CNMO: A Frente Antirracista do PCB
Por Adelmo Felipe, Militante do PCB e do CNMO em Pernambuco
Introdução
O Coletivo Negro Minervino de Oliveira é muitas vezes mal compreendido. Alguns o tratam como uma espécie de entidade do movimento negro parcamente associada a um Partido, onde a disciplina pode ser mais frouxa e o marxismo é uma das possibilidades, enquanto outros o tratam como mera correia de transmissão das ideias do PCB, passadas de maneira vertical e sem levar em conta a militância do Coletivo. Ambas as formas de tratar o CNMO são incorretas e reducionistas.
Esse escrito resume as reflexões que tenho tido a respeito do Minervino. Enquanto jovem militante, quero melhorar cada vez mais através das críticas, sugestões e acréscimos dos meus camaradas.
Os comunistas e suas frentes de atuação
Não é novidade que os comunistas criaram várias frentes de atuação para lidar com as necessidades concretas do dia a dia da luta. Seja na legalidade, seja na clandestinidade, os revolucionários precisam inovar para burlar os entraves que a burguesia coloca cotidianamente. Em nossa história, temos o Bloco Operário-Camponês, entidade criada para representar os interesses do Partido Comunista sem no entanto levar o seu nome, inclusive servindo de plataforma eleitoral para nossos camaradas, como foi o caso de Minervino de Oliveira.
No que tange à legalidade, vemos que mesmo os Partidos Comunistas no poder se preocupam em tratar das particularidades da luta de classes, vide a criação do Komsomol, juventude do Partido Comunista da URSS, criada para iniciar os jovens soviéticos na vida partidária, militante e comunista, sem falar das organizações de mulheres.
Apesar desse histórico quase onipresente de organizações de massa que complementam o Partido Comunista, muitos podem questionar a validade de um “Coletivo Negro” liderado e hegemonizado por marxistas. Ora, se não somos identitários, por que um coletivo particularmente negro?
Contextualização
A grande derrota que os comunistas sofreram no final dos anos 90 afetou duramente a capacidade de atuação e até a autoestima dos revolucionários, forçando-os a reagir de alguma forma frente à queda das experiências socialistas. Muitos as renegaram, tratando-as como meras tentativas fracassadas de criar um novo mundo usando Marx e Lênin como referência principal. Alguns achavam que Stálin era o culpado, outros entendiam que a falta de Stálin era o grande problema. Outros, poucos, achavam que o problema vinha de Lênin, enquanto alguns até mesmo culpavam Marx e Engels.
Independentemente da análise, todos aqueles que se diziam e se dizem revolucionários foram afetados, pois todo um projeto de mudança social radical passou a ser considerado ineficaz e utópico. Sem dúvidas isso também caiu sobre os Partidos, não apenas aos Partidos Comunistas, mas a própria Forma-Partido. Tendo em vista esse cenário em que os partidos políticos sofrem desconfiança prévia, tratados apenas como máquinas eleitorais, o que é verdade para a maioria deles, houve a necessidade de “inovar”.
Perspectiva classista
Quais as consequências da deslegitimação do marxismo para a esquerda não marxista? Com o fim do chamado campo socialista, muitas das perspectivas clássicas da esquerda influenciada pelos marxistas se perderam ou foram tratadas como ultrapassadas. Uma delas, além da perspectiva revolucionária e de transformação radical, foi a noção de totalidade. Os chamados “Novos Movimentos Sociais” cada vez mais se envolviam em perspectivas particularistas que, mesmo legítimas, costumavam se distanciar do todo. Até o horizonte anticapitalista, mesmo de maneira genérica, se esvaiu, vide as várias entidades e pessoas que “representam a luta” sendo bem aceitas por grandes marcas de supermercados, bancos e cosméticos. Nesses casos, o assim chamado “identitarismo” é o mote principal. Para eles, mais importante que a luta contra o Capital, que mantém a exploração dos negros, mulheres e LGBTs, é a conquista de espaços institucionais ou comerciais para poucos representantes dessas camadas oprimidas.
O Coletivo Negro Minervino de Oliveira vai na contramão dessa tendência, pois, além de estar intrinsecamente ligado a um Partido Comunista, também coloca a questão de classe e a luta anticapitalista como parte fundamental da luta antirracista. Não apenas isso, muitos aspectos internos nos diferenciam de muitas das outras organizações. Por exemplo, pessoas brancas podem compor o Coletivo, assim como pessoas racializadas que não se identificam enquanto negros e negras, como indígenas e ciganos. Por quê? Porque entendemos que a luta antirracista necessita escapar das bolhas. Especialmente as pessoas brancas devem se envolver na luta. Não queremos segregar a luta. Se antirracistas e comunistas brancos querem e podem colaborar diretamente, que venham.
