os juros passaram de 7,50% para 8% anuais. O documento, divulgado ontem, trouxe um discurso mais duro contra a inflação e sinalizou que o BC, comandado por Alexandre Tombini, continuará a elevar os juros a um ritmo de 0,50 ponto. No mercado futuro, as apostas são de que a Selic ficará entre 9,25% e 9,50% ao ano até o fim de 2013. Se chegar a esse nível, deverá demorar a voltar a um percentual que atrele novamente a remuneração da poupança à Selic.

Descontrole e gastança

Na avaliação do governo, apesar de todo o desgaste político quando se fala em mudança na poupança, o mais importante agora é recuperar a credibilidade do BC e da política econômica — a desconfiança é tamanha, que a agência de classificação de riscos Standard & Poor”s ameaçou rebaixar a nota do Brasil (leia mais na página 10). Segundo a ata chancelada por Tombini, a inflação no país está “resistente e disseminada” e exige uma ação “tempestiva” da autoridade monetária.

Para os diretores do BC, o elevado nível do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que se mantém no teto da meta, de 6,5%, em 12 meses, e a dispersão dos reajustes contribuem para a piora na percepção dos agentes econômicos sobre a dinâmica dos preços. Ou seja, famílias e empresários deixam de acreditar na capacidade do governo de manter a inflação sob controle. O documento do Copom mostra ainda que índices de preços além do desejado retiram o poder de compra dos salários e das transferências de renda (Bolsa Família), ampliando a onda de desconfiança.

A ata projeta um IPCA em 2013 mais alto do que há 45 dias e, por isso, o BC precisa estar “especialmente vigilante”. Para este ano e 2014, o centro da meta é de 4,5%, com variação de no máximo dois pontos percentuais para cima ou para baixo. “Tendo em vista os danos que a persistência (inflacionária) causaria à tomada de decisões sobre consumo e investimentos, faz-se necessário que, com a devida tempestividade, a mesma seja revertida”, destacou o documento. “Por isso, o Comitê entende ser apropriada a intensificação do ritmo de ajuste das condições monetárias ora em curso.”

O BC jogou parte da culpa pelo descontrole da inflação ao Ministério da Fazenda, por causa do gastos públicos excessivos, que estimulam as remarcações de preços. O perigo da expansão fiscal inclui a estratégia de estímulo ao consumo por meio de benefícios tributários (redução de impostos). No entender do Copom, a despeito da limitada capacidade produtiva do país, que tem levado ao aumento de preços e de importações, o governo continuou a impulsionar a demanda e, consequentemente, a carestia.

Especialistas alertam que, com a elevação dos juros básicos, a Fazenda pode se sentir ainda mais confortável para expandir as despesas, o que anularia os efeito do aperto monetário sobre a inflação. Segundo Flávio Combat, economista-chefe da Concórdia Corretora, a tendência é de que as despesas públicas cresçam conforme se aproximem as eleições de 2014. “Com a intensificação do ritmo de aumento dos juros, o BC também abriria, a princípio, maior espaço para a expansão fiscal”, ponderou.

Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, fez avaliação semelhante. “Temos, de um lado, a política monetária fechando a torneira e, do outro, a fiscal escancarando. É preciso um realinhamento dessas estratégias”, criticou.

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Ata do Copom vê inflação ‘mais forte e persistente’

O Globo

O Banco Central (BC) acelerou a alta dos juros, na semana passada, de 7,5% para 8% ao ano, porque a inflação está mais forte, persistente, tende a crescer e está contaminando as expectativas de investidores e consumidores. Num tom mais duro que o usual, a ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) destacou ainda “mecanismos formais e informais de indexação” na economia e mencionou as expectativas do mercado sobre a inflação como um destes mecanismos. A ata fez o mercado revisar suas estimativas para juros, e alguns analistas já preveem que a Taxa Selic vá chegar a até 10% ao ano ainda este ano.

Quase 20 anos depois do Plano Real, especialistas afirmam que os preços ainda são fortemente indexados no país, o que torna mais difícil o controle da inflação. Estimativa do professor de Economia da PUC-Rio Luiz Roberto Cunha indica que 42% dos 365 itens que compõem o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA, usado nas metas de inflação do governo) têm algum tipo de indexação. Parte vem de serviços (26%, principalmente ligado ao salário mínimo) e parte (16,1%) de preços administrados, ou seja, que são controlados pelo governo

– A indexação é uma realidade no país, ainda que hoje seja menos intensa e ampla do que já foi.

