A Miguel Urbano, um comunista
Ángeles Maestro – La Haine
Querido Miguel:
O desânimo que sinto ante sua morte (me vem à cabeça a palavra francesa anéantir, certamente porque tantas vezes falávamos em francês) é o resultado da resistência raivosa de minha mente em aceitar que uma pessoa de dimensões tão ilimitadas como a que você era tenha deixado de existir.
Sinceramente, creio que Georges Labica e você, os dois gigantes que agora nos faltam, foram chaves de cúpula – essa maravilhosa expressão que traz reminiscências dos construtores de catedrais, porém também da classe operária que, com suas mãos, torna possível a cada dia a reprodução da vida – para a recriação teórica e prática do que é ser comunista, aqui e agora.
Você, Miguel, assumiu o risco de romper com o dogma, porque em si mesmo é a negação do comunismo, e porque é utilizado como “auctoritas” para justificar políticas que se tornaram o tesouro da resistência heroica da classe trabalhadora no indecente tabuleiro das políticas institucionais.
Porém, esse enfrentamento sem paliativos com as burocracias você empreendeu, precisamente, para resgatar a mais fresca, a mais pura, a mais imprescindível de todas as tentativas da classe operária para assaltar os céus e, muito especialmente, a Revolução Soviética.
O enorme tesouro dos encontros de Serpa, “Civilização ou Barbárie”, foi o presente mais apreciado que Caty e você deram a um punhado de pessoas, de muitos lugares diferentes. Estou certo de que, pela chama intelectual e política que neles prendeu, pelo conhecimento mútuo que em torno de você se produziu e pela recarga de consciência e de compromisso que deles emanava, cada um de nós tem sido mais capaz de desenvolver a tarefa que cada um de nós tem em nossos países.
Creio que existe apenas uma maneira de acalmar a dor insuportável pela morte de um ser querido – essa dor da qual Miguel Hernández dizia: “que por doer me dói até o alento” e é aceitar essa continuidade efêmera que define nossa existência no marco da luta geral do proletariado por sua emancipação.
Frente à rebelião raivosa diante da ideia de que um cérebro tão precioso, uma vontade tão precisamente dirigida a orientar em tempos de tão grande confusão e a cálida presença de um camarada de uma talha humana tão ilimitada como a sua tenha morrido, só cabe continuar a luta. Assumindo, além de todas as razões históricas e imediatas que formam cada um de nós como militantes, as que aprendemos de você e consigo e que o formaram como comunista.
O elogio mais precioso que me deram na vida veio de você, Miguel. Você me disse que parecia um bolchevique de 1917. Não é verdade, porém tentarei merecê-lo.
Até a vitória, sempre, Miguel.
Venceremos!
27 de maio de 2017
Fonte: http://www.lahaine.org/a-
Tradução: Partido Comunista Brasileiro (PCB)