Em relação ao PCB, o CNMO não é o local onde exclusivamente estão aqueles e aquelas que vão debater sobre a questão racial, muito menos é o local onde todos os negros e negras do Partido devem atuar. O Coletivo não foi feito para que os militantes racializados tenham a obrigação de compor. Isso seria uma limitação, pois daria-nos a responsabilidade única de pensar e formular sobre o racismo no Brasil utilizando a linha do Partido. Nem todos os militantes negros do PCB devem fazer parte do Minervino, assim como nem todos os seus membros são ou serão membros do PCB. Do contrário, teríamos um Coletivo inchado de militantes sobrecarregados ou ociosos obrigados a militar em duas instâncias. Estar no PCB e no CNMO ao mesmo tempo deve ser uma escolha individual e coletiva que leve em consideração as necessidades e possibilidades dos militantes.
Por fim, nosso papel não é negligenciar os debates mais recentes sobre a questão racial, o feminismo negro, a religiosidade de matriz africana ou o epistemicídio provocado pela colonização. Esses “novos” debates servem para desenvolver e aperfeiçoar nossas teses, superar erros antigos que persistem e nos envolvermos cada vez mais no dia a dia da classe trabalhadora, que é, em sua maioria, racializada. Nosso papel é fazer a disputa. Se boa parte do Movimento Negro capitulou diante do capital e aos acordos de gabinete, que sejamos a contratêndencia.
Relação dialética entre o PCB e o Minervino
O Coletivo Negro Minervino de Oliveira é um instrumento do Partido Comunista Brasileiro. O CNMO possui autonomia para inovar e flexibilizar de acordo com as demandas da luta de classes, mas suas ações e formulações não podem contradizer a linha mestra do Partido, que é tirada nos Congressos Nacionais. Reforçar esses fatos não significa dizer que 100% das deliberações vindas das instâncias superiores sempre serão corretas e que devemos aceitar e colocar em prática de maneira cega. Nosso Coletivo possui autonomia, ou seja, pode organizar autonomamente seu recrutamento, formação, AgitProp, núcleos e até suas direções, com o aval das respectivas instâncias partidárias. A militância do Coletivo tem a capacidade e o dever de formular de maneira criativa a respeito da realidade nacional, regional ou local. Se não fosse assim, o Minervino seria apenas um aparelho que visa esconder o nome do PCB. Não teria identidade própria.
O nosso Coletivo também pode e deve ser uma ferramenta para melhorar o Partido através da inserção cada vez maior nas periferias, nos movimentos populares e nas comunidades religiosas de matriz africana. É uma via de mão dupla. O Partido fornece a linha mestra e esta é colocada em prática de maneira criativa na realidade concreta. Se ela for insuficiente, que seja melhorada. Se ela se mostrou inadequada, que seja levada aos Congressos para ser revista e talvez modificada.
Conclusão
Muitos tentaram e ainda tentam criar uma espécie de oposição ou pelo menos diferenciação entre o Partido e o Coletivo, alegando que são bem diferentes especialmente no que tange a origem social dos militantes. O Partido seria dirigido por brancos acadêmicos, enquanto o CNMO estaria repleto de negros e negras precarizados. Mesmo que na aparência, e graças a uma certa manipulação, este tipo de fenômeno se mostre, não podemos cair na armadilha simplista e identitária. Raça e Classe fazem parte de uma totalidade. Defendemos que os trabalhadores enquanto classe se organizem e lutem por suas reivindicações históricas. Isso não nos impede de pensar nas particularidades desses trabalhadores. Nós, negros e negras, somos LGBTs, PCDs, neurodiversos, temos particularidades em relação à região, trabalho, sálario, religião, moradia e muito mais. Lidar com essas diferenças, com o objetivo de organizar a classe, é o nosso maior desafio.
O Coletivo Negro Minervino de Oliveira é parte orgânica e inseparável do Partido Comunista Brasileiro!
Viva o Coletivo Negro Minervino de Oliveira!
Viva o Partido Comunista Brasileiro!
Pretos e Vermelhos pelo Socialismo!