Cunha avalia que o efeito das expectativas sobre a inflação tem peso maior no Brasil que em outros países por conta do histórico inflacionário e dos 30 anos vividos com forte indexação (1964-1994)

– Estamos com quase 20 anos de inflação relativamente baixa e é só os preços darem uma acelerada que aparece alguém para falar de indexação salarial. Por isso, é perigoso aceitar um pouco mais de inflação – diz o economista-chefe do ABC Brasil, Luis Otavio de Souza Leal.

Analista critica meta de inflação “tabelada”

Na avaliação do professor da FEA-USP Heron do Carmo, a indexação ocorre também pelo reajuste do salário mínimo e por títulos públicos atrelados a índices de preços e taxas de juros.

– Isso sem falar na indexação pelas expectativas, que são muito mais arraigadas que em outros países. O problema é que a inflação fica mais rígida e os choques são mais persistentes.

Ele critica o fato de o governo trabalhar com a mesma meta de inflação (4,5%, com margem de tolerância de dois pontos percentuais para baixo e para cima) desde 2006.

– Estamos com 18 anos de Real e é hora de mudar. Não tem cabimento tabelar a meta de inflação, que é a mesma há anos. Precisamos estabelecer um escalonamento para trazer o teto da inflação para 4%. Isso vai ajudar a indexação a perder força.

Na ata divulgada ontem, o BC disse que a decisão “tempestiva” de elevar a Selic, por unanimidade, de 7,5% ao ano para 8%, contribuirá para por a inflação em declínio e assegurar que a tendência persista em 2014. “Tendo em vista os danos que a persistência desse processo causaria à tomada de decisões sobre consumo e investimentos, faz-se necessário que, com a devida tempestividade, o mesmo seja revertido”, afirmou o Copom. “Para tanto, o comitê entende ser apropriada a intensificação do ritmo de ajuste das condições monetárias ora em curso”.

Para o economista-chefe da Votorantim Corretora, Roberto Padovani, o BC acertou a mão na coordenação de expectativas. Segundo ele, a comunicação mais clara e num tom acima, que levou os economistas a afirmarem que haverá ao menos mais dois aumentos de meio ponto percentual este ano. Ele chamou atenção para um detalhe na decisão do Copom: a unanimidade. Na reunião anterior, em abril, dois diretores votaram pela manutenção dos juros. E a maioria decidiu pela alta de 0,25 ponto percentual, que levou a Selic para 7,5% ao ano.

Para o economista da CM Capital Markets, Darwin Dib, o BC deve fazer mais duas elevações na Selic, de 0,5 e de 0,25 ponto percentual, com a taxa encerrando 2013 em 8,75%, mesmo patamar esperado pelo Itaú Unibanco. A consultoria LCA, que previa 8,75% até o fim do ano, agora aposta em algo entre 9% e 10%.

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Setor eleva preços e recupera margem de lucro, aponta CNI

Valor Econômico

Com a maior alta nos preços das mercadorias manufaturadas em cerca de quatro anos, a indústria começou 2013 recuperando margem de lucro. Os custos do setor continuaram desacelerando e fecharam com expansão de 5,8% no primeiro trimestre do ano em relação a igual período de 2012. No lado da inflação dos produtos, o aumento foi de 7,6% na mesma comparação, portanto, superior ao das despesas.

Essa retomada na margem de lucro é fundamental para que as empresas industriais possam executar seus projetos de investimento, avaliou a Confederação Nacional da Indústria (CNI). “Enquanto os custos vão aumentando, a indústria tenta manter suas margens, mas isso depende muito das condições de mercado”, disse Renato da Fonseca, gerente-executivo de pesquisa da CNI.

Iniciada timidamente no fim de 2012, “a tendência é que haja recomposição das margens”, completou. Mas, na média, 2012 fechou com movimentos invertidos: os preços aumentaram menos que os custos.

Desde o primeiro trimestre do ano passado – quando os preços subiram 2,3% em relação ao mesmo período de 2011 – esse indicador tem apresentado aceleração, ou seja, os aumentos consecutivos têm sido maiores. Nesse ritmo, a alta dos preços dos manufaturados nacionais chegou a 7,6% – a maior desde o quarto trimestre de 2008, quando o índice foi de 12,7%.

