Similaridades entre as mortes de Pablo Neruda e João Goulart
RIO DE JANEIRO (ANSA)- A Comissão da Verdade sobre a ditadura do Brasil (1964-1985), criada pela presidenta Dilma Rousseff, “segue com atenção” as investigações sobre a morte do escritor chileno Pablo Neruda, que pode ter sido envenenado por um ex-agente da CIA, segundo denunciou o ex-chofer da vítima.
No Brasil não se descarta que existam eventuais similaridades entre o falecimento de Neruda e a morte do ex-presidente João Goulart, cujo cadáver será exumado com o aval de Rousseff. “Para a Comissão da Verdade é importante que se averigue no Chile a morte de Pablo Neruda, porque existe a suspeita de que foi envenenado e agora se conhecem mais declarações de seu ex-chofer”, afirmou hoje Nadine Borges, assessora do organismo em entrevista a ANSA.
Manuel Araya, que foi chofer do prêmio Nobel de literatura Pablo Neruda, declarou ontem a ANSA no Chile, que ele possivelmente foi envenenado por Michael Townley, o ex-agente da CIA estadunidense e da DINA chilena.
Nos anos 70 o domicílio de Townley foi utilizado como laboratório para realizar experimentos com gás Sarin destinado a eliminar opositores da ditadura de Augusto Pinochet, que assassinou vários dissidentes que haviam buscado refúgio em outros países, através da rede Condor, em cumplicidade com as ditaduras da região.
O cadáver de Pablo Neruda foi exumado no dia 8 de abril passado por ordem da Justiça chilena, que acatou uma solicitação do Partido Comunista Chileno de que o escritor pode ter sido vítima de uma intoxicação intencional quando se encontrava hospitalizado em Santiago do Chile.
Seu ex-chofer Anaya, que foi prisioneiro político no Estádio Nacional de Santiago, sustentou que há suspeitas de que Townley se havia se passado por um médico para inocular uma substância letal no corpo do escritor morto 12 dias depois do golpe que derrocou seu amigo o ex-presidente Salvador Allende.
“Estou tomando conhecimento através de suas declarações que o senhor trabalhava como chofer de Pablo Neruda, e ainda que eu não possa emitir uma opinião definitiva sobre isto agora, o que posso dizer é que vamos incorporar esta informação como elemento para nossas investigações sobre o caso Goulart”, afirmou hoje Nadine Borges.
Ela é colaboradora de Rosa Cardoso, a coordenadora da Comissão da Verdade brasileira, e antes disso Borges era subsecretaria de Direitos Humanos da Presidência da Nação.
A Justiça chilena ordenou a averiguação do paradeiro de um suposto “Doutor Price”, que haveria assinado o certificado de óbito de Neruda e, de acordo com a declaração do ex-chofer seria Michael Townley, que reside nos Estados Unidos com identidade falsa e amparado pela lei que protege os delinquentes arrependidos.
“Townley esteve comprometido em casos muito conhecidos da Operação Condor, e se esta denuncia se confirma seria outro sinal de que os membros dessa coordenação realmente utilizaram o veneno como arma, e nos aportaria outro elemento para esclarecer o que aconteceu com Goulart” quando estava exilado na Argentina.
O ex-presidente João Goulart faleceu em circunstâncias não esclarecidas no dia 6 de dezembro de 1976 em sua fazenda em Corrientes, estado do nordeste argentino, e um dia depois seu corpo foi sepultado em São Borja, localidade do estado do Rio Grande do Sul, onde se encontra até hoje. A ditadura brasileira, sob o comando do general Ernesto Geisel, proibiu que se realizasse uma autópsia, o que foi mencionado por seus familiares para fundamentar, junto a outros indícios, que o ex-mandatário foi envenenado.
“Tudo o que está relacionado com a operação Condor é parte de um plano que seguia diretrizes mais ou menos parecidas, por muitos anos se considerou que a suspeita de envenenamento de Goulart era algo descabelado, agora se considera uma possibilidade e por isto se decidiu exumá-lo”, declarou Borges.
“Nós queremos que tudo seja feito com a maior seriedade, não vamos fazer uma concatenação apressada de fatos entre Neruda e Goulart, e inclusive o presidente (chileno) Eduardo Frei também é uma possível vítima de envenenamento”, aclarou a colaboradora da Comissão da Verdade.
“Pelo momento vamos aguardar mais notícias do Chile para ter um panorama mais consistente e buscar, se é que existem, as similaridades com o que aconteceu com Goulart”, resumiu.
Tradução: PCB Partido Comunista Brasileiro