Termômetro da competitividade do setor, o Indicador de Custos Industriais (ICI), divulgado ontem, apontou a expansão de 5,8%. O cálculo considera três variáveis: gastos com produção (mão de obra, insumos e energia), com capital de giro, e com tributos.

A redução do custo da energia elétrica e com capital puxaram para baixo o indicador. As quedas foram de 5% e de 22,5%, respectivamente. As despesas com tributos aumentaram um pouco (1%), resultado de desonerações feitas pelo governo federal. O aumento do custo tributário só ocorreu por causa da alta do ICMS.

O que mais contribuiu para o crescimento dos custos industriais no período foi a despesa com insumos, que subiu 9,9%. “Esses custos continuam subindo e aumentos reais de salário, pela própria exaustão da indústria, serão cada vez menores”, explicou Fonseca. No primeiro trimestre, os gastos com mão de obra subiram 7,7% – a menor alta desde o quarto trimestre de 2010, quando o índice foi de 5,9%.

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S&P revisa perspectiva de nota do Brasil para ‘negativa’

Valor Econômico

A decepção com a taxa de investimentos do Brasil, o baixo crescimento do país e uma política fiscal expansionista, graças à queda no resultado primário e ao avanço dos bancos públicos, foram os fatores que levaram a agência de classificação de risco Standard & Poor”s (S&P) a revisar a perspectiva da nota soberana do Brasil de “estável” para “negativa”. É o que afirmou Sebastian Briozzo, diretor de rating soberano da S&P, em entrevista ao Valor PRO, o serviço de informações em tempo real do Valor.

Mesmo com a piora na perspectiva, o rating de longo prazo do Brasil foi mantido em “BBB”, em moeda estrangeira, dentro do “grau de investimento” da agência. A mudança na perspectiva indica que, dentro dos próximos dois anos, a S&P pode rebaixar a nota do país. “O grande fator que estaremos olhando para um possível rebaixamento é a evolução da situação fiscal”, diz o analista.

“Em novembro de 2011, quando elevamos a nota do país para “BBB”, nossa projeção era que os investimentos representariam seguramente mais de 20% do PIB hoje. Isso não aconteceu e é algo que ajudaria o país a crescer a taxas mais altas”, diz Briozzo.

“Não é uma mudança de rating. É de perspectiva. Vamos estudar com calma o documento e acompanhar essa questão”, afirmou ontem o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Márcio Holland, ao comentar o anuncio feito pela agência. Segundo o secretário, o Brasil vem crescendo mais que a média internacional, há demonstrações claras de confiança na economia e a política fiscal anticíclica tem sido suficiente para reduzir a relação entre dívida líquida e PIB.

Para Briozzo, a perspectiva negativa reflete os riscos da estratégia que o governo brasileiro tem usado para incentivar o crescimento do país. Ele cita os riscos, por exemplo, de se usar os bancos públicos como ferramenta anticíclica na economia. “Os bancos públicos brasileiros são bem administrados, mas qualquer instituição financeira em que o crédito cresça a taxas de 30% ao ano, está sujeita a riscos”, diz.

O analista diz que há uma reticência do setor privado em investir no país, em parte graças à perda de credibilidade do governo. Também pondera que a desaceleração da economia chinesa traz impactos negativos para todos os emergentes e outros países com rating soberano semelhante ao do Brasil. “Só que os demais países da América Latina comparáveis ao Brasil têm um espaço fiscal maior e não sofreram baixas taxas de crescimento como as do Brasil.”

O movimento da S&P reforça o crescente desconforto dos investidores. No espaço de um mês, o custo de proteção contra um calote da dívida brasileira, conhecido como “Credit Default Swap” (CDS), registrou a maior alta entre as principais economias do mundo.

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Energia cai abaixo do esperado na indústria

Valor Econômico

Apesar do estardalhaço oficial, as tarifas de energia elétrica para a indústria brasileira não ficaram tão baixas como prometia a presidente Dilma Rousseff, em janeiro. No primeiro trimestre, segundo indicadores divulgados ontem pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), o custo da eletricidade para o setor diminuiu 5% ante igual período do ano passado. Na comparação com o último trimestre de 2012, a queda é maior e chega a 11,7%.

Mesmo assim, o recuo verificado pela CNI fica significativamente abaixo dos valores anunciados por Dilma, em rede nacional de televisão. Na ocasião, ela havia prometido uma redução média de 20% nas tarifas, que podia chegar a 32%. Quanto mais uma indústria fosse intensiva no consumo de energia elétrica, maior o desconto nas contas de luz. A redução foi efetivamente aplicada, mas uma série de fatores tem corroído os ganhos de competitividade da indústria.

“A nossa expectativa é que ainda possa aparecer alguma queda dos custos com energia elétrica no segundo trimestre”, diz Renato Fonseca, gerente-executivo da unidade de pesquisa da CNI. Segundo ele, o levantamento toma como base as tarifas informadas pelas distribuidoras à Aneel.

O desconto nas contas de luz passou a valer no dia 24 de janeiro, fazendo com que nem todo seu efeito pudesse ter sido captado pelo indicador do primeiro trimestre. Apesar disso, é difícil que o patamar de redução anunciado pelo governo, após um penoso processo de renovação das concessões de usinas hidrelétricas e linhas de transmissão, seja mantido nos próximos meses.

No caso do mercado cativo, formado pelas distribuidoras de energia e seus clientes regulares, reajustes e revisões tarifárias aplicados pela Aneel nos últimos meses já “comeram” parte dos ganhos obtidos em janeiro.

A comercializadora de energia Comerc analisou detidamente o que ocorreu com as tarifas industriais de duas grandes distribuidoras: a paulista CPFL e a mineira Cemig. Para os consumidores da categoria A3, que abriga indústrias eletrointensivas, a Medida Provisória 579 – responsável por cortar encargos setoriais e renovar as concessões de usinas – fez a tarifa da CPFL baixar de R$ 229,91 para R$ 181,18 por megawatt-hora (MWh). Em abril, porém, a revisão tarifária da companhia elevou esse valor para R$ 227,94. Para a Cemig, houve a mesma gangorra: inicialmente, o valor do MWh passou de R$ 279,59 para R$ 214,14. Em abril, subiu para R$ 244,77. Somado, o desconto foi de 14%.

“A redução prometida pelo governo foi efetivamente calculada e aplicada, em cima da tarifa praticada em janeiro. Então, houve um ganho estrutural, mas os reajustes e revisões continuam acontecendo normalmente, obedecendo o calendário de cada distribuidora”, explica o presidente da Comerc, Christopher Vlavianos.

A esmagadora maioria da indústria, entretanto, compra energia diretamente no mercado livre. Esse mercado foi contemplado só parcialmente pela MP 579. Foram retirados os encargos setoriais que engordavam suas contas de luz e a tarifa-fio, pelo uso da rede de transmissão, também caiu. Mas não houve nenhum ganho, para os consumidores livres, com a renovação das concessões de usinas hidrelétricas. Toda a energia proveniente dessas usinas, cujos valores diminuíram mais de 70%, foi alocada às distribuidoras de energia.

O sócio-diretor da Ecom Energia, Paulo Toledo, estima que a redução efetiva para os consumidores livres acabou ficando entre 6% e 8%. A tendência é que as próprias geradoras e comercializadoras alinhem seus preços ao mercado cativo, segundo ele, a fim de evitar a perda de clientes.

O problema é que, pressionados pelo nível ainda relativamente baixo dos reservatórios, os preços mais altos do mercado “spot” (de curto prazo) neste ano contaminaram os contratos de maior duração. “Isso pode mudar de uma hora para outra. Basta um inverno chuvoso, por exemplo, mas o quadro hoje é de preços altos pelo resto do ano”, diz Toledo.

Atualmente, fecha-se um contrato de fornecimento para o ano inteiro de 2014 por valores em torno de R$ 160 a R$ 165 por megawatt-hora. Há um ano, pagava-se cerca de R$ 145 pelo mesmo período de fornecimento, segundo o sócio da comercializadora.

 

Apesar do cenário difícil e das pressões conjunturais nos custos da energia, um ponto está sendo celebrado pela indústria: o Ministério de Minas e Energia autorizou, em portaria publicada na quarta-feira, a venda de “sobras” de eletricidade que não tenham sido usadas por empresas no mercado livre. Montantes contratados e não usados pela indústria poderão, a partir de fevereiro de 2014, ser vendidos a qualquer agente do mercado. Hoje, ele só podem ser liquidados na Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) pelo preço de liquidação das diferenças (PLD), fixado toda